Acórdão Nº 0000732-53.2018.8.10.0112 do TJMA. Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, 3ª Câmara Criminal, 2023

Ano2023
Classe processualApelação Criminal
Órgão3ª Câmara Criminal
Tipo de documentoAcórdão


Gabinete Desembargadora SÔNIA AMARAL

TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 732-53.2018.8.10.0112

APELANTE: ERIVALDO PEREIRA DO NASCIMENTO

ADVOGADOS: CRISTOVAO SOUSA BARROS - MA5622-A, FRANCISCO CARLOS AVELINO LIMA - MA16190-A

APELADO:MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MARANHÃO

RELATORA: DESEMBARGADORA SÔNIA MARIA AMARAL FERNANDES RIBEIRO

REVISOR: DESEMBARGADOR SEBASTIÃO JOAQUIM LIMA BONFIM

EMENTA

PENAL. CRIME DE NATUREZA SEXUAL. VIOLÊNCIA REAL. AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA. DECADÊNCIA DO DIREITO DE REPRESENTAÇÃO. INEXISTÊNCIA. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. EXAME DE CORPO DE DELITO ELABORADO POR APENAS UM MÉDICO. UTILIZAÇÃO COMO PROVA TÉCNICA. ARTIGO. 12, § 3º, LEI MARIA DA PENHA. CRIME DE ESTUPRO. PALAVRA DA VÍTIMA. ESPECIAL RELEVÂNCIA. AUSÊNCIA DE CORROBORAÇÃO POR OUTROS ELEMENTOS DE PROVA. INEXISTÊNCIA DE CERTEZA DA OCORRÊNCIA DO CRIME. DÚVIDA ACERCA DA VERACIDADE DOS FATOS. IMPOSIÇÃO DA INTERPRETAÇÃO FAVORÁVEL AO RÉU. PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO. APELO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

I - É entendimento do Supremo Tribunal Federal que, em crime de estupro cometido mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada, nos termos da Súmula 608, mesmo antes da alteração legislativa promovida pela Lei de nº 13.718/2018, pelo que não há, portanto, falar de decadência do direito de representação.

II- O artigo 12, § 3º, da Lei de n° 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) admite como meio de prova, nos crimes de violência doméstica, laudos ou prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde. E o Superior Tribunal de Justiça adota a possibilidade de atestado médico com descrição das lesões corporais sofridas ser modelo de prova técnica apta a demonstrar a materialidade delitiva, o que ocorre neste caso, em que o Exame de Corpo de Delito foi elaborado por apenas 01 (um) médico.

III- Pela jurisprudência, a palavra da vítima assume especial relevância nos crimes sexuais. Contudo, para que alcance essa preponderância, deve estar ancorada em outras provas dos autos, o que não acontece no caso em tela, em que as declarações da vítima não encontram suporte em outras provas dos autos.

IV- Em não havendo a certeza de ocorrência do crime de estupro, impõe-se a absolvição do acusado mediante o consagrado princípio do in dubio pro reo.

V – Pleito de gratuidade da justiça deve ser aferido no juízo da execução penal. Precedentes.

VI- Apelação Criminal conhecida e parcialmente provida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Desembargadores da Terceira Câmara Criminal, por unanimidade, e em conformidade com o parecer adequado em banca da Procuradoria Geral de Justiça, para conhecer e dar parcial provimento ao recurso, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.

Participaram do julgamento esta relatora e presidente da Terceira Câmara Criminal, e os senhores Desembargadores Gervásio Protásio dos Santos Júnior e Sebastião Joaquim Lima Bonfim. Participou do julgamento o Procurador de Justiça Joaquim Henrique de Carvalho Lobato.

Sala das sessões virtuais da Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em São Luís-MA, julgamento realizado em vinte e sete de fevereiro de Dois Mil e Vinte e três.

Desembargadora SÔNIA Maria AMARAL Fernandes Ribeiro

Relatora e Presidente da Terceira Câmara Criminal

1 Relatório

Trata-se de Apelação Criminal interposta por ERIVALDO PEREIRA DO NASCIMENTO contra sentença da Vara Única da Comarca de Poção de Pedras, MA., que o condenou a 7 (sete) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime semiaberto, pela prática, em concurso material, dos crimes previstos no artigo 129 §9º (lesão corporal praticada no contexto de violência doméstica) e no artigo 213 (estupro), ambos do Código Penal.

Consta nos autos que, em 02/07/2018, por volta das 19 horas, na residência do casal, ERIVALDO PEREIRA DO NASCIMENTO agrediu fisicamente sua companheira, praticou com ela conjunção carnal sem consentimento e a ameaçou quando a lançou ao chão, dela arrancou as chaves da moto e da residência, desferiu-lhe mordidas no abdômen e na boca e a trancou no quarto para obrigá-la a manter relações sexuais, ao que se seguiu, na noite posterior, ele ter queimado roupas e documentos da vítima e das filhas do casal.

A denúncia contra o apelante, inicialmente pela prática dos crimes de lesão corporal e ameaça, foi recebida em 08/03/2019 e, em 10/08/2020, foi recebido aditamento da denúncia para inclusão do crime de estupro depois da colheita de novos elementos em oitiva da vítima.

A sentença (ID 18180049) absolveu o apelante do crime de ameaça, pois o Juízo entendeu que o delito fora praticado no mesmo contexto do crime de estupro, isto é, como crime-meio para amedrontar a vítima e assegurar a prática do primeiro delito mediante aplicação do princípio da consunção.

1.1 Argumentos do apelante

1.1.1 Decadência do direito de representação relativa ao crime de estupro, pois ao comparecer à Delegacia, a vítima relatou, apenas, os crimes de lesão corporal e de ameaça e, à época, ainda não estava vigente a Lei de nº 13.718/2018, que tornou os crimes contra a liberdade sexual de ação penal pública incondicionada;

1.1.2 Nulidade do processo por ausência de defesa efetiva, pois o defensor nomeado nada disse de concreto em favor do apelante, nas duas ocasiões em que ofereceu resposta à acusação;

1.1.3 Nulidade do laudo pericial que, supostamente, comprovou a materialidade das lesões corporais sofridas pela vítima, pois realizado por um único perito ad hoc, em violação ao que dispõe o artigo 159 §1º do Código de Processo Penal;

1.1.4 Inexistência de Exame de Corpo de Delito no que se refere ao crime de estupro;

1.1.5 Insuficiente a palavra da vítima como prova exclusiva da materialidade do delito;

1.1.6 Presentes contradições na versão da vítima apresentada em Juízo, pois, na Delegacia, ela relatou, apenas, a ocorrência da ameaça e das lesões corporais e só acrescentou a denúncia da prática da conjunção carnal não consentida em audiência ocorrida 01 (um) ano e 02 (dois) meses após os fatos, por ter visto o apelante feliz com outra mulher.

1.2 Argumentos do apelado

1.2.1 Constrangimento assumido pela vítima ao não relatar a ocorrência do estupro, quando depôs na Delegacia;

1.2.2 Inquestionáveis a segurança e...

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