Acórdão Nº 0000485-55.2019.8.24.0045 do Terceira Câmara Criminal, 14-04-2020

Número do processo0000485-55.2019.8.24.0045
Data14 Abril 2020
Tribunal de OrigemPalhoça
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Criminal n. 0000485-55.2019.8.24.0045, de Palhoça

Relator: Desembargador Ernani Guetten de Almeida

APELAÇÃO CRIMINAL. RÉU PRESO. CRIMES CONTRA A SAÚDE E A INCOLUMIDADE PÚBLICAS. TRÁFICO DE DROGAS (ARTS. 33, CAPUT, DA LEI N. 11.343/06) E POSSE DE ARMA DE FOGO COM NUMERAÇÃO SUPRIMIDA (ART. 16, PARÁGRAFO ÚNICO, IV, DA LEI N. 10.826/2003). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA.

JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. PLEITO DE RECONHECIMENTO DA ATENUANTE DE CONFISSÃO ESPONTÂNEA NO CRIME PREVISTO NO ART. 16, PARÁGRAFO ÚNICO, IV, DA LEI N. 10.826/2003 EM BENEFÍCIO DE J.C.F. MEDIDA JÁ ADOTADA NA ORIGEM. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO.

PLEITOS EM COMUM. PRELIMINARES. ALMEJADO O RECONHECIMENTO DA NULIDADE DAS PROVAS COLHIDAS SOB A ALEGAÇÃO DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA INVIOLABILIDADE DE DOMICÍLIO. AFASTAMENTO. INFORMAÇÕES REPASSADAS PELA CENTRAL DE INTELIGÊNCIA DA POLÍCIA MILITAR SOBRE A LOCALIZAÇÃO DE J.C.F NA RESIDÊNCIA, O QUAL ESTAVA FORAGIDO, ALÉM DA OCORRÊNCIA DE TRANSAÇÃO DE DROGAS REALIZADA EM CONJUNTO COM R.R.B.D NA LOCALIDADE. AGENTES PÚBLICOS QUE SE DIRIGIRAM ATÉ O ENDEREÇO E CONFIRMARAM A PRESENÇA DOS APELANTES. INDICATIVO DA PRÁTICA DE CRIME PERMANENTE. FLAGRANTE DELITO CONFIGURADO. RELATIVIZAÇÃO DA INVIOLABILIDADE DE DOMICÍLIO JUSTIFICADA. ALÉM DISSO, AÇÃO POLICIAL DOCUMENTADA EM MÍDIAS AUDIOVISUAIS, AS QUAIS EVIDENCIAM AUSÊNCIA DE VIOLÊNCIA OU COAÇÃO EM DESFAVOR DOS APELANTES. PREFACIAL REJEITADA.

PRETENSA NULIDADE DO PROCESSO POR AUSÊNCIA DE CONTRADITÓRIO NO INQUÉRITO POLICIAL. ALEGAÇÃO DE QUE OS APELANTES NÃO ESTAVAM ACOMPANHADOS DE ADVOGADO QUANDO DE SEU INTERROGATÓRIO. INOCORRÊNCIA. INQUÉRITO POLICIAL CUJA NATUREZA SE REVESTE DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. PRESCINDIBILIDADE DE CONTRADITÓRIO. PRESENÇA DE DEFENSOR QUE SE AFIGURA COMO MERA FACULDADE. APELANTES DEVIDAMENTE CIENTIFICADOS DE SEUS DIREITOS CONSTITUCIONAIS. INEXISTÊNCIA DE EIVA A SER SANADA. TESE RECHAÇADA.

MÉRITO. POSTULADA ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA DO DELITO PREVISTO NO ART. 33, CAPUT, DA LEI N. 11.343/06. INVIABILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS. APREENSÃO DE 04 PORÇÕES DE MACONHA, COM PESO TOTAL DE 13,5G (TREZE GRAMAS E CINCO DECIGRAMAS), 19 PORÇÕES INDIVIDUAIS DE COCAÍNA, COM PESO TOTAL DE 7,7G (SETE GRAMAS E SETE DECIGRAMAS), ALÉM DE BALANÇA DE PRECISÃO, CADERNO CONTENDO ANOTAÇÕES SOBRE A VENDA DE ENTORPECENTES E QUANTIA EM ESPÉCIE. INVESTIGAÇÕES PRETÉRITAS REALIZADAS PELA CENTRAL DE INTELIGÊNCIA DA POLÍCIA MILITAR QUE LOGROU ÊXITO EM COMPROVAR O ENVOLVIMENTO DOS APELANTES COM O TRÁFICO DE DROGAS, INCLUSIVE REVELANDO A DIVISÃO DE TAREFAS POR ELES REALIZADAS. ADEMAIS, DEPOIMENTOS FIRMES E COERENTES DOS POLICIAS QUE PARTICIPARAM DA SITUAÇÃO FLAGRANCIAL EM AMBAS AS FASES DA PERSECUÇÃO CRIMINAL. CIRCUNSTÂNCIAS QUE NÃO DEIXAM DÚVIDAS ACERCA DA PRÁTICA DA MERCANCIA ESPÚRIA. PLEITO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O ART. 28 DA LEI N. 11.343/06 IGUALMENTE INVIÁVEL. CONDIÇÕES DE USUÁRIOS QUE NÃO AFASTAM AS DE TRAFICANTES. VERSÃO DEFENSIVA INVEROSSÍMIL E ISOLADA. CONDENAÇÃO MANTIDA.

PLEITO DE J.C.F. REQUERIDA A ABSOLVIÇÃO DO DELITO PREVISTO NO ART. 16, PARÁGRAFO ÚNICO, IV, DA LEI N. 10.826/2003. AVENTADA INEFICÁCIA DA ARMA DE FOGO APREENDIDA OU RECONHECIMENTO DA EXCLUDENTE DE ILICITUDE DO ESTADO DE NECESSIDADE. DESPROVIMENTO. LAUDO PERICIAL QUE ATESTOU QUE A ARMA DE FOGO E AS MUNIÇÕES SE PRESTAVAM AO FIM QUE SE DESTINAM. MÁ CONSERVAÇÃO DO ARTEFATO BÉLICO QUE NÃO INDUZ, POR SI SÓ, A SUA INEFICÁCIA. OUTROSSIM, ALEGAÇÃO DE AQUISIÇÃO DA ARMA DE FOGO PARA SEGURANÇA PESSOAL QUE NÃO CONSTITUI PERIGO ATUAL E IMINENTE. REQUISITOS PARA A CONFIGURAÇÃO DO ESTADO DE NECESSIDADE NÃO EVIDENCIADOS. POSSE DO ARTEFATO NO INTERIOR DA RESIDÊNCIA SUFICIENTE A CONFIGURAR O CRIME. DELITO DE MERA CONDUTA E PERIGO ABSTRATO. ABSOLVIÇÃO DESCARTADA.

DOSIMETRIA. SEGUNDA FASE. PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA (CP, ART. 65, III, "D") NO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS. DESPROVIMENTO. APELANTE QUE DECLAROU QUE AS SUBSTÂNCIAS APREENDIDAS ERAM DESTINADAS AO SEU CONSUMO PRÓPRIO. CONFISSÃO QUALIFICADA QUE NÃO TEM CONDÃO DE ATENUAR A PENA. SÚMULA 630 DO STJ.

PLEITEADA A APLICAÇÃO DA ATENUANTE PREVISTA NO ART. 65, II, DO CÓDIGO PENAL EM RELAÇÃO AO DELITO DE POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO COM NUMERAÇÃO RASPADA. ALEGADO DESCONHECIMENTO DA LEI. IMPOSSIBILIDADE. CONDUTA AMPLAMENTE DIVULGADA NA MÍDIA, SENDO OBJETO, INCLUSIVE, DE REFERENDO POPULAR. DOSIMETRIA MANTIDA

PLEITO EM COMUM. PRETENSO AFASTAMENTO DA REINCIDÊNCIA. SUSTENTADO BIS IN IDEM POR DUPLA CONDENAÇÃO PELO MESMO FATO. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA. PREVISÃO DE REPRIMENDA MAIOR AO AGENTE QUE DESAFIA A JUSTIÇA E PERSISTE NA REITERAÇÃO CRIMINOSA. DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, EM REPERCUSSÃO GERAL. SENTENÇA IRRETORQUÍVEL.

RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO, PRELIMINARES AFASTADAS E, NO MÉRITO, DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0000485-55.2019.8.24.0045, da comarca de Palhoça 1ª Vara Criminal em que é/são Apelante(s) Roberto Revelino Bizarro Duarte e outro e Apelado(s) Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Terceira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer parcialmente do recurso, afastar as preliminares e, no mérito, negar-lhe provimento.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, o Exmo. Júlio César M. Ferreira de Melo e o Exmo. Des. Leopoldo Augusto Brüggemann. Funcionou como Representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. José Eduardo Orofino da Luz Fontes.

Florianópolis, 14 de abril de 2020

Desembargador Ernani Guetten de Almeida

Presidente e Relator


RELATÓRIO

O representante do Ministério Público, com atribuição para atuar perante a 1º Vara Criminal da comarca de Palhoça, ofereceu denúncia em desfavor de Júlio César Ferreira e Roberto Revelino Bizarro Duarte, por incursão nas sanções do art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06 e art. 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei n. 10.826/2003, em virtude dos seguintes fatos narrados na exordial acusatória, "in verbis" (fls. 11/113):

Consta dos autos que policiais militares da Agência de Inteligência do 21º Batalhão de Florianópolis vinham recebendo informações precisas de que os denunciados JÚLIO CÉSAR FERREIRA (vulgo "Cuca") e ROBERTO REVELINO BIZARRO DUARTE (vulgo "Neguinho"), indivíduos que seriam integrantes da facção criminosa Primeiro Grupo Catarinense (PGC) e envolvidos na prática de tráfico de drogas na localidade do Rio Vermelho, em Florianópolis, estariam escondendo drogas e armas em determinada residência na cidade de Palhoça, precisamente na Rua Olávio de Biase, 135, casa 2, bairro Pachecos. Além do tráfico, JÚLIO estaria se homiziando de mandado de prisão que sabia ter sido expedido pelo Juízo Criminal da Capital nos autos n. 0022232-11.2011.8.24.0023. Os informes apontavam o denunciado ROBERTO como braço direito de JÚLIO no tráfico de drogas, servindo como motorista do veículo FIAT/Bravo, placa MKT9687, que era utilizado para transporte e entrega de entorpecentes.

Assim, na manhã de 24 de janeiro de 2019, por volta das 10 horas, policiais militares diligenciaram no mencionado endereço e, ao confirmarem que havia movimentação suspeita, ingressaram no imóvel e cumpriram o mandado de prisão contra JÚLIO. No local, lograram êxito em confirmar a prática de tráfico de drogas, exatamente como se havia suspeitado, com apreensão de 19 petecas de cocaína (8,1g) e 4 porções de maconha (12,9g), drogas que estavam embaladas e individualizadas para venda, mais 1 pistola calibre .380, marca Taurus, com numeração suprimida e 27 munições do mesmo calibre.

Além desse material, os policiais apreenderam anotações indicando contabilidade do tráfico de drogas, uma balança de precisão1, dois carregadores de pistola, a quantia de R$ 387,00 em espécie e um dólar, uma faca, um canivete, um chip de celular, cinco cartões de memória, um pen drive, dois celulares e duas chaves do Fiat/Bravo, veículo também apreendido e utilizado pelos denunciados para transporte da droga.

Todo material apreendido está descrito no auto de exibição e apreensão de fl. 19 e laudo de constatação de fl. 20.

Com essa conduta, os denunciados executavam tráfico de drogas em coautoria, pois tinham em depósito e guardavam drogas (maconha e cocaína) com objetivo de entregar a consumo de terceiros, sendo que as circunstâncias do flagrante, fracionamento, anotações, balança de precisão e dinheiro apreendidos mostram que a situação era de tráfico de drogas. Além disso, os denunciados possuíam arma de fogo, munições e carregadores de uso permitido, com numeração suprimida/raspada, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada parcialmente procedente para, in litteris (fls. 532/549):

a) Condenar o acusado Júlio César Ferreira à pena privativa de liberdade de 11 (onze) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e à pena de multa de 790 (setecentos e noventa) dias-multa, cada qual com valor fixado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, por infração aos arts. 33, caput, da Lei nº 11.343/06, e 16, parágrafo único, IV, da Lei nº 10.826/03;

b) Condenar o réu Roberto Revelino Bizarro Duarte à pena privativa de liberdade de 6 (seis) anos, 9 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e à pena de multa de 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa, cada qual com valor fixado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, por infração ao art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06, absolvendo-o, de outro lado, da prática do crime previsto no art. 16, parágrafo único, IV, da Lei nº 10.826/03, com fundamento no art. 386, V, do Código de Processo Penal.

Considerando o regime imposto, a reincidência específica e a necessidade de se assegurar a ordem...

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