Acórdão Nº 0000458-56.2020.8.24.0039 do Primeira Câmara Criminal, 10-05-2022

Número do processo0000458-56.2020.8.24.0039
Data10 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão
Recurso em Sentido Estrito Nº 0000458-56.2020.8.24.0039/SC

RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO

RECORRENTE: ALEXSANDRO LOTTERMANN (RECORRENTE) RECORRENTE: FABRICIO DE OLIVEIRA AGUIAR RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (RECORRIDO)

RELATÓRIO

No Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Lages, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em face de Rudinei Kuster Vieira, Fabrício de Oliveira Aguiar e Alexsandro Lottermann, pela prática, em tese, da infração penal contra a vida prevista no art. 121, § 2º, II e IV, do Código Penal, em razão dos fatos assim narrados na inicial acusatória (Evento 248, PROCJUDIC1, fls. 2-4, dos autos principal):

No dia 05 de dezembro de 2010, aproximadamente às 19h47min., a vítima Roberto Dolberth, em companhia de Renata do Prado Dolberth, Edson Dolverth e Marcilene Fátima de Souza ingressaram no interior do Bar do Palhano, localizado na Avenida Juscelino Kubitschek, acesso norte desta Cidade, onde já se faziam presentes o denunciado Alexsandro Lotterman, julgo "Alemão", e o denunciado Fabrício Oliveira Aguiar, conhecido por "Rabicó", além do denunciado Rudnei Kuster Vieira, proprietário do mencionado bar.

No local, em virtude do som que tocava no interior do veículo da vítima, Roberto Dolberth e Edson Dolberth travaram discussão com os denunciados Alexsandro e Fabrício, momento em que todos passaram a lutar no interior do mencionado bar.

Em seguida, a vítima Roberto Dolberth, em companhia de Renata do Prado Dolberth, valendo-se do veículo FIAT/Tempra, placas LXL - 0009, de sua propriedade, retirou-se do bar em alta velocidade sem pagar pelos produtos consumidos, a qual passou a ser perseguida pelos denunciados Alexsandro e Fabrício, que conduziam o veículo GM/Corsa, cor bordô, de placas de São Joaquim, os quais também não haviam realizado o pagamento pelos produtos consumidos no bar do denunciado Rudnei Kuster Vieira.

Na sequência, em certo momento da perseguição - nas imediações do bairro Guadalajara, o veículo conduzido pelo denunciado Alexsandro cortou a frente do veículo conduzido pela vítima Roberto Dolberth, ocasião em que este colidiu com a traseira daquele, fazendo com que a vítima perdesse o controle do seu automóvel, o qual capotou e colidiu contra um posto de energia elétrica.

Ato contínuo, após a vítima ter saído do interior do veículo abalroado, os denunciados Alexsandro e Fabrício, com manifesto animus necandi, abordaram a vítima Roberto Dolberth e passaram a agredi-la, sendo que o denunciado Fabrício fazia uso de uma barra de ferro, direcionando os golpes na cabeça da vítima, já o denunciado Alexsandro empregava socos e chutes contra a vítima.

Destaca-se que as agressões só cessaram quando a vítima ficou totalmente inerte com o corpo deitado na Avenida Maria Augusta de Oliveira, momento em que os denunciados Alexsandro e Fabrício embarcaram no veículo GM/Corsa, cor bordô, de placas de São Joaquim, e evadiram-se do local.

Neste momento, surgiu na mencionada Avenida o veículo FIAT/Tempra, placas KLA-1313, dirigido por Rudnei Kuster Vieira, o qual, em alta velocidade e com manifesto animus necandi - em virtude da dívida contraída pela vítima, atropelou Roberto Dolbeth [sic], sendo que após o atropelamento, o denunciado Rudnei Kuster Vieira, engatou a marcha a ré e passou novamente por cima da vítima Roberto Dolbeth [sic], a qual faleceu no local em virtude das agressões físicas praticadas pelos denunciados Alexsandro e Fabrício, assim como pelo duplo atropelamento praticado pelo denunciado Rudnei Kuster Vieira.

Frisa-se que todos os denunciados utilizaram de recurso de dificultou a defesa da vítima, haja vista que as primeiras agressões, praticadas pelos denunciados Alexsandro e Fabrício, ocorreram em um momento em que vítima encontrava-se debilitada em razão do capotamento e colisão do seu veículo, sendo que na segunda agressão, praticada pelo denunciado Rudnei Kuster Vieira, a vítima sequer teve a oportunidade de defesa, pois, em razão das primeiras agressões, se encontrava totalmente inerte, deitada na via pública, não podendo, dessa forma, esboçar qualquer reação.

Além disso, todos os denunciados praticaram homicídio por motivo fútil, pois as primeiras agressões, praticadas pelos denunciados Alexsandro e Fabrício, decorreram de uma discussão acerca do volume do som automotivo do veículo da vítima e a segunda agressão, praticada por Rudnei Kuster Vieira, decorreu do fato da vítima ter deixado o bar do denunciado Rudnei Kuster Vieira sem ter realizado o devido pagamento pelos produtos consumidos.

Sobreveio aos autos informação dando conta da morte do denunciado Rudinei Kuster Vieira, razão pela qual foi declarada extinta a sua punibilidade.

Encerrada a instrução processual e apresentadas alegações finais pelas partes, sobreveio sentença de pronúncia, submetendo os acusados a julgamento perante o Conselho de Sentença pela suposta prática do delito descrito na peça vestibular, com o seguinte dispositivo (Evento 248, PROCJUDIC10, fls. 21-34, dos autos principal):

III. Ante o exposto, ACOLHO a denúncia de fls. III/V para PRONUNCIAR os réus Alexsandro Lottermann e Fabrício de Oliveira, ambos já devidamente qualificados nos autos, como incursos nas sanções do artigo 121, § 2º, incisos II e IV, do Código Penal.

Inconformados com o decisum, os pronunciados interpuseram o presente recurso. O recorrente Alexsandro, almeja, em suma: a) a absolvição sumária ou a impronúncia, ao argumento de que as provas dos autos demonstram que não participou da empreitada delituosa ou suscitam dúvida invencível sobre a sua atuação no delito; e b) subsidiariamente, a desclassificação para lesão corporal e o decote das qualificadoras (Evento 10 dos autos originários).

Sinteticamente, o recorrente Fabrício pretende a desclassificação do crime de homicídio para lesão corporal e, subsidiariamente, o afastamento das qualificadoras. Ao arremate, pugna o prequestionamento de dispositivo de lei federal e constitucional (Evento 38 destes autos).

Em contrarrazões, o Ministério Público propôs a manutenção incólume da sentença recorrida (Evento 14 dos autos originários e Evento 38 destes autos).

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Dr. Procurador Lio Marcos Marin, que se manifestou pelo conhecimento e desprovimento dos recursos (Eventos 10 e 44 destes autos).

Este é o relatório.

VOTO

Tratam-se de Recursos em Sentido Estrito interpostos por Alexsandro Lottermann e Fabrício de Oliveira contra sentença prolatada pelo Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Lages que, ao julgar admissível o pedido formulado na denúncia, pronunciou os acusados, submetendo-os a julgamento perante o Conselho de Sentença em razão do suposto cometimento do delito contra a vida insculpido no art. 121, § 2º, II e IV, do Código Penal.



1. Dos fatos

Consta da peça vestibular, em síntese, que na data de 05-12-2010, no período da noite, a vítima Roberto Dolberth, em companhia de Renata do Prado Dolberth, Edson Dolverth e Marcilene Fátima de Souza ingressaram no interior do "Bar do Palhano", onde já se encontravam os recorrentes Alexsandro, vulgo "Alemão" e Fabrício, conhecido por "Rabicó", além do denunciado Rudinei, dono do estabelecimento. Segundo a pretensão acusatória, em determinado momento o ofendido e Edson iniciaram uma discussão com os recorrentes em razão do som automotivo pertencente ao veículo da vítima, e logo em seguida entraram em luta corporal.

Ato contínuo, consoante o Parquet, o ofendido, junto de sua companheira Renata, retiraram-se do local em alta velocidade no veículo Fiat/Tempra, ocasião em que foram perseguidos pelos acusados Alexsandro e Fabrício, que conduziam um automóvel GM/Corsa, tendo todos deixado o bar sem realizar o pagamento dos produtos consumidos. Em certo momento, o veículo dirigido por Alexsandro cortou a frente do carro da vítima, instante em que houve uma colisão e o ofendido perdeu o controle do automóvel, vindo a capotar e colidir em um poste de energia elétrica.

De acordo com a versão acusatória, logo após o acidente, quando o ofendido saiu do veículo capotado, os recorrentes, de forma consciente e voluntária, imbuídos de manifesto animus necandi, passaram a agredi-lo, tendo o acusado Fabrício utilizado uma barra de ferro, direcionando os golpes contra a cabeça da vítima, enquanto Alexsandro empregava socos e chutes. Conforme o Órgão Ministerial, as agressões unicamente cessaram no momento em que o ofendido encontrava-se totalmente inerte com o corpo deitado na via pública, oportunidade em que os recorrentes fugiram no veículo GM/Corsa.

Ainda, após a evasão dos réus Alexsandro e Fabrício, o denunciado Rudinei, com inegável propósito homicida, motivado pela dívida da vítima, que saiu do seu estabelecimento sem pagar pelos produtos consumidos, atropelou-a duas vezes, porquanto, depois de passar por cima do ofendido pela primeira vez, realizou manobra de marcha ré e efetuou o segundo atropelamento, tendo a vítima falecido em decorrência das lesões causadas, tanto pelas agressões dos recorrentes, quanto pelos atropelamentos.

Por essas razões, o Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor de Alexsandro Lottermann, Fabrício de Oliveira Aguiar e Rudinei Kuster Oliveira, dando-o como incursos na sanção do art. 121, § 2º, II e IV, do Código Penal.

Sobreveio aos autos informação da morte do denunciado Rudinei, motivo pelo qual foi declarada extinta a sua punibilidade.

Devidamente instruído o feito, sobreveio sentença de pronúncia, que acatou o pedido formulado exordial acusatória para submeter os acusados Alexsandro e Fabrício a julgamento perante o Conselho de Sentença.

Irresignado, os réus manejaram as presentes insurgências.



2. Da admissibilidade

Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, conheço dos recursos e passo ao exame dos méritos recursais.



3. Mérito

3.1 Dos pedidos de absolvição sumária, impronúncia e desclassificação

O recorrente Alexsandro argumenta que, consoante a prova...

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