Acórdão Nº 0000408-27.2013.8.24.0087 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 10-12-2020

Número do processo0000408-27.2013.8.24.0087
Data10 Dezembro 2020
Tribunal de OrigemLauro Müller
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Cível n. 0000408-27.2013.8.24.0087, de Lauro Müller

Relator: Desembargador Jaime Machado Junior

APELAÇÕES CÍVEIS. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. REVISÃO CONTRATUAL OPERADA. READEQUAÇÃO DE CLÁUSULAS.

RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA

ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE EXCESSIVA ONEROSIDADE CONTRATUAL. POSSIBILIDADE DE REVISAR AS CLÁUSULAS QUE COLOQUEM O CONSUMIDOR EM DEMASIADA DESVANTAGEM OU QUE SEJAM ABUSIVAS. PROVOCAÇÃO DA PARTE. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR QUE NÃO FERE O PRINCÍPIO DO PACTA SUNT SERVANDA.

JUROS REMUNERATÓRIOS. ENCARGO QUE SE REVELA ABUSIVO, VISTO QUE PACTUADO EM PATAMAR SUPERIOR A 10% DA TAXA MÉDIA DE MERCADO FIXADA PELO BACEN PARA O PERÍODO DA CONTRATAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO, NO PONTO.

CAPITALIZAÇÃO., COMISSÃO DE PERMANÊNCIA E MORA. RAZÕES RECURSAIS QUE NÃO REBATEM OS FUNDAMENTOS CONTIDOS NO DECISUM. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE RECURSAL.

Se o recorrente não expõe os fundamentos que dão causa a seu inconformismo, seja por fazê-lo de forma estranha ao contexto entabulado na decisão, seja por repetir ipsis litteris argumentos já enfrentados e rejeitados pelo magistrado de primeiro grau, e não discorre especificamente sobre as razões de decidir constantes da sentença, atenta contra o princípio da dialeticidade e, por isso, seu recurso não pode ser conhecido (Apelação Cível n. 0803570-92.2013.8.24.0023, rel. Des. Janice Goulart Garcia Ubialli, j. 03-04-2018).

RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS A MAIOR. POSSIBILIDADE, DIANTE DE MONTANTE ADIMPLIDO INDEVIDAMENTE.

RECURSO DOS EMBARGANTES

DEFENDIDA ILEGITIMIDADE PASSIVA DO CÔNJUGE QUE FIRMOU O CONTRATO NA QUALIDADE DE ANUENTE. TESE ACOLHIDA. IMPOSSIBILIDADE DE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA DO AVAL. AUTORIZAÇÃO PARA O COMPROMETIMENTO DO PATRIMÔNIO FAMILIAR QUE NÃO TORNA AQUELE QUE ANUIU GARANTIDOR DO DÉBITO NA CONDIÇÃO DE DEVEDOR SOLIDÁRIO. ILEGITIMIDADE PASSIVA RECONHECIDA. EXTINÇÃO DO PROCESSO EM RELAÇÃO À ANUENTE, SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO, COM FUNDAMENTO NO ART. 267, VI, DO CPC/73 (CORRESPONDENTE AO ART. 485, VI, DO CPC.

"Constando na nota promissória emitida como garantia de contrato de compra e venda apenas o marido como avalista, e comparecendo sua esposa apenas como anuente (outorga uxória), ela não assume a qualidade de garantidora" (TJSC, Apelação Cível n. 0002229-96.2011.8.24.0035, rel. Rubens Schulz, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 31-01-2017).

ÔNUS SUCUMBENCIAIS READEQUADOS.

RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA CONHECIDO EM PARTE E, NESTA, DESPROVIDO.

RECURSO DOS EMBARGANTES CONHECIDO E PROVIDO.



Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0000408-27.2013.8.24.0087, da comarca de Lauro Müller Vara Única em que é Apte/Apdo Banco Santander Brasil S/A e Apdo/Apte Bett Car Ltda e outros.



A Terceira Câmara de Direito Comercial decidiu, por unanimidade, conhecer em parte do recurso da instituição financeira e, nesta, negar-lhe provimento. Outrossim, vota-se por conhecer do recurso dos embargantes e dar-lhe provimento a fim reconhecer a ilegitimidade passiva de Marilene Gonçalvez Bett, julgando-se o feito extinto em relação a ela, com fundamento no art. 267, VI, do CPC/73 (correspondente ao art. 485, VI, do CPC/15), readequados os ônus sucumbenciais, nos termos da fundamentação. Custas legais.











O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Tulio Pinheiro, com voto, e dele participou o Excelentíssimo Senhor Desembargador Sebastião César Evangelista.



Florianópolis, 10 de dezembro de 2020



Desembargador Jaime Machado Junior

Relator





















RELATÓRIO

Banco Santander Brasil S.A. Interpôs recurso de apelação cível contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Lauro Müller que, nos autos da ação executiva ajuizada em desfavor de Bett Car Ltda., acolheu em parte os embargos à execução, nos seguintes termos:

JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados Bett Car Ltda, Jair Paulo Bett e Marilene Gonçalves Bett em desfavor de Banco Santander (Brasil) S/A nos presentes embargos à execução para:

a) declarar nula a cobrança dos títulos de capitalização, consórcios e seguros adquiridos a título de venda casada;

b) reconhecer a abusividade da taxa de juros praticada, limitando-a à média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil para o período da contratualidade, qual seja, de 2,16% ao mês, exceto se, na fase de liquidação de sentença, verificar-se que a taxa contratada é mais benéfica ao consumidor;

c) declarar a ilegalidade da cobrança das taxas administrativas (TAC, TEC, Taxa de Retorno ou outras denominações com mesmo fato gerador);

d) reconhecer a legalidade da cobrança de comissão de permanência no período de inadimplência à taxa de 2,16% ao mês (taxa média de mercado);

Condeno o embargado à devolução dos valores eventualmente cobrados a maior ou sua compensação com os valores que, porventura, o autor ainda deva, sendo que para sua apuração os valores cobrados deverão ser calculados de acordo com o estabelecido na fundamentação supra.

Em face da sucumbência recíproca, arcam os litigantes, ex vi do art. 21. Caput do CPC, com o pagamento pro rata das custas e despesas processuais, bem como da verba honorária, que fixo em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), partilhada na proporção acima estabelecida, admitindo-se a compensação na forma prevista na Súmula 306 do STJ.

Postergo a análise da liberação de eventuais valores depositados em Juízo para depois do trânsito em julgado.

Opostos embargos de declaração pelos embargantes, foram estes parcialmente acolhidos, acrescentando ao dispositivo da sentença o seguinte teor:

[...]

e) declarar a ausência de mora por parte do autor antes a falta do requisito subjetivo, nos moldes da fundamentação.

No mais, porque demonstrada a hipossuficiência dos autores, defiro o benefício da justiça gratuita pleiteado na exordial. Via de consequência, cumpre alterar a redação do parágrafo que tratou da sucumbência: "Em face da sucumbência recíproca, arcam os litigantes, ex vi do art. 21, caput, do CPC, com o pagamento pro rata das custas e despesas processuais, bem como da verba honorária, que fixo em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), partilhada na proporção acima estabelecida, admitindo-se a compensação na forma prevista na Súmula 306 do STJ: suspensa a exigibilidade, contudo, no que diz respeito aos autores, diante da justiça gratuita deferida.".

Ante o exposto, ACOLHO os embargos opostos pelos autores, nos termos da fundamentação.

Inconformada com a prestação jurisdicional entregue, a instituição financeira sustentou a legalidade da contratação, defendendo que o contrato não padece de cláusulas abusivas. Para tanto, discorreu acerca da possibilidade da contratação dos juros remuneratórios acima da taxa média de mercado; do cabimento da capitalização e legalidade da cobrança de comissão de permanência cumulada com juros moratórios e multa. Aduziu, ainda, que não há valores a serem restituídos. Pugnou, por fim, pela caracterização da mora.

Interposto recurso de apelação também pelos embargantes, estes pugnam pelo reconhecimento da ilegitimidade passiva de Marilene Gonçalves Bett, alegando que esta firmou o contrato objeto da execução na qualidade de anuente e não como avalista.

Com as contrarrazões, ascenderam os autos a este Tribunal de Justiça.

Este é o relatório.

VOTO

Considerando que a sentença objurgada restou publicada na vigência do Código Processual de 1973, a análise dos reclamos ficará a cargo de mencionado diploma legal.

No que diz respeito ao Código de Defesa do Consumidor denota-se que o juízo a quo determinou a aplicação da legislação consumerista, em conformidade com a Súmula n. 297 do Superior Tribunal de Justiça, o que enseja a interpretação mais favorável ao consumidor.

A instituição financeira sustentou a legalidade do pacto celebrado entre as partes, a significar a impossibilidade de revisão, em virtude do princípio pacta sunt servanda.

Com base na aplicação do Código de Defesa do Consumidor, exsurge a possibilidade de revisar as cláusulas contratuais que coloquem o consumidor em situação desfavorável ou que sejam abusivas, consoante artigo 51, inciso IV, do citado diploma. Tal revisão, porém, não vai de encontro aos princípios do citado pacta sunt servanda, autonomia da vontade e ato jurídico perfeito, os quais cedem espaço à norma específica prevista no artigo 6º, inciso V, do CDC, por serem genéricos.

Por oportuno, importa citar o verbete da Súmula n. 381 do Superior Tribunal de Justiça: "Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas."

Nessa linha de raciocínio, a revisão de cláusulas contratuais poderá ocorrer mediante provocação da parte, o que se deu através dos embargos à execução.

A respeito dos juros remuneratórios, é importante frisar que o entendimento jurisprudencial admite sua variação acima da taxa média de mercado, desde que não seja iníqua ou abusiva, com o objetivo de conservar a natureza do encargo.

A propósito, transcreve-se trecho do voto da Ministra Nancy Andrighi, no REsp n. 1.061.530/RS: "[...] conclui-se que é admitida a revisão das taxas de juros em situações excepcionais, desde que haja relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) esteja cabalmente demonstrada."

Ainda sobre a temática, estabelece o Enunciado I do Grupo de Câmaras de Direito Comercial que:

I -...

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