Acórdão Nº 0000203-54.2016.8.24.0002 do Segunda Câmara Criminal, 18-02-2020

Número do processo0000203-54.2016.8.24.0002
Data18 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemAnchieta
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão




Recurso Em Sentido Estrito n. 0000203-54.2016.8.24.0002, de Anchieta

Relator: Desembargador Norival Acácio Engel

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (RÉU SOLTO). DELITOS DE HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO E FRAUDE PROCESSUAL (ART. 121, §2º, INCISOS I E IV, E ART. 347, § ÚNICO, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). DECISÃO DE PRONÚNCIA. INSURGÊNCIA DEFENSIVA.

PLEITO DE DESPRONÚNCIA POR INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. PROVAS DA MATERIALIDADE E INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA DO CRIME DOLOSO CONTRA A VIDA. DEPOIMENTO DE POLICIAL CIVIL QUE ATUOU NA INVESTIGAÇÃO, CORROBORADO POR LAUDO PERICIAL QUE ATESTA A EXISTÊNCIA DE CONTRADIÇÕES NA VERSÃO APONTADA PELO RECORRENTE. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE PARA AMPARAR A DECISÃO DE PRONÚNCIA. VERSÃO DEFENSIVA NÃO DEMONSTRADA DE MANEIRA INCONTROVERSA. ANÁLISE APROFUNDADA DA PROVA INVIÁVEL NESTA ETAPA PROCESSUAL. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DO "IN DUBIO PRO SOCIETATE". MANUTENÇÃO DA PRONÚNCIA QUE SE IMPÕE.

REQUERIMENTO DE FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. INVIABILIDADE. VERBA QUE, EM PROCESSOS DE COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI, DEVE SER FIXADA AO FINAL DO PROCEDIMENTO BIFÁSICO. PRECEDENTES.

RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Em Sentido Estrito n. 0000203-54.2016.8.24.0002, da comarca de Anchieta Vara Única em que é Recorrente V. A. B. e Recorrido Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Segunda Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Sérgio Rizelo, com voto, e nele tomou parte o Exmo. Sr. Des. Moacyr de Moraes Lima Filho. Funcionou como representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. Rogério Antônio da Luz Bertoncini.

Florianópolis, 18 de fevereiro de 2020.

Desembargador Norival Acácio Engel

Relator


RELATÓRIO

Na Comarca de Anchieta, o Ministério Público ofereceu denúncia contra V. A. B., dando-o como incurso nas sanções dos arts. 121, § 2º, incisos I e IV, e 347, § único, ambos do Código Penal, em razão dos fatos assim descritos:

1. Do crime previsto no art. 121, § 2º, incisos I e IV, do Código Penal:

No dia 25 de maio de 2015, por volta das 8h, na Linha São Roque, interior da cidade de Anchieta, o denunciado V. A. B., consciente e voluntariamente, matou N. B., sua esposa, mediante dois disparos de arma de fogo e golpes com instrumento contundente, os quais atingiram a cabeça da vítima e produziram-lhe: "1 - Ferimento pérfuro contundente com orifício de entrada no lábio superior a esquerda (...); 2 - Ferimento perfuro contundente com orifício de entrada na região mandibular esquerda, a cinco (5) centímetros abaixo do poli inferior do pavilhão auricular esquerdo (...); 3 - Múltiplos ferimentos corto-contusos no couro cabeludo em número de quatorze (14) ferimentos localizados na calota craneana; (...)".

O crime foi levado a efeito por motivo torpe, uma vez que o denunciado pretendia, com a morte da esposa, receber o valor oriundo do contrato de seguro referente à apólice n. 81264482162, cuja cobertura contratada era justamente a morte de N. B..

O delito foi cometido mediante recurso que dificultou a defesa da ofendida, pois N. foi surpreendida com a ação de denunciado, completamente inesperada no contexto apresentado.

2. Do crime previsto no artigo 347 do Código Penal:

Ainda no mês de maio de 2015, no mesmo local descrito no tópico anterior, o denunciado V. A. B., consciente e voluntariamente, inovou artificiosamente o estado de lugar e coisa, com o fim de induzir a erro o perito e o juiz.

Na ocasião, o denunciado, já suspeito da prática do crime de homicídio de sua esposa, a fim de comprovar a versão apresentada à autoridade responsável pela investigação, alterou o local em que ocorrida a morte, inserindo um projétil de arma de fogo na parede de madeira do galpão situado aos fundos do imóvel.

Segundo informado pelo denunciado, o projétil teria sido disparado por terceiro e buscava atingi-lo. Ato contínuo, segundo a versão do denunciado, a mesma pessoa, utilizando-se da mesma arma de fogo, disparou contra N. B..

Ocorre que, após a realização de exames periciais, restou atestado que a munição que atingiu a vítima não teve origem na mesma arma de fogo que disparou contra a parede do galpão e que da posição em que estaria o atirador, indicada pelo denunciado, a parede não poderia ter sido atingida da forma retratada no laudo técnico.

O denunciado, com sua conduta, pretendeu produzir efeito em processo penal, ainda que não iniciado na época. (fls. 1/3)

Concluída a instrução preliminar, foi julgado admissível o pleito formulado na exordial e, em consequência, o Magistrado a quo pronunciou V. A. B. como incurso nas sanções dos arts. 121, § 2º, incisos I e IV, c/c 347, § único, ambos do Código Penal.

Irresignada, a defesa interpôs Recurso em Sentido Estrito (fls. 497/498), em cujas Razões (fls. 517/521) pugna pela impronúncia, por insuficiência probatória, mediante o reconhecimento do in dubio pro reo, bem como a fixação de honorários pela atuação neste grau de jurisdição.

Apresentadas as Contrarrazões (fls. 524/543), os autos ascenderam ao Segundo Grau, oportunidade em que a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Aurino Alves de Souza, manifestou-se pelo parcial conhecimento e, nesta extensão, não provimento do Apelo (fls. 554/559).

Este é o relatório.

VOTO

O recurso merece ser conhecido, por próprio e tempestivo.

Pugna, a defesa, pela impronúncia, sob o argumento de insuficiência probatória, por entender que "não há nos autos qualquer indício de ter sido o réu o agente praticante do crime" (fl. 519).

Razão, entretanto, não lhe assiste.

Cumpre destacar, desde já, que, em crimes da competência do Tribunal do Júri, como na hipótese, o Magistrado somente está autorizado a reconhecer provas da materialidade do crime e indícios de sua autoria, relegando a apreciação do mérito da causa ao Conselho de Sentença.

Desta forma, nesta fase, é defeso ao Juiz uma profunda valoração das provas amealhadas ao processo, cabendo-lhe, tão-somente, o exame da viabilidade da acusação.

Pois bem.

Consta da Exordial, em suma, que, na manhã de 25/05/2015, no interior de Anchieta/SC, o Recorrente, agindo com manifesto animus necandi, matou a ofendida N. B., sua esposa, utilizando-se de uma arma de fogo.

Por essa razão, o Recorrente foi pronunciado pela prática do crime de homicídio qualificado pelo motivo torpe e emprego de recurso que dificultou ou impossibilitou a defesa da vítima.

Isso posto, observa-se que a prova da materialidade e os indícios de autoria restaram demonstrados por meio do Boletim de Ocorrência (fls. 8/9), Fotografias (fls. 14/18), Laudos Periciais Cadavérico (fls. 23/28), de Exame em Local de Morte Violenta (fls. 30/49) e de Comparação Balística (fls. 173/181), Relatórios de Investigação (fls. 121/128 e 196/212), Termo de Exibição e Apreensão (fl. 141), bem como pelas provas orais colhidas durante a persecução criminal.

A testemunha D. M., perante a Autoridade Judicial, disse:

Que mora a cerca de um quilometro do local dos fatos; Que estava em casa no dia do ocorrido; Que por volta das 08:30 da manhã visualizou algumas viaturas passando por perto de sua residência; Que pensou que fosse alguma acidente; Que foi até a casa da vítima; Que visualizou o Recorrente na porta da residência, chorando, e um pouco a frente identificou o corpo da ofendida; Que, então, voltou para sua casa; Que viu dois veículos pretos passando pela sua residência, um deles em alta velocidade; Que nunca viu o Recorrente e sua esposa brigando; Que nunca viu o Recorrente portando arma de fogo; Que desconhece qualquer inimizade entre o Recorrente, sua esposa e outras pessoas. (Audiovisual de fls. 338/339)

O testigo I. M., em Juízo, afirmou:

Que estava em casa no dia dos fatos; Que por volta das 08:10 estava tomando chimarrão em frente à sua casa, quando viu um veículo escuro passar; Que achou suspeito o fato de o automóvel estar sendo conduzido em alta velocidade; Que em seguida pôde visualizar algumas viaturas da polícia; Que sua esposa foi atrás para ver o que aconteceu; Que o depoente...

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