Acórdão Nº 0000328-38.2017.8.24.0050 do Primeira Câmara Criminal, 09-12-2021

Número do processo0000328-38.2017.8.24.0050
Data09 Dezembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0000328-38.2017.8.24.0050/SC

RELATORA: Desembargadora Ana Lia Moura Lisboa Carneiro

APELANTE: SILVANA BRUHMULLER (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Vara Criminal da Comarca de Pomerode, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em face de Silvana Bruhmuller, pelo cometimento, em tese, dos crimes de estelionato (art. 171, caput, Código Penal), por 4 (quatro) vezes, na forma do art. 71, caput, do Código Penal, e de violação de direitos autorais (art. 184, § 1º, Código Penal), em razão dos fatos assim narrados na exordial acusatória (Evento 24, dos autos 0000328-38.2017.8.24.0050):

FATO 01

No dia 25 de fevereiro de 2017, no período matutino, a denunciada SILVANA BRUHMULLER obteve para si vantagem ilícita em prejuízo alheio ao induzir as vítimas Griselda Fischer, Orival Hille, Ivo Glau e Michele Steinert em erro mediante ardil.

Segundo se infere dos autos, a DENUNCIADA, que reside na cidade de Jaraguá do Sul/SC, ludibriava pessoas residentes neste município, como foi o caso das vítimas supramencionadas, dizendo estava recolhendo doações/contribuições para ajudar familiares que passavam por dificuldade.

Visando dar credibilidade ao seu ardil, a DENUNCIADA afirmava para as vítimas que as contribuições/doações ocorreriam mediante a aquisição de CD's com reproduções de músicas gospel, de forma que o lucro obtido seria revertido para a pessoa necessitada. Argumentava também, para vencer a resistência das vítimas, que aquela ação beneficente contava com a anuência e apoio do pastor Ademar Kroenke, responsável por uma das Igrejas locais, o que evidentemente não era verdade.

Assim, foi mediante este ardil que a DENUNCIADA convenceu as vítimas Griselda Fischer a lhe entregar R$ 9,00 (nove reais), Orival Hille a entregar R$ 10,00 (dez reais), Ivo Glau a lhe entregar R$ 20,00 (vinte reais), e Michele Steinert a lhe entregar R$ 70,00 (setenta reais).

FATO 02

Na mesma oportunidade (dia, hora e local) os Policias Militares lograram apreender em poder da DENUNCIADA o total de 25 (vinte e cinco) CDs de diversos títulos, todos contendo obras intelectuais (músicas gospel) reproduzidas com violação de direitos autorais (pirataria), conforme comprova a perícia de fl. 48/52

Por assim agir, a denunciada SILVANA BRUHMULLER incorreu nas sanções dos crimes previstos no artigo 171, caput, do Código Penal (quatro vezes), c/c artigo 71 e no artigo 184, § 1.º, todos do Código Penal, motivo pelo qual o MINISTÉRIO PÚBLICO promove a presente ação penal, requerendo o recebimento da denúncia e a citação da acusada para apresentação de defesa escrita. Requer, outrossim, seja admitida a acusação, prosseguindo-se nos demais termos do processo, com designação de audiência para inquirição das pessoas adiante arroladas e final condenação da acusada, inclusive ao pagamento de reparação do prejuízo as vítimas.

Encerrada a instrução e apresentadas alegações finais, sobreveio a sentença com o seguinte dispositivo (Evento 129, dos autos, idem):

Do exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão acusatória exposta na denúncia (art. 387 do CPP), para condenar a ré Silvana Bruhmuller ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 3 (três) anos, 5 (cinco) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime aberto, e substituídas por duas penas restritivas de direitos, nos moldes da fundamentação; bem como ao pagamento de 23 (vinte e três) dias-multa, no valor de 1/30 do salário mínimo vigente na época dos fatos, por infração ao artigo 184, §1º e 2º e ao artigo 171, caput, por quatro vezes, na forma do artigo 71, todos do Código Penal.

Inconformada com o decisum, Silvana Bruhmuller interpôs recurso de apelação, postulando, preliminarmente: 1) a nulidade dos depoimentos prestados em juízo diante da sua preclusão, na medida em que o Ministério Público apresentou rol de testemunhas de forma intempestiva; 2) a nulidade processual por não ter sido a denunciada ouvida por meio de carta precatória.

No mérito, pugna pela sua absolvição, alegando, em suma, a inexistência de provas contundentes para a manutenção da condenação, invocando o princípio in dubio pro reo. Subsidiariamente, requer a reforma da dosimetria da pena, "[...] que não segue os parâmetros da jurisprudência" (Eventos 139 e 148, respectivamente, dos autos da Ação Penal).

Contrarrazões da acusação pela manutenção incólume da sentença recorrida (Evento 156, dos autos da Ação Penal).

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça, o Exmo. Sr. Dr. Rogério A. Da Luz Bertoncini, que se manifestou pelo parcial conhecimento e não provimento do recurso do apelo interposto (Evento 11).

Este é o relatório.

Documento eletrônico assinado por ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO, Desembargadora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 1231516v25 e do código CRC 56c9d496.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIROData e Hora: 22/11/2021, às 19:10:38





Apelação Criminal Nº 0000328-38.2017.8.24.0050/SC

RELATORA: Desembargadora Ana Lia Moura Lisboa Carneiro

APELANTE: SILVANA BRUHMULLER (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

1. Da Admissibilidade

Trata-se de recurso de apelação interposto por Silvana Bruhmuller em face da sentença proferida pelo juízo da 2ª Vara da Comarca de Pomerode, que julgou procedente a pretensão deduzida na denúncia, a fim de condená-la ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 3 (três) anos, 5 (cinco) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime aberto, substituídas por 2 (duas) penas restritivas de direito, nas modalidades prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no montante de 1 (um) salário mínimo, além do pagamento de 23 (vinte e três) dias-multa, no valor individual de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na época dos fatos, por infração ao artigo 184, §§ 1º e 2º, e ao artigo 171, caput, por 4 (quatro) vezes, na forma do artigo 71, caput, todos do Código Penal

Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso e passo ao exame do pleito recursal.

2. Das Preliminares

2.1 Da nulidade em razão da ausência de expedição de carta precatória para interrogatório

Pugna a defesa pela nulidade da sentença, em razão da ausência de expedição de carta precatória para o interrogatório da acusada residente em comarca diversa à do ato.

A insurgência não comporta deferimento.

Colhe-se dos autos de primeiro grau que a recorrente foi intimada no dia 16 de maio de 2019, para audiência de instrução e julgamento a ser realizada no dia 11 de julho do mesmo ano (Eventos 103 e 104, dos autos originários).

Após a realização da solenidade, constatada a ausência da ré, foi requerida a expedição de carta precatória para interrogatório, o que restou indeferido pelo magistrado a quo.

Em sede de apelação, se insurgiu novamente a defesa, buscando a nulidade do decreto condenatório, sob argumento que a acusada reside em Guaramirim, comarca diversa à da realização do ato (Pomerode) e que, portanto, naquela deveria ter sido ouvida.

Primeiramente, cumpre mencionar que o prazo entre a intimação e o ato - de quase dois meses, ressalta-se - era mais do que suficiente para a denunciada manifestar-se pela impossibilidade de comparecimento em audiência, optando por manter-se inerte.

Ademais, inexiste norma que imponha a realização do interrogatório por meio de carta precatória, não havendo, consequentemente, nenhuma nulidade a ser arguida nesse sentido.

Extrai-se do artigo 367, do Código de Processo Penal que "O processo seguirá sem a presença do acusado que, citado ou intimado pessoalmente para qualquer ato, deixar de comparecer sem motivo justificado, ou, no caso de mudança de residência, não comunicar o novo endereço ao juízo."

A doutrina leciona:

Prosseguimento do feito sem a presença do réu: as hipóteses previstas neste artigo são mais que razoáveis para o curso do processo, ainda que o réu dele não participe ativamente. A primeira delas diz respeito à citação (dando-lhe conhecimento da ação e chamando-o para o interrogatório) ou à intimação pessoal (comunicando-lhe e chamando-o para audiência ou outro ato), quando não houver comparecimento, sem apresentação de motivo justificado. Demonstra o seu desinteresse de acompanhar a instrução, não havendo razão para o juiz continuar insistindo para que compareça, afinal, é seu direito de audiência e não obrigação de estar presente - salvo motivo imperioso, como ocorre, por exemplo, quando há necessidade de reconhecimento ou para qualificação. (Nucci, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. Rio de Janeiro: Forense, 2021, 20 ed., e-book, grifo nosso)

Ainda, inarredável a concorrência da apelante para o ocorrido, vez que, mesmo que intimada, não compareceu em audiência, sem motivo justificável, bem como não se pronunciou em momento oportuno, não podendo, portanto, arguir nulidade, nos termos do artigo 565, do CPP, in verbis:

Art. 565. Nenhuma das partes poderá argüir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido, ou referente a formalidade cuja observância só à parte contrária interesse.

Ademais, poderia a recorrente se socorrer na regra do artigo 185 do mesmo diploma legal, que firma que "O acusado que comparecer perante a autoridade judiciária, no curso do processo penal, será qualificado e interrogado na presença de seu defensor, constituído ou nomeado."

Ou seja, dentro do curso do processo e a qualquer tempo, faculta-se o comparecimento do acusado a juízo para interrogatório, acompanhado de seu defensor constituído ou, caso não o possua, postular pela nomeação de defensor para acompanhamento do ato.

Vale ressaltar que a autodefesa é um direito renunciável - ao contrário da defesa técnica (art. 261, CPP) -...

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