Acórdão Nº 0000903-38.2014.8.24.0022 do Terceira Câmara Criminal, 01-02-2022

Número do processo0000903-38.2014.8.24.0022
Data01 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0000903-38.2014.8.24.0022/SC

RELATOR: Desembargador LEOPOLDO AUGUSTO BRÜGGEMANN

APELANTE: ARISTIDES PADILHA DOS SANTOS (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca de Curitibanos, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Aristides Padilha dos Santos, dando-o como incurso nas sanções do art. 302, § 1º, IV, e no art. 303, parágrafo único, c/c art. 302, § 1º, IV, do Código de Trânsito Brasileiro e art. 61, II, alínea "h", em concurso formal de delitos, e ambos na forma do art. 18, II, do Código Penal e art. 28 do Código de Trânsito Brasileiro, pela prática das condutas assim descritas na inicial acusatória:

No dia 14 de abril de 2013, por volta das 00h20min, na região de Araponga, Caraguatá, município de São Cristóvão do Sul, próximo ao Km 222,7 da SC 470, o denunciado Aristides Padilha dos Santos, no exercício de sua profissão como motorista de ônibus destinado ao transporte de passageiros praticou homicídio culposo e lesão corporal culposa na direção do veículo automotor Mercedes Benz/MPolo Viaggio R, placas MFD-3628.

Assim foi que, nas proximidades do Túnel 18, o denunciado, de forma imprudente, dirigindo sem a atenção e os cuidados indispensáveis à segurança do trânsito, perdeu o domínio do veículo e colidiu com um barranco que havia no acostamento da pista1.

Em razão dessa sua conduta, o denunciado deu causa aos ferimentos provocados em 2 (duas) passageiras que utilizavam os serviços de transporte da empresa Reunidas, linha Joinville/Caçador.

A vítima Laudilina Alves Eleutério, com idade acima de 60 (sessenta) anos, sofreu lesões em sua perna direita, que inclusive lhe resultaram incapacidade para as suas ocupações habituais por mais de 30 (trinta). A vítima Cátia Patzer, porém, não sobreviveu aos ferimentos causados pelo acidente, permanecendo em estado de coma até o dia 25 de abril de 2013, na CTI do Hospital Maicé de Caçador, quando veio a óbito por traumatismo crânio encefálico (ev. 14).

Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada procedente para condenar o acusado às penas de 3 (três) anos, 1 (um) mês e 10 (dez) dias de detenção, a ser cumprida inicialmente em regime aberto, e mais a suspensão de dirigir veículo automotor pelo período de 3 (três) meses, com pena privativa de liberdade substituída por duas restritivas de direitos, por infração ao disposto no art. 302, § 1º, inciso IV e art. 303, parágrafo único, c/c art. 302, § 1º, IV, ambos Código de Trânsito Brasileiro, em concurso formal. Foi-lhe concedido o direito de apelar em liberdade (ev. 133).

Irresignada, a defesa do acusado interpôs recurso de apelação, no qual pugnou pela sua absolvição por ausência de provas de ato culposo. Alegou que não ficou devidamente apurada a causa do sinistro, sendo que esta não pode ser atribuída a qualquer manobra impudente do apelante. Na dosimetria, requereu o reconhecimento do concurso formal entre os delitos, a suspensão condicional do processo e a substituição da pena corporal por restritiva de direitos ou multa. Ainda pleiteou a incidência da Lei n. 9.099/95, a aplicação da pena no mínimo legal, bem como o reconhecimento de circunstâncias atenuantes (ev. 146).

Juntadas as contrarrazões (ev. 155), ascenderam os autos a esta instância, e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Gilberto Callado de Oliveira, opinou pelo parcial conhecimento e pelo não provimento (ev. 10).

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Aristides Padilha dos Santos contra decisão que julgou procedente a denúncia e o condenou à sanção prevista no art. 302, § 1º, inciso IV, e art. 303, parágrafo único, c/c art. 302, § 1º, IV, ambos Código de Trânsito Brasileiro, em concurso formal.

O apelo é de ser conhecido, porquanto presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade.

Do mérito

Persegue a defesa a absolvição de seu defendido por ausência de provas da autoria do delito. Alegou que não ficou devidamente apurada a causa do sinistro, sendo que esta não pode ser atribuída a qualquer manobra impudente do apelante.

Sem razão.

A materialidade do fato vem comprovada pelo inquérito policial de fls. 5-28, complementado às fls. 35-64, em especial da Comunicação de Acidente de Trânsito (fls. 10-11), Boletim de Acidente de Trânsito (fls. 56-62), Boletim de Ocorrência (fl. 78), laudos periciais (fls. 26 e 41) e laudo médico (fl. 43).

A autoria, ao contrário do que alega a defesa, ficou comprovada e recai sobre a pessoa do acusado.

Para elucidar tal entendimento pertinente percorrer a prova oral produzida, cujas algumas transcrições, muito bem elaboradas pelo togado, passarão a integrar este voto, evitando desnecessária tautologia.

[...] o próprio acusado admitiu, em ambas as fases do processo, o envolvimento no acidente, atribuindo a culpa ao uso de medicamentos, conforme se observa:

"(...) QUE, o interrogando era motorista da empresa Reunidas Transportes Coletivos; que, com relação aos fatos afirma que fazia a linha Joinville/Chapecó, sendo que vinha de Joinville até esta cidade de Curitibanos onde era efetuada a troca de motoristas; Que, naquela noite o interrogado saiu da cidade de Joinville às 19 horas e seguiu rumo a Curitibanos; Que, quando chegou nas proximidades do local conhecido por Túnel 18, o interrogado acabou dormindo ao volante; que, com a "cochilada", perdeu o controle do ônibus e acabou colidindo contra um barranco, à direita de sua direção; que, acredita que haviam no ônibus 15 passageiros; que, afirma que naquela época o interrogado estava em tratamento para labirintite, mas afirma não lembrar o nome do remédio que estava tomando; Que, como ficou bastante assustado com aquele acidente, o interrogado resolveu pedir demissão do cargo de motorista; que, saiu da empresa cerca de 15 dias após o acidente; Que, se recorda que uma das passageiras ficou bastante machucada, tendo falecido 15 após o acidente, no hospital da cidade de Caçador; que, pelo que ficou sabendo posteriormente, tal passageira havia se levantado para ir ao banheiro no momento em que o ônibus colidiu contra o barranco; que, não recorda o nome da passageira, mas sabe que ela havia pego o ônibus na cidade de Indaial e teria como destino final a cidade de Irai/RS; Que, por fim afirma que ficou com apenas alguns arranhões por conta do acidente, mas nada grave". Acusado Aristides Padilha dos Santos, depoimento de fl. 37. Destaquei.

Não destoa a versão apresentada em seu interrogatório judicial: "(...) Juízo:

O senhor tava trabalhando na empresa quanto tempo, seu Aristides? Acusado: Quatro anos e meio. Juízo: O senhor sempre fazia o mesmo trajeto ou fazia outros trajetos? Acusado: Dois anos eu tava nessa linha. Juízo: Como era essa linha? Acusado: No caso eu tava aqui, descia a Joinville, ficava o dia todo lá e retornava as 19h da noite, voltando aqui pra Curitibanos, aqui era a troca e na próxima noite eu subia a Chapecó, daí vinha e folgava. Juízo: A linha que o senhor assumia pra ir a Joinville, como é que é o nome? Acusado: Joinville a Chapecó. Juízo: Então o senhor subia daqui, aqui tinha uma troca? Acusado: Sim, o que me entregava descia de Chapecó até aqui, aqui ele ficava no repouso descansando e eu subia até Joinville e de Joinville o ônibus ficava ali ou tinha troca as vezes. Juízo: Mas o senhor permanecia em Joinville durante o dia? Acusado: Permanecia durante o dia. Juízo: Normalmente que horas o senhor saia de lá? Acusado: Sete horas. Juízo: E o senhor saia aqui de Curitibanos, sempre de manhã? Acusado: Meia noite e quarenta saia daqui. Juízo: E chega em Joinville? Acusado: Chega em torno de 7h, se atrasar que nem ali em Blumenau na época tinha bastante movimento, se atrasar vai pras 8h mais ou menos. Juízo: E o senhor permanecia lá durante o dia das 8h da manhã até mais ou menos que hora? Acusado: 19h eu saia do terminal da rodoviária subindo pra cá. Juízo: Eram linhas bastante movimentadas? Acusado: Não, aquele dia eu tava com 15 passageiros, sempre dava 20, 30, dava mais de Blumenau pra cá e de Joinville a Jaraguá dava pouco. Juízo: O senhor estava com alguns problemas de saúde na época, eu queria saber o que que o senhor tava tratando na época? Acusado: Eu tava com começo de labirintite. Juízo: E o senhor tava tomando remédios? Acusado: Tava. Juízo: O senhor tomava remédio todos os dias? Acusado: Todos os dias, era um tratamento né, até deve ta aí o nome dos remédios. Juízo: E na ocasião do acidente, o senhor já teve problemas de tontura durante a condução outras vezes? O senhor lembra como é que estava o tempo, se houve outro veículo que influiu para esse sinistro? Acusado: Olha na verdade eu sai de Joinville bem descansado, ficava o dia todo lá né, bem tranquilo, passei em Rio do Sul ainda proseei com os pia ali, porque a gente dois anos nessa linha tem conhecimento com os pia da agência, bem tranquilo subindo pra vir, aí chegou naquelas alturas me deu um branco e eu não lembro dizer pro senhor o que que me deu. Juízo: O senhor estava tomando os remédios regularmente? Acusado: Isso, tomava esses medicamentos pra tratamento. Juízo: Já tinha problema de tontura outras vezes ou não? Acusado: Tinha dado uma vez, ali no Nadin, na parada de lanche, de janta, ali quando cheguei de Joinville, aí quando entrei no restaurante me deu aquele branco, aquela tontura e já me amontoei e veio um motorista de Blumenau até aqui, conduzindo o ônibus, veio um reserva. Eu falei eu não aguento levar o ônibus, liguei pro chefe de Blumenau e ele disse vai um outro lá e pode aguardar aí. Eu aguardei e ele veio até aqui e eu vim de carona. Isso foi antes desse fato aí. Juízo: E nesse dia o senhor não teria sentido nada até a ocasião. Em Rio do Sul, o senhor tava bem? Acusado: Sim, tava viajando tranquilo, no sábado não tinha muito movimento, tava bem sossegado, bem tranquilo no horário, não tinha atraso, nem nada, tava bem sossegadão, pouco passageiro. Juízo: Não lembra de situações...

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