Acórdão Nº 0000657-56.2016.8.24.0027 do Segunda Câmara Criminal, 27-04-2021

Número do processo0000657-56.2016.8.24.0027
Data27 Abril 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0000657-56.2016.8.24.0027/SC

RELATORA: Desembargadora HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA APELANTE: ASSISTENTE DA ACUSAÇÃO ADVOGADO: PABLO IDEKER DA SILVA (OAB SC016044) APELANTE: ERIC SANDERS GOMES ADVOGADO: Daniel Florêncio (OAB SC030299) APELADO: DIOGO FARIAS CANTALIXTO ADVOGADO: Daniel Florêncio (OAB SC030299)

RELATÓRIO

Denúncia (Evento 5 dos autos originários): o Ministério Público ofereceu denúncia em face de Diogo Farias Cantalixto e Eric Sanders Gomes, nos autos n. 0000657-56.2016.8.24.0027, dando-os como incurso nas sanções do art. art. 121, §§ 3º e 4º, primeira parte, do Código Penal, em razão dos seguintes fatos:

FATO 1

Em 9 de julho de 2015, por volta das 13h16min, no Hospital Dr. Waldomiro Colautti, localizado no Município de Ibirama/SC, DIOGO FARIAS CANTALIXTO, médico do referido hospital, prestou atendimento a Joás Gedesias de Andrade, com 3 (três) anos e 3 (três) meses de idade, e, mesmo diante dos sintomas apresentados pelo paciente - diarréia, vômitos e dor em mão esquerda (Prontuário médico às fls. 28-29) -, bem como das informações prestadas pela genitora da vítima, agiu de forma negligente e imprudente, deixando de realizar exames clínicos pormenorizados, de solicitar outro exames laboratoriais, de manter o paciente em observação hospitalar para monitoramento da evolução dos sintomas e/ou de recomendar a sua internação, o que permitiria a correta identificação do quadro de broncopneumonia aguda (fls. 26-27).

Após a conclusão falha, receitou uma injeção de Plasil e outros medicamentos para tratar uma "virose", conforme Receita Médica à fl. 20, e solicitou raio-x do punho, mão e antebraço esquerdo da criança (fls. 31-32), liberando o paciente cerca 1 (uma) hora após a entrada no hospital (Prontuário às fls. 28-29).

FATO 2

Na madrugada do dia 10 de julho de 2015, por volta das 1h31m, com a piora do estado de saúde do menino, decorrente da conduta negligente e imprudente do codenunciado, a criança Joás Gedesias de Andrade foi levada, mais uma vez, ao Hospital Dr. Waldomiro Colautti, pois a genitora observou que seu braço esquerdo estava inchado, avermelhado e que não havia melhora no quadro.

Foi, então, atendido por ERIC SANDERS GOMES, outro médico do mesmo hospital, o qual, mesmo diante da inalteração dos sintomas, da ausência de melhoras, do atendimento médico anterior e do prontuário arquivado no sistema informatizado do hospital, agiu de maneira negligente e imprudente, deixando de realizar exames clínicos pormenorizados, de solicitar exames laboratoriais, de manter o paciente em observação hospitalar para o monitoramento dos sintomas e/ou de recomendar a sua internação.

Limitou-se a solicitar nova radiografia e a receitar analgésicos de uso tópico e oral, orientando a genitora de procurar um ortopedista e aplicar gelo no braço esquerdo da vítima (fl. 21).

Na mesma data, por volta das 8h39min, Joás Gedesias de Andrade retornou ao Hospital Dr. Waldomiro Colautti pela última vez, logo após a genitora constatar a existência de manchas roxas por todo seu corpo e sangramento pelo nariz, verificando, também, que a criança estava em parada cardio-respiratória (fl. 36). Apesar do esforço dos profissionais envolvidos, o menino faleceu às 9h00min, conforme Prontuário às fls. 36-38, por choque séptico decorrente de broncopneumonia aguda, conforme constatado pelo Laudo Pericial n. 9414.15.01100 (fls. 26-27), situação clínica não detectada pelos denunciados devido à negligência e à imprudência que demonstraram na atuação profissional.

Sentença (Evento 131 dos autos originários): A Juíza de Direito Manoelle Brasil Soldati julgou improcedentes os pedidos formulados na denúncia para absolver Diogo Farias Cantalixto e Eric Sanders Gomes, com fulcro no art. 386, V, Código de Processo Penal.

Recurso de apelação do Ministério Público de Santa Catarina (Evento 144 dos autos originários): a acusação sustentou o desacerto da decisão objurgada, sob o argumento de que as provas coligidas nos autos são suficientes para a prolação do édito condenatório do apelado Eric Sanders Gomes.

Argumentou que "em uma análise pormenorizada dos elementos probatórios jungidos ao feito, assim como dos depoimentos colhidos em ambas as fases processuais, é possível aferir que o apelado deixou de observar regras técnicas na ocasião em que atendeu a vítima Joás Gedesias de Andrade".

Recurso de apelação do assistente de acusação (Evento 148 dos autos originários): a assistência ratificou todos os termos das razões de apelação apresentadas pelo Ministério Público, acrescentando o laudo pericial realizado nos autos de Indenização por Danos Morais n. 0300833-59.2016.8.24.0027, promovidos por Josias de Andrade e outros contra o Estado de Santa Catarina, em virtude do falecimento do menor Joás Gedesias de Andrade, o qual não deixou dúvidas acerca da conduta omissa e negligente do apelado médico Eric Sanders Gomes.

Contrarrazões de Eric Sanders Gomes (Evento 156 dos autos originários): a defesa do médico impugnou as razões recursais e postulou pelo conhecimento do recurso e a manutenção da incólume sentença absolutória.

Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça (Evento 161 dos autos originários): o Excelentíssimo Senhor Procurador de Justiça Dr. Raul Schaefer Filho opinou pelo conhecimento e o desprovimento do recurso.

Este é o relatório.

Documento eletrônico assinado por HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO, Desembargadora Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 708255v4 e do código CRC b1f6670a.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHOData e Hora: 26/2/2021, às 13:59:39





Apelação Criminal Nº 0000657-56.2016.8.24.0027/SC

RELATORA: Desembargadora HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA APELANTE: ASSISTENTE DA ACUSAÇÃO ADVOGADO: PABLO IDEKER DA SILVA (OAB SC016044) APELANTE: ERIC SANDERS GOMES ADVOGADO: Daniel Florêncio (OAB SC030299) APELADO: DIOGO FARIAS CANTALIXTO ADVOGADO: Daniel Florêncio (OAB SC030299)

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina e pela assistência da acusação contra a sentença que absolveu Diogo Farias Cantalixto e Eric Sanders Gomes do crime de homicídio culposo, previsto no art. 121, §§ 3º e 4º, primeira parte, do Código Penal, com fundamento no art. 386, V, do Código de Processo Penal.

1 - Do juízo de admissibilidade

Os recursos preenchem os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual são conhecidos.

2- Do mérito

A acusação (aqui se entende o representante do Ministério Público com o apoio da assistência) pretende o acolhimento do pleito condenatório, sob o fundamento, em síntese, de que restou comprovada a autoria e materialidade do crime imputado, tão só, ao apelado Eric Sanders Gomes.

Argumentou que o médico Dr. Eric, em atendimento, agiu de maneira negligente e imprudente, deixando de realizar exames clínicos pormenorizados, de solicitar exames laboratoriais, de manter o paciente em observação hospitalar para monitoramento dos sintomas e/ou de recomendar a sua internação, cujo quadro clínico evoluiu para uma broncopneumonia aguda, resultando na morte da vítima.

Por sua vez, o assistente de acusação complementou os argumentos apresentados pelo parquet, acrescentando um laudo pericial realizado nos autos de Indenização por Danos Morais n. 0300833-59.2016.8.24.0027, promovidos pelos familiares da vítima contra o Estado de Santa Catarina, em virtude do falecimento do menor Joás Gedesias de Andrade.

No entanto, em que pese o triste e trágico falecimento de uma criança de três anos, adianta-se que o pleito acusatório não comporta acolhimento.

De início, é de se destacar que a morte repentina de uma criança sensibiliza a todos, sobretudo quando a causa mortis até o momento não restou indubitavelmente esclarecida. Logo, é perfeitamente natural e compreensível que os pais e familiares desse menino busquem conforto em explicações para o ocorrido, de modo a se certificarem que essa fatalidade poderia ter sido evitada.

Também é comumente que os sobreviventes de uma tragédia de tal envergadura, procurem por um culpado ou, de alguma forma, sintam-se culpados. Todavia, é necessário ter consciência de que cada ser vivente é filho de um pai e de uma mãe e de muitos ancestrais. Em ambos os lados aconteceram muitas coisas que afetaram a vida dessa criança, desde a sua concepção. Isso faz parte de seu DNA.

O fato é que, o caso aqui tratado envolve o aspecto criminal de uma suposta negligência médica, e assim deve ser analisado sob enfoque específico, distinto do civil e/ou administrativo. Ou seja, da análise do conjunto probatório colacionado, será verificado se o Dr. Eric Sanders Gomes, ora acusado, deixou de dar a devida atenção na ocasião em que atendeu a vítima Joás Gedesias de Andrade e se tal atitude foi a causa decisiva para a sua morte, cerca de oito horas depois.

Não se desconhece que por conta dos fatos aqui narrados, o Estado de Santa Catarina foi condenado em primeira instância ao pagamento de indenização de danos morais aos familiares da vítima, nos autos n. 0300833-59.2016.8.24.0027, trazidos à baila pelo assistente de acusação nas suas razões recursais de Evento 148 dos autos originários, acrescentando até um laudo pericial constante naqueles autos.

No entanto, o fato de o recorrido ter sido responsabilizado civilmente não influencia na sua condenação criminal. Sobre o tema, extrai-se julgado do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ESFERA CÍVEL E PENAL. INDEPENDÊNCIA. ART. 935 DO CC/2002. SÚMULA N. 83 DO STJ. EXISTÊNCIA DO DANO. REEXAME DO CONJUNTO...

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