Acórdão Nº 0000917-24.2020.8.24.0018 do Quinta Câmara Criminal, 22-10-2020

Número do processo0000917-24.2020.8.24.0018
Data22 Outubro 2020
Tribunal de OrigemChapecó
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Agravo de Execução Penal n. 0000917-24.2020.8.24.0018 de Chapecó.

Relator: Desembargador Luiz Neri Oliveira de Souza

AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. PRISÃO DOMICILIAR. RECOMENDAÇÃO 62/2020 DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. INDEFERIMENTO. INSURGÊNCIA DA DEFESA. REFORMA DA DECISÃO. NÃO ACOLHIMENTO. MEDIDAS PREVENTIVAS À PROPAGAÇÃO DA INFECÇÃO PELO NOVO CORONAVÍRUS - COVID-19 - APLICADAS EM TODO ESTADO. SISTEMAS DE JUSTIÇA PENAL E SOCIOEDUCATIVO PRESERVADOS. APENADO ACOMETIDO COM HIPERTENSÃO ARTERIAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE CONDIÇÃO ESPECIAL ALÉM DA PRÓPRIA DOENÇA. RISCO DE CONTAMINAÇÃO NÃO DEMONSTRADO. RECOMENDAÇÃO N. 78 DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. INCLUSÃO DO ART. 5º-A NA RECOMENDAÇÃO 62/2020. NÃO APLICAÇÃO DAS MEDIDAS PREVISTAS NOS ARTIGOS E ÀS PESSOAS CONDENADAS POR CRIMES PREVISTOS NA LEI N. 12.850/2013 (ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA), NA LEI N. 9.613/1998 (LAVAGEM OU OCULTAÇÃO DE BENS, DIREITOS E VALORES), CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, POR CRIMES HEDIONDOS OU POR CRIMES DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER. HIPÓTESE DOS AUTOS. APENADO CONDENADO PELA PRÁTICA DE CRIME HEDIONDO. MEDIDA NÃO ADEQUADA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Execução Penal n. 0000917-24.2020.8.24.0018, da comarca de Chapecó 3ª Vara Criminal em que é Agravante Mauri Fagundes e Agravado Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Quinta Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Desembargador Antônio Zoldan da Veiga, com voto, e dele participou a Exma. Sra. Desembargadora Cinthia Beatriz da S. Bittencourt Schaefer.

Participou da sessão pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Marcílio de Novaes Costa.

Florianópolis, 22 de outubro de 2020

Luiz Neri Oliveira de Souza

Relator


RELATÓRIO

Trata-se de recurso de agravo em execução penal interposto por Mauri Fagundes, por intermédio de defensor constituído, contra decisão de fls. 825/826, proferida no processo de execução criminal n. 0013795-25.2013.8.24.0018, por meio da qual o juízo da 3ª Vara Criminal de Chapecó indeferiu seu pedido de concessão de prisão domiciliar.

Em suas razões, a defesa requer a reforma da decisão com a concessão do benefício. Argumenta que a situação de calamidade pública em decorrência do COVID-19 aliada as recomendações do CNJ, da CGJ/GMF e Órgãos de Segurança Pública justificam a concessão do benefício pois o reeducando se encontra no grupo de risco da doença, conforme orientação da Organização Mundial da Saúde.

Afirma que, as informações fornecidas pelo setor de saúde do estabelecimento prisional são contraditórias e não revelam a realidade vivenciada pelo apenado, que, em suas palavras, "não está recuperado das sequelas da COVID-19, não está respirando normalmente, possui sequelas graves da doença no seu dia a dia, não está recebendo tratamento necessário para a sua recuperação dentro da Unidade Prisional".

Com isso, entende estar suficientemente comprovada a necessidade e adequação da medida.

Apresentadas às contrarrazões (fls. 21/24) e mantida a decisão objurgada (fl. 25), os autos ascenderam à esta Corte.

Com vista, a Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer lavrado pelo(a) Exmo(a). Sr(a). Dr(a). Luiz Ricardo Pereira Cavalcanti, posicionou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 890/893).

Este é o relatório.

VOTO

Infere-se do presente recurso e também dos autos principais que o Juiz de Direito da Vara de Execuções Penais de São José, na decisão atacada, indeferiu o terceiro pedido do agravante de concessão de prisão domiciliar, com fundamento na redução dos riscos epidemiológicos e Recomendação 62/2020, do Conselho Nacional de Justiça, que recomenda aos Tribunais e magistrados a adoção de medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus - COVID-19, in verbis:

Durante o curso processual, o apenado realizou mas teve indeferido dois pedidos de prisão domiciliar (pp. 549-550, parte final, e 619).

Contudo, apresentou sintomas similares àqueles do COVID-19 e, por integrar o grupo de risco (diz ser obeso e hipertenso), foi internado no HRO para tratamento (pp. 734).

Em função disso, requereu novamente o benefício de prisão domiciliar (pp. 727-728 e 800-802).

A Unidade Prisional foi ouvida e prestou os esclarecimentos necessários (pp. 809-810).

Depois disso, o Ministério Público lavrou parecer contrário (pp. 819-820).

É o breve relato. Decido.

Outra vez, entendo que o pleito defensivo não merece guarida.

Isso porque para ser agraciado com o benefício o(a) reeducando(a) deve comprovar situação excepcional em seu quadro de saúde (de impossibilidade de receber tratamento intramuros), situação esta não encontrada no caderno processual.

Com tal fundamentação, inclusive, o E. TJSC cassou diversas prisões domiciliares concedidas por este juízo a presos integrantes do grupo de risco, a exemplo do que se viu nos Agravos ns. 0000366-44.2020.8.24.0018 e 0000478-13.2020.8.24.0018, que não diferem do seguinte:

AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL - PRISÃO DOMICILIAR INDEFERIDA NA ORIGEM - INSURGÊNCIA DA DEFESA - AGRAVANTE PORTADORA DE HIV - REQUERIMENTO SOB O VIÉS DA PANDEMIA ORIGINADA PELO COVID-19 - AUSÊNCIA DE PROVAS DE QUE O ESTADO NÃO POSSUI CONDIÇÕES DE FORNECER O ADEQUADO TRATAMENTO DE SAÚDE NO ESTABELECIMENTO PRISIONAL - GESTORES DAS UNIDADES PRISIONAIS QUE VÊM ZELANDO PELA INTEGRIDADE FÍSICA E PSÍQUICA DA POPULAÇÃO CARCERÁRIA - RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Agravo de Execução Penal n. 0000707-55.2020.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Salete Silva Sommariva, Segunda Câmara Criminal, j. 09-06-2020).

Parece, inclusive, que o tema possui ressonância no Supremo Tribunal Federal, que no bojo da Ação Penal n. 996 também indeferiu pleito de prisão domiciliar a apenado integrante do grupo de risco, pois o tratamento poderia ser prestado intramuros.

No caso prático, como dito no início desta decisão, Mauri Fagundes apresentou sintomas similares aos do COVID-19 e, por integrar o grupo de risco, foi internado no HRO para receber o competente tratamento. Recebeu alta hospitalar no dia 10.08.2020 (p. 734).

Contudo, desde que deixou o nosocômio, o apenado parece ter se recuperado com regularidade, como comprova a resposta de pp. 809-810.

Aliás, para não restar dúvidas, veja-se como ficou o ofício acima mencionado:

Em resposta a CI 396/2020/GEPEN/PACH E PICH, a qual solicita informações de saúde do apenado Mauri Fagundes - 475635, conforme os quesitos solicitados respondemos abaixo:

a) O reeducando já é considerado recuperado da COVID-19?

R: Sim.

b) Ele apresenta alguma sequela da doença no seu dia a dia? Se sim, qual(is)?

R: Não apresenta sequela.

c) O apenado está recebendo o tratamento necessário para as sequelas que contraiu (caso respondida de forma afirmativa a resposta acima)?

d) A respiração do apenado voltou ao normal?

R: Conforme última avaliação realizada pelo setor de saúde, sim, está normal.

e) O reeducando tem desenvolvido alguma atividade (trabalho,etc) desde que voltou do HRO?

R: Conforme consta em sistema Ipen já está realizando trabalho interno.

f) em qual unidade está alocado o apenado atualmente?

R: Conforme sistema Ipen está alocado no regime semiaberto, alojamento externo, cela 30.

Ademais, em contato telefônico com a Unidade Prisional ainda no decorrer desta semana, existiam somente 2 (dois) casos de COVID-19 confirmados no regime semiaberto.

Penso, assim, não haver situação de excepcionalidade para justificar a concessão da prisão domiciliar (pois o reeducando é dito como recuperado e não apresenta sequelas, estando, inclusive, trabalhando, consoante resposta transcrita acima).

Não bastasse isso, o fato de existirem outros casos suspeitos e/ou confirmados de COVID-19 dentro da Unidade Prisional não é suficiente para soltar indiscriminadamente todos os presos, sob pena de se causar verdadeira desordem social.

Para casos tais, existe protocolo administrativo traçado pelas Secretarias Estaduais de Saúde e de Administração Prisional do Estado de Santa Catarina (chamado de Procotolo de Atuação, de março de 2020), o qual recomenda o isolamento do preso que possua caso confirmado ou suspeito da doença ("2.5.2 Casos suspeitos e/ou confirmados DENTRO da unidade prisional. Em havendo casos suspeitos e/ou confirmados têm-se as seguintes ações: Nível I: Alerta. [...] Isolamento de internos com sintomas e sinais de caso suspeito).

Ora, a medida preventiva acima não difere daquela encarada por qualquer pessoa em liberdade que venha a contrair a doença. Aliás, a segunda opção (de pessoa solta que precise se isolar), em termos de saúde, parece ainda pior, pois o setor carcerário consegue realizar o isolamento do preso, coisa que nem sempre acontece em casa.

Trata-se, assim, de medida de prevenção também dos familiares do próprio apenado, pois se o preso alegasse que iria ficar sozinho, estar-se-ia colocando em risco toda coletividade, já que ele necessitaria dos serviços básicos e, em tal condição (só), não poderia executá-los sem colocar em risco os demais a sua volta.

A Unidade Prisional, que tem sido diligente (inclusive fez boa parte dos pedidos de prisão domiciliar), está atenta e possui o olhar voltado a todos os cenários possíveis. Tanto é verdade que para reduzir danos colaterais o estabelecimento prisional tem realizado controle sanitário diário dos presos com casos suspeitos e/ou confirmados com COVID-19. Além disso, eventuais presos isolados receberão visitas virtuais de familiares, para que não se perca o vínculo afetivo.

Não custa frisar que como em qualquer caso, se existir agravamento da doença, o apenado infectado será levado ao serviço público de saúde para internação, como ocorre com as demais pessoas (e como aconteceu com o próprio reeducando)....

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT