Acórdão Nº 0000375-62.2019.8.24.0043 do Primeira Câmara Criminal, 13-02-2020

Número do processo0000375-62.2019.8.24.0043
Data13 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemMondai
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Criminal n. 0000375-62.2019.8.24.0043, de Mondaí

Relator: Desembargador Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. FURTO QUALIFICADO PELO ABUSO DE CONFIANÇA. ARTIGO 155, PARÁGRAFO 4°, INCISO II. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO.

PRELIMINAR. NULIDADE DO PROCESSO POR CERCEAMENTO DE DEFESA. ALEGADO PREJUÍZO PELA NÃO REALIZAÇÃO DE INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL. DESCABIMENTO. INEXISTÊNCIA DE DÚVIDA RAZOÁVEL ACERCA DA HIGIDEZ MENTAL DO RECORRENTE. PREFACIAL AFASTADA.

MÉRITO. ABSOLVIÇÃO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INVIABILIDADE. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. RES DE VALOR SIGNIFICATIVO E AGENTE REINCIDENTE ESPECÍFICO EM DELITOS PATRIMONIAIS REPROVABILIDADE DO COMPORTAMENTO DO AGENTE QUE NÃO PODE SER CONSIDERADO REDUZIDO. DECISÃO CORRETA.

PENA. AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA REFERENTE AO ABUSO DE CONFIANÇA. ARGUMENTO DE QUE NÃO EXISTIA VÍNCULO ENTRE AS PARTES. REDUZIDO TEMPO DE CONVÍVIO E A CONDIÇÃO DE APENADO NÃO ASSEGURAM O MEIO SURPRESA ESSENCIAL PARA A RELAÇÃO DE CONFIANÇA. INVIABILIDADE. APELANTE QUE TINHA LIVRE ACESSO AO LOCAL. RELAÇÃO DE CONFIANÇA ASSEGURADA. QUALIFICADORA MANTIDA.

DECISÃO CONFIRMADA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0000375-62.2019.8.24.0043, da comarca de Mondaí Vara Única em que é/são Apelante(s) Claonei Grings e Apelado(s) Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Primeira Câmara Criminal decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Carlos Alberto Civinski, e dele participou a Exma. Sra. Desa. Hildemar Meneguzzi de Carvalho e o Exmo. Sr. Des. Paulo Roberto Sartorato.

Funcionou como membro do Ministério Público a Exma. Sra. Dra. Procuradora de Justiça Cristiane Rosália Maestri Boell.

Florianópolis,13 de fevereiro de 2020.

Desembargador Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva

Relator


RELATÓRIO

O representante do Ministério Público do Estado de Santa Catarina com atuação perante a Vara Única da Comarca de Mondaí ofereceu denúncia contra Claonei Grings dando-o como incurso na sanção do art. 155, caput, do Código Penal, pela prática dos fatos delituosos assim narrados na exordial acusatória (fls. 111/112):

"[...]No dia 16 de março de 2019, em horário que a instrução poderá melhor apurar, mas no período da manhã, na Rua Simões, n. 118, centro de Iporã do Oeste/SC, no Grupamento dos Bombeiros Militares de Iporã do Oeste, o denunciado CLAONEI GRINGS, de forma livre e consciente da reprovabilidade de sua conduta e com o firme propósito de assenhorear-se definitivamente do patrimônio alheio (animus furandi), subtraiu, para si, 1 (um) carregador de bateria 20A, bivolt, marca Sentinela, cor predominante laranja, com frente vermelha, avaliado em R$ 500,00 (quinhentos reais) 1, de propriedade do Grupamento dos Bombeiros Militares de Iporã do Oeste.

Segundo se extrai do incluso procedimento investigativo, o denunciado estava cumprindo pena de prestação de serviços à comunidade no interior do Grupamento do Batalhão em razão de condenação pela prática de furto, quando, aproveitando-se da situação, subtraiu o carregador de bateria acima mencionado. Para tanto, primeiramente, escondeu o objeto nos fundos do prédio e, antes de deixar o local, arremessou o bem para o outro lado do muro, tendo, na sequência levado a bateria em questão para sua casa.

A ação do denunciado foi flagrada pelas câmeras de segurança existentes no local e o bem, após cumprimento de mandado de busca e apreensão, foi apreendido e devolvido à vítima. [...]".

A Magistrada competente julgou procedente a denúncia e, em consequência (fls. 166/175), condenou Claonei Grings ao cumprimento de 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão, em regime fechado, bem como, a 13 (treze) dias-multa, cada qual no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na época dos fatos, por infração ao disposto no art. 155, § 4º, inc. II (abuso de confiança) do Códex Penal.

Inconformado, o réu, mediante Defensor Constituído (Carlos Leste - OAB/SC 7.861) interpôs recurso de apelação, em cujas razões (fls. 181/184) requereu, em síntese:

a) preliminarmente, reconhecimento de cerceamento de defesa, com a consequente anulação da decisão questionada, e deferimento da abertura de incidente de insanidade mental.

a) a absolvição do apelante, ante a atipicidade da conduta à luz do princípio da insignificância, nos termos do art. 386, inc. III, do Código de Processo Penal.

c) por fim, o afastamento da qualificadora do abuso de confiança (art. 155, § 4º, inc. II do CP).

Em sede de contrarrazões, a Promotoria de Justiça manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do apelo defensivo (fls. 192/201).

A 12ª Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Procurador de Justiça Aurino Alves de Souza, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento recursal (fls. 216/223).

É o relatório necessário.

VOTO

O recurso merece ser conhecido, porquanto presentes os pressupostos de admissibilidade.

Em síntese, ao agente restou imputado o crime de furto qualificado pelo abuso de confiança (art. 155, § 4º, inc. II do CP), porque no presente ano, ao realizar o trabalho comunitário no Grupamento dos Bombeiros Militares de Iporã do Oeste, em razão de sentença condenatória de delito análogo, afanou para si 01 (um) carregador de bateria 20A, bivolt, marca Sentinela, na cor predominante laranja, com frente vermelha, avaliada em R$ 500,00 (quinhentos reais).

Diante das insurgências já detalhadas no relatório, passa-se a análise dos pleitos.

Preliminar: Cerceamento de Defesa - Incidente de Insanidade Mental

Inicialmente, no que se refere à preliminar de nulidade decorrente do indeferimento de instauração de incidente de sanidade mental, cumpre destacar que, ao contrário do que sustenta a defensa, não se está diante de qualquer vício, muito menos de caráter absoluto, capaz de macular a regularidade da presente Ação Penal.

No caso, o requerimento foi apresentado ao juízo de origem em peça inominada, com o objeto "pedido de instauração de incidente de insanidade mental do acusado com liberdade provisória" (fls. 121/122), após, a Douta Magistrada, enfrentando as minucias do caso, indeferiu o pedido (fls. 133/136).

Na audiência de instrução e julgamento, nenhum questionamento foi realizado naquele sentido, e ainda, finda a coleta probatória, a defesa não requereu a análise daquele pleito (fl. 162) e em suas alegações finais, de igual maneira, sem qualquer outra menção sobre eventual insanidade mental (fls. 163/164).

Proferida a sentença condenatória (fls. 166/175), o Defensor Constituído interpôs recurso de apelação, e neste, fez referência ao suposto cerceamento de defesa, ante a não realização do exame de sanidade mental (fls. 181/184).

Como se vê, a defensa não foi impedida de produzir prova da eventual imputabilidade ou semi-imputabilidade do acusado, tendo, voluntariamente, desistido da realização do exame, não se tratando de matéria que reclamasse reapreciação de ofício, especialmente porque, conforme esclarecido pelo Magistrado de Primeiro Grau, ausente qualquer indicativo de doença mental ou desenvolvimento mental incompleto do acusado.

A propósito, Guilherme de Souza Nucci esclarece:

Como dito anteriormente, a defesa manteve-se em silêncio até a prolação da sentença final sobre a ausência de apreciação de seu pedido de exame psiquiátrico/psicológico, formulado ainda antes da resposta à acusação, consentiu tornasse precluso esse direito.

Neste passo, vale mencionar também que, conforme o art. 565 do Código de Processo Penal, "[...] nenhuma das partes poderá arguir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido [...]", preceito legal que encontra justificativa na necessidade de se evitar "[...] a utilização dos mecanismos legais para conturbar o processo e não para garantir o devido processo legal [...]" (NUCCI. Op. cit. p. 1522).

Da mesma forma, impossível olvidar ser princípio geral do processo penal, insculpido no art. 563 do Código de Processo Penal, que não haverá o reconhecimento de nulidade sem a demonstração de prejuízo, sob pena de "[...] consagração de um formalismo exagerado e inútil, que sacrificaria o maior objetivo da atividade jurisdicional; assim, somente a atipicidade relevante dá lugar à nulidade; daí a conhecida expressão utilizada pela doutrina francesa: pas de nullité sans grief. [...]" (GRINOVER, Ada Pellegrini. As Nulidades no Processo Penal. 6ª ed., 4ª tiragem, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2000, p. 26 grifo do original).

Não existindo nos autos nenhum indicativo de que o réu fosse, ao tempo das práticas criminosas narradas na denúncia, incapaz de entender o...

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