Acórdão Nº 0000289-43.1998.8.24.0006 do Segunda Câmara de Direito Comercial, 03-05-2022

Número do processo0000289-43.1998.8.24.0006
Data03 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0000289-43.1998.8.24.0006/SC

RELATORA: Desembargadora REJANE ANDERSEN

APELANTE: BANCO DO BRASIL S.A. APELADO: VALDIR TAVARES APELADO: COMERCIAL DE BOLOS ARTISTICOS IRABEL LTDA. APELADO: STELLA MARIA TAVARES

RELATÓRIO

Banco do Brasil S/A ajuizou ação de execução de título extrajudicial em desfavor de Comercial de Bolos Artísticos Irabel Ltda, sustentando ser credor do requerido da importância de R$24.193,59 (vinte e quatro mil, cento e noventa e três reais e cinquenta e nove centavos), referente ao contrato particular de confissão e assunção de dívida, o qual foi firmado entre as partes em 20-9-1996.

Diante das tentativas inexitosas de penhora dos bens do executado, a casa bancária exequente requereuao Juízo singular, o arquivamento do feito (evento 243 - petição 180), pleito que foi deferido em 24-4-2003 (evento 246).

Em 10-1-2014, aportou aos autos petição (evento 248) na qual a exequente requereu a juntada de procuração nos autos (evento 248), após, nova petição em que postulou informações a fim de buscar bens em nome do executado (evento 251).

Após o deferimento de diligências diversas, a parte executada apresentou exceção de pré-executividade alegando a ocorrência de prescrição intercorrente (evento 290).

Intimada, a parte exequente refutou a possibilidade de extinção do feito com fundamento na prescrição (evento 294).

Ato contínuo, sobreveio sentença (evento 296) da qual se extrai a seguinte parte dispositiva:

Diante do exposto, JULGO EXTINTO o processo, nos termos do artigo 924, inciso V, do Código de Processo Civil, ante a ocorrência da prescrição intercorrente da pretensão executiva amparada em instrumento particular, com base no artigo 206, § 5º, inciso I, do Código Civil. Tendo em vista que a inércia da parte exequente deu causa à extinção da ação, condeno-a ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como honorários de sucumbência, que arbitro em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), nos termos do artigo 85, §§ 2º e 8º, do CPC (TJSC, Apelação Cível n. 0001177-37.1999.8.24.0051, de Ponte Serrada, rel. Des. Jânio Machado, j. 23-8-2018). Ainda, indefiro o pedido de fls. 306-308 do antigo procurador do Banco do Brasil S/A (fls. 209-210), pois a questão não diz respeito a este feito, já que "A controvérsia quanto ao percentual de honorários advocatícios que cada advogado que atuou na causa deve receber, tendo em vista a revogação do mandato e substituição dos causídicos, deve ser solucionada em ação autônoma" (STJ, REsp 766279/RS, Rel. Ministro Teiri Albino Zavascki, Primeira Turma, j. 20-10-2005). Como a medida restritiva foi efetivada somente após a configuração da prescrição, determino o cancelamento da indisponibilidade em relação ao valor retido, com o consequente desbloqueio das quantias através do sistema BACENJUD. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpridas as formalidades legais, inclusive o art. 2º, § 6º, da Resolução TJ nº 1/2017, arquive-se.

Inconformada a casa bancária interpôs recurso de apelação (evento 301), sustentando, em suma, a inexistência de prescrição intercorrente na hipótese.

Contrarrazões no evento 307.

Após, os autos ascenderam a este Egrégio Tribunal de Justiça.

É o relato do necessário.

VOTO

A insurgência manifestada no apelo é contra sentença que reconheceu a prescrição intercorrente e julgou extinto o feito com resolução de mérito, nos termos do art. 487, II, do CPC/2015.

Sabe-se que a prescrição intercorrente caracteriza-se pela perda da pretensão em decorrência da inércia do requerente. Assim, quando o credor não impulsiona o feito por prazo igual ou superior ao previsto em lei, restam preenchidos os requisitos para o reconhecimento da prescrição ora analisada.

Sobre o tema, leciona Carlos Roberto Gonçalves:

Configura-se a prescrição intercorrente quando o autor de processo já iniciado permanece inerte, de forma continuada e ininterrupta, durante lapso temporal suficiente para perda da pretensão. Interrompida a prescrição, o prazo voltará a fluir do último ato do processo ou do próprio ato que a interrompeu, [...] devendo o processo ser impulsionado pelo autor. Não pode este permanecer inerte, abandonando o andamento da causa durante prazo superior àquele fixado em lei para a prescrição da pretensão. A prescrição intercorrente foi implicitamente admitida no art. 202, parágrafo único, do Código Civil, que assim dispõe: [...]. A prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do último ato do processo para a interromper" (Direito Civil esquematizado v.1. 2. Ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 402-403).

Portanto, a "Prescrição intercorrente, ou superveniente, é pois a que sobrevém após a propositura da pretensão de direito material. Caracteriza-se pela inércia do titular, de que também decorre prescrição" (Da prescrição e decadência no novo Código Civil. Vilson Rodrigues Alves, 3. ed. Campinas: Servanda, 2006. p. 657).

Em virtude da regra de transição inserida no art. 2.028 do Código Civil de 2002, verifica-se que quando do início da sua vigência (11-1-2003) não havia transcorrido mais da metade do antigo prazo (20 anos) para cobrança do débito objeto da presente demanda.

Dessa forma, como bem asseverou o MM. Magistrado a quo, é impositiva a incidência, no caso concreto, do prazo prescricional de 5 (cinco) anos previsto no art. 206, § 5º, I, do Código Civilista vigente, o qual dispõe que prescreve em 5 (cinco) anos "a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular".

Compulsando detidamente os autos, verifica-se que o feito foi arquivado administrativamente em 24/4/2003 (evento 246), a pedido da parte exequente e permaneceu por mais de 10 (dez) anos arquivado, ou seja, sem que a parte interessada (credora) diligenciasse a fim de contribuir com a execução.

Por oportuno, esclarece-se que, apesar da inexistência de bens em nome dos devedores ser causa suspensiva da execução, conforme previsto no inciso III do artigo 921 do CPC/2015 (art. 791, inciso III do CPC/1973) não deve ser admitida uma espécie de eternização do processo.

A respeito, colaciona-se lição de Luís Guilherme Marinoni:

A suspensão, todavia, não pode ocorrer por prazo indeterminado. Assim, a suspensão da execução por prazo superior ao da exigibilidade do direito importa prescrição intercorrente (Código de Processo Civil comentado artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. P. 736).

Corrobora, a doutrina de Humberto Theodoro Júnior:

Acontece que a eternização da execução é incompatível com a garantia constitucional de duração razoável do processo e de observância de tramitação conducente à rápida solução dos litígios (CF, art. 5º, LXXVIII). Tampouco, se pode admitir que a inércia do credor qualquer que seja sua causa, redunde em tornar imprescritível uma obrigação patrimonial. O sistema de prescrição, adotado por nosso ordenamento jurídico, é incompatível com pretensões obrigacionais imprescritíveis. Nem mesmo subordina a prescrição civil a algum tipo de culpa por parte do credor na determinação da inércia no exercício da pretensão. A prescrição, salvo os casos legais de suspensão ou interrupção, flui objetivamente, pelo simples decurso do tempo.

Daí a criação pretoriana da apelidada prescrição intercorrente, que se verifica justamente quando a inércia do processo perdure por tempo superior ao lapso da prescrição prevista para a obrigação disputada em juízo. Poder-se-ia objetar que, interrompida pela citação, a prescrição somente voltaria a correr depois de encerrado o processo (Cód. Civil, art. 202, parágrafo único). A regra, no entanto, pressupõe processo que esteja em andamento regular, não aquele que, anomalamente, tenha sido acometido de...

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