Acórdão Nº 0000759-60.2015.8.24.0012 do Terceira Câmara Criminal, 13-07-2021

Número do processo0000759-60.2015.8.24.0012
Data13 Julho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão










Recurso em Sentido Estrito Nº 0000759-60.2015.8.24.0012/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0000759-60.2015.8.24.0012/SC



RELATOR: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA


RECORRENTE: GILBERTO PEPES BETANIN (ACUSADO) ADVOGADO: ÉDIMO DEBARBA JUNIOR (OAB SC021638) ADVOGADO: JOSEMAR CORDOVA LOTTIN (OAB SC012784) ADVOGADO: GUSTAVO ZENATI (OAB SC026585) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) OFENDIDO: EVERTON JUNGLES DE SOUZA (OFENDIDO)


RELATÓRIO


O representante do Ministério Público, com atribuição para atuar perante a Vara Criminal da comarca de Caçador, ofereceu denúncia contra Gilberto Pepes Betanin (com 33 anos à época) pela prática, em tese, do crime previsto no art. 121, § 2º, inciso IV, c/c art. 14, inciso II, ambos do Código Penal, em razão dos seguintes fatos criminosos, in verbis (evento 22):
No dia 2 de março de 2015, por volta das 23 horas, o denunciado Gilberto Pepes Betanin, portando uma arma de fogo e imbuído de animus necandi, dirigiu-se até a residência da vítima Everton Jungles de Souza, localizada na Rua José Lemos Braga, n. 75, Bairro Alto Bonito, nesta cidade de Caçador/SC, local onde pretendia reaver seu animal de estimação - um cachorro da raça Boxer -, furtado dias antes, o qual tivera notícia de que estava sob a posse da vítima.
Ato contínuo, o denunciado Gilberto Pepes Betanin, dolosamente e ciente da ilicitude de sua conduta, após breve discussão com a vítima a respeito da restituição do animal, sacou a arma de fogo que portava e efetuou diversos disparos na direção de Everton, um dos quais atingiu a vítima nas costas, causando-lhe um ferimento perfuro-contuso na linha média lombar alta, transfixando o tecido subcutâneo, com trajetória no sentido posteroanterior, de cima para baixo e da direita para a esquerda, com orifício de saída na crista ilíaca (linha axilar posterior), conforme o laudo pericial das fls. 89- 91.
O denunciado, ao assim agir, deu início à execução de um crime de homicídio, o qual somente não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade, uma vez que, a despeito da multiplicidade de disparos, não conseguiu atingir a vítima em região vital, tendo esta conseguido fugir e se refugiar, vindo a ser socorrida com êxito.
O crime foi cometido mediante recurso que dificultou a defesa da vítima, pois o denunciado efetuou os disparos pelas costas da vítima, no momento em que ela tentava fugir, surpreendendo-a e impedindo-a de reagir.
Encerrada a instrução da primeira fase do rito especial do Tribunal do Júri, sobreveio decisão em que se admitiu a denúncia para pronunciar Gilberto Pepes Betain como incurso às sanções do art. art. 121, § 2º, IV c/c 14, II, do Código Penal, a fim de submetê-lo a julgamento perante o Tribunal do Júri (evento 161).
Inconformada com a prestação jurisdicional entregue, a defesa de Gilberto Pepes Betain interpôs recurso em sentido estrito, em cujas razões requer, em apertada síntese, sua impronúncia por ausência de indícios suficientes da autoria delitiva, com base no art. 414 do Código de Processo Penal (evento 183).
Em juízo de retratação (CPP, art. 589), a decisão foi mantida (evento 183).
Contra-arrazoado o recurso (evento 183), os autos ascenderam a este Tribunal, oportunidade em que a Douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer do Exmo. Sr. Dr. Carlos Henrique Fernandes, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 10).
Este é o relatório

VOTO


Presentes os seus pressupostos intrínsecos e extrínsecos, conhece-se do recurso.
O recurso em sentido estrito interposto pela defesa de Gilberto Pepes Betanin objetiva reformar decisão que, julgando admissível a denúncia, pronunciou-o pela prática do crime previsto no art. 121, § 2º, inciso IV, c/c art. 14, inciso II, ambos do Código Penal.
Para isso, sustenta pela inexistência de provas da autoria delitiva, razão pela qual a impronúncia de Gilberto Pepes Betanin é medida de rigor, com fundamento no art. 414 do Código de Processo Penal.
Razão, contudo, não lhe assiste.
De início, cumpre destacar que a pronúncia é um mero juízo de admissibilidade da acusação, de modo que o feito deve ser remetido a julgamento pelo Tribunal do Júri quando estiver comprovada a materialidade do crime e houver indícios suficientes de autoria, nos termos do art. 413 do Código de Processo Penal. Logo, dispensa-se a cognição exauriente de todos os elementos de prova, encargo que incumbe ao Conselho de Sentença.
Ao final da etapa do judicium accusationis, após cognição sumária do caso, deve o Magistrado realizar apenas um juízo de probabilidade.
A respeito do tema, anota a doutrina (DEMERCIAN, Pedro Henrique; MALULY, Jorge Assaf. Curso de Processo Penal. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 509):
Em síntese, no judicium accusationis ou sumário da culpa, examina-se a admissibilidade da acusação, para se evitar que alguém seja levado à presença dos jurados (Conselho de Sentença) de maneira temerária, sem que haja um mínimo de viabilidade fática. Sua finalidade é, portanto, exclusivamente processual, pois dela emerge apenas a possibilidade de ser instaurada a fase procedimental do judicium causae, em que, então, se decidirá sobre o conteúdo da acusação, ou pretensão punitiva, isto é, o próprio meritum causae.
No mesmo sentido Renato Brasileiro de Lima (Manual de Processo Penal, 8ª ed., Salvador: Ed. Juspodivm, 2020, p. 1468) discorre que:
[...] a pronúncia encerra um juízo de admissibilidade da acusação de crime doloso contra a vida, permitindo o julgamento pelo Tribunal do Júri apenas quando houver alguma viabilidade de haver a condenação do acusado. Sobre ela, o art. 413 do CPP, dispõe que, estando convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, deve o juiz sumariante pronunciar o acusado fundamentadamente. Há um mero juízo de prelibação, por meio do qual o juiz admite ou rejeita a acusação, sem qualquer valoração acerca do mérito. Julga-se admissível o jus accusationis. Restringe-se à verificação da presença do fumus boni juris, admitindo todas as acusações que tenham ao menos probabilidade de procedência [...].
Portanto, "para a pronúncia não são exigidos os mesmos critérios valorativos dispensados à formação da convicção condenatória. A existência de indícios consistentes, apontando o acusado como autor do delito, é suficiente para autorizar o envio do feito à sessão plenária do júri" (TJSC, Recurso Criminal n. 2013.028277-4, de Itajaí, rel. Des. José Everaldo Silva, j. 24.09.2013).
Sob essa premissa, segundo a denúncia, no dia 02 de março de 2015, por volta das 23h, o recorrente, portando arma de fogo e imbuído de animus necandi, dirigiu-se até a residência da vítima Everton Jungles de Souza, localizada na Rua José Lemos Braga, n. 75, Bairro Alto Bonito, na cidade de Caçador e, supostamente mediante recurso que dificultou a defesa da vítima, efetuou diversos disparos em seu desfavor, tendo um deles atingido a região lombar do ofendido, após discussão entre ambos envolvendo a posse de um cachorro.
A materialidade delitiva e os indicativos mínimos de autoria emergem do auto de prisão em flagrante (fl. 03 - evento 01), do boletim de ocorrência (fls. 04/05 - evento 01), do auto de exibição e apreensão (fl. 20 - evento 01) e dos depoimentos colhidos em ambas as fases da persecução penal.
Sem a análise aprofundada das provas, incabível nesta fase processual, cumpre transcrever os trechos dos depoimentos que indicam a prática da conduta supramencionada pelo recorrente.
Acerca dos fatos, o recorrente Gilberto Pepes Betain declarou na etapa extrajudicial (fl. 29 - evento 01):
"[...] que, na sexta-feira, dia 27/02/2015, no período da tarde, teve furtado de sua residência no bairro Berger, um cachorro da raça Boxer; que, na presente data quando retornou de Videira/SC, ao chegar em sua casa por volta das 19h00min, constatou a furto que já havia sido informado per sua mulheres; que, havia sido furtado da residência, roupas, um ténis Niki, branco com vermelho, uma jaqueta de cor marrom, três jaquetas de couro de sua esposa, roupas íntimas da esposa, e uma TV LCD 32' SHARP; que, ao conversar com um vizinho já idoso de alcunha "Miloca", que ele não tinha certeza, mas ele havia vista um cachorro amarrado em urna casa, perto da casa dele, informou ainda que eram "malacos" e que eram perigosos; que, a vizinho disse ao interrogado que se cuidasse, mas que observasse no local se era realmente a cachorro do interrogado; que, a interrogado foi até o local indicado, na rua Belém, esquina com Rua José Lemos Braga,...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT