Acórdão Nº 0000361-76.2020.8.24.0000 do Câmara de Recursos Delegados, 25-11-2020

Número do processo0000361-76.2020.8.24.0000
Data25 Novembro 2020
Tribunal de OrigemCapital - Continente
ÓrgãoCâmara de Recursos Delegados
Classe processualConflito de competência
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Conflito de Competência n. 0000361-76.2020.8.24.0000

Relator: Desembargador Salim Schead dos Santos

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA INSTAURADO ENTRE OS JUÍZOS DA VARA DA FAMÍLIA DO FORO DO CONTINENTE (SUSCITANTE) E VARA DE SUCESSÕES E REGISTROS PÚBLICOS (SUSCITADO), AMBOS DA COMARCA DA CAPITAL. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE AVERBAÇÃO DE CLÁUSULA DE INALIENABILIDADE, IMPENHORABILIDADE E INCOMUNICABILIDADE DE PARTE IDEAL DE IMÓVEL OBJETO DE DOAÇÃO INTER VIVOS. DOADOR E DONATÁRIOS FALECIDOS. SUCESSORES QUE ALEGAM A IMPOSSIBILIDADE DE CONCLUIR AÇÃO DE INVENTÁRIO E PARTILHA EM TRÂMITE EM VIRTUDE DA PERMANÊNCIA DO GRAVAME. TEMÁTICAS DEBATIDAS PELOS JUÍZOS EM CONFLITO QUE NÃO DESBORDAM DA ESFERA DE JURISDIÇÃO DOS COLEGIADOS CÍVEIS DESTE SODALÍCIO. INEXISTÊNCIA DE EMBATE ENTRE AS GRANDES ÁREAS DO DIREITO. DEVOLUÇÃO À SEXTA CÂMARA DE DIREITO CIVIL. CONFLITO NÃO CONHECIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Conflito de Competência n. 0000361-76.2020.8.24.0000, da comarca da Capital - Continente Vara da Família do Foro do Continente, em que é Suscitante Juízo de Direito da Vara da Família do Foro do Continente da comarca da Capital e Suscitado Juízo de Direito da Vara de Sucessões e Registros Públicos da comarca da Capital.

A Câmara de Recursos Delegados decidiu, por votação unânime, não conhecer do incidente e determinar a devolução à Egrégia Sexta Câmara de Direito Civil. Custas legais.

O julgamento, realizado no dia 25 de novembro de 2020, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. João Henrique Blasi, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Volnei Celso Tomazini. Funcionou como representante do Ministério Público a Exma. Sra. Dra. Gladys Afonso.

Florianópolis, 27 de novembro de 2020.

Desembargador Salim Schead dos Santos

Relator

RELATÓRIO

O Juízo de Direito da Vara da Família do Foro do Continente suscitou conflito negativo de competência em razão de decisão declinatória do Juízo de Direito da Vara de Sucessões e Registros Públicos, ambos da comarca da Capital, nos autos da intitulada "ação de cancelamento de averbação de cláusula de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade".

O Suscitado declinou da competência sob o fundamento de que a causa de pedir versa sobre a anulação do gravame imposto, em vida, pelo doador sobre a parte ideal do imóvel indicado, sendo o cancelamento mera consequência jurídica da anulação; ademais, o bem imóvel estaria localizado em bairro da cidade que está sob a jurisdição do Juízo de Direito da Vara da Família do Foro do Continente (fls. 119/120 - SAJ5/PG).

Por sua vez, o Suscitante considera que, ainda que o imóvel esteja localizado no bairro Estreito, a questão diz respeito a cláusula de bem doado inter vivos, matéria de competência do Juízo de Direito da Vara de Sucessões e Registros Públicos da Capital (fls. 32/34 - SAJ5/PG).

Nesta Corte, o incidente foi inicialmente distribuído à Sexta Câmara de Direito Civil. Por decisão, a Excelentíssima Senhora Desembargadora Denise Volpato designou o Juízo Suscitante para resolver as medidas urgentes, bem como solicitou informações ao Juízo Suscitado, com a posterior remessa à Procuradoria-Geral de Justiça (fl. 6 - SAJ5/SG).

Prestadas as informações pelo Juízo Suscitado, a Procuradoria-Geral de Justiça, em manifestação da Procuradora de Justiça Monika Pabst, emitiu parecer pela procedência do incidente processual, bem como, pela remessa ex officio dos autos a uma das varas cíveis do Foro do Continente da comarca da Capital (fls. 12-17/22-26 - SAJ5/SG).

Ato contínuo, os ilustres integrantes da Egrégia Sexta Câmara de Direito Civil, em voto da Excelentíssima Senhora Desembargadora Denise Volpato, determinaram a remessa do conflito negativo a esta Câmara de Recursos Delegados (fls. 31/36 - SAJ5/SG).

Os autos foram encaminhados à Secretaria deste Órgão Fracionário para oportuna inclusão em pauta, nos termos do artigo 75 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina.

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de conflito negativo de competência instaurado entre os Juízos de Direito da Vara da Família do Foro do Continente (Suscitante) e Vara de Sucessões e Registros Públicos (Suscitado), ambos da comarca da Capital, nos autos da intitulada "ação de cancelamento de averbação de cláusula de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade".

De plano, vale sublinhar que a competência desta Câmara de Recursos Delegados é disciplinada pelo artigo 75 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, nos seguintes termos:

Art. 75. Compete à Câmara de Recursos Delegados, por delegação do Órgão Especial, julgar:

[...]

II - os conflitos de competência entre os grupos de câmaras de áreas de especialização diferentes, entre os grupos de câmaras e a Seção Criminal, entre as câmaras de áreas de especialização distintas, entre o Conselho da Magistratura e qualquer outro órgão judicante do Tribunal de Justiça e entre juízes de unidades jurisdicionais com competência diferente, bem como os respectivos incidentes;

[...].

Como se vê, portanto, o atual Regimento Interno manteve o critério funcional adotado desde o Ato Regimental TJ n. 160, de 21/3/2018, preservando a delegação a esta Câmara para apreciação dos conflitos de competência outrora atribuídos ao Órgão Especial.

A propósito dessa atribuição delegada, convém salientar entendimento há muito sufragado pelo Órgão Especial, no sentido de que, quando a matéria de fundo não transcender as grandes áreas do Direito, compete às Câmaras isoladas dirimi-los.

Nesse sentido, destaca-se o posicionamento firmado no Conflito de Competência n. 0159221-88.2014.8.24.0000, inclusive deste Relator quando, à época, integrava o Órgão Especial, cujo aresto paradigma guarda a seguinte ementa:

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUIZADO ESPECIAL CÍVEL E VARA CÍVEL. INCOMPETÊNCIA DO ÓRGÃO ESPECIAL. COMPETÊNCIA DAS CÂMARAS ISOLADAS DE DIREITO CIVIL. REDISTRIBUIÇÃO.

Só se justifica a competência do Órgão Especial para o processamento e julgamento de conflitos de competência quando o fundamento do conflito se fundar em controvérsia sobre a natureza da matéria de fundo discutida na ação e, diante disso, houver confronto entre as grandes áreas do Direito atribuídas a cada um dos Grupos de Câmaras desta Corte, a saber: Direito Civil, Direito Comercial, Direito Público e Direito Penal.

Dessa forma, ainda que o incidente tenha sido instaurado entre juizado especial cível e vara cível, se o fundamento do conflito refoge à definição da natureza da questão de fundo discutida na ação, de forma a implicar confronto entre as grandes áreas do Direito supracitadas, a competência para o processamento e julgamento do conflito de competência é de uma das câmaras isoladas que detenha competência na área do Direito coincidente com aquela em que se insere a ação. (TJSC, Conflito de Competência n. 0159221-88.2014.8.24.0000, de Itajaí, j. 6/7/2016 - grifou-se).

Destaca-se do corpo do acórdão suso ementado:

[...]

Certo é que a interpretação da expressão unidades jurisdicionais com competência diferente tem se mostrado bastante controversa no Tribunal, tanto no âmbito do Órgão Especial quanto no âmbito das Câmaras Isoladas, o que dificulta inclusive o serviço de distribuição dos feitos, razão pela qual é preciso definir a questão.

Para tanto, é importante anotar que o dispositivo supramencionado deve ser interpretado em conjunto com o parágrafo único do artigo 1º do Ato Regimental n. 119/2011:

Os conflitos de competência instaurados entre Câmaras Isoladas com idêntica competência continuam afetos ao respectivo Grupo de Câmaras ou à Seção Criminal, conforme o caso, bem como os conflitos de competência instaurados entre juízes de unidades jurisdicionais com idêntica competência material ou funcional continuam afetos às Câmara Isoladas, observada a competência destas na distribuição dos feitos.

Da análise conjunta das regras, nota-se que a intenção da normativa era conferir ao Órgão Especial a competência para o julgamento do incidente apenas quando a origem do conflito estivesse na definição da natureza da matéria de fundo da ação e quando, a depender dessa definição, a ação estivesse submetida hipoteticamente em grau recursal a câmaras isoladas com competências distintas. Em outras palavras, seria como projetar no primeiro grau de jurisdição a regra já existente para o julgamento dos conflitos entre câmaras isoladas: o Órgão Especial só é competente para o julgamento de conflitos instaurados entre câmaras de grupos distintos.

Didaticamente, a adequada incidência da regra é de fácil percepção quando se imagina um conflito entre juiz da vara da fazenda e juiz da vara cível em ação de interdição, em que o primeiro defende que a ação é de natureza civil e o segundo entende que pela presença de um ente estatal no polo passivo a ação deva se processar na vara fazendária; neste caso, a depender da definição da natureza da ação, ela estaria submetida hipoteticamente em grau recursal a câmaras isoladas pertencentes a grupos distintos, câmara de Direito Público e câmara de Direito Civil, o que justificaria a competência do Órgão Especial para o julgamento do conflito. Por outro lado, se o conflito se verificasse entre juiz da vara da infância e juventude e juiz da vara cível em ação de indenização por danos morais ajuizada por uma criança, em que o primeiro juiz defende que a causa é eminentemente civil e o segundo defende que a presença da criança no polo ativo determina a competência da vara especializada, o conflito deveria ser julgado por uma câmara isolada de Direito Civil, pois, embora aparentemente os juízos detenham competência diferente, estariam submetidos hipoteticamente em grau recursal a uma das câmaras do Grupo de Câmaras de Direito Civil - grifou-se.

A grande questão controvertida, entretanto, surge...

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