Acórdão Nº 0000764-90.2011.8.24.0087 do Primeira Câmara Criminal, 12-11-2020

Número do processo0000764-90.2011.8.24.0087
Data12 Novembro 2020
Tribunal de OrigemLauro Müller
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Criminal n. 0000764-90.2011.8.24.0087, de Lauro Müller

Relator: Desembargador Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A RELAÇÃO DE CONSUMO (ART. 7º, IX, DA LEI N.8.137/90 C/C ART. 18, § 6º, I, DO CDC). SENTENÇA CONDENATÓRIA. INSURGÊNCIA DE AMBAS AS PARTES.

RECURSO DA DEFESA. ALMEJADA ABSOLVIÇÃO EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE EXAME PERICIAL NAS MERCADORIAS. NÃO ACOLHIMENTO. APREENDIDAS MERCADORIAS EM CONDIÇÕES IMPRÓPRIAS AO CONSUMO (PRAZO DE VALIDADE EXPIRADO). CRIME FORMAL E DE PERIGO ABSTRATO. DESNECESSIDADE DE PERÍCIA NOS CASOS DO ART. 18, § 6º, INCISOS I E II, PARTE FINAL, DO CDC.ENTENDIMENTO CONSOLIDADO PELA SEÇÃO CRIMINAL DESTA CORTE DE JUSTIÇA EM INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. CONDENAÇÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DOSIMETRIA DA PENA. MAJORAÇÃO DA PENA BASE. VALORAÇÃO NEGATIVA DA CULPABILIDADE, CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME E CONDUTA SOCIAL DO RÉU. INVIABILIDADE. ANÁLISE ESCORREITA DO JUÍZO SINGULAR. PENA-BASE MANTIDA NO MÍNIMO LEGAL. MAJORANTE DO ART. 12, III, DA LEI N. 8.137/90. NÃO INCIDÊNCIA. PRODUTOS SUPÉRFLUOS OU SUBSTITUÍVEIS. PLEITO DE AFASTAMENTO DA CONTINUIDADE DELITIVA. ACOLHIMENTO. CONDUTAS QUE ULTRAPASSAM O LIMITE DE 30 (TRINTA) DIAS. RECONHECIMENTO DO CONCURSO MATERIAL. MODIFICAÇÃO NO QUANTUM DE PENA DE MULTA IMPOSTA. ADEMAIS, PLEITO DE APLICAÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE COMINADA AO TIPO PENAL. NÃO ACOLHIMENTO. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE E PENA DE MULTA ALTERNATIVAMENTE COMINADAS. DISCRICIONARIEDADE DO JULGADOR. JUÍZO SINGULAR QUE OBSERVANDO AS PARTICULARIDADES DA CAUSA, OPTOU PELA PENA DE MULTA. PENA DE MULTA MANTIDA.

RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

PRESCRIÇÃO. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO. PENA ÚNICA DE MULTA APLICADA. PRAZO PRESCRICIONAL DE 2 (DOIS) ANOS. ART. 114, I, DO CÓDIGO PENAL. LAPSO TEMPORAL DECORRIDO ENTRE A DATA DA PUBLICAÇÃO DA SENTENÇA ATÉ A PRESENTE. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE QUE SE IMPÕE.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0000764-90.2011.8.24.0087, da comarca de Lauro Müller Vara Única em que é/são Apte/Apdo(s) Ministério Público do Estado de Santa Catarina e Apdo/Apte(s) Alexsandro Nazário.

A Primeira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer de ambos os recursos e dar provimento parcial tão somente ao recurso do Ministério Público para afastar a continuidade delitiva e aplicar o concurso material, a teor do art. 69 do Código Penal, declarando-se, ainda, a extinção da punibilidade do réu. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Paulo Roberto Sartorato, e dele participou a Exma. Sra. Desa. Hildemar Meneguzzi de Carvalho.

Funcionou como membro do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. Procurador de Justiça Raul Schaefer Filho.

Florianópolis, 12 de novembro de 2020.

Desembargador Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva

Relator


RELATÓRIO

Na comarca da Lauro Muller, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina, ofereceu denúncia em face de Alexsandro Nazário e Mercado Nazário (Alexsandro Nazário- ME), dando-o como incurso nas sanções do art. 7º, IX, da Lei n 8.137/90 c/c art. 18, § 6º, I do Código de Defesa do Consumidor, na forma do art. 71 do Código Penal, em virtude do seguinte fato:

No dia 29 de abril de 2010, por volta das 15 horas, os agentes da Vigilância Sanitária Municipal, no exercício regular de suas atividades e ainda considerando o desinteresse do estabelecimento em assinar o termo de ajustamento de condutas em relação à questão, visando fiscalizar o estabelecimento Mercado Nazário (de propriedade do denunciado), lá estiveram, e constataram eu o referido Mercado, sob os auspícios do denunciado, deliberadamente expunha à venda mercadoria impróprias ao uso e consumo, notadamente aquelas descritos no auto de intimação de fl. 3, todas com prazo de validade vencidos, os quais foram apreendidos e inutilizados.

Ainda, na data de 27 de setembro de 2010, foi realizada nova fiscalização pela Vigilância Sanitária do Município no mesmo estabelecimento, tendo os seu agentes encontrado irregularidades similares àquelas do mês de março, porquanto flagraram que o já referido estabelecimento, sob os auspícios do Denunciado, expunha à venda produtos impróprios para uso e consumo (prazo de validade vencido), conforme descrito no Auto de Intimação de fls. 4, motivando os agentes a apreenderem tais mercadorias.

Neste contexto, o denunciado Alexsandro Nazário, cônscio da ilicitude de sua conduta, na qualidade de responsável pela administração do "Mercado Nazário", expôs deliberadamente à venda várias mercadorias impróprias ao consumo humano descrita às fls. 3 e 4.

[...]

Concluída a instrução, sobreveio sentença que julgou parcialmente procedente a denúncia para Absolver Alexsandro Nazário ME (pessoa jurídica), com fulcro no art. 386, III do Código de Processo Penal e condenar Alexsandro Nazário (pessoa física) à pena de 11 (onze) dias-multa, no valor unitário de 1/5 (um quinto) do salário mínimo vigente à data dos fatos, por infração ao disposto no art. 7º, IX, da Lei n. 8.137/90 c/c art. 18, § 6º, I, do CDC, na forma do art. 71 do Código Penal (por duas vezes).

Inconformada com a prestação jurisdicional entregue, ambas as partes interpuseram recurso de apelação.

O Ministério Público pugna pela majoração da pena-base, considerando-se como desfavoráveis a culpabilidade, as circunstâncias do crime e a conduta social do apelado; a aplicação da pena privativa de liberdade cominada; a aplicação da agravante prevista no art. 12, inciso III, da lei n. 8.137/90 e, por fim, a aplicação do concurso material de crimes, somando-se as penas dos crimes cometidos.

A Defesa, por sua vez, requer a absolvição do réu, ao argumento de que não há nos autos a comprovação da impropriedade dos produtos, sendo imprescindível no presente caso, a realização da perícia nas mercadorias, para aferir se seriam nocivas ou não.

As contrarrazões foram apresentadas respectivamente pelo Ministério Público e Defesa às fls. 115/118 e 132/134.

Instada, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Excelentíssimo Procurador de Justiça Sidney Eloy Dalabrida, opinou pelo conhecimento e provimento parcial do recurso Ministerial, tão somente para aplicar o cúmulo material entre os delitos perpetrados.

Este é o relatório.

VOTO

Presente os pressupostos de admissibilidade, conhece-se dos recursos e passa-se à análise de seus objetos.

Do recurso interposto por Alexsandro Nazário

A defesa almeja em suas razões a absolvição do réu ao argumento de que não há nos autos comprovação da impropriedade dos produtos expostos à venda, mormente por conta da ausência de exame pericial nas mercadorias.

Aduz, assim, que apenas a declaração dos agentes nos termos de apreensão informando que as mercadorias apreendidas estariam impróprias para o consumo, não é suficiente para assegurar a materialidade direta do delito. Assevera, por derradeiro, que não há uma descrição pormenorizada sobre as condições dos produtos, tais como prazo de validade, informação de quanto tempo estariam vencidos, número de lotes etc.

No entanto, adianta-se, o recurso não comporta provimento.

Acerca do delito em análise, verbera o art. 7º, IX, da Lei n. 8.137/1990:

Art. 7° Constitui crime contra as relações de consumo: [...]

IX - vender, ter em depósito para vender ou expor à venda ou, de qualquer forma, entregar matéria-prima ou mercadoria, em condições impróprias ao consumo; [...].

Em complemento à referida norma penal em branco, dispõe o art. 18, § 6º, do Código de Defesa do Consumidor:

Art. 18. [...] § 6° São impróprios ao uso e consumo:

I - os produtos cujos prazos de validade estejam vencidos;

II - os produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos ou, ainda, aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação;

III - os produtos que, por qualquer motivo, se revelem inadequados ao fim a que se destinam (grifou-se).

Pois bem. Em recente discussão, a Seção Criminal deste Tribunal de Justiça decidiu, por maioria de votos, fixar tese jurídica no sentido de que o crime tipificado no art. 7º, IX, da Lei n. 8.137/1990 prescinde da produção de prova pericial para a constatação da materialidade quando o produto estiver fora do prazo de validade (artigo 18, § 6º, inciso I, da Lei n. 8.078/1990) ou em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação (artigo 18, § 6º, inciso II, última parte, da Lei n. 8.078/1990) (Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas n. 4009173-78.2016.8.24.0000, de Armazém, j. 13-5-2020).

Na hipótese, seguindo o entendimento acima referenciado, foram apreendidas diversas mercadorias cujos prazos de validade estavam expirados (fls. 3/4) sendo, portanto, despicienda a apresentação de laudo pericial, pois entende-se que o simples fato de constar a validade expirada é o suficiente para subsumir a conduta à figura típica do delito previsto no art. 7º, inciso IX, c/c art. 18, § 6º, I, do CDC, visto se tratar de delito formal, o qual independe da produção do resultado naturalístico - prejuízo ao consumidor - para configurar-se.

Ademais, não há falar que o auto de intimação não foi preenchido de forma pormenorizada, pois como bem pontuou o juízo de primeiro grau, entende-se que não se faz necessário tecer maiores considerações, notadamente porque presumem-se verdadeiros os atos praticados pelos Agentes da Vigilância Sanitária, quando no uso de suas atribuições.

Assim, diante de tais elementos, tenho que a manutenção da condenação do réu é mesmo de rigor, não havendo espaço para a absolvição pretendida.

Do Recurso do Ministério Público

Quanto ao reclamo ministerial, este cinge-se à dosimetria da pena e seus efeitos.

Pugna o parquet, em...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT