Acórdão Nº 0000477-21.2017.8.24.0022 do Terceira Câmara Criminal, 07-04-2020

Número do processo0000477-21.2017.8.24.0022
Data07 Abril 2020
Tribunal de OrigemCuritibanos
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão





Apelação Criminal n. 0000477-21.2017.8.24.0022, de Curitibanos

Relator: Desembargador Ernani Guetten de Almeida

APELAÇÃO CRIMINAL. RÉU SOLTO. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO E A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. DANO QUALIFICADO (ART. 163, PARÁGRAFO ÚNICO, III, DO CÓDIGO PENAL) E DESACATO (ART. 331 DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DE DEFESA.

CRIME DE DANO QUALIFICADO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. SUSTENTADA AUSÊNCIA DE DOLO E APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INVIABILIDADE. AGENTE QUE DANIFICOU VIATURA DA POLÍCIA MILITAR ENQUANTO ERA CONDUZIDO À DELEGACIA. DEPOIMENTOS DOS AGENTES PÚBLICOS CONFIRMADOS PELO LAUDO PERICIAL, QUE ATESTOU A AVARIA NO INTERIOR DO VEÍCULO. INEXISTÊNCIA DE QUALQUER INDICATIVO DE QUE OS POLICIAS MILITARES TERIAM AGIDO COM EXCESSO. DOLO EVIDENCIADO. ADEMAIS, INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. CRIME QUE TEM COMO OBJETO MATERIAL BEM PÚBLICO DE USO ESPECIAL, DESTINADO A SERVIÇO DE SEGURANÇA PÚBLICA. MÍNIMA OFENSIVIDADE DA CONDUTA E REDUZIDÍSSIMO GRAU DE REPROVABILIDADE NÃO VERIFICADOS. CONDENAÇÃO MANTIDA.

CRIME DE DESACATO. POSTULADA A ABSOLVIÇÃO. ALEGAÇÕES DE INCONVENCIONALIDADE E/OU INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 331, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL E DE AUSÊNCIA DE DOLO. NÃO ACOLHIMENTO. APELANTE QUE, AINDA NA VIATURA, ULTRAJOU POLICIAIS MILITARES NO EXERCÍCIO DE SUAS FUNÇÕES, PROFERINDO PALAVRAS COM A INTENÇÃO DE MENOSPREZAR E HUMILHAR OS MESMOS. HIPÓTESES EM QUE AS OFENSAS AFIGURAM-SE SUFICIENTES PARA CONFIGURAR O DESACATO. LIBERDADE DE EXPRESSÃO QUE NÃO CONSTITUI DIREITO ABSOLUTO. ADEMAIS, CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS QUE NÃO DERROGOU O CRIME DE DESACATO. ENTENDIMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. (HC 379.269). PRECEDENTES DESTA CORTE. ADEMAIS, ALTERAÇÃO DE ESTADO DE ÂNIMO QUE NÃO EXCLUI A RESPONSABILIDADE PENAL. PRETENSÃO AFASTADA.

DOSIMETRIA. REQUERIDA A REDUÇÃO DA FRAÇÃO DE AUMENTO APLICADA EM RAZÃO DA AGRAVANTE DE REINCIDÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. AGENTE MULTIRREINCIDENTE, INCLUSIVE ESPECÍFICO EM RELAÇÃO AO CRIME DE DESACATO. HIPÓTESE EM QUE É POSSÍVEL APLICAR FRAÇÃO DE AUMENTO MAIS ELEVADA. PRECEDENTES. PENA MANTIDA.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0000477-21.2017.8.24.0022, da comarca de Curitibanos Vara Criminal em que é Apelante Sérgio Liz de Jesus Júnior e Apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Terceira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, o Exmo. Sr. Des. Leopoldo Augusto Büggemann e o Exmo. Sr. Des. Júlio César M. Ferreira de Melo. Funcionou como Representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr.Ernani Dutra.

Florianópolis, 07 de abril de 2020.

Desembargador Ernani Guetten de Almeida

Presidente e Relator


RELATÓRIO

O representante do Ministério Público com atribuição para atuar perante a Vara Criminal da Comarca de Curitibanos ofereceu denúncia em face de Sérgio Liz de Jesus pela suposta prática dos crimes definidos no art. 163, parágrafo único, III, e 331, caput, ambos do Código Penal, em virtude dos seguintes fatos narrados na exordial acusatória, in verbis: (fls. 01/02)

No dia 25 de fevereiro de 2017 o denunciado SÉRGIO LIZ DE JESUS JUNIOR, ao ser conduzido para a delegacia pela Policia Militar, danificou patrimônio público, na medida em que se debatia e chutava a caixa da viatura, ato este que ocasionou os danos descritos no laudo pericial de fls. 58-63.

Na mesma oportunidade, o denunciado SÉRGIO LIZ DE JESUS JÚNIOR desacatou funcionário público no exercício de sua função, ao passo que ao ser conduzido para a delegacia proferiu vária palavras ofensivas aos policiais militares tais como "pés de porco, filhos da puta, policial de merda, viados".

Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada procedente para condenar Sérgio Liz de Jesus Júnior ao cumprimento da pena de 01 (um) ano, 05 (cinco) meses e 14 (quatorze) dias de detenção, em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 11 (onze) dias-multa, no mínimo valor legal, pela prática dos crimes definidos no art. 163, parágrafo único, III, e no art. 331, ambos do Código Penal.

Não foi substituída a pena privativa de liberdade por restritivas de direitios (art. 44, II, do Código Penal), nem concedido o sursis (art. 77, I, do Código Penal).

Por fim, foi concedido ao réu o direito de recorrer em liberdade (fls. 138/147).

Inconformada com a prestação jurisdicional entregue, a defesa de Sérgio Liz de Jesus Junior interpôs a presente apelação (fl. 158), em cujas razões (fls. 167/185) pleiteia, em relação ao delito de dano qualificado (art. 163, parágrafo único, III, do Código Penal), sua absolvição por ausência de comprovação do elemento subjetivo do tipo penal ou pela aplicação do princípio da insignificância. No tocante ao crime de desacato, requer o reconhecimento da inconvencionalidade do tipo penal e a consequente absolvição por atipicidade da conduta ou, não sendo o caso, a absolvição igualmente por ausência de comprovação do elemento subjetivo. Por último, quanto à dosimetria, almeja a redução da fração de aumento aplicada em decorrência do reconhecimento da agravante de reincidência.

Contra-arrazoado o recurso (fls. 197/210), os autos ascenderam a este Tribunal, oportunidade em que a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer do Exmo. Sr. Dr. Raul Schaefer Filho, manifestou-se pelo conhecimento e parcial provimento do recurso interposto, a fim de absolvê-lo do crime de desacato (fls. 217/220).

Este é o relatório.

VOTO

Presentes os seus pressupostos intrínsecos e extrínsecos, conhece-se do recurso.

O apelo manejado por Sérgio Liz de Jesus objetiva reformar a sentença que, julgando procedente a denúncia, condenou-o pela prática dos crimes de dano qualificado (art. 163, parágrafo único, III, do Código Penal) e de desacato (art. 331 do Código Penal).

Não foram levantadas preliminares, o que autoriza ingressar diretamente no mérito.

1. Do crime de dano qualificado

Em suas razões, quanto ao crime de dano qualificado, a defesa postula a absolvição do apelante por ausência de comprovação do elemento subjetivo do tipo penal, porquanto a avaria na viatura policial teria sido causada tão somente porque ele estava se defendendo da ação abusiva de policiais militares.

Sob a mesma pretensão, alega que a conduta ainda é materialmente atípica, sendo aplicável o princípio da insignificância.

Os argumentos, contudo, não prosperam.

A autoria e a materialidade delitivas restaram devidamente comprovadas pelo Laudo Pericial n. 9125.17.00035 (fls. 61/65 - Exame em Local de Dano Contra o Patrimônio Público) e pela prova oral colhida ao longo da instrução.

Infere-se dos autos que, no dia 25 de fevereiro de 2017, ao ser conduzido à Delegacia de Polícia, o apelante Sérgio Liz de Jesus danificou a viatura da Polícia Militar, ao se debater e chutar a caixa do veículo, conforme laudo pericial de fls. 58/63.

Além disso, passou a desacatar os agentes públicos responsáveis por sua condução, fato que será objeto de análise posterior.

Sob esse contexto, ao ser interrogado tanto durante o inquérito como em juízo, o apelante exerceu seu direito de permanecer em silêncio (fl. 10 e mídia de fl. 121).

Apesar disso, atentando-se inicialmente ao crime de dano qualificado, os demais elementos colhidos não deixam dúvidas acerca da prática delitiva.

Nesse sentido, ao ser ouvido na etapa administrativa, o policial militar Matheus Santos Malinverni relatou (fl. 07):

QUE no que diz respeito aos fatos, alega que encontra-se de serviço na data de hoje, quando ao deslocar com a pessoa de SÉRGIO LIZ DE JESUS JÚNIOR, para a delegacia na caixa da viatura por seu envolvimento em uma ocorrência de receptação, este se debatia e chutava a parede da caixa a todo instante, além de desacatar os policiais; Que ao retirar SÉRGIO da caixa da viatura, verificou-se que a caixa da cela havia sido danificada por SÉRGIO [...]

Sob o crivo do contraditório, disse (mídia de fl. 121, com transcrição):

Era a respeito de um furto de um celular que estava dentro de um veículo e foi furtado o celular, e daí eles entraram em contato com a vítima que queriam trocar mediante que ele devolvesse R$500,00 para eles né, aí foi feita a negociação da vítima junto com nós, em frente a creche do São José ali que era para a vítima ir lá para negociar a troca do celular aí foi eu e o outro policial dentro do carro da vítima para a hora que eles fossem negociar a gente saísse e abordasse eles, na hora que eles vieram para negociar, o Sérgio e o Cleyton a gente saiu e abordou os dois, na verdade os dois saíram correndo né, eu consegui abordar o Sérgio em um bar próximo ali e o Cleyton entrou no carro e saiu sendo abordado em frente a igreja do São José em frente aos Terézios lá, mas diante de tudo eles estavam com o celular lá, pegamos e colocamos na caixa, depois de abordados e detidos e conduzimos até à delegacia, nesse caminho como era de praxe do Sérgio, não é a primeira vez né, já tive outras ocorrências com ele, desacatou a guarnição, chutes na caixa, se eu não me engano danificou a caixa, pé de porco, vermes, seus filha da puta a gente vai se encontrar de novo daí para cima; eu não recordo porque depois (se os dois foram na mesma caixa); mas quem desacatava era o Sérgio, o outro eu não me recordo porque como eu fiquei com ele abordado no bar ao lado ali, quem abordou o Cleyton foi o P2 em frente aos Terézios; o Sérgio chutou a caixa e ofendeu; eu acredito que tenha sido (spray de pimenta); porque na hora da abordagem ele tentou fazer força também; não recordo (o que foi quebrado na caixa); não quebrou muito porque é uma caixa resistente né, então quando quebra ou dá uma trincada na parte que tem os parafusos né, então grande dano não foi, mas quebrou.

Corroborando a versão de seu colega de...

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