Acórdão Nº 0000377-91.2012.8.24.0135 do Segunda Câmara Criminal, 24-11-2020

Número do processo0000377-91.2012.8.24.0135
Data24 Novembro 2020
Tribunal de OrigemNavegantes
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Criminal n. 0000377-91.2012.8.24.0135, de Navegantes

Relator Designado: Des. Sérgio Rizelo

APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO QUALIFICADO PELO EMPREGO DE FRAUDE E PELO CONCURSO DE PESSOAS, E DANO PRATICADO COM EMPREGO DE SUBSTÂNCIA INFLAMÁVEL (CP, ARTS. 155, § 4º, II E IV, E 163, PARÁGRAFO ÚNICO, II). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA ACUSADA.

1. ERRO MATERIAL. DISPOSITIVO DA SENTENÇA. GRAFIA INCORRETA DO NOME DE UMA DAS ACUSADAS. MENÇÃO EQUIVOCADA À NORMA PENAL VIOLADA. 2. DELITO DE DANO QUALIFICADO. PRESCRIÇÃO RETROATIVA. PENA INFERIOR A 1 ANO. MARCOS INTERRUPTIVOS. SUPERAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL (CP, ART. 107, IV). 3. PROVA DA AUTORIA. CONFISSÃO DA COACUSADA. ADMISSÃO INFORMAL. PALAVRAS DOS POLICIAIS CIVIS. 4. EMPREGO DE FRAUDE (CP, ART. § 4º, II). SUBSTITUIÇÃO DE DINHEIRO POR PAPEL. SIMULAÇÃO DE ASSALTO E INCÊNDIO. 5. CONCURSO DE PESSOAS (CP, ART. 155, § 4º, IV). PROVA ORAL. UNIÃO DE VONTADES E UNIDADE DE DESÍGNIOS. 6. CONFISSÃO INFORMAL. INCIDÊNCIA DA ATENUANTE (CP, ART. 65, III, "D"). 7. TENTATIVA (CP, ART. 14, II). POSSE MANSA E PACÍFICA. INVERSÃO DA POSSE. CONSUMAÇÃO. 8. PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA (CP, ART. 29, § 1º). EXECUÇÃO DIRETA. COMUNHÃO DE VONTADES E UNIDADE DE DESÍGNIOS. COAUTORIA. 9. PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA SUBSTITUTIVA. FUNDAMENTAÇÃO. REDUÇÃO.

1. Configuram meros erros materiais, passíveis de correção, a grafia incorreta do nome de uma das acusadas e a referência equivocada, no dispositivo da sentença resistida, da norma penal violada, se o crime foi nela devidamente fundamentado e houve menção ao quantum sancionatório imposto.

2. O prazo prescricional, se aplicada pena inferior a um ano de privação de liberdade, é de 3 anos. Se tal interregno transcorreu entre a data do recebimento da denúncia e a da publicação da sentença condenatória, decretam-se extintas as punibilidades das acusadas.

3. Está comprovada a autoria do crime de furto apontada à acusada se os policiais civis responsáveis pela investigação declararam que ela confessou informalmente a prática delituosa e se a coacusada igualmente admitiu que ambas atuaram em comunhão de esforços e unidade de desígnios.

4. Pratica o crime de furto mediante fraude a acusada que, a fim de ludibriar o proprietário da lotérica onde trabalhava, subtrai numerário de envelopes, substituindo-o por papeis sem valor, banhados em substância semelhante a combustível e, na sequência, simula uma situação de incêndio praticada por suposto assaltante.

5. Ocorre concurso de pessoas no crime de furto quando duas agentes se unem para subtrair dinheiro do seu local de trabalho (ficando uma responsável por carregar a quantia e a outra por substituir o montante por papel) e ajustam a divisão do valor rapinado.

6. Faz jus à atenuante de confissão espontânea a agente que admite seu envolvimento na prática delituosa quando entrevistada por policiais civis, se tal fato foi utilizado como elemento de convicção.

7. Pratica o delito de furto consumado, e não tentado, a acusada que substitui dinheiro alheio por papel e entrega a res furtiva a sua comparsa, que deixa o local em poder do bem rapinado, porque houve inversão da posse da coisa subtraída.

8. Não tem direito à causa de diminuição da participação de menor importância a acusada que subtrai dinheiro, substituindo-o por papel, e entrega a quantia para sua comparsa, para que ela esconda e armazene o montante.

9. O arbitramento da pena de prestação pecuniária em valor superior ao do mínimo legal exige fundamentação amparada na condição financeira da acusada; a falta de justificativa impõe a redução da reprimenda ao menor patamar legalmente possível.

RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO; DE OFÍCIO, DECLARADA EXTINTA A PUNIBILIDADE DAS ACUSADAS QUANTO AO CRIME DE DANO QUALIFICADO; RECONHECIDA A ATENUANTE DE CONFISSÃO ESPONTÂNEA NO TOCANTE À APELANTE; E REDUZIDA A PENA DE PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA IMPOSTA ÀS ACUSADAS.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0000377-91.2012.8.24.0135, da comarca de Navegantes (Vara Criminal), em que é Apelante Cláudia Pinheiro e Apelado o Ministério Público do Estado de Santa Catarina:

A Segunda Câmara Criminal decidiu, por unanimidade, decretar extintas as punibilidades das Denunciadas com relação ao delito de dano qualificado; conhecer do recurso e, por maioria de votos, dar-lhe parcial provimento para corrigir erro material no dispositivo da sentença; e, de ofício, reconhecer a atenuante da confissão com relação a Cláudia Pinheiro e reduzir o valor da prestação pecuniária com relação a ambas as Acusadas. Vencida a Excelentíssima Desembargadora Hildemar Meneguzzi de Carvalho, que votou pelo provimento o recurso para absolver Cláudia Pinheiro. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado no dia 24 de novembro de 2020, os Excelentíssimos Desembargadores Hildemar Meneguzzi de Carvalho e Sidney Eloy Dalabrida.

Florianópolis, 3 de dezembro de 2020.




Sérgio Rizelo

PRESIDENTE E RELATOR DESIGNADO


RELATÓRIO

Na Comarca de Navegantes, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Iorrara de Souza e Cláudia Pinheiro, imputando-lhes a prática dos crimes previstos nos arts. 155, § 4º, incisos I, II e IV, e 163, ambos do Código Penal, nos seguintes termos:

No dia 20 de janeiro de 2012, por volta das 7 horas, na Avenida João Sacavem, nº 552, Centro, Navegantes/SC, as denunciadas Iorrara de Souza e Cláudia Pinheiro, em comunhão de esforços, subtraíram para si, o valor de R$ 13.000,00 (treze mil reais) da "Lotérica Chaplin", local este de trabalho de ambas.

As denunciadas há algum tempo vinham desviando dinheiro do caixa da Lotérica, para tanto rasuravam o livro de contas, colocando nos envelopes valores depositados no cofre da lotérica sempre maiores daqueles que fossem depositados na Caixa Econômica. Para encobrir a fraude colocavam papel ao invés de dinheiro no cofre da lotérica.

E com o intuito de forjar um assalto, em primeiro momento, informaram que teriam sido vítimas de uma tentativa de roubo, e que os agentes teriam roubado o dinheiro do cofre e ateado fogo. Porém, logo após as denunciadas confessaram que haviam retirado todo o dinheiro existente no interior do cofre da lotérica, e logo após atearam fogo em papéis, bem como, nas filmagens.

No interior do cofre foi verificado que não havia dinheiro e sim envelopes com folhas de papel em branco, o laudo da perícia demonstrou também, a existência de resíduos de material inflamável e palitos de fósforo" (fls. 21-23).

Concluída a instrução, o Doutor Juiz de Direito julgou parcialmente procedente a exordial acusatória e condenou Iorrara de Souza e Cláudia Pinheiro à pena individual de 2 anos e 4 meses de reclusão e 6 meses de detenção, a ser cumprida em regime inicialmente aberto, e 21 dias-multa, arbitrados individualmente no mínimo legal, substituída a privativa de liberdade por restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária de valor equivalente a quatro salários mínimos, pelo cometimento dos delitos previstos nos arts. 155, § 4º, incisos I, II e IV, e 163, parágrafo único, II, ambos do Código Penal (fls. 496-512).

Insatisfeita, Cláudia Pinheiro deflagrou recurso de apelação.

Em suas razões de insurgência, sustenta o desacerto da sentença resistida, alegando, preliminarmente, a existência de erro material quanto à tipificação da condenação, uma vez que na parte narrativa da sentença, mais precisamente à fl. 505, a qualificadora de rompimento de obstáculo (art. 155, § 4º, I, do Código Penal) foi afastada. Postula, portando, o afastamento da respectiva circunstância qualificadora.

No mérito, argumenta que as provas coligidas aos autos não autorizam a prolação do édito condenatório, mormente por não demonstrarem a sua participação no crime narrado na denúncia.

Pugna, ainda, pelo afastamento da qualificadora pormenorizada no art. 155, § 4º, II, do Código Penal, sob a tese de que "o que houve foi a simples subtração dos valores da lotérica, sem qualquer conduta que levasse a vítima a erro, fator esse indispensável para caracterização da qualificadora da fraude".

De igual modo, assevera ser inviável o reconhecimento da qualificadora do concurso de pessoas, reiterando que não há prova de que "a Apelante tivesse conhecimento dos fatos, não tendo esta contribuído para a execução do crime, não há que se falar em concurso de pessoas".

Postula, ainda, o reconhecimento da tentativa (CP, art. 14, II) e da participação de menor importância (CP, art. 29, §1º).

Por fim, afirma que "não há que se falar em crime de dano, eis que este fora cometido para acobertar o furto supostamente cometido pelas Apelantes" (fls. 563-577).

O Ministério Público ofereceu contrarrazões pelo conhecimento e parcial provimento do reclamo, apenas para que seja promovida a correção da parte dispositiva da sentença (fls. 582-591).

A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Paulo Roberto de Carvalho Roberge, posicionou-se pelo conhecimento e provimento do recurso (fls. 594-606).

Este é o relatório.


VOTO

O recurso preenche os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.

1. Deve ser acolhido o pleito liminar para corrigir erro material existente no dispositivo da sentença resistida, uma vez que o Magistrado de Primeiro Grau fez constar que a condenação deu-se também mediante a incidência da qualificadora de rompimento de obstáculo (CP, art. 155, § 4º, I), em que pese tenha expressamente afastado-a no corpo do ato decisório:

No que tange às qualificadoras, verifica-se que na exordial acusatória as...

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