Acórdão nº 0000770-33.2007.8.11.0109 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Terceira Câmara Criminal, 12-07-2023

Data de Julgamento12 Julho 2023
Case OutcomeProvimento em Parte
Classe processualCriminal - APELAÇÃO CRIMINAL - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Número do processo0000770-33.2007.8.11.0109
AssuntoAtentado Violento ao Pudor

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 0000770-33.2007.8.11.0109
Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417)
Assunto: [Atentado Violento ao Pudor]
Relator: Des(a).
GILBERTO GIRALDELLI


Turma Julgadora: [DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA, DES(A). RONDON BASSIL DOWER FILHO]

Parte(s):
[MILTON ADEMIR BLANK - CPF: 560.617.739-00 (APELANTE), VANIA SANTOS DE SOUZA DORNELLES - CPF: 829.613.790-91 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REPRESENTANTE), JACQUELINE DAYANE DA CUNHA - CPF: 032.114.931-90 (VÍTIMA), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)]


A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
Não encontrado, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR MAIORIA, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.


E M E N T A

APELAÇÃO CRIMINAL – ART. 214, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CP, AINDA SOB A VIGÊNCIA DA LEI N.º 8.069/90 – SENTENÇA CONDENATÓRIA – IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA – 1. PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE DA AÇÃO PENAL – REJEIÇÃO – CRIME COMETIDO POR PADRASTO DURANTE A VIGÊNCIA DO ART. 225, §1º, II, DO CP – NATUREZA PÚBLICA INCONDICIONADA DA AÇÃO PENAL JÁ ESTIPULADA À ÉPOCA – DESNECESSIDADE DE REPRESENTAÇÃO DA VÍTIMA – 2. SUSCITADA A PREJUDICIAL DE MÉRITO DA PRESCRIÇÃO EM ABSTRATO DA PRETENSÃO PUNITIVA – NÃO ACOLHIMENTO – PRAZO PRESCRICIONAL NÃO ALCANÇADO – MÉRITO – 3. PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO POR FALTA DE PROVAS – IMPROCEDÊNCIA – MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS – DECLARAÇÕES FIRMES E COERENTES DA VÍTIMA CORROBORADAS POR PROVA JUDICIAL – CONDENAÇÃO MANTIDA – 4. DOSIMETRIA DA PENA-BASE – PRETENDIDO O REAJUSTE AO PATAMAR MÍNIMO LEGAL – CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME DEPRECIADAS MEDIANTE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA – REQUERIDA A REDUÇÃO DO PESO ATRIBUÍDO À CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DESFAVORÁVEL – VIABILIDADE – OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE – SANÇÃO BÁSICA READEQUADA – 5. POSTULADO O AFASTAMENTO DA CAUSA DE AUMENTO PREVISTA NO ART. 226, INC. II, DO CP – DESCABIMENTO – CONTEXTO FÁTICO QUE JUSTIFICA A INCIDÊNCIA DA MAJORANTE – LEI ANTIGA JÁ PREVIA O AUMENTO – EVIDENCIADOS A CONDIÇÃO DO RÉU DE PADRASTO DA VÍTIMA E O EXERCÍCIO DE AUTORIDADE SOBRE ELA – 6. VINDICADO O AFASTAMENTO DA CONTINUIDADE DELITIVA – IMPOSSIBILIDADE – ALEGADA IMPRECISÃO QUANTO AO NÚMERO EXATO DE ABUSOS PERPETRADOS – IRRELEVÂNCIA – DEMONSTRADA A OCORRÊNCIA EM MAIS DE UMA OPORTUNIDADE – 7. ALMEJADA A MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS DA DEFENSORA DATIVA – INVIABILIDADE – VERBA HONORÁRIA ARBITRADA DE FORMA EQUILIBRADA NA SENTENÇA – 8. PRELIMINAR E PREJUDICIAL DE MÉRITO REJEITADAS E APELO PARCIALMENTE PROVIDO.

1. A redação original do inciso II do §1º do art. 225 do Código Penal, atualmente revogada mas vigente à época dos fatos sub judice, já estipulava a ação penal pública incondicionada para a apuração dos delitos tipificados nos Capítulos I e II do Título VI do mesmo códex quando cometido com abuso do pátrio poder, ou da qualidade de padrasto, tutor ou curador, portanto, não é o caso de se apontar ausência de condição de procedibilidade para a deflagração da persecução penal à vista da ausência de representação da vítima. Precedente do STJ.

2. Não procede a alegada ocorrência da prescrição propriamente dita da pretensão punitiva estatal se o prazo prescricional aplicável à espécie não foi alcançado entre quaisquer dos marcos interruptivos previstos no art. 117 do Código Penal.

3. Descabida a pretensão absolutória quando a materialidade do delito e a autoria do apelante se apresentam comprovadas a partir da Notícia de Fato elaborada pela Conselheira Tutelar que primeiro tomou conhecimento do crime e a encaminhou ao Ministério Público, somada às declarações firmes e coerentes prestadas pela vítima em juízo, corroboradas que estão por outras provas judiciais, ao passo que resta isolada nos autos a negativa de autoria apresentada pelo réu na Delegacia e não repetida em juízo porquanto revel, devendo ser ratificado o édito condenatório.

4. É inviável a redução da pena-base ao patamar mínimo legal se as circunstâncias do delito foram valoradas negativamente mediante fundamentação idônea, especificamente considerando que o recorrente utilizava a própria residência em que coabitava com a vítima enquanto padrasto desta para praticar os atos libidinosos, aproveitando-se das breves ausências da genitora da menor. No entanto, aferidas a falta de motivação e de razoabilidade para o incremento efetivado na sanção básica, cumpre ser readequado o respectivo quantum.

5. Restando evidenciado que os abusos perpetrados pelo acusado contra a vítima se deram na condição de padrasto, e considerando que a lei antiga já previa o aumento da pena nesses casos, impõe-se manter a incidência da majorante prevista no art. 226, inc. II, do Código Penal, na fração de 1/4, conforme redação anterior à vigência da Lei n.º 11.106/2005.

6. É cabível a aplicação da continuidade delitiva, ainda que no patamar mínimo, quando estiver demonstrado que o réu praticou o delito sexual por mais de uma vez, nas mesmas condições de tempo, lugar e modo de execução, sendo irrelevante a ausência da exata quantificação do número de eventos criminosos, sobretudo porque, in casu, os abusos foram praticados contra vítima de pouca idade.

7. “As tabelas de honorários elaboradas unilateralmente pelos Conselhos Seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil não vinculam o magistrado no momento de arbitrar o valor da remuneração a que faz jus o defensor dativo que atua no processo penal, mas servem como referência para a fixação de valor que seja justo e que reflita o labor despendido pelo advogado, nos termos da tese firmada no Tema Repetitivo n. 984 do Superior Tribunal de Justiça, de modo que cabe ao julgador, ao fixar tal verba, levar em consideração não apenas a referida tabela, mas a complexidade da causa e a qualidade do trabalho desempenhado pelo defensor. Portanto, se o valor fixado pelo juízo de primeiro grau está condizente com a complexidade da causa e com o trabalho apresentado pelo advogado dativo em segundo grau de jurisdição, é de rigor a manutenção dessa verba para remunerar o serviço por ele prestado (apresentação de razões de recurso de apelação).” (TJ-MT – N.U 0003658-97.2017.8.11.0052, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, LUIZ FERREIRA DA SILVA, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 07/02/2023, Publicado no DJE 17/02/2023).

Recurso de apelação criminal conhecido e provido em parte.

APELANTE:

MILTON ADEMIR BLANK

APELADO:

MINISTÉRIO PÚBLICO



R E L A T Ó R I O

EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI

Egrégia Câmara:

Trata-se de recurso de apelação criminal interposto por MILTON ADEMIR BLANK contra a sentença proferida pelo d. Juízo da Vara Única da Comarca de Marcelândia/MT na ação penal n.º 0000770-33.2007.8.11.0109, que o condenou à pena de 09 (nove) anos, 10 (dez) meses e 03 (três) dias de reclusão, no regime inicial fechado, pela prática da conduta tipificada no art. 214, parágrafo único, c/c arts. 224 e 226, II, na forma do art. 71, caput, todos do Código Penal.

Nas razões recursais disponíveis no ID 150178159, o apelante suscita a preliminar de nulidade ab initio do processo, ante a inexistência de condição de procedibilidade para a ação penal, à conta da falta de representação formal da vítima.

Sucessivamente, argui a prejudicial de mérito de prescrição em abstrato da pretensão punitiva, ao argumento de que o delito teria ocorrido entre os anos de 1999 e 2000, e à época dos fatos, o caput do art. 214 do Código Penal previa pena máxima de 07 (sete) anos de reclusão, logo, tendo a denúncia sido recebida somente em 2015, entende que já se operou o lapso prescricional de 12 (doze) anos previsto no art. 109, inc. III, do Código Penal, devendo ser extinta a punibilidade do réu.

No mérito, o recorrente invoca o brocardo jurídico in dubio pro reo e pugna pela absolvição, sob o argumento de insuficiência de provas para ensejar a condenação. Subsidiariamente, requer a aplicação da pena-base no mínimo legal, ante a inidoneidade do desabono conferido às circunstâncias do crime e a desproporção do incremento efetivado; a exclusão da causa de aumento de pena prevista no artigo 226, II, do CP, porquanto o crime é anterior à vigência da Lei n.º 11.106/2005 e, por fim, o afastamento da continuidade delitiva, por não haver prova da quantidade de vezes que os abusos supostamente se repetiram. Por derradeiro, vindica a majoração dos honorários advocatícios da defensora dativa.

Em contrarrazões vistas no ID 150178161, o Ministério Público rechaça as pretensões defensivas e requer seja negado provimento ao apelo.

Instada a se manifestar, a i. Procuradoria-Geral de Justiça, por meio do parecer encartado no ID 155693655, opinou pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

À douta Revisão.

VOTO (PRELIMINAR DE NULIDADE POR AUSÊNCIA DE CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE DA AÇÃO PENAL FALTA DE REPRESENTAÇÃO FORMAL DA VÍTIMA)

EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI (RELATOR)

Egrégia Câmara:

De proêmio, cumpre reconhecer que o recurso em apreço é tempestivo, foi interposto por quem tinha legitimidade para fazê-lo, e o meio de impugnação empregado afigura-se necessário e adequado para se atingir a finalidade colimada, motivos por que, estando presentes os requisitos objetivos e subjetivos para a sua admissibilidade, CONHEÇO do apelo manejado pela i. defesa.

Antes de adentrar no mérito da insurgência, verifica-se que a i. defesa suscita preliminar de nulidade da ação penal desde o nascedouro, sob o argumento de que teria se operado a decadência do direito da ofendida J. D. da C. de representar criminalmente o recorrente MILTON ADEMIR BLANK, pois, no que lhe concerne, o fato delituoso...

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