Acórdão Nº 0000266-97.2019.8.24.0059 do Quinta Câmara Criminal, 27-01-2022

Número do processo0000266-97.2019.8.24.0059
Data27 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0000266-97.2019.8.24.0059/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ CESAR SCHWEITZER

APELANTE: MARCOS ANTONIO VOLKWEIS (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

A representante do Ministério Público do Estado de Santa Catarina com atuação perante o Juízo de Direito da Unidade de Divisão Judiciária da comarca de São Carlos ofereceu denúncia em face de Marcos Antônio Volkweis, dando-o como incurso nas sanções dos arts. 129, caput, combinado com § 12, 163, parágrafo único, III, e 331, todos do Código Penal, pela prática dos fatos delituosos assim narrados:

Na data de 18 de março/2019, 19h40min, na residência localizada à Rua do Comércio, 599, Centro de São Carlos/SC, Marcos Antonio Wolkweis desacatou funcionários públicos no exercício da função e ofendeu a integridade física de integrantes da Polícia Militar deste Estado de Santa Catarina.Ao agir, irresignado com a presença de policiais militares em atendimento à situação de violência doméstica relatada pelo filho do denunciado, Marcos Volkweis, verificando que o Soldado Luiz Alexandre Kades Ferrarese subia as escadas de acesso à residência empurrou o policial, pelo pescoço, contra o corrimão da escada, vindo a danificar a farda e causar escoriações em coxa posterior direita e em antebraço direito de Luiz Alexandre (fl. 8).E, bradando que "ninguém entraria na casa dele"(fl. 3), Marcos passou a desferir chutes e golpes com os braços contra os policiais, vindo a atingir o Soldado Felipe Demarchi, causando nesta vítima "edema + hiperemia em antebraço direito, com dor a palpação local e movimentação do punho e da mão"(fl. 7).Na sequência da conduta em menosprezo à atividade pública desempenhada pelos policiais militares, Marcos afirmou que "iria 'foder' com os policiais" e que "iriam pagar por isso", além de desqualificá-los, chamando-os de "bandidos".Por fim, conduzido à Delegacia de Polícia, durante o trajeto, Marcos deteriorou a caixa de condução da viatura policial, patrimônio do Estado de Santa Catarina, tendo, com a cabeça, atingido a lateral da caixa de condução, causando no bem público rachadura (sic, fls. 1-2 do evento 5.18).

Encerrada a instrução, a Magistrada a quo julgou procedente o pedido formulado na inicial acusatória para condená-lo às penas de dois anos, um mês e vinte dias de detenção, a ser resgatada em regime inicialmente aberto, e pagamento de quinze dias-multa, individualmente arbitrados à razão de metade do salário mínimo vigente à época dos fatos, por infração ao preceito dos arts. 129, combinado com § 12, 163, parágrafo único, III, e 331, na forma do art. 69, caput, todos do Código Penal.

Inconformado, interpôs o réu recurso de apelação, objetivando a sua absolvição.

Em relação ao crime de lesão corporal, aduz que agiu em legítima defesa do patrimônio, haja vista que os agentes estatais, de forma "abusiva e inconstitucional" invadiram sua residência sem qualquer mandado judicial ou situação de flagrância.

Quanto ao desacato, assevera que seu comportamento está amparado pela excludente de culpabilidade da inexigibilidade de conduta diversa, porquanto se realmente proferiu palavras de cunho ofensivo, apenas o fez em momento de raiva, em razão da situação a que estava sendo submetido na sua própria moradia, não tendo a intenção de "ofender, humilhar, causar vexame e menosprezar o funcionário público em razão de suas funções" (sic, fls. 10 do evento 12.1).

Por fim, no que tange ao delito de dano ao patrimônio público, sustenta que deve incidir o princípio do in dubio pro reo na espécie, uma vez que não há nos autos provas suficientes de que foi o responsável por quebrar a parte superior do compartimento da viatura.

Em suas contrarrazões, a Promotora de Justiça oficiante pugna pela preservação da decisão vergastada.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio de parecer da lavra do eminente Procurador de Justiça Rogério Antônio da Luz Bertoncini, opinou pelo conhecimento e desprovimento do reclamo.

É o relatório.

VOTO

Presentes os respectivos pressupostos de admissibilidade, conhece-se da irresignação e passa-se à análise do seu objeto.

Nada obstante as ponderações constantes das razões recursais, a pretensão absolutória não merece prosperar.

Com efeito, a materialidade e autoria dos ilícitos encontram-se sobejamente comprovadas por meio de boletim de ocorrência (evento 1.3-5), autos de exame de corpo de delito (evento 1.6-8) e ofício 267/2019/JCK (evento 12.25-28), bem assim pelas narrativas acostadas ao feito.

Acerca das ocorrências criminais não há maiores digressões. Assim, fazendo uso da técnica da fundamentação referenciada ou aliunde, amplamente admitida pela jurisprudência pátria, em especial nas Cortes Superiores (STF, AgR no RE 1099396/SC, rel. Min. Roberto Barroso, j. 23-3-2018; STJ, HC 462.140/RS, rel. Min. Laurita Vaz, j. 4-10-2018, AgRg no REsp 1.640.700/RS, rel. Min. Félix Fischer, j. 18-9-2018, AgRg nos EDcl no AREsp 726.254/SC, rel. Min. Joel Ilan Paciornik, j. 21-8-2018 e HC 426.170/RS, rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 8-2-2018; TJSC, Embargos de Declaração n. 0006291-74.2018.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Getúlio Corrêa, j. 16-10-2018 e Embargos de Declaração n. 0000906-80.2011.8.24.0027, de Ibirama, rel. Des. Sidney Eloy Dalabrida, j. 6-9-2018), adotam-se os bem lançados fundamentos da sentença da lavra da Juíza de Direito Cristine Schutz da Silva Mattos como razões de decidir, porquanto examinou os elementos de convicção de acordo com a compreensão deste Colegiado:

[...]Lesão corporal (art. 129, § 12º, do CP)Segundo a peça pórtica, no dia 18 de março de 2019, por volta das 19h40min, o réu Marcos Antonio Volkweis, irresignado com a presença dos Soldados Luiz Alexandre Kades Ferrarese e Felipe Demarchi em sua residência, para atendimento à situação de violência doméstica relatada pelo filho do denunciado, empurrou o policial Luiz, pelo pescoço, contra o corrimão da escada, vindo a danificar a farda e causar escoriações em coxa posterior direita e em antebraço direito do agente.Ainda, visando evitar o ingresso dos milicianos na casa, desferiu chutes e golpes contra a guarnição, atingindo e lesionando Felipe, que apresentou "edema + hiperemia em antebraço direito, com dor a palpação local e movimentação do punho e da mão".Diante desses fatos, teria o réu praticado o crime descrito no art. 129, §12º, do Código Repressivo Brasileiro:

"Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: Pena - detenção, de três meses a um ano. [...] § 12. Se a lesão for praticada contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição, a pena é aumentada de um a dois terços".

O delito de lesão corporal tutela qualquer dano do ponto de vista anatômico, fisiológico ou psíquíco, praticado sem intenção de matar (animus necandi).Para a caracterização do delito, é necessária a produção de lesão no corpo da vítima, interno ou externo, abrangendo também as alterações psíquicas. A dor ou o eritema - "vermelhidão" decorrente da vasolidatação dos capilares sanguíneos, causados por um tapa ou bofetada - não configuram lesão corporal.Com a edição da Lei n. 13.142/2015, foi incluído o § 12.º ao art. 129 do Código Penal, passando a prever causa especial de aumento de pena (1/3 a 2/3), incidente na terceira fase da dosimetria, quando a ofensa a integridade física ou a saúde for praticada contra policiais ou integrantes dos órgãos de segurança pública ou seus familiares, independentemente da natureza da lesão.A par disso, denoto que a materialidade e a autoria do delito ressumbram de maneira inequívoca no presente feito, encontrando guarida no boletim de ocorrência (evento 1, pgs. 3-5), nos autos de exame de corpo de delito (evento 1, pgs. 7 e 8), e nos depoimentos dos milicianos lesionados.Com efeito, o agente Luiz Alexandre Kades Ferrarese, inquirido na Delegacia de Polícia, esclareceu que, embora a guarnição tenha sido acionada pelo filho de Marcos, que noticiava a prática de violência doméstica, o réu impedia a entrada dos policiais na casa, mediante empurrões, chutes e golpes com os braços, sendo contido apenas com o uso moderado da força, algemas e spray de pimenta. Descrevendo as agressões sofridas, relatou que o acusado o empurrou pelo pescoço contra o corrimão da escada que dá acesso à residência, rasgando a farda e ocasionando escoriações na perna direita. A propósito, veja-se o teor do depoimento (evento 1, pg. 3):

"[...] estando de serviço na GUPM de São Carlos, juntamente com seu colega, SD DEMARCHI, recebeu uma ligação de violência doméstica, ocasião em que uma mulher estaria sendo agredida pelo seu companheiro no local dos fatos. O solicitante da ocorrência era o enteado da mulher supostamente agredida, FELIPE AUGUSTO SILVA VOLKEIS. Informa que ao chegar no local, juntamente com seu colega, foram ouvidos gritos no interior da residência, ocasião em que o solicitante FELIPE pediu ajuda e pediu para subir as escadas de acesso a casa. Quando estavam chegando na residência, a porta de vidro estava entre aberta, sendo que o comunicante estava na frente e seu colega atrás. Informa que quando chegou na porta, MARCOS ANTONIO VOLKWEIS, ora autor, o empurrou pelo pescoço contra o corrimão da escada, ocasião em que rasgou a farda e ocasionou escoriação na perna direita, conforme AECD. Após isso, o comunicante e seu colega tentaram conter o autor, que a todo o momento tentava empurrar os policiais de volta para fora, desferindo chutes e golpes com os braços. Informa que o autor gritava dizendo que ninguém entraria na casa dele, somente com mandado judicial. Após tentaram dialogar e acalmar MARCOS, este, visivelmente embriagado e com odor etílico, não se acalmava e resistia à prisão. Informa ainda que a vítima, Sra. SUZANE...

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