Acórdão Nº 0000763-60.2018.8.24.0055 do Quarta Câmara Criminal, 03-12-2020

Número do processo0000763-60.2018.8.24.0055
Data03 Dezembro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0000763-60.2018.8.24.0055/SC

RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELADO: CLAUDEMIR KIRSCHBAUER (RÉU)

RELATÓRIO

Na comarca de Rio Negrinho, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Claudemir Kirschbauer, imputando-lhe a prática do delito capitulado no art. 38-A, c/c o art. 53, II, "c", ambos da Lei n. 9.605/98, pois, segundo consta na inicial (Evento 16, PET32):

No dia 3 de setembro de 2017, em imóvel rural situado na localidade de Posto Castilho, interior do município de Rio Negrinho/SC, o denunciado CLAUDEMIR KIRSCHBAUER, em imóvel de sua responsabilidade, destruiu vegetação secundária em estágio médio de regeneração natural do Bioma Mata Atlântica mediante o corte seletivo de 7 (sete) árvores da espécie Araucaria angustifolia, popularmente conhecida como Pinheiro brasileiro, que está entre as espécies em extinção, sem autorização do órgão ambiental competente, conforme relatório de fiscalização de ff. 11-17 e auto de infração ambiental de f. 1.

Finalizada a instrução, o Magistrado a quo julgou improcedente o pedido formulado na denúncia, por ausência de materialidade delitiva e pela não comprovação do preenchimento das elementares do tipo penal, com fulcro no art. 386, III, do Código de Processo Penal (Evento 54, SENT65).

Inconformado com a prestação jurisdicional, o Ministério Público interpôs apelação criminal, mediante a qual postulou a condenação do réu, nos termos da denúncia, sustentando a suficiência de provas para amparar o decreto condenatório (Evento 72, PET79).

Apresentadas as contrarrazões (Evento 77, CONTRAZAP1), em que o patrono requereu o arbitramento de honorários advocatícios, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do Exmo. Dr. Ernani Dutra, manifestou-se pelo "conhecimento e provimento do apelo, bem como pelo deferimento do pedido articulado em contrarrazões para fixação de honorários recursais ao advogado nomeado" (Evento 9, PROMOÇÃO1).

VOTO

Presente os pressupostos legais de admissibilidade, conhece-se do recurso.

1 O Ministério Público requer a condenação do acusado como incurso nas sanções dos delitos previstos nos arts. 38-A, c/c o art. 53, II, "c", ambos da Lei n. 9.605/98, escorado no argumento de que há comprovação suficiente da autoria e materialidade delitivas.

Razão lhe assiste.

De acordo com o disposto no art. 38-A da Lei n. 9.605/98, constitui crime "destruir ou danificar vegetação primária ou secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção", sujeito à pena de "detenção de 1 (um) a 3 (três) anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente".

Acerca da infração penal, lecionam Luiz Flávio Gomes e Silvio Maciel:

Esse art. 38-A foi acrescentado pela Lei 11.428, de 22 de dezembro de 2006, que dispõe sobre a "utilização e proteção da vegetação nativa do Bioma Mata Atlântica". Objeto jurídico do delito, portanto, é o Bioma Mata Atlântica, tal como definido na mencionada Lei 11.428/2006.

Biomas são "grandes ecossistemas que compreendem várias comunidades bióticas em diferentes estágios de evolução, em vasta extensão geográfica (...). É a unidade ecológica imediatamente superior ao ecossistema. Há biomas terrestres e aquáticos. Os grandes biomas brasileiros são a Floresta Amazônica, a Mata Atlântica, o Pantanal Mato-Grossense, o Cerrado, a Caatinga, o Domínio das Araucárias, as pradarias e os ecossistemas litorâneos".

A Mata Atlântica teve 93% de sua área devastada, limitando-se hoje a uma extensão de 100.000 km² em razão do processo de industrialização e de ciclos econômicos do ouro, café e cana-de-açúcar. Ela se estende ao longo da Costa Brasileira, do Rio Grande do Sul ao Rio Grande do Norte e sua largura varia entre grandes e pequenas faixas de extensão, em média de 200 km de largura. Abrange, total ou parcialmente, 3.409 municípios, em 17 Estados do País.

Finalmente, após 14 anos de tramitação no Congresso Nacional, a Lei 11.428/2006 entrou em vigor, com o objetivo de regulamentar a utilização e proteção da vegetação nativa do Bioma Mata Atlântica, tentando proteger o que ainda resta dela [...] (Lei dos Crimes Ambientais: Comentários à Lei 9.605/1998. 2. ed. São Paulo: Método, 2015. p. 180).

Pelo que se infere dos autos, no dia 3 de setembro de 2017, em imóvel rural situado no interior do município de Rio Negrinho/SC, policiais militares ambientais constataram que Claudemir Kirschbauer, sem autorização do órgão ambiental competente, destruiu vegetação secundária, em estágio médio de regeneração, pertencente ao Bioma Mata Atlântica, mediante o corte seletivo de 7 (sete) árvores da espécie Araucaria angustifolia, conhecida como "pinheiro brasileiro", considerada em extinção.

A autoria e materialidade delitivas emergem do termo de apreensão e depósito (Evento 4, APREENSAO9), relatório de fiscalização (Evento 6, INF11-17), instrumento particular de arrendamento (Evento 7, INF19-20), termo circunstanciado (Evento 11, INF2-8), bem como da prova oral colhida ao longo da instrução.

Na fase administrativa, o réu negou ter ciência acerca da necessidade de autorização do órgão ambiental competente para efetuar o corte de árvores nativas. Por outro lado, confessou ter promovido o corte, com uma motosserra, de 7 (sete) pinheiros araucária e disse ter conhecimento de que essa espécie está ameaçada de extinção. Ademais, explicou que utilizaria as toras de madeira obtidas para fazer as vigas de cobertura de uma estufa de fumo (Evento 8, DECLARACOES25).

Sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, confirmou ser proprietário da terra de 4 (quatro) hectares, de onde a vegetação foi suprimida. Confessou ter derrubado 7 (sete) pinheiros para construir uma estufa. Alegou acreditar que poderia efetuar o corte dessas árvores sem autorização, caso fosse para consumo próprio. Negou ter conhecimento de que a espécie era ameaçada de extinção (Evento 53, VÍDEO82).

O policial militar Carlos Luciano Dolla, por sua vez, elucidou, em juízo, que a guarnição foi apurar uma denúncia anônima, ocasião em que, ao chegar na propriedade, constataram o corte das araucárias. Consignou que, no local, também estavam as madeiras procedentes das árvores que haviam sido suprimidas, o que foi confirmado pelo acusado no momento da abordagem. Afirmou que foi analisado o estágio da vegetação por meio da altura e diâmetro das cepas e, portanto, identificou-se o estágio médio. Contou que o réu havia alegado que não possuía conhecimento acerca da necessidade de autorização para a supressão das árvores (Evento 53, VÍDEO83).

Na mesma linha, o agente público Sidnei Schveiczvski Pereira, perante a autoridade judiciária, asseverou que foi até a propriedade do apelado, para atender a uma denúncia anônima, razão pela qual, ao chegar no local, deparou-se com o corte de 7 (sete) árvores...

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