Acórdão Nº 0000368-68.2020.8.24.0000 do Câmara de Recursos Delegados, 30-09-2020

Número do processo0000368-68.2020.8.24.0000
Data30 Setembro 2020
Tribunal de OrigemNavegantes
ÓrgãoCâmara de Recursos Delegados
Classe processualConflito de competência
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Conflito de Competência n. 0000368-68.2020.8.24.0000

Relator: Desembargador Volnei Celso Tomazini

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA INSTAURADO ENTRE OS JUÍZOS DA 1ª VARA CÍVEL (SUSCITANTE) E 2ª VARA CÍVEL (SUSCITADO), AMBOS DA COMARCA DE NAVEGANTES. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA. PRESENÇA DE ENTE PÚBLICO NO POLO PASSIVO DA LIDE. AUSÊNCIA DE DISCUSSÃO SOBRE A CAPACIDADE CIVIL DA PESSOA NA CAUSA DE PEDIR ORIGINÁRIA. ADEMAIS, A INTERDIÇÃO DECLARADA PELO SUSCITANTE EM AÇÃO ANTERIOR NÃO ATRAI AUTOMATICAMENTE A JURISDIÇÃO SOBRE AS AÇÕES POSTERIORES RELACIONADAS AO INTERDITADO. QUESTÃO CENTRAL QUE VERSA EXCLUSIVAMENTE SOBRE POLÍTICA PÚBLICA. APLICAÇÃO DO ENUNCIADO I DO ÓRGÃO ESPECIAL DESTA CORTE DE JUSTIÇA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO, O QUAL POSSUI JURISDIÇÃO PARA OS FEITOS QUE ENVOLVEM A FAZENDA PÚBLICA. CONFLITO PROCEDENTE.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Conflito de Competência n. 0000368-68.2020.8.24.0000, da comarca de Navegantes 1ª Vara Cível, em que é Suscitante Juízo de Direito da 1ª Vara Cível da comarca de Navegantes e Suscitado Juízo de Direito da 2ª Vara Cível da comarca de Navegantes.

A Câmara de Recursos Delegados decidiu, por votação unânime, julgar procedente o conflito negativo, para declarar competente o Juízo de Direito da 2ª Vara Cível da comarca de Navegantes para processar e julgar o feito. Custas legais.

O julgamento, realizado no dia 30 de setembro de 2020, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. João Henrique Blasi, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Salim Schead dos Santos. Funcionou como representante do Ministério Público a Exma. Sra. Dra. Gladys Afonso.

Florianópolis, 1º de outubro de 2020.

Desembargador Volnei Celso Tomazini

Relator

RELATÓRIO

O Juízo de Direito da 1ª Vara Cível de Navegantes suscitou conflito negativo de competência em razão de decisão declinatória do Juízo de Direito da 2ª Vara Cível daquela comarca proferida nos autos da ação civil pública n. 0900679-22.2017.8.24.0135, proposta pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina em desfavor de Edson Roberto da Silva Rodrigues e Município de Navegantes.

O Suscitado, após deferir a tutela de urgência, no curso do feito declinou da competência por considerar que, em razão do primeiro demandado ter sido declarado interditado pela 1ª Vara Cível de Navegantes nos autos n. 0004064-13.2011.8.24.0135, cabe a esse último, o qual possui jurisdição sobre interditos, o julgamento acerca de eventuais medidas a serem aplicadas (fl. 83 SAJ5/PG).

Ao rejeitar a competência, o Suscitante pontua que o objeto da ação contempla exclusivamente questão de ordem pública; tramitou na 1ª Vara Cível de Navegantes a ação de interdição n. 0004064-13.2011.8.24.0135, estando superada a matéria referente ao estado civil de pessoa; a atual controvérsia aborda apenas política pública de atendimento a dependente químico, cuja jurisdição pertence à 2ª Vara Cível da comarca (fls. 88/91 SAJ5/PG).

A Procuradoria-Geral de Justiça, em manifestação do Procurador de Justiça Carlos Alberto de Carvalho Rosa, emitiu parecer no sentido da procedência do incidente (fls. 25/28 SAJ5/SG).

Os autos foram encaminhados à Secretaria da Câmara de Recursos Delegados para oportuna inclusão em pauta, nos termos do artigo 75 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina.

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de conflito negativo de competência instaurado entre os Juízos de Direito da 1ª Vara Cível (Suscitante) e 2ª Vara Cível (Suscitado), ambos da comarca de Navegantes, nos autos da ação civil pública n. 0900679-22.2017.8.24.0135, proposta pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina em desfavor de Edson Roberto da Silva Rodrigues e Município de Navegantes.

De início, recorda-se que a competência desta Câmara de Recursos Delegados é disciplinada pelo artigo 75 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, nos seguintes termos:

Art. 75. Compete à Câmara de Recursos Delegados, por delegação do Órgão Especial, julgar:

[...]

II - os conflitos de competência entre os grupos de câmaras de áreas de especialização diferentes, entre os grupos de câmaras e a Seção Criminal, entre as câmaras de áreas de especialização distintas, entre o Conselho da Magistratura e qualquer outro órgão judicante do Tribunal de Justiça e entre juízes de unidades jurisdicionais com competência diferente, bem como os respectivos incidentes;

[...].

Como se vê, portanto, o atual Regimento Interno manteve o critério funcional adotado desde o Ato Regimental TJ n. 160, de 21/3/2018, preservando a delegação a esta Câmara para apreciação dos conflitos de competência outrora atribuídos ao Órgão Especial.

O incidente preenche os requisitos legais dos artigos 66, 951 e 953, todos do Código de Processo Civil, razão pela qual deve ser conhecido.

Consigna-se a desnecessidade de oitiva dos órgãos julgadores em conflito porque suas razões constam nos presentes autos, possibilitando a compreensão da celeuma (CC n. 0000178-76.2018.8.24.0000, da Capital, rela. Desa. Rosane Portella Wolff, j. 22/2/2018).

Tocante à competência para processar e julgar o feito, dispõem os artigos 2º e 3º da Resolução TJ n. 6/2011, atualizados pelas Resoluções TJ n. 25/2011, n. 6/2015 e n. 19/2017:

Art. 2º Compete privativamente ao Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da comarca de Navegantes:

I - processar e julgar:

a) os feitos relativos à família (art. 96 da Lei n. 5.624, de 9 de novembro de 1979);

b) os feitos relativos à infância e juventude (Leis n. 5.624, de 9 de novembro de 1979, e 8.069, de 13 de julho de 1990), inclusive os procedimentos para apuração de ato infracional;

c) as causas relativas à investigação de paternidade de que trata a Lei n. 8.560, de 29 de dezembro de 1992; e

d) os feitos relativos aos órfãos, às sucessões - inclusive entre maiores e capazes -, aos ausentes e aos interditos (art. 97 e 98, I, "a", todos da Lei n. 5.624, de 9 de novembro de 1979).

II - cumprir cartas de ordem e cartas precatórias no âmbito de sua competência.

Parágrafo único. Os processos referidos no inciso II e nas alíneas "b" e "d" do inciso I deste artigo, atualmente em tramitação na 2ª Vara Cível da comarca de Navegantes, serão redistribuídos ao Juiz de Direito da 1ª Vara Cível.

Art. 3º Compete privativamente ao Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da comarca de Navegantes:

I - processar e julgar:

a) as causas cíveis de menor complexidade (art. 3º da Lei n. 9.099, de 26 de setembro de 1995);

b) os feitos relativos à provedoria, aos resíduos e às fundações (art. 98 da Lei n. 5.624, de 9 de novembro de 1979, excetuadas as ações previstas na alínea "a" do inciso I do referido artigo).

c) os feitos relativos à Fazenda Pública (art. 99 da Lei n. 5.624, de 9 de novembro de 1979);

d) os feitos relativos aos registros públicos (art. 95 da Lei n. 5.624, de 9 de novembro de 1979);

e) as ações constitucionais (mandado de segurança, ação civil pública, ação popular e habeas data); e

f) as ações acidentárias (art. 109, I, da Constituição da República Federativa do Brasil) e as previdenciárias (art. 129, II, da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991).

II - cumprir cartas de ordem e cartas precatórias no âmbito de sua competência.

Parágrafo único. Os processos referidos nas alíneas "a" e "b" deste artigo, atualmente em tramitação na 1ª Vara Cível da comarca de Navegantes, serão redistribuídos ao Juiz de Direito da 2ª Vara Cível. (grifou-se)

Fixadas aludidas premissas, na origem visualiza-se que o Ministério Público do Estado de Santa Catarina manejou ação civil pública em face de Edson Roberto da Silva Rodrigues e Município de Navegantes, a fim de obrigar o ente público a providenciar a internação compulsória do primeiro demandado, em razão deste ser dependente químico e portador de doença mental (fls. 1/16 SAJ5/PG).

Após deferir a tutela de urgência, no curso da lide o Juízo de Direito da 2ª Vara Cível de Navegantes, com jurisdição sobre os feitos que envolvem a Fazenda Pública, declinou da competência por entender que em razão do primeiro demandado ter sido declarado interditado pela 1ª Vara Cível de Navegantes nos autos n. 0004064-13.2011.8.24.0135, cabe a esse último, o qual possui jurisdição sobre interditos, o julgamento acerca de eventuais medidas a serem aplicadas (fl. 83 SAJ5/PG).

Ao recusar a jurisdição e instaurar o presente incidente, o Juízo de Direito da 1ª Vara Cível de Navegantes pontua que o objeto da ação contempla exclusivamente questão de ordem pública; tramitou na 1ª Vara Cível de Navegantes a ação de interdição n. 0004064-13.2011.8.24.0135, estando superada a matéria referente ao estado civil de pessoa; a atual controvérsia aborda apenas política pública de atendimento a dependente químico, cuja competência pertence à 2ª Vara Cível da comarca (fls. 88/91 SAJ5/PG).

Razão assiste ao Suscitante.

Com efeito, a orientação deste Tribunal de Justiça, firmada nos autos do Conflito de Competência n. 9141148-75.2015.8.24.0000, de relatoria do Exmo. Sr. Des. Eládio Torret Rocha, é no sentido de que compete às varas da Fazenda Pública processar e julgar as ações de internação compulsória dirigida contra o Estado de Santa Catarina ou contra um dos seus municípios, para tratamento de saúde às expensas dos entes federativos.

Eis a ementa do citado aresto:

PROPOSTA DE SÚMULA. COMPETÊNCIA PARA O PROCESSAMENTO E O JULGAMENTO DE AÇÃO DE INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA DE TOXICÔMANO. ATRIBUIÇÃO DAS VARAS DA FAZENDA PÚBLICA QUANDO O FEITO ENVOLVER PEDIDO COMINATÓRIO EM FACE DE PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO INTERNO, INDEPENDENTEMENTE DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO COM O DEPENDENTE QUÍMICO, RESSALVADAS AS HIPÓTESES NAS QUAIS HÁ CUMULAÇÃO DE PEDIDO DE INTERDIÇÃO, TUTELA OU CURATELA, CASOS EM QUE A DISCUSSÃO É ATINENTE À CAPACIDADE CIVIL E AO ESTADO DA PESSOA, E O FEITO, ENTÃO, COMETE-SE...

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