Acórdão Nº 0000548-97.2016.8.24.0235 do Quinta Câmara Criminal, 10-12-2020
| Número do processo | 0000548-97.2016.8.24.0235 |
| Data | 10 Dezembro 2020 |
| Tribunal de Origem | Herval d'Oeste |
| Órgão | Quinta Câmara Criminal |
| Classe processual | Apelação Criminal |
| Tipo de documento | Acórdão |
Apelação Criminal n. 0000548-97.2016.8.24.0235, de Herval d'Oeste
Relatora: Desembargadora Cinthia Beatriz da S. Bittencourt Schaefer
APELAÇÕES CRIMINAIS. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. FURTOS QUALIFICADOS PELO ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO E CONCURSO DE PESSOAS, EM CONCURSO MATERIAL (CÓDIGO PENAL, ART. 155, § 4.º, INCISOS I E IV, NA FORMA DO ART. 69, CAPUT). CRIME CONTRA A PAZ PÚBLICA. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA (CÓDIGO PENAL, ART. 288, CAPUT). SENTENÇA PARCIALMENTE CONDENATÓRIA. ABSOLVIÇÃO DA PRÁTICA DO DELITO DE ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. INSURGIMENTO DA DEFESA E DA ACUSAÇÃO.
RECURSO DA DEFESA. PRELIMINAR. ALEGADA NULIDADE POR CERCEAMENTO DE DEFESA, ANTE O INDEFERIMENTO DE OITIVA DE TESTEMUNHA REFERIDA. MÁCULA NÃO CARACTERIZADA. PROVA POSTULADA EXTEMPORANEAMENTE. ADVOGADO QUE SABIA OU DEVERIA SABER DA EXISTÊNCIA DE TESTEMUNHAS CITADAS PELO PRÓPRIO RÉU NA INSTRUÇÃO. PRECLUSÃO TEMPORAL VERIFICADA. EXISTÊNCIA DE OUTROS ELEMENTOS DE CONVICÇÃO NOS AUTOS. CONVENIÊNCIA E ANÁLISE DISCRICIONÁRIA DO JUIZ. ART. 209, § 1.º, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. DISCRICIONARIEDADE DA AUTORIDADE JUDICIÁRIA. PREFACIAL AFASTADA. ALMEJADO RECONHECIMENTO DE NULIDADE DA SENTENÇA POR VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIDADE DA PENA. INCONFORMISMO COM A PENA-BASE APLICADA AOS DELITOS. PRETENSÃO QUE SE CONFUNDE COM O MÉRITO DA QUESTÃO. PREJUDICIAL AFASTADA. MÉRITO. PLEITO ABSOLUTÓRIO PAUTADO NA TESE DE HIPOSSUFICIÊNCIA DE ELEMENTOS PROBATÓRIOS. IMPOSSIBILIDADE. PRIMEIRO FATO. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS DEVIDAMENTE COMPROVADAS. LAUDO PERICIAL DATILOSCÓPICO QUE DEMONSTRA QUE A DIGITAL DO RÉU FOI ENCONTRADA NA PARTE EXTERNA DA MÁQUINA FURTADA, PRÓXIMO AO LOCAL ONDE SE GUARNECE O COFRE. PROVA ORAL QUE TAMBÉM CORROBORA A TESE ACUSATÓRIA. APREENSÃO DE APARELHOS CELULARES E BLOQUEADOR, ETIQUETAS COMUMENTE UTILIZADAS EM CADEADOS DIGITAIS DESSAS MÁQUINAS E, INCLUSIVE EQUIPAMENTOS ELETRÔNICOS E ANOTAÇÕES COM INSTRUÇÕES ESPECÍFICAS, CUJO CONTEXTO DOS AUTOS PERMITE CONCLUIR QUE ERAM DESTINADOS AO ACESSO DE CAIXAS ELETRÔNICOS, DENTRE OUTROS OBJETOS PESSOAIS, EM RESIDÊNCIA UTILIZADA PELO RÉU. TESE NEGATIVA DE AUTORIA NÃO COMPROVADA. ABSOLVIÇÃO INDEVIDA. SEGUNDO FATO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DECLARAÇÕES FIRMES E COERENTES DOS AGENTES RESPONSÁVEIS PELAS INVESTIGAÇÕES QUE RECONHECERAM O RÉU ATRAVÉS DAS CÂMERAS DE VIGILÂNCIA E IDENTIFICARAM O VEÍCULO UTILIZADO NA PRÁTICA DELITIVA, O QUAL DETINHA A POSSE DE FATO. RESULTADO DA APREENSÃO QUE TAMBÉM SE MOSTRA SIGNIFICATIVO PARA ELUCIDAÇÃO DO FATO. MODUS OPERANDI IDÊNTICO UTILIZADO NA PERPETRAÇÃO DOS OUTROS ILÍCITOS. TESE ACUSATÓRIA NÃO COMPROVADA. ABSOLVIÇÃO INDEVIDA. TERCEIRO FATO. AUTORIA E MATERIALIDADE EVIDENTES. PROVA ORAL QUE DÁ CONTA DO RECONHECIMENTO DO RÉU ATRAVÉS DAS CÂMERAS DE VIGILÂNCIA E IDENTIFICAÇÃO DO VEÍCULO UTILIZADO PARA PRÁTICA DELITIVA, O QUAL DETINHA A POSSE DE FATO. RESULTADO DA APREENSÃO QUE TAMBÉM SE MOSTRA SIGNIFICATIVO PARA ELUCIDAÇÃO DO FATO. MODUS OPERANDI IDÊNTICO UTILIZADO NA PERPETRAÇÃO DOS OUTROS ILÍCITOS. TESE ACUSATÓRIA NÃO COMPROVADA. ELEMENTOS APTOS A EMBASAR O DECISUM. JUÍZO DE MÉRITO IRRETOCÁVEL. DOSIMETRIA DA PENA. PRIMEIRA FASE. INCONFORMISMO COM A PENA-BASE APLICADA AOS DELITOS. ANÁLISE DOS VETORES NEGATIVOS. CULPABILIDADE. SITUAÇÃO DOS AUTOS QUE DENOTA A AUDÁCIA E O DESTEMOR DO RÉU NA PRÁTICA DO ILÍCITO, BEM COMO A MAIOR REPROVABILIDADE DE SUA CONDUTA DIANTE DA PREMEDITAÇÃO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA APTA A JUSTIFICAR A AVALIAÇÃO DESFAVORÁVEL DO VETOR. CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO. INSURGÊNCIA CONTRA A UTILIZAÇÃO DA QUALIFICADORA DO ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO PARA EXASPERAR A PENA-BASE. OBSERVÂNCIA DA TEORIA DA MIGRAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIA COMPROVADA POR LAUDO PERICIAL E PROVA TESTEMUNHAL. MANUTENÇÃO DE RIGOR. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. ALEGAÇÃO DE QUE A FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA SERIA, EM TESE, INIDÔNEA POR AMPARAR-SE EM ELEMENTOS INERENTES AO TIPO PENAL. ARGUIÇÃO DE QUE O PREJUÍZO FINANCEIRO SERIA ÍNSITO AO DELITO DE FURTO. TESE NÃO ACOLHIDA. DECRÉSCIMO PATRIMONIAL SUPORTADO PELA VÍTIMA QUE EXTRAPOLOU A NORMALIDADE DOS DESDOBRAMENTOS ESPERADOS. NECESSIDADE, NO ENTANTO, DE ABRANDAMENTO DO PATAMAR FRACIONÁRIO CONFERIDO À PENA-BASE DOS TRÊS DELITOS DE FURTO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. MINORAÇÃO AO PATAMAR DE 1/6 (UM SEXTO), USUALMENTE EMPREGADO POR ESTE SODALÍCIO, QUE SE IMPÕE. SEGUNDA FASE. PLEITO PELO AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA DO CONCURSO DE AGENTES. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE VÍNCULO SUBJETIVO COM OS TERCEIROS NÃO IDENTIFICADOS. INVIABILIDADE. AGENTES PÚBLICOS QUE VISUALIZARAM EM CÂMERAS DE SEGURANÇA DUAS PESSOAS NAS PROXIMIDADES DOS ESTABELECIMENTOS VÍTIMAS. IMAGENS JUNTADAS AOS AUTOS. VÍNCULO DEMONSTRADO. QUALIFICADORA MANTIDA. PLEITO DE RECONHECIMENTO DA CONTINUIDADE DELITIVA. IMPOSSIBILIDADE. HABITUALIDADE CRIMINOSA QUE NÃO SE CONFUNDE COM CONTINUIDADE DELITIVA. AUSÊNCIA DO REQUISITO OBJETIVO (MESMAS CONDIÇÕES DE TEMPO) E DO SUBJETIVO (UNIDADE DE DESÍGNIOS). LAPSO TEMPORAL DE MAIS DE DOIS MÊS ENTRE OS PRIMEIROS DOIS DELITOS. ADEMAIS, SUCESSÃO CIRCUNSTANCIAL DE CRIMES NÃO VISLUMBRADA.
RECURSO DA ACUSAÇÃO. ALMEJADA CONDENAÇÃO DO RÉU PELO DELITO DO ART. 288, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL. INVIABILIDADE. AUSÊNCIA DE PROVAS SEGURAS ACERCA DA ESTABILIDADE E DA PERMANÊNCIA. REQUISITOS DO DELITO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA NÃO PREENCHIDOS. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. DOSIMETRIA DA PENA. SEGUNDA FASE. REQUERIDA A INCIDÊNCIA DA AGRAVANTE DE QUEM PROMOVE OU ORGANIZA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA (ARTIGO 62, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL). POSSIBILIDADE. CONJUNTO PROBATÓRIA QUE EVIDENCIA QUE O RÉU ORGANIZOU E DIRIGIU A EMPREITADA CRIMINOSA. REFORMA DA SENTENÇA NO PONTO. NECESSÁRIA READEQUAÇÃO DA DOSIMETRIA.
RECURSOS CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0000548-97.2016.8.24.0235, da comarca de Herval d'Oeste Vara Única em que é Apte/Apdo Ministério Público do Estado de Santa Catarina e Apdo/Apte Gilmar Rottini.
A Quinta Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer dos recursos e dar-lhes parcial provimento. Custas legais.
Participaram do julgamento, realizado nesta data, o Exmo. Sr. Desembargador Luiz Cesar Schweitzer e o Exmo. Sr. Desembargador Luiz Neri Oliveira de Souza.
Florianópolis, 10 de dezembro de 2020.
Cinthia Beatriz da S. Bittencourt Schaefer
Presidente e Relatora
RELATÓRIO
A representante do Ministério Público do Estado de Santa Catarina com atuação perante o Juízo da Vara Única da comarca de Herval d'Oeste ofereceu denúncia em face de Gilmar Rottini, dando-o como incurso nas sanções do artigo 288, caput, e artigo 155, § 4º, incisos I e IV (por três vezes), ambos do Código Penal, pela prática dos fatos delituosos assim narrados (fls. 162/167):
"1. DO CRIME DE ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA
Conforme se apurou, pelo menos a partir de janeiro de 2016, em lugar que a instrução criminal poderá precisar, o denunciado, Gilmar Rottini, associou-se com no mínimo outras duas pessoas (ainda não identificadas), para o fim específico de cometer crimes de furto, notadamente furtos a caixas eletrônicos de agências e postos de atendimento do Banco Bradesco em cidades do interior do Estado de Santa Catarina.
Na prática da associação criminosa, Gilmar Rottini deslocava-se juntamente com um dos demais integrantes da associação (os quais se alternavam na companhia de Gilmar), utilizando-se, entre outros, do veículo Peugeot 207 Passion XR S, placa EZC-5518, ano/modelo 2011/2012, cor prata (registrado em nome de sua mãe, Nadir Rodrigues de Barro, mas tendo como proprietário anterior o denunciado), até as proximidades da agência/posto de atendimento do Banco Bradesco onde seria cometido o furto.
Na sequência, de posse de uma bolsa escura, Gilmar e seu comparsa adentravam na agência, em horário em que não havia movimentação de pessoas, rompiam o lacre da porta que dá acesso ao cofre do caixa eletrônico e, posteriormente, violavam o sistema do cadeado do cofre, retirando as gavetas com o dinheiro contido na máquina, o que era colocado na bolsa escura por eles carregada.
Consumado o furto, os agentes da associação criminosa retiravam-se da agência e adentravam no veículo utilizado na ocasião, evadindo-se do local de posse da res furtiva.
Nesse contexto, Gilmar Rottini participou, juntamente com no mínimo duas pessoas diferentes, integrantes da associação criminosa, de ao menos três furtos a agências do Banco Bradesco, de janeiro a abril de 2016, nas cidades de Ibicaré, Herval d'Oeste e Witmarsum (os quais serão detalhados abaixo), sem se ignorar que diversos outros furtos e tentativas de furtos com procedimento idêntico e na mesma época foram constatados em agências do Banco Bradesco do interior do estado, a exemplo dos Municípios de Treze Tílias, Palmeiras, Caxambu do Sul e Guatambu (que, contudo, não são objeto destes autos).
O denunciado, portanto, associou-se com no mínimo outras duas pessoas (ainda não identificadas), para o fim específico de cometer crimes.
2. DO FURTO QUALIFICADO EM IBICARÉ
No contexto da associação criminosa antes relatada, apurou-se que no dia 5 de janeiro de 2016, aproximadamente às 19h30min, no posto de atendimento do Banco Bradesco de Ibicaré, localizado na Av. Presidente Nereu Ramos, 217, Centro, Ibicaré/SC, o denunciado, Gilmar Rottini, agindo em comunhão de esforços e unidade de desígnios com um dos integrantes da associação criminosa (ainda não identificado), subtraiu, para si e para os demais membros da associação criminosa, o valor de R$ 59.750,00 (cinquenta e nove mil setecentos e cinquenta reais), de propriedade de Banco Bradesco S.A.
Na ocasião, os autores da conduta, conforme era prática da associação criminosa, deslocaram-se, no dia dos fatos, com um veículo Fiat/Pálio, cor prata, até o município de Ibicaré, estacionando-o nas proximidades do Posto de Atendimento do Banco Bradesco (conforme levantamento fotográfico anexo).
Na sequência, Gilmar e seu comparsa entraram no posto de...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO