Acórdão Nº 0000440-61.2014.8.24.0066 do Quarta Câmara de Direito Civil, 22-10-2020

Número do processo0000440-61.2014.8.24.0066
Data22 Outubro 2020
Tribunal de OrigemSão Lourenço do Oeste
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão



Apelação Cível n. 0000440-61.2014.8.24.0066

Apelação Cível n. 0000440-61.2014.8.24.0066, de São Lourenço do Oeste

Relator: Des. Luiz Felipe Schuch

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO DE VIDA. COBERTURA PARA O CASO DE MORTE. FALECIMENTO DA ESPOSA DO DEMANDANTE/CONTRATANTE. NEOPLASIA MALIGNA DE MAMA. PRETENSÃO RESISTIDA PELA SEGURADORA DEMANDADA COM BASE NA VIOLAÇÃO DO CONTRATO SECURITÁRIO. DOENÇA PREEXISTENTE. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DA SEGURADORA.

PLEITO DE REVERSÃO DA CONDENAÇÃO. FALECIMENTO EM DECORRÊNCIA DE CÂNCER DE MAMA. DOENÇA PREEXISTENTE. TESE ACOLHIDA. COMPROVAÇÃO DA PREEXISTÊNCIA DA MOLÉSTIA CAUSADORA DA MORTE DA SEGURADA. SUBMISSÃO À CIRURGIA (MASTECTOMIA) E POSTERIOR TRATAMENTO QUIMIOTERÁPICO. CONHECIMENTO DO AUTOR ACERCA DO QUADRO DE SAÚDE DE SUA ESPOSA. DECLARAÇÃO FALSA PERPETRADA NA "PROPOSTA DE SEGURO" QUANTO A NÃO SER PORTADORA DE DOENÇA GRAVE. CAUSA MORTIS ASSOCIADA À NEOPLASIA ANTERIORMENTE CONHECIDA. INEXISTÊNCIA DE EXAME PRÉVIO. IRRELEVÂNCIA NO CONTEXTO APURADO NOS AUTOS. REQUISITO, ADEMAIS, NÃO EXIGIDO PELA NORMA DE REGÊNCIA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ E VERACIDADE CONDICIONADORES DA VALIDADE DO CONTRATO DE SEGURO (CC, ART. 765). MÁ-FÉ DO CONTRATANTE/BENEFICIÁRIO ÍNSITA AO OMITIR CIRCUNSTÂNCIA PESSOAL ESSENCIAL CAPAZ DE MODIFICAR OS TERMOS DA CONTRATAÇÃO PELA SEGURADORA. APLICAÇÃO DA SÚMULA 609 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, SEGUNDA PARTE. CONTRATO DE ADESÃO QUE NÃO DESNATURA A LIBERDADE DE CONTRATAR. PROTEÇÃO DO ART. 47 DO CÓDIGO CONSUMERISTA E INTERPRETAÇÃO FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR ADERENTE. CRITÉRIOS INTERPRETATIVOS IMPRESTÁVEIS PARA AFASTAR A EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE CONTRATUALMENTE PREVISTA. DEVER DE INDENIZAR AFASTADO. DECISUM REFORMADO. IMPROCEDÊNCIA.

ENCARGOS SUCUMBENCIAIS. ALTERAÇÃO DO JULGADO NESTA INSTÂNCIA. REDISTRIBUIÇÃO NECESSÁRIA. CONDENAÇÃO DO AUTOR AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS, CONFORME O ART. 85, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. EXIGIBILIDADE SUSPENSA FACE O BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA (ART. 98, § 3º, DO CPC).

RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

A omissão e as declarações inexatas sobre doenças e tratamentos médicos de conhecimento prévio do segurado, relevantes para a contratação do seguro e cálculo da taxa do prêmio, constituem condutas as quais a lei civil classificou automaticamente como má-fé, independentemente de qualquer exame médico preliminar, a permitir a recusa do segurador ao pagamento da indenização quando essas moléstias ocultadas intencionalmente se manifestarem no curso da contratualidade securitária.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0000440-61.2014.8.24.0066, da comarca de São Lourenço do Oeste (Vara Única), em que é apelante Brasilseg Companhia de Seguros e apelado Gelson Luis Zauza.

A Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento a fim de reformar a sentença vergastada para julgar improcedente o pedido inicial, nos termos do art. 487, I, do CPC, e condenar o autor ao pagamento integral das custas processuais e da verba honorária em favor dos patronos da suplicada, nos termos da fundamentação, ficando suspensa a exigibilidade em face do benefício da justiça gratuita, consoante o art. 98, § 3º, do CPC. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Desembargador Helio David Vieira Figueira dos Santos, com voto, e dele participou o Desembargador José Agenor de Aragão.

Florianópolis, 22 de outubro de 2020.

Luiz Felipe Schuch

RELATOR


RELATÓRIO

Acolho o relatório da sentença de fls. 470-476, por contemplar precisamente o conteúdo dos presentes autos, ipsis litteris:

Gelson Luis Zauza ajuizou ação de cobrança de seguro em face de Companhia de Seguros Aliança do Brasil, alegando, em síntese, que o autor é beneficiário do seguro de vida feito por ele e extensivo à esposa Marli Fátima Cecchin Zauza, no valor de R$ 195.000,00, cujo contrato teve vigência de 2/8/2012 a 2/8/2013.

Segundo consta, a segurada beneficiária (esposa) Marli Fátima Cecchin Zauza contava com boa saúde e, após a contratação do seguro, descobriu um câncer (neoplasia maligna) de mama, vindo a falecer em 10/5/2013 (certidão de óbito à fl. 20).

Em razão disso, o autor encaminhou a documentação necessária para o recebimento do seguro, que foi negado ao argumento de que a segurada veio a óbito em decorrência de doença preexistente não informada, quando da contratação do seguro, conforme carta de fl. 26.

Contudo, o autor alegou que a recusa da seguradora ré não se justifica, pois não houve má-fé no preenchimento do cartão de proposta, até porque não lhe foi exigido nenhum exame para a lavratura do contrato e, ainda que houvesse doença preexistente, essa era desconhecida do autor e de sua esposa.

Com base nisso, requereu a condenação da seguradora ré ao pagamento da indenização do seguro, no valor de R$ 195.000,00, mais acréscimos. Também requereu a justiça gratuita.

À fl. 30, foi deferida a justiça gratuita e ordenada a citação da seguradora ré.

Em contestação (fls. 34-51), a ré teceu considerações sobre o contrato de risco de seguro de vida, sustentando que a segurada omitiu ser portadora de uma doença grave câncer de mama - desde 29/4/2010, quando aderiu à proposta de seguro, pois havia expressa exclusão de cobertura para doença pré-existente. No presente caso, alegou ser inaplicável a inversão do ônus da prova. Quanto à incidência de juros, correção monetária e a fixação dos honorários advocatícios não devem incidir no patamar exigido. Ao final, apontou como valor real do capital segurado a quantia de R$ 50.000,00. Requereu, pois, a improcedência do pedido do autor.

Réplica às fls. 94-101.

A decisão de fl. 102 deixou de designar audiência de conciliação e determinou a intimação das partes para especificarem as provas que pretendem produzir.

O autor disse não ter interesse na produção de outras provas e requereu o julgamento antecipado da lide (fl. 104).

Às fls. 105-106, a parte ré requereu a produção de prova pericial médica indireta nos prontuários médicos da cônjuge do segurado, o que restou deferido à fl. 107.

À fl. 107, foi determinada a retificação do polo passivo para passar a constar a Companhia de Seguros Aliança do Brasil.

Às fls. 114-453, foram juntados os prontuários pelo Hospital Regional do Oeste e pela Clínica PHD Patologia Humana diagnosticada.

A parte autora se manifestou sobre a documentação juntada às fls. 457-461.

À fl. 468, certificou-se o decurso do prazo sem manifestação da parte ré.

A Magistrada de primeiro grau julgou procedente o pedido exordial, nos seguintes termos:

Ante o exposto, resolvo o mérito e ACOLHO (CPC, art. 487, I) o pedido formulado pelo autor Gelson Luis Zauza e, como consequência, CONDENO a ré Companhia de Seguros Aliança do Brasil a pagar em favor do autor o valor de R$ 195.000,00. Essa condenação é acrescida de correção monetária pelo IPCA, desde 17/07/2012 (adesão - fl. 22), e os juros de mora, em 1% ao mês, desde 16/07/2013 (aviso do sinistro fl. 25).

Em face do princípio da causalidade, CONDENO, ainda, a ré ao pagamento das custas processuais (CPC, art. 82, § 2°) e honorários advocatícios, estes últimos fixados em 15% sobre o valor da condenação, tendo em vista o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e, ainda, o tempo exigido para o seu serviço (CPC, art. 85, § 2°, I a IV).

Por meio do despacho de fl. 478, a julgadora a quo esclareceu que, "na sentença retro, onde se lê 28 de agosto de 2017 leia-se: 23 de agosto de 2017".

A seguradora ré opôs embargos declaratórios (n. 0001243-39.2017.8.24.0066), os quais foram acolhidos para retificar o dispositivo da sentença, que passou a ter a seguinte redação:

Ante o exposto, resolvo o mérito e ACOLHO (CPC, art. 487, I) o pedido formulado pelo autor Gelson Luis Zauza e, como consequência, CONDENO a ré Companhia de Seguros Aliança do Brasil a pagar em favor do autor o valor de R$ 195.000,00. Essa condenação é acrescida de correção monetária pelo IPCA, desde 17/07/2012 (adesão - fl. 22), e os juros de mora, em 1% ao mês, desde a data da interpelação extrajudicial, em 10/06/2013 (fl. 24).

Em face do princípio da causalidade, CONDENO, ainda, a ré ao pagamento das custas processuais (CPC, art. 82, § 2°) e honorários advocatícios, estes últimos fixados em 15% sobre o valor da condenação, tendo em vista o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e, ainda, o tempo exigido para o seu serviço (CPC, art. 85, § 2°, I a IV).

Irresignada com a prestação jurisdicional entregue, a ré interpôs apelação. Esclarece, inicialmente, que as cláusulas contratuais respeitaram as normas do Código Civil e das Circulares n. 27 e 17 da Susep, estando correto, portanto, o procedimento adotado pela apelante, "não havendo, no caso em tela, configuração da garantia contratada que poderia incorrer no pagamento da elevada indenização almejada pelo apelado" (fl. 489). Alega que "a pretensão autoral não apresenta respaldo nas cláusulas contratuais, que não podem comportar interpretação extensiva, sob pena de ensejar desiquilíbrio contratual, aumentando a responsabilidade sem a correlata cobertura" (fl. 491). Aduz que, ao aderir à proposta de seguro, a segurada omitiu ser portadora de câncer de mama desde 29-4-2010, doença que constituiu a sua causa mortis. Aponta à cláusula 4.1 a existência de previsão contratual de exclusão da cobertura do seguro de doenças preexistentes. Salienta que "o que se discute na demanda não é o tempo que a segurada permaneceu com a moléstia, mas sim o fato de ter lançado, de próprio punho, informações inverídicas no contrato se seguro" de que não possuía qualquer doença, estando caracterizada, dessa forma, a má-fé...

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