Acórdão Nº 0000531-98.2018.8.24.0103 do Primeira Câmara Criminal, 13-02-2020

Número do processo0000531-98.2018.8.24.0103
Data13 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemAraquari
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Apelação Criminal n. 0000531-98.2018.8.24.0103, de Araquari


Apelação Criminal n. 0000531-98.2018.8.24.0103, de Araquari

Relator: Des. Carlos Alberto Civinski

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRIBUNAL DO JÚRI. CRIME DE HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO (ARTIGO 121, § 2º, II E IV, DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA.

PEDIDO DE ANULAÇÃO DO JULGAMENTO POR SER A DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS (ARTIGO 593, III, "D", DO CPP). INVIABILIDADE. TESE APRESENTADA PELA ACUSAÇÃO E ACOLHIDA PELOS JURADOS QUE ENCONTRA RESPALDO NOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS. JULGAMENTO MANTIDO.

DOSIMETRIA. ERRO OU INJUSTIÇA NO TOCANTE À APLICAÇÃO DA PENA (ARTIGO 593, III, "C", DO CPP). (1) PENA-BASE. PLEITO DE AFASTAMENTO DA CONDUTA SOCIAL. INVIABILIDADE. AUMENTO OPERADO EM ELEMENTOS CONCRETOS DOS AUTOS. AGENTE QUE INTEGRA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. CONDUTA SOCIAL QUE MERECE REGISTRO NEGATIVO. (2) PEDIDO DE REDUÇÃO DA PENA, AO ARGUMENTO DE QUE FOI FIXADA EM PATAMAR DESPROPORCIONAL. DESCABIMENTO. EXASPERAÇÃO NA FRAÇÃO DE 1/6 PARA A CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DESFAVORÁVEL E DE 1/6 PARA CADA AGRAVANTE RECONHECIDA. PATAMAR USUALMENTE UTILIZADO PELAS CORTES SUPERIORES. DESPROPORCIONALIDADE NÃO VERIFICADA.

SENTENÇA MANTIDA.

- O Tribunal de Justiça não possui competência para analisar se o Conselho de Sentença valorou de forma adequada as provas, mas apenas verificar se a decisão é arbitrária e/ou dissociada do conjunto fático-probatório, conforme artigo 593, III, "d", do Código de Processo Penal.

- Aquele que se dedica ao mundo do crime e tem nele sua fonte de renda e meio de vida, bem como integra violenta facção criminosa, não ostenta boa conduta social.

- Não há reconhecer a desproporcionalidade do aumento realizado na dosimetria da pena, quando, nas primeira e segunda fases, o julgador exaspera a reprimenda na fração de 1/6 para cada circunstância reconhecida, conforme posição adotada usualmente pelas Cortes Superiores.

- Recurso conhecido e desprovido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0000531-98.2018.8.24.0103, da comarca de Araquari (2ª Vara), em que é apelante Emerson Silva de Moura, e apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina:

A Primeira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Comunicar a família da vítima, conforme determinação do art. 201, § 2º, do Código de Processo Penal. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Desembargadores Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva e Hildemar Meneguzzi de Carvalho.

Florianópolis, 13 de fevereiro de 2020.

Assinado digitalmente

Carlos Alberto Civinski

PRESIDENTE E relator

RELATÓRIO

Denúncia: o Ministério Público ofereceu denúncia em face de Gabriel Camargo da Silva, Rafael Fernandes Budal e Emerson Silva de Moura, dando-o como incurso nas sanções do artigo 121, § 2º, incisos II e IV, do Código Penal, em razão dos seguintes fatos:

No dia 23 de março de 2018, por volta das 7h, nesta cidade de Araquari, os denunciados Gabriel Camargo da Silva, Rafael Fernandes Budal e Emerson Silva Moreira, em junção de vontades entre si e com Giomar Zacharias (falecido em 20.4.2018), mataram Deivid Carlos Barbosa, vulgo "Baby" com quatro disparos de arma de fogo.

Consta dos autos que Emerson ordenou que seus comparsas ceifassem a vida de Deivid, em razão de um furto que ele havia cometido.

Atendendo ao comando de Emerson, Rafael e Giomar foram até o Posto Sinuelo para encontrar o ofendido, que trabalhava no local e que foi convencido pelos agentes a se dirigir, em sua companhia, à Rua Domingos Fermino, Bairro Areais Pequenas, nesta cidade de Araquari.

No local, Gabriel aguardava Deivid e, quando ele chegou, efetuou quatro disparos de arma de fogo em sua direção, que foram a causa eficiente de sua morte.

A motivação do crime foi fútil, uma vez que a vítima foi morta por ter furtado uma bicicleta no Bairro Areias Pequenas.

Os denunciados agiram mediante dissimulação, uma vez que Rafael e Giomar atraíram Deivid até o local onde o delito ocorreu, ocultando sua real intenção e a de seus comparsas, que era matá-lo. (fls. 201-203)

Decisão de pronúncia: o juiz de direito Luiz Carlos Cittadin da Silva julgou admissível o pedido formulado na denúncia e pronunciou os acusados Gabriel Camargo da Silva, Rafael Fernandes Budal e Emerson Silva de Moura, como incurso nas sanções do artigo 121, § 2º, incisos II e IV, do Código Penal, submetendo-o a julgamento pelo Tribunal do Júri da comarca de Araquari (fls. 438-452).

Certificado o trânsito em julgado para as partes sem interposição de recurso (fl. 484).

Finda a fase do artigo 422 do Código de Processo Penal, foi instalada a sessão do Tribunal do Júri.

Sentença em plenário: em atenção à decisão soberana dos jurados, o juiz de direito e presidente do Tribunal do Júri Luiz Carlos Cittadin da Silva julgou parcialmente procedente a denúncia para:

a) condenar Gabriel Camargo da Silva pela prática do crime previsto no artigo 121, § 2º, II e IV, do Código Penal, ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 12 anos de reclusão, em regime inicial fechado, negando-lhe o direito de recorrer em liberdade;

b) condenar Emerson Silva de Moura pela prática do crime previsto no artigo 121, § 2º, II e IV, do Código Penal, ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 19 anos e 20 dias de reclusão, em regime inicial fechado, negando-lhe o direito de recorrer em liberdade;

c) absolver Rafael Fernandes Budal da prática do crime de homicídio qualificado, determinando a expedição do alvará de soltura (fls. 641-647).

Recurso de Emerson Silva de Moura: a defesa interpôs recurso de apelação, no qual sustentou que:

a) a decisão dos jurados é manifestamente contrária à prova dos autos, pois, com exceção do laudo de exame cadavérico, que atesta a materialidade, os únicos meios de prova constante nos presentes autos que apontam para Emerson, são o depoimento da testemunha protegida, que apresentou declarações contraditórias, e a denúncia anônima recebida pela polícia;

b) não há razão para a pena-base ter sido fixada em 14 anos, uma vez que todas as circunstâncias judiciais são favoráveis;

c) caso o apelante não seja submetido a novo julgamento, "deve ser feita a correção da pena na segunda fase, pois se aumentou em mais de 2/6" (fl. 717).

Requereu o conhecimento e provimento do recurso, a fim de que o julgamento seja anulado face a existência de decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos. Subsidiariamente, pugnou pela revisão da dosimetria (fls. 704-718).

Contrarrazões do Ministério Público: a acusação impugnou as razões recursais, ao argumento de que a valoração da prova realizada pelos jurados, que apreciaram as questões a eles submetidas durante a sessão em Plenário, avaliando os argumentos da acusação e da defesa, e reconhecendo que o recorrente praticou o delito de homicídio, está devidamente alicerçada na prova dos autos, de modo que não há falar em decisão manifestamente contrária à prova dos autos. Quanto à dosimetria da pena, a elevação da pena-base levada a efeito na sentença, além de ter sido fundamentada, tem aplicação reconhecida nos tribunais pátrios.

Postulou o conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 722-732).

Trânsito em julgado: foi certificado pelo Juízo a quo o trânsito em julgado da sentença para o acusado Gabriel Camargo da Silva (fl. 693).

Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: o procurador de justiça Paulo Roberto Speck opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 735-743).

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Emerson Silva de Moura contra sentença que o condenou pela prática de crime contra a vida.

O recurso preenche os requisitos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido. E, em atenção ao princípio tantum devolutum quantum appellatum, a apreciação limita-se à análise dos argumentos expostos em sede recursal.

Da decisão manifestamente contrária à prova dos autos

A defesa sustenta, em síntese, que a decisão dos jurados foi manifestamente contrária à prova dos autos, uma vez que a autoria delitiva é incerta.

Sem razão.

Como é cediço, o Tribunal do Júri, por disposição constitucional, é sustentado pelo princípio da íntima convicção (artigo 5º, inciso XXXVIII, da Constituição Federal), o que possibilita a livre apreciação da prova sem necessidade da motivação jurídica da decisão. O acolhimento de uma das versões, quando lastreada nos autos, é prevalente em face da soberania dos vereditos (CAMPOS, Walfredo Cunha. Tribunal do Júri. São Paulo: Atlas, 2010, p. 285/286).

Diante disso, a esta Corte, cabe apenas examinar se o veredito prolatado é totalmente contrário à prova dos autos, hipótese em que estaria divorciado da realidade fática aventada durante a instrução processual. A propósito, colaciona-se deste Tribunal:

APELAÇÃO CRIMINAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO PELO MOTIVO TORPE E PELA IMPOSSIBILIDADE DE DEFESA DA VÍTIMA (CP, ART. 121, § 2º, I E IV). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DO ACUSADO. 1. ANULAÇÃO DO JULGAMENTO POR SER A DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA. OPÇÃO DOS JURADOS POR UMA DAS VERSÕES DEDUZIDAS EM PLENÁRIO. 2. DOSIMETRIA. 2.1. CULPABILIDADE. VIOLÊNCIA EXCESSIVA. NÚMERO DE DISPAROS. 2.2. CONSEQUÊNCIAS. EXPULSÃO DE FAMILIARES SOBREVIVENTES DA RESIDÊNCIA. 1. Se lastro probatório há, ainda que mínimo, em favor da tese acolhida pelos Senhores Jurados, não é permitido a esta Corte determinar que a outro julgamento o acusado seja submetido, pois a decisão do Tribunal do Júri, soberana que é, só pode ser desconstituída quando arbitrária e totalmente divorciada do contexto probatório carreado aos autos. 2.1. É possível o aumento da pena-base, por má valoração da...

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