Acórdão Nº 0000748-30.2015.8.24.0077 do Primeiro Grupo de Direito Criminal, 31-08-2022

Número do processo0000748-30.2015.8.24.0077
Data31 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeiro Grupo de Direito Criminal
Classe processualEmbargos Infringentes e de Nulidade
Tipo de documentoAcórdão
Embargos Infringentes e de Nulidade Nº 0000748-30.2015.8.24.0077/SC

RELATOR: Desembargador JÚLIO CÉSAR MACHADO FERREIRA DE MELO

EMBARGANTE: PAULO CESAR NUNES (RÉU) EMBARGADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de Embargos Infringentes opostos por Paulo César Nunes, por seu advogado constituído, em face do acórdão proferido nos autos da apelação n. 0000748-30.2015.8.24.0077, contido nos eventos 26 e 30, em razão do voto divergente proferido pelo desembargador Carlos Alberto Civinski, abaixo transcrito:

[...] Após análise detida dos autos, tenho que a conduta imputada ao apelante e ao corréu é atípica, tanto pela ausência do elemento subjetivo doloso, quanto pela não demonstração dos elementos objetivos do tipo.

Isso porque, a meu sentir, o caderno probatório é frágil em demonstrar o efetivo acordo com o fim de frustrar ou fraudar o caráter competitivo. Não ignoro que a prova oral, em especial a palavra do procurador jurídico Felipe e da gestora de projetos Daniela, revela que o apelante Paulo, então secretário de turismo do município de Urubici, e o codenunciado Marcos, empresário e artesão, teriam tido conversas prévias acerca do objeto da licitação, com nítido desejo de que este se sagrasse o vencedor.

No entanto, nem Daniela nem Felipe esclareceram minimamente quais foram as providências tomadas pelos denunciados para que essa pretensão fosse concretizada em prejuízo ao caráter competitivo do procedimento licitatório. Não há notícias de que tenham sido incluídas especificações no edital com o fim de restringir ou direcionar os competidores. Pelo contrário, o engenheiro civil Vinicius, ao ser ouvido em juízo como testemunha arrolada pela acusação, afirmou "que a madeira das placas não era difícil de encontrar; que seria o pinos auto clavado; que qualquer empresa na região faria o projeto; que não tem nada de diferente [nele]; que não era um material difícil; que uma marcenaria teria condições de fazer as placas; que era um poste com uma placa, que tinham alguns desenhos, mas isso tranquilamente qualquer pessoa poderia fazer; que acredita que outras empresas além da de Marcos poderiam fazer as placas, como Lages, Florianópolis e, Urubici talvez sim".

De igual modo, nota-se que foram observadas as exigências relativas à publicidade de certame, com a publicação do aviso em Diário Oficial Eletrônico e jornal de circulação na região (jornal "Correio Lageano"), além da afixação em mural próprio da Prefeitura.

Não se verifica, também, qualquer contato dos denunciados com outros fornecedores, a fim de que influenciassem, previamente, quem deveria ou não participar da licitação.

Com efeito, o mero desejo compartilhado pelo apelante e pelo codenunciado não se traduziu, ao menos a partir da prova dos autos, em atos contra o caráter competitivo do certame.

Ressalto que as testemunhas foram uníssonas em destacar que o corréu Marcos é reconhecido pelo trabalho de qualidade prestado no município de Urubici, tendo sido referenciado diversos trabalhos de relevo e com nítida adesão à característica turística da cidade.

É natural que a administração, ao buscar desenvolver a vocação turística do município, queira prestigiar o fornecedor local, reforçando vínculo de identidade dos elementos turísticos com o própria região, circunstância que, por si só, não macula o caráter competitivo do certame.

Destaco, também, que o fato de o codenunciado ter procurado o engenheiro responsável pelo projeto das placas de sinalização ainda durante a elaboração denota o seu interesse em ver aplicado no Município um material bonito e refinado, já que as discussões, conforme afirmado pela testemunha, foram de cunho meramente estético e que não implicariam habilidades ou maquinários especiais a restringir participação de outros artesãos interessados na licitação.

Nesse cenário, não obstante os indícios de irregularidade que levaram o procurador jurídico e o prefeito municipal a instaurarem a sindicância, tenho que, ao fim e ao cabo, não se demonstrou, seja sob o aspecto formal, seja sob o aspecto material, qualquer fraude ou frustração do caráter competitivo do procedimento licitatório.

Por essas razões, voto por conhecer em parte do recurso para, no mérito, dar-lhe provimento, a fim de absolver Paulo César Nunes da prática do crime previsto no art. 90 da Lei 8.666/90, forte no art. 386, III, do Código de Processo Penal [...] (Grifo nosso) (evento 30, DOC1)

O embargante pretende a prevalência do voto vencido, que entendeu pela fragilidade do conjunto probatório para demonstrar "o fim de frustrar ou fraudar o caráter competitivo de contratação pela Administração Pública", para que seja absolvido quanto ao crime previsto no art. 90 da Lei 8.666/93 (evento 37, DOC1).

Instado a se manifestar nos autos, o exmo. dr. procurador de justiça Hélio José Fiamoncini opinou pelo: "desprovimento dos presentes embargos infringentes, mantendo-se incólume o acórdão" (evento 41, DOC1).

Documento eletrônico assinado por JÚLIO CÉSAR MACHADO FERREIRA DE MELO, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2355190v29 e do código CRC 716c0b30.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): JÚLIO CÉSAR MACHADO FERREIRA DE MELOData e Hora: 8/6/2022, às 19:46:10





Embargos Infringentes e de Nulidade Nº 0000748-30.2015.8.24.0077/SC

RELATOR: Desembargador JÚLIO CÉSAR MACHADO FERREIRA DE MELO

EMBARGANTE: PAULO CESAR NUNES (RÉU) EMBARGADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

Conheço do recurso porque presentes seus requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, ao que passo à apreciação das razões recursais.

No mérito, o voto é pelo desprovimento, como passo a expor.

Consoante disposto no art. 609 do Código de Processo Penal, admitem-se embargos infringentes quando não for unânime a decisão de segunda instância desfavorável ao réu, sendo que, conforme doutrina e jurisprudência: se o desacordo for parcial, os embargos ficam restritos à matéria objeto de divergência.

Na hipótese, o embargante pretende a prevalência do voto vencido, proferido pelo desembargador Carlos Alberto Civinski, no sentido de que "não houve demonstração do acordo entre os denunciados com o fim de frustrar ou fraudar o caráter competitivo", o que ensejaria a absolvição do embargante.

A meu ver, e com a devida vênia aos argumentos expostos no voto divergente, o conjunto probatório demonstrou sim o referido acordo de vontades.

Considerando que a questão está suficiente e devidamente enfrentada no voto vencedor, da lavra da exma. des. Ana Lia Moura Lisboa Carneiro, que apreciou detidamente os contornos do caso concreto, valho-me dos seus fundamentos, abaixo, com destaque aos pontos que considero mais importantes:

[...] 1. Dos fatos sob recurso.

Inicialmente, faz-se necessário um breve relato dos fatos julgamento.

Conforme consta do caderno processual, em meados de dezembro de 2013, nas dependências da Prefeitura de Urubici, o réu Paulo César Nunes, então Secretário de Turismo do Município, convocou a então Gerente de Projetos do Munícípio, Daniela da Luz, para tratar da elaboração daquele que viria a ser o Edital de Licitação na modalidade de pregão presencial n. 43/2014, cujo objeto seria a aquisição de placas turísticas de sinalização.

Neste encontro, Paulo César orientou Daniela a elaborar o edital em questão de forma a beneficiar a empresa Rephazenda Ltda. ME, de propriedade do réu Marcos Antônio Mühlbach, possibilitando, assim, que esta pudesse sagrar-se vencedora do certamente.

Assim, em 9 de junho de 2014, deu-se início ao procedimento licitatório para a aquisição de placas referidas, cadastrado sob o n. 43/2014, na modalidade pregão presencial.

Ocorre, no entanto, que mencionada irregularidade foi constatada pela Procuradoria Municipal, a qual manifestou-se pela suspensão do certame, tendo tal manifestação restado acatada pelo Executivo Municipal.

Não obstante, em 13 de novembro de 2014, iniciou-se novo procedimento licitatório com o mesmo objeto do anterior, cadastrado sob o n. 52/2014, cujos termos novamente buscavam beneficiar a empresa do réu Marcos Antônio, tendo em vista que este, juntamente com Paulo César, haviam realizado negociações anteriores acerca do preço e da especificação dos bens a serem adquiridos pelo Município, fato que possibilitou à empresa Rephazenda Ltda ME. obtivesse uma vantagem injusta acerca do objeto do certame.

E tal modus operandi consistiu, inicialmente, na ausência de cumprimento de requisitos legais, vez elaborado edital com especificações dos bens objeto de aquisição, mediante orientação e participação do corréu Marcos Antônio Muhlbach, proprietário da empresa Rephazenda Ltda que participaria do processo licitatório, não sendo efetuada pesquisa de preços, lançando-se valores aleatórios à prestação dos serviços, sem qualquer embasamento prévio naqueles praticados pelo mercado, como forma exclusiva de justificar o repasse da verba e a realização da licitação, preenchendo, assim, os requisitos de legalidade para o ato.

Tal situação, entretanto, teria sido objeto de manifestação por parte da procuradoria geral do município, em parecer apontando tais irregularidades. Diante disto, abriu-se sindicância para apurar os fatos relatados, enviando-se notícia crime à autoridade competente, fato que deu azo à abertura do Inquérito Policial n. 66/2015.

[...]

3. Do mérito recursal.

Em sede meritória, postula a defesa do apelante Paulo César, nos termos das razões recursais juntadas no Evento 188, dos autos originários, a sua absolvição quanto à prática do crime de fraude à licitação previsto no artigo 90, da Lei 8.666/93, aduzindo, para tanto, que "Os elementos constantes dos autos não trazem qualquer indício, mínimo que seja, de que os acusados tenham frustrado...

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