Acórdão Nº 0000330-35.2018.8.24.0062 do Terceira Câmara Criminal, 06-10-2020

Número do processo0000330-35.2018.8.24.0062
Data06 Outubro 2020
Tribunal de OrigemSão João Batista
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Criminal n. 0000330-35.2018.8.24.0062, de São João Batista

Relator: Desembargador Leopoldo Augusto Brüggemann

Apelação Criminal. Crime de trânsito. Embriaguez na direção de veículo automotor (art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro). Sentença condenatória. Recurso da defesa.

PLEITO ABSOLUTÓRIO. PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO COM BASE NA AUSÊNCIA DE PROVAS E, ALTERNATIVAMENTE, EM RAZÃO DA ATIPICIDADE DA CONDUTA. NÃO ACOLHIMENTO. MATERIALIDADE, AUTORIA E TIPICIDADE SUFICIENTEMENTE COMPROVADAS. ACUSADO PRESO EM FLAGRANTE DELITO POR DIRIGIR ALCOOLIZADO. EXAME DE BAFÔMETRO QUE APONTOU CONCENTRAÇÃO DE ÁLCOOL SUPERIOR AO DOBRO DA PERMITIDA POR LEI (0,84 MG/L). PROVA IRREPETÍVEL, SUBMETIDA A CONTRADITÓRIO DIFERIDO. DEPOIMENTO DOS POLICIAIS NA FASE JUDICIAL, FIRMES E HARMÔNICOS ENTRE SI, A DESCREVER A EMBRIAGUEZ DO APELANTE. ELEMENTOS PROBATÓRIOS SUFICIENTES. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. DESNECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDUÇÃO DE VEÍCULO DE FORMA IMPRUDENTE. CONDUTA, CONTUDO, QUE GEROU ACIDENTE. CONDENAÇÃO MANTIDA.

PEDIDO DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA. APELANTE ATENDIDO POR DEFENSOR DATIVO. HIPOSSUFICIÊNCIA PRESUMIDA. ENTENDIMENTO DESTA CÂMARA. ACOLHIMENTO.

REQUERIMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS PELA DEFESA NESTE GRAU RECURSAL. CABIMENTO. VALOR FIXADO COM BASE NAS RESOLUÇÕES N. 5/2019 E N. 1/2020 DO CONSELHO DA MAGISTRATURA DESTA CASA DE JUSTIÇA.

RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0000330-35.2018.8.24.0062, da comarca de São João Batista (2ª Vara) em que é Apelante Ronaldo da Silveira e Apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Terceira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do apelo e dar-lhe parcial provimento. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado no dia 06 de outubro de 2020, os Excelentíssimos Desembargadores Júlio César M. Ferreira de Melo e Getúlio Corrêa. Atuou pelo Ministério Público a Excelentíssima Procuradora de Justiça Heloísa Crescenti Abdalla Freire.

Florianópolis, 09 de outubro de 2020

Desembargador Leopoldo Augusto Brüggemann

Relator


RELATÓRIO

Na comarca de São João Batista, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Ronaldo da Silveira, dando-o como incurso nas sanções do art. 306, caput, do Código de Trânsito Brasileiro, pela prática da conduta assim descrita na inicial acusatória:

Na data de 11 de março de 2018, por volta das 19h30min, o denunciado RONALDO DA SILVEIRA foi preso por agentes da Polícia Militar porque conduziu o veículo Ford/Fiesta, placas LCD 3369, na Estrada Geral de Colônia de Dentro, Bairro Colônia, neste município de São João Batista/SC, portanto, em via pública, com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool.

A conduta do denunciado foi constatada por meio do teste de alcoolemia de fl. 18, segundo o qual o denunciado apresentava 0,84 miligrama de álcool por litro de ar alveolar.

A conduta do denunciado colocou em risco a segurança viária, tanto que ele acabou colidindo contra um poste de energia elétrica (pp. 37-38).

Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada procedente para condenar o acusado às penas de 8 (oito) meses e 5 (cinco) dias de detenção, em regime inicial aberto, ao pagamento de 12 (doze) dias-multa, em seu mínimo legal, e 2 (dois) meses e 21 (vinte e um) dias de suspensão da habilitação para conduzir veículo automotor, por infração ao disposto no art. 306, caput, do Código de Trânsito Brasileiro. A pena privativa de liberdade foi substituída por uma restritiva de direitos, na forma do art. 312-A do Código de Trânsito Brasileiro, conforme fundamentação (art. 312, I, do CTB), ou, em caso de impossibilidade, em razão da saúde do acusado, prestação pecuniária, Foi-lhe concedido o direito de apelar em liberdade (pp. 138-147).

Irresignada, a defesa interpôs recurso de apelação, no qual pugnou pela absolvição do acusado, em razão da atipicidade da conduta, declarando que não ofereceu risco ao bem jurídico tutelado, bem como alegou insuficiência de provas para embasar a condenação proferida, em virtude da falta de exame pericial que comprovasse a ingestão de álcool ou qualquer outra substância entorpecente. Por fim, pleiteou a concessão da justiça gratuita e o arbitramento de honorários advocatícios (pp. 160-168).

Juntadas as contrarrazões (p. 172-183), ascenderam os autos a esta instância, e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Paulo de Tarso Brandão, opinou pelo conhecimento e parcial provimento do recurso (pp. 189-193).

Este é o relatório.


VOTO

Trata-se de recurso de apelação contra decisão que julgou procedente a denúncia e condenou Ronaldo da Silveira às sanções previstas nos arts. 306 da Lei n. 9.503/1997.

O apelo é de ser conhecido, porquanto presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade.

Do pleito absolutório

Pretende a defesa a absolvição do apelante, sob o argumento de ausência de provas, assim como pela ausência de ofensividade da conduta.

Razão não lhe assiste.

De início, convém destacar que o delito em estudo foi praticado em 11 de março de 2018 portanto quando já vigiam as alterações trazidas pela Lei n. 12.760/2012, que modificou o art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro, e que se ampliou as hipóteses de configuração do crime de embriaguez ao volante.

Veja-se:

Art. 306. Conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência:

Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

§ 1º As condutas previstas no caput serão constatadas por:

I - concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar; ou

II - sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora.

§ 2º A verificação do disposto neste artigo poderá ser obtida mediante teste de alcoolemia, exame clínico, perícia, vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o direito à contraprova.

§ 3º O Contran disporá sobre a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia para efeito de caracterização do crime tipificado neste artigo.

No caso dos autos, o teste alcoólico foi realizado e apontou a concentração de 0,84 mg de álcool por litro de ar expelido (p. 6), quantidade, portanto, superior à permitida por lei.

Dessa forma, a materialidade do delito vem estampada através do auto de prisão em flagrante n. 30.18.00011 (p. 3), boletim de ocorrência n. 00030-2018-0000776 (pp. 4-5) e extrato de exame de alcoolemia (p. 6).

No que tange à autoria, está comprovada e recai sobre o apelante.

O acusado, na fase policial (p. 26), reservou-se o direito de permanecer em silêncio.

Não foi possível sua oitiva em juízo, uma vez que, embora devidamente intimado (p. 98), não compareceu ao ato aprazado, sendo declarada sua revelia (p. 101).

De outra banda, não bastasse o resultado do exame, os depoimentos dos agentes públicos que atenderam a ocorrência foram uníssonos a identificar a embriaguez do apelante. Veja-se:

O policial Estevão Henrique Likoski, em juízo (p. 101), confirmou ter atendido a ocorrência. Asseverou que estava atuando em uma festa de igreja próximo ao local dos fatos, quando populares informaram o acidente. Narrou ter se deslocado até o ponto, quando constatou que o recorrente apresentava forte odor etílico e possuía latas de cerveja no interior do veículo. Relatou que o acusado confessou a ingestão de bebida alcoólica. Afirmou que em decorrência, foi ele conduzido à delegacia, momento em que foi ofertado o teste do etilômetro. Disse que o apelante assentiu à sua realização, o qual atestou a embriagues, apontando um resultado de 0,84.

Por sua vez, o policial Tcharles Max Moraes, sob o crivo do contraditório (p. 103), narrou que o apelante apresentava sinais de embriaguez, como voz enrolada, vestes desalinhadas, falta de equilíbrio.

Dessa forma, não há falar em ausência de provas, uma vez que ambos os agentes do estado foram uníssonos ao narrar a embriaguez do denunciado, sendo suas falas harmônicas em relação às demais provas existentes nos autos, em especial o exame de alcoolemia (p. 6). Desse modo, aptas a fundamentar um decreto condenatório.

A respeito da validade dos depoimentos dos agentes públicos, Hugo Nigro Mazzilli ensina:

Não merece o depoimento dos policias uma eiva abstrata e genérica de suspeição. Se o Estado encarrega seus agentes do grave munus de defender a coletividade contra o crime, se os arma, se lhes dá o poder de polícia, se lhes atribui a investigação de crimes e até o direito de prender pessoas a apreender bens, seria rematado contra-sensu recusar-lhes a priori qualquer crédito ao seu depoimento, apenas porque são policiais. Ora, seu testemunho há de ser aferido no contexto instrutório, no seu todo, e se, longe de desmentido pela instrução, for com essa coerente, razão não há para recusá-lo (RT417/94).

Não discrepa a orientação jurisprudencial:

HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. ARTS. 33, DA LEI N.º 11.343/06, 304 E 333, DO CÓDIGO PENAL. TESE DE FRAGILIDADE DA PROVA PARA SUSTENTAR A ACUSAÇÃO. VIA IMPRÓPRIA. NECESSIDADE DE EXAME APROFUNDADO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. DEPOIMENTO DE POLICIAIS. VALIDADE PROBATÓRIA. ILEGALIDADE DA DOSIMETRIA DAS PENAS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INOCORRÊNCIA.

Os policiais não se encontram legalmente impedidos de depor sobre atos de ofício nos processos de cuja fase investigatória tenham participado, no exercício de suas funções, revestindo-se tais depoimentos de inquestionável eficácia probatória, sobretudo quando prestados em juízo, sob a garantia do contraditório. Precedentes desta...

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