Acórdão Nº 0000225-16.2012.8.24.0144 do Quarta Câmara de Direito Civil, 21-10-2021

Número do processo0000225-16.2012.8.24.0144
Data21 Outubro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0000225-16.2012.8.24.0144/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ FELIPE SCHUCH

APELANTE: WALDIR MARCHI APELADO: ALDORI VIEIRA FIGUEIREDO

RELATÓRIO

Acolho o relatório da sentença (evento 212 dos autos de primeiro grau), por contemplar precisamente o conteúdo dos presentes autos, ipsis litteris:

Waldir Marchi ajuizou ação indenizatória contra Aldori Vieira Figueiredo, alegando, em síntese, que: a) foi vítima de acidente de trânsito ocorrido em 1º de fevereiro (sic) de 2010; b) referido acidente foi provocado por Aldori Vieira Figueiredo, condutor e proprietário do veículo VW/15.190, placas MBW-1171, que perdeu a direção do veículo, invadindo a pista em que seguia o autor; c) em razão do evento danoso, sofreu diversas lesões e prejuízos de ordem material e moral. Assim, com a ação aforada, pretende a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos materiais, morais e pensão vitalícia. Citado, o réu apresentou contestação, na qual alegou não ter sido o causador do sinistro. Requereu a denunciação do suposto culpado. Impugnou os pedidos de danos materiais, lucros cessantes, morais, pensão alimentícia e requereu a total improcedência dos pedidos iniciais. Réplica às pp. 311/324 [evento 187, Impugnação 325 a Impugnação 337]. Indeferido o pedido de denunciação à lide, foi determinada a produção da prova pericial. Em decisão saneadora foram fixados os pontos controvertidos e determinada a produção da prova oral (p. 391) [evento 109]. Em audiência de instrução e julgamento realizada nesta Comarca, foram ouvidas quatro testemunhas. As demais foram inquiridas por meio de cartas precatórias expedidas às Comarcas de São Lourenço do Oeste/SC, São Joaquim/SC e Rio do Sul/SC. Encerrada a instrução, às partes apresentaram alegações finais por memoriais. O autor requereu a total procedência dos pedidos iniciais, porquanto comprovada a responsabilidade do réu no evento danoso. O réu, por sua vez, disse que não restou comprovado ter sido o responsável pelo sinistro. Mas sim, terceiro. Requereu, alternativamente, a produção de prova pericial a ser realizada nos veículos. À p. 859 [evento 194], o procurador do autor informou o falecimento deste, sendo então promovida a habilitação do espólio. Vieram os autos conclusos. É o relatório. Decido.

A Magistrada julgou improcedentes os pedidos exordiais, nos seguintes termos:

Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE, com resolução de mérito, os pedidos formulados por Waldir Marchi, substituído no curso da ação pelo espólio, na presente ação que move contra Aldori Vieira Figueiredo. Condeno o vencido ao pagamento das custas processuais e os honorários advocatícios (art. 85 do NCPC) em favor do advogado do vencedor, estes fixados - atendidos o grau de zelo do profissional o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa e o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço - em R$ 1.500,00 (art. 85, §2º, do NCPC). Sobre tal valor deverá ser acrescido juros de 1% a.m, contados do trânsito em julgado da sentença e correção monetária pelo índice do INPC, desde a presente data. Sendo o vencido beneficiário de justiça gratuita (Lei n. 1.060/1950), pois ora defiro ao espólio, as benesses da Justiça Gratuita, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário (art. 98, § 3º, do NCPC).

A parte autora apresentou Embargos de Declaração (autos 0000088-87.2019.8.24.0144 - certidão evento 219 dos autos de origem), que foram rejeitados pelo juízo (evento 221 dos autos de origem).

Irresignado com a prestação jurisdicional entregue, o espólio do autor interpôs apelação (evento 223), na qual alegou estar caracteriza a culpa exclusiva do réu pelo sinistro objeto do feito, conforme o croqui constante no Boletim de Ocorrência lavrado pela autoridade policial, visto que o caminhão do requerido, que estava descarregado, fazia curva acentuada para a sua direita e em declive também acentuado, com a pista molhada e sob chuva, não tendo adotado as devidas cautelas, invadindo a pista contrária e colidindo com dois caminhões, dentre os quais o seu, conforme corrobora o depoimento de Policial Rodoviário Sebastião Marcelino, que atendeu a ocorrência.

Ressalta que a versão apresentada pelo requerido de que a culpa pelo acidente seria de terceiro veículo é fantasiosa e contrária a interpretação do boletim do acidente e demais provas dos autos, especialmente os depoimentos prestados pelas testemunhas Osmair Fillippini, Aldo Luiz Pan e do citado Policial Rodoviário, que são uníssonas ao corroborar a veracidade do Boletim de Ocorrência.

Aduz que o depoimento da informante Elizabete de Melo Figueiredo, que é esposa do requerido, bem como das testemunhas Anilson Lima Souza e Valdoir Gobeti, são imprestáveis para derruir a presunção do Boletim de Ocorrência, uma vez que a cônjuge do réu, ainda que estivesse no caminhão no momento do sinistro, não esclareceu sua dinâmica, enquanto os testigos mencionados não presenciaram o acidente e tomaram conhecimento dos fatos ao visitarem o requerido no hospital e ouviram apenas a versão deste, no seu exclusivo interesse, gerando mera suposição da dinâmica.

Argumenta que o próprio réu confessou que seu caminhão rodou na pista por estar sem controle e atingiu o veículo do autor que estava trafegando em sentido contrário e na terceira faixa, apontando contradição nas versões do apelado que, por primeiro, afirmou que seu veículo foi atingido por terceiro no lado direito e na ponta final da carroceria, dinâmica esta impossível na medida em que o outro caminhão subia em curva para a esquerda, e, posteriormente, disse que foi atingido na parte esquerda dianteira e na parte traseira esquerda, dinâmica que se coaduna justamente com o descrito no Boletim de Ocorrência.

Enfatiza que o Boletim de Ocorrência é ato administrativo que goza da presunção juris tantum de veracidade, somente podendo ser derruído por prova robusta em sentido contrário, o que não ocorreu no caso.

Postula o provimento do recurso, com a reforma da sentença e o acolhimento dos pedidos deduzidos na peça exordial, para que a parte ré seja condenada a pagamento de indenização por danos materiais, lucros cessantes, pensão mensal vitalícia, danos morais e danos estéticos, bem como a inversão dos encargos sucumbenciais.

Ofertadas contrarrazões (Evento 227 dos autos de origem).

É o relatório.

VOTO

De início, assinalo que, não obstante a existência de outros feitos mais antigos no acervo de processos distribuídos a este Relator, a apreciação do presente recurso em detrimento daqueles distribuídos há mais tempo não significa violação ao disposto no art. 12, caput, do novo Código de Processo Civil, tendo em vista a exceção contida no § 2º, VII, primeira parte, do mesmo dispositivo legal.

O recurso preenche os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.

1. DA CULPA PELO SINISTRO

Trata-se de recurso apelatório contra a sentença que julgou improcedentes os pedidos deduzidos na peça exordial, referente a acidente automobilístico ocorrido em 1º-2-2010, às 16h30min., no Km 159,5, da BR 470, no município de Trombudo Central/SC, envolvendo três caminhões, quais sejam M. Benz L 708E, placa MDH-9760, dirigido pelo autor/apelante Waldir Marchi, VW/15.190, placa MBW-1171, guiado pelo réu/apelado Aldori Vieira Figueiredo, e o terceiro envolvido Volvo/FH 440, placa MFW-1363, dirigido por Osmair Filippini.

Nesse sentido, na peça exordial (evento 187, Petições 6/27), Waldir Marchi sustentou que o réu, ao contornar uma curva, rodou na pista e invadiu a contramão de direção, atingindo seu caminhão e lhe causando graves ferimentos, especialmente Traumatismo Crânio encefálico e fraturas exposta do fêmur e da mandíbula, deixando-o com sequelas.

Por seu turno, o réu Aldori Vieira Figueiredo, na sua peça defensiva (evento 187, petições 293/308), alegou que não foi o causador do sinistro, que ocorreu por culpa do terceiro que está citado no Boletim de Ocorrência, qual o seja o veículo Volvo/FH 4406X2T, dirigido por Osmair Filippini, que transitava em frente ao veículo do autor, que se perdeu na curva e atingiu a traseira do caminhão guiado pelo réu na ponta final da carroceria, ao seu lado direito, e ocasionou a rodada na pista e a colisão com o veículo do autor, decorrente do denominado "efeito chicote". Apontou, ademais, que conforme fotografias do caminhão do réu, não houve avarias na sua parte frontal, nem no lado esquerdo, que justifiquem o reconhecimento da invasão da sua contramão de direção, sendo que o Boletim de Ocorrência lavrado não retrata a realidade dos fatos.

Após a instrução do feito, com a confecção de laudos periciais médicos e a oitiva de testemunhas e informantes, sobreveio a sentença de improcedência dos pedidos, haja vista o juízo de origem entender que o réu não foi o causador do acidente, ou seja, excluindo sua culpa, sob os seguintes fundamentos (Evento 212):

Pois bem. Analisando detidamente as provas constantes nos autos, tenho que a parte autora não logrou êxito em comprovar o fato constitutivo do seu direito, isto é, que o réu foi o autor do evento danoso. Senão vejamos. O Boletim de Ocorrência de pp. 43/51 aponta que o ponto de impacto dos veículos ocorreu na pista em que seguiam autor e o veículo Volvo/FH. Consta no Boletim de Ocorrência a seguinte narrativa: "Conforme informações dos condutores e vestígios no local, o veículo 01 seguia em frente e ao contornar a curva o mesmo rodou na pista, invadiu a contramão e colidiu com os veículos 02 e 03 que seguiam em sentido contrário". No mesmo sentido da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT