Acórdão Nº 0000290-60.2011.8.24.0139 do Terceira Câmara de Direito Civil, 21-01-2020

Número do processo0000290-60.2011.8.24.0139
Data21 Janeiro 2020
Tribunal de OrigemPorto Belo
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0000290-60.2011.8.24.0139

Relator: Desembargador Marcus Tulio Sartorato

RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. DEPREDAÇÃO DE PATRIMÔNIO DO CONDOMÍNIO. DEMANDA MOVIDA EM FACE DO INQUILINO QUE PERPETROU OS DANOS E A PROPRIETÁRIA DO IMÓVEL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INCONFORMISMO DO AUTOR. RÉU PRESO EM ELEVADOR JUNTO À SUA ESPOSA, FILHA E SOBRINHA EM VIRTUDE DE QUEDA DE LUZ. ARROMBAMENTO DA PORTA DO ELEVADOR E ESTILHAÇAMENTO DO VIDRO DA PORTA DE ENTRADA DO PRÉDIO. SITUAÇÃO INCONTROVERSA NOS AUTOS. SUSCITADA A OCORRÊNCIA DE ESTADO DE NECESSIDADE. CIRCUNSTÂNCIA INSUFICIENTE PARA EXCLUIR O DEVER DE INDENIZAR. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 929 DO CÓDIGO CIVIL. PROPRIETÁRIA SOLIDARIAMENTE RESPONSÁVEL PELA REPARAÇÃO (ARTIGO 932, IV, E 933 DO CÓDIGO CIVIL). QUANTUM PRETENDIDO NÃO IMPUGNADO PELOS RÉUS. ARBITRAMENTO EM R$ 6.028,49 (SEIS MIL, VINTE E OITO REAIS E QUARENTA E NOVE CENTAVOS). INVERSÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. FIXAÇÃO DOS HONORÁRIOS RECURSAIS. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO.

Ainda que lei considere lícito o ato praticado em estado de necessidade, ela não libera o agente do dever de indenizar as vítimas do evento danoso, resguardando-lhe apenas o direito de ajuizar ação regressiva contra o terceiro culpado (CC, arts. 929 e 930).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0000290-60.2011.8.24.0139, da comarca de Porto Belo 1ª Vara em que é Apelante Condomínio Residencial Alcina Mafra e Apelados Lair Eugênia Zimermann e outro.

A Terceira Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade, dar provimento ao recurso e fixar honorários recursais nos termos do voto. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, com votos vencedores, a Exma. Sra. Des.ª Maria do Rocio Luz Santa Ritta e o Exmo. Sr. Des. Saul Steil.

Florianópolis, 21 de janeiro de 2020.

Desembargador Marcus Tulio Sartorato

Presidente e Relator


RELATÓRIO

Adota-se o relatório da sentença recorrida que é visualizado à fl. 346, por revelar com transparência o que existe nestes autos, in verbis:

CONDOMÍNIO RESIDENCIAL ALCINA MAFRA, com qualificação nos autos, deduziu a presente AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS contra [1] LAIR EUGÊNIA ZIMERMAN e [2] RUBENS VIEIRA, também qualificados, através da qual pretende ser ressarcida pelos prejuízos que alega ter sofrido em razão da conduta do segundo réu.

Trouxe documentos [fls. 09/45].

A parte ré foi devidamente citada e apresentou contestação [fls. 60/64 e 137/145].

Houve pedido de denunciação à lide, que foi indeferido [fls. 77].

Impugnação [fls. 70/73].

A parte ré RUBENS apresentou reconvenção [fls. 121/129].

Impugnação [fls. 183/185].

Contestação à reconvenção [fls. 186/192].

Foi realizada audiência de instrução e julgamento [fls. 227/228], tendo sido deprecada a inquirição de uma testemunha [fls. 270/271].

O MM. Juiz de Direito, Dr. Márcio Renê Rocha, decidiu a lide nos seguintes termos (fls. 351/352):

I. JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado na inicial por CONDOMÍNIO RESIDENCIAL ALCINA MAFRA contra LAIR EUGÊNIA ZIMERMAN e RUBENS VIEIRA, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

I.I. Em consequência, considerando a improcedência dos pedidos formulados pela parte autora, JULGO EXTINTA, sem resolução do mérito, a denunciação à lide promovida por LAIR EUGÊNIA ZIMERMAN contra IMOBILIÁRIA CÉLIO MAFRA, com fundamento nos artigos 129, parágrafo único, e 485, inciso VI, ambos do Código de Processo Civil.

II. JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado na reconvenção por RUBENS VIEIRA contra CONDOMÍNIO RESIDENCIAL ALCINA MAFRA, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

III. Em razão da sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados no importe de 10% [dez por cento] sobre o valor atualizado da causa [CPC, artigo 85, §2º].

IV. Transitada em julgado, arquivem-se os autos.

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação (fls. 357/375), no qual sustenta, em suma, que: a) o réu não logrou êxito em comprovar o estado de necessidade; b) de qualquer forma, se esta Corte compreender que houve, de fato, a ocorrência de estado de necessidade, ainda assim incide o dever de reparar, por força do que dispõe o artigo 929 do Código Civil; c) a proprietária do imóvel locado pelo réu é solidariamente responsável pelos danos causados ao condomínio.

Conquanto intimada, a parte ré deixou transcorrer in albis o prazo para apresentar contrarrazões (fl. 380).


VOTO

1. Via de regra, para que alguém possa ser obrigado a reparar danos, é necessário que seja demonstrado, no curso do processo, que os causou pela prática de algum ato ilícito. O caput do artigo 927 do Código Civil, primeiro do título sobre responsabilidade civil deste Diploma, é claro ao vincular a obrigação de reparar dano a esta circunstância, in verbis: "Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo" (grifou-se).

Embora haja discussão na doutrina sobre se os casos de responsabilidade civil objetiva são, ou não, hipóteses de responsabilidade civil por ato lícito, já que não incluem o elemento culpa em seu conceito, tido por alguns como indispensável para caracterização da ilicitude (sobre a polêmica, confira-se: CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 10. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2012), são uníssonos os civilistas quanto à existência de algumas hipóteses excepcionais de obrigação de reparar danos pela prática de atos lícitos, resultantes de determinações legais expressas. Interessa ao caso em análise a hipótese de dano causado em estado de necessidade. Segundo o art. 188, II, do Código Civil, não constituem ato ilícito "a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente". Em que pese a licitude do ato praticado em estado de necessidade, os artigos 929 e 930 deste Diploma estabelecem a obrigação do agente causador direto do dano de indenizar as vítimas do evento, in verbis:

Art. 929. Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso II do art. 188a, não forem culpados do perigo, assistir-lhes-á direito à indenização do prejuízo que sofreram.

Art. 930. No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por culpa de terceiro, contra este terá o autor do dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido ao lesado.

Dessa forma, aquele que causa dano a outrem para evitar a lesão a terceiro é obrigado a indenizar a vítima do evento, desde que não tenha sido esta a própria causadora do perigo. Não aproveita ao agente, nesses casos, o argumento de fato de terceiro com forma de exclusão de responsabilidade, conforme bem ensinam Carlos Alberto Menezes de Direito e Sérgio Cavalieri Filho:

Distinguir estado de necessidade de fato de terceiro tem grande relevância prática. No primeiro, persiste o dever de indenizar; no segundo, não. A distinção tem que ser buscada no plano do nexo de causalidade. No estado de necessidade, a conduta do agente, embora lícita, é causa direta e imediata do evento: para se desviar de uma fechada o motorista atropela um pedestre. No fato de terceiro essa causa direta é a conduto exclusiva de outrem: o veículo é arremessado por outro contra a vítima, transformando-se em mero instrumento da ação culposa do terceiro. A conduta do aparente agente não tem nenhuma relevância na relação causal e, por isso, não responde pelos danos causados. O fato de terceiro, conforme já ressaltado, constitui causa de exoneração, porque se encontra equiparado, para todos os efeitos, ao caso fortuito ou de força maior, em outras palavras, porque elimina por completo a relação de causalidade entre a conduta do agente e o dano. No estado de necessidade o ato volitivo daquele que assim age integra de forma determinante a dinâmica do evento lesivo. Em suma, é a sua causa direta.

Em acórdão luminar da relatoria do eminente Ministro Ruy Rosado de Aguiar, no REsp. Nº 81.631-SP, da...

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