Acórdão Nº 0000870-79.2011.8.24.0175 do Terceira Câmara de Direito Público, 22-02-2022

Número do processo0000870-79.2011.8.24.0175
Data22 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Nº 0000870-79.2011.8.24.0175/SC

RELATOR: Desembargador JÚLIO CÉSAR KNOLL

EMBARGANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA

RELATÓRIO

Trata-se de embargos de declaração, opostos pelo pelo Estado de Santa Catarina, contra acórdão proferido por esta Terceira Câmara de Direito Público, nos autos da "ação de indenização por desapropriação indireta", promovida por José Valmir Bosa e Maria de Fátima Scandolara Bosa.

Em suas razões, sustentou que o aresto padece de mácula relativa a omissão, porquanto, de acordo com o recente julgamento do tema 1004 pelo STJ, ocorrido após a interposição do recurso de apelação e da oposição dos primeiros aclaratórios, os adquirentes de imóveis, após o apossentamento administrativo, carecem de legitimidade ativa para postular indenização.

Sustentou que, tendo em vista se tratar de matéria de ordem pública, a questão pode ser conhecida a qualquer tempo e grau de jurisdição, inclusive de ofício, nos termos do artigo 485, § 3º, do CPC.

Arguiu, ainda, contradição em relação aos juros compensatórios.

Desse modo, requereu o aclaramento e a integração do decisum.

Com as contrarrazões, os autos vieram-me conclusos em 28-01-2022.

Esse é o relato do necessário.

VOTO

A insurgência voluntária apresentou-se tempestiva e preencheu os demais requisitos de admissibilidade, motivo pelo qual merece ser conhecida.

Registra-se, prima facie, que estabelece o artigo 1.022 do Código de Processo Civil, o cabimento de embargos de declaração contra qualquer decisão para:

I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição;

II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento;

III - corrigir erro material.

Parágrafo único. Considera-se omissa a decisão que:

I - deixe de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento;

II - incorra em qualquer das condutas descritas no art. 489, § 1º.

Acerca da obscuridade e da contradição, Teresa Arruda Alvim Wambier, Maria Lúcia Lins Conceição, Leonardo Ferres da Silva Ribeiro e Rogério Licastro Torres de Mello lecionam:

"Esclarecer obscuridade ou eliminar contradição - inciso I as primeiras causas que justificam a interposição dos embargo de declaração são a obscuridade e a contradição. 2.1 É obscura a decisão, quando não e compreende exatamente o que foi decidido. A possibilidade de a decisão ser interpretada de maneiras diferentes gera obscuridade. Pode decorrer de defeito na expressão ou da falta de firmeza na convicção do juiz, que se perceba pela leitura do texto da decisão [...]. 2.2 A contradição se confunde com a incoerência interna da decisão, com a coexistência de elementos racionalmente inconciliáveis. 2.3 A contradição interna deve constar da decisão: deve estar em um dos seus elementos ou entre elementos. Ou ainda, e esta é uma exceção, resultar de se colocar lado a lado acórdão e ementa e se verificar que são desarmônicos". (Primeiros comentários ao novo código de processo civil. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 1627-1628).

Já a omissão relevante que enseja a arguição de embargos, é representada pela falta de manifestação expressa sobre algum ponto ou questão sobre a qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento. (MARINONI, Luiz Guilherme. Novo Curso de Processo Civil: Vol. 2 - Tutela dos direitos mediante procedimento comum. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 539-540)

No que toca aos erros materiais, estes correspondem aos erros de cálculo e às inexatidões materiais (art. 494, I, do CPC). O erro de cálculo consiste no erro aritmético (não se confunde, porém, com o erro quanto a critério de cálculo ou elementos do cálculo, que constituem erro de julgamento a respeito do cálculo). Inexatidão material constitui erro na redação da decisão - e não no julgamento nela exprimido (NEVES, Daniel Assumpção Amorim. Novo Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 954).

Adianto que a irresignação comporta acolhimento.

Recentemente o Superior Tribunal, sob o rito dos repetitivos, Tema n. 1004, definiu a seguinte tese: "Reconhecida a incidência do princípio da boa-fé objetiva em ação de desapropriação indireta, se a aquisição do bem ou de direitos sobre ele ocorrer quando já existente restrição administrativa, fica subentendido que tal ônus foi considerado na fixação do preço. Nesses casos, o adquirente não faz jus a qualquer indenização do órgão expropriante por eventual apossamento anterior. Excetuam-se da tese hipóteses em que patente a boa-fé objetiva do sucessor, como em situações de negócio jurídico gratuito ou de vulnerabilidade econômica do adquirente." (REsp 1750660, Ministro Relator para Acórdão Herman Benjamin)

A evolução da compreensão sobre o assunto foi pontuada detalhadamente na ementa do mencionado julgado, vejamos:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO. APOSSAMENTO ADMINISTRATIVO ANTERIOR À ALIENAÇÃO. INDENIZAÇÃO. ILEGITIMIDADE ATIVA DO ADQUIRENTE. DESCABIMENTO DE PRETENSÃO FUNDADA EM CESSÃO DE DIREITOS E SUB-ROGAÇÃO. ARTS. 286, 290, 346, 347, 349, 884, CAPUT, E 927 DO CÓDIGO CIVIL. PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ OBJETIVA, DA MORALIDADE E DA PROIBIÇÃO DE ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. INAPLICABILIDADE DO ART. 31 DO DECRETO-LEI 3.365/1941. PRECEDENTES DA PRIMEIRA SEÇÃO E DA PRIMEIRA E SEGUNDA TURMAS DO STJ. JURISPRUDÊNCIA INERCIAL. ARTS. 926, CAPUT, E 927, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.

HISTÓRICO DA DEMANDA 1. O 2º Vice-Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina admitiu, com fundamento no inciso IV do art. 1.030 do Código de Processo Civil, o presente Recurso Especial como representativo da controvérsia. A Primeira Seção proferiu decisão de afetação, assim delimitando a tese controvertida: "análise acerca da sub-rogação do adquirente de imóvel em todos os direitos do proprietário original, inclusive quanto a eventual indenização devida pelo Estado, ainda que a alienação do bem tenha ocorrido após o apossamento administrativo." 2. Na origem, trata-se de Ação de Indenização por Desapropriação Indireta contra o Departamento de Infraestrutura de Santa Catarina (Deinfra), sob a alegação de que, no curso de pavimentação da Rodovia SC-303, houve parcial apossamento material dos imóveis das autoras. O Tribunal de Justiça deliberou que, após o apossamento, ocorrido em 13.5.1981, os imóveis foram transmitidos por doação às autoras em 12.5.1982. Declarou, então, "de ofício, a ilegitimidade ativa dos apelados, para reformar a sentença e extinguir o feito sem resolução do mérito, com fulcro no art. 485, VI, do Código de Processo Civil de 2015 (art. 267, VI, do CPC/1973)." 3. Na fundamentação, o acórdão recorrido lembrou que "o Superior Tribunal de Justiça passou a impor, como requisito para a procedência do pleito indenizatório, prova, por parte do atual proprietário, de que o valor pago correspondia ao montante antes da desvalorização oriunda do apossamento [...] O raciocínio visa evitar a obtenção de vantagem indevida pelo adquirente, que supostamente paga valor inferior ao original, e ainda postula indenização correspondente a perda não suportada por si." (fl. 195, e-STJ, grifo acrescentado).

IDENTIFICAÇÃO DA DIVERGÊNCIA 4. Com brilhantismo, objetividade e erudição característicos de seus pronunciamentos, o eminente Relator, Ministro Gurgel de Faria, deu provimento ao pleito e, na sistemática dos Recursos Especiais Repetitivos, propôs a seguinte tese: "Os adquirentes dos imóveis submetidos à desapropriação indireta sub-rogam-se no direito de receber indenização se, ao tempo do negócio, não tiver havido respectivo pagamento ao antigo proprietário, nem averbação no Cartório de Registro de Imóveis das dimensões atualizadas, sendo...

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