Acórdão Nº 0000996-26.2015.8.24.0067 do Quarta Câmara Criminal, 14-07-2022

Número do processo0000996-26.2015.8.24.0067
Data14 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0000996-26.2015.8.24.0067/SC

RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA

APELANTE: BRUNO SECONDO CELUPPI APELANTE: WOLMIR WERNO HETZEL APELANTE: INES ENDRIGO HETZEL APELANTE: SANDRA ANICE FONTANA APELANTE: LEANDRO CARLOS MACHADO APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

RELATÓRIO

Na comarca de São Miguel do Oeste, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Bruno Secondo Celuppi, Ieda Maria Celuppi, Inês Endrigo Hetzel, Leandro Carlos Machado, Sandra Anice Fontana e Wolmir Werno Hetzel, imputando-lhes a prática do delito capitulado no art. 4º, I e II, "a", da Lei n. 8.137/90, pois, segundo consta na inicial:

Os denunciados Sandra Anice Fontana e Leandro Carlos Machado são sócios administradores do Centro de Formação de Condutores Cometa Ltda EPP (fl. 15 e 425); os denunciados Inês Endrigo Hetzel e Wolmir Werno Hetzel são sócios administradores do Centro de Formação de Condutores Educar Ltda Me (fl. 118); e os denunciados Ieda Maria Celuppi e Bruno Secondo Celuppi são sócios administradores do Centro de Formação de Condutores AB São Miguel Ltda - ME (fl. 180).

No período de janeiro de 2013 a dezembro de 2016, em datas e horários a serem apuradas no decorrer da instrução, os denunciados Sandra Anice Fontana, Leandro Carlos Machado, Inês Endrigo Hetzel, Wolmir Werno Hetzel, Ieda Maria Celuppi e Bruno Secondo Celuppi, por si e representando as referidas empresas, abusando do poder econômico que a aliança entre os seus CFCs (Centros de Formação de Condutores) lhes oferece, formaram acordo visando a fixação artificial de preços e também com o objetivo de eliminar qualquer concorrência entre si e de outras empresas nesta cidade de São Miguel do Oeste.

Segundo o apurado, os denunciados se reuniram, em várias oportunidades, para tratar, dentre outros assuntos, da combinação dos preços praticados por suas empresas, a fim de controlar a oferta e a procura dos serviços prestados pelos CFCs (Centros de Formação de Condutores) em São Miguel do Oeste, principalmente a primeira emissão de Carteira Nacional de Habilitação, das categorias A, AB e B.

Veja-se que nessas reuniões nem sempre compareciam todos os sócios das três empresas, ora comparecendo alguns, ora outros denunciados, mas sempre com o intuito de aproveitar-se dos encontros para ajustar entre si os preços que seriam cobrados pelos serviços por eles prestados (emissão de CNHSs das categorias acima listadas).

Assim foi que, os denunciados, proprietários dos três únicos Centro de Formação de Condutores de São Miguel do Oeste (doc. anexo), firmaram ajuste a fim de sempre praticarem preços muito similares ou idênticos entre si e, em grande parte das vezes, muito próximos ao máximo estipulado pela tabela do DETRAN/SC, em prejuízo dos consumidores migueloestinos.

Saliente-se que o ajuste formado entre as empresas lhes gerava um maior poderio econômico, do qual abusavam para fixar artificialmente o preço cobrado por seus serviços, aniquilando com qualquer concorrência entre eles ou mesmo com outras empresas que tivessem interesse em aqui se estabelecer.

É bem verdade que o Departamento Estadual de Trânsito (DETRAN) de Santa Catarina, regulariza, por meio de Portaria, os preços mínimos e máximos que os Centros de Formação de Condutores podem exigir para a realização de todos os cursos e taxas necessários para o consumidor requerer a sua Carteira Nacional de Habilitação (CNH).

No entanto, destaca-se que tais Portarias estipulam diferenças consideráveis entre os valores mínimos e máximos (dando sempre margem de várias centenas de reais para a formação dos preços) que podem ser cobrados pelos Centro de Formação de Condutores para a realização da CNH (Carteira Nacional de Habilitação). E, nesse particular, apurou-se que os referidos CFCs em todo o período de investigação sempre mantiveram os valores de seus serviços idênticos ou em valores muito próximos entre si.

Ressalte-se que durante o trâmite do incluso Inquérito Policial, houve a apreensão de um livro/caderno no Centro de Formação de Condutores Solar de São José do Cedro (fls. 324-387), de onde se extraem várias anotações que comprovam a existência das reuniões anteriormente referidas e a formação de acordo para a fixação de preços padronizados, a fim de controlar o mercado local.

Nesse sentido, importante destacar a reunião ocorrida em 3/4/2013, com a participação dos denunciados Bruno e Leandro (fls. 338-339), onde restou anotado o seguinte: "[...] Mudar a conduta ou arcar com as consequências. O maior problema é ter todos os mesmos valores. Quanto ao juro, o ideal é 1%. Respeitar os valores do DETRAN. Fazer uma pequena diferença entre um CFC. Respeitar os valores mínimos e máximos estipulados pela tabela do DETRAN. Cuidar de não colocar valores nas atas [...] Cuidar para não falar esses problemas fora do CFC. Cuidar o que falamos no telefone [...]".

Na reunião realizada em 6/4/2013, com a participação dos denunciados Inês, Bruno, Volmir e Sandra (fls. 340-346), discutiu-se que: "[...] Questão preços sempre cumprir. O Ministério Público investiga autoescolas de chapecó. Assistimos a reportagem. Temos que ter preços diferentes [...] Jamais falar que os preços são diferentes. Falar que estamos dentro da tabela estipulada pelo DETRAN. Reunir os 18 CFC de preferência para que sirva de modelo. Todos procurar reunir todos que teremos mais sucesso. Não usar mais o termo tabelado [...] Ver reunião com Neca, Nega e Mana, para alterar a tabela e ficar dentro dos valores do DETRAN".

Em 9/11/2013, os denunciados participaram de reunião na qual foi estabelecida a seguinte tabela de preço: "[...] 8,6% de aumento. Aumento geral de honorários de 8,6%. R$ 2.280,00 preço máximo AB.

São Miguel:AB - 2.090,00B - 1.800,00A - 1.500,00C - 1.150,00D - 1.350,00E - 1.450,00. Chapecó: arquivado o processo. DETRAN fez vistorias, onde solicitou preços praticados e analisou alguns contrato

Como faremos os aumentos:

AB - 2090 C - 1200,00

B - 1800 D - 1400,00

A - 1500 E = [...]" (fls. 370-374).

No dia 1º de fevereiro de 2014, extrai-se do referido livro que ficaram estabelecidas algumas metas para o ano, dentre elas a "[...] elaboração de tabelas de preços regionalizadas [...]" (fls. 375-381).

Em 11/3/2014, os denunciados ajustaram nova tabela de preços, nos moldes seguintes (fls. 382-386, reunião com participação dos denunciados Inês, Leandro e Bruno, fl. 383):

AB - 2.292,00A - 1.959,00B - 1.632,00C - 1.250,00D - 1.469,00E - 1.578,00

Além disso, verifica-se das fls. 476, 12563 e 13665 dos autos em apenso, que em dezembro de 2016, em cumprimento a ordem judicial, foram apreendidas as tabelas de preços então praticados pelos Centros de Formação de Condutores envolvidos, das quais se extrai uma diferença mínima (R$ 20,00 na categoria A e R$ 35,00 nas categorias AB e B) entre os valores cobrados por cada empresa para a realização das carteiras de habilitação nas categorias AB, A e B, conforme quadro abaixo:

[...]

O ajuste realizado pelos denunciados fica ainda mais claro pela análise dos contratos firmados pelos CFCs das quais são sócios administradores, juntados às fls. 15-309 dos presentes autos, bem como às fls. 440-16168, dos autos em apenso.

Nesse sentido, veja-se que, nos anos de 2013, 2014, 2015 e 2016, embora o DETRAN tenha fixado os valores mínimos e máximos com significativa diferença (de centenas de reais entre o piso e o teto), os valores praticados pelos denunciados nos Centros de Formação de Condutores de suas propriedades, foram os mesmos ou ao menos muito próximos entre si.

Com efeito, extrai-se dos documentos que seguem em anexo que, nos referidos anos, os valores mínimos e máximos estipulados pelo DETRAN/SC, para a realização da carteira nacional de habilitação, eram os seguintes:

[...]

Contudo, para a realização da habilitação nas categorias AB e B, como já adiantado acima, é visível, pela análise dos contratos apreendidos, o ajuste de valores entabulados entre os denunciados, haja vista que estão padronizados em quantias idênticas ou similares entre si e muitas vezes próximas ao máximo estipulado pelas referidas tabelas, senão vejamos [...] (Evento 51, PET431, autos originários).

Finalizada a instrução, o Magistrado a quo julgou parcialmente procedente o pedido formulado na denúncia, para:

a) absolver Ieda Maria Celuppi das imputações realizadas na denúncia, com fulcro no art. 386, VII, do Código de Processo Penal;

b) condenar o réu Bruno Secondo Celuppi ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por duas medidas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à entidade pública e prestação pecuniária, na importância de 80 (oitenta) salários mínimos, além do pagamento de 12 (doze) dias-multa, cada qual no valor de 2 (dois) salários mínimos vigentes à época dos fatos, pela prática do crime previsto no art. 4º, II, "a", da Lei n. 8.137/90;

c) condenar os réus Wolmir Werno Hetzel e Inês Endrigo Hetzel, cada qual, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por duas medidas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à entidade pública e prestação pecuniária, na importância de 100 (cem) salários mínimos, além do pagamento de 12 (doze) dias-multa, fixados no valor unitário de 2 (dois) salários mínimos vigentes à época dos fatos, pela prática do crime previsto no art. 4º, II, "a", da Lei n. 8.137/90;

d) condenar os réus Leandro Carlos Machado e Sandra Anice Fontana, igualmente, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por duas medidas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à entidade pública e prestação pecuniária, na importância de 120 (cento e vinte) salários mínimos, além do pagamento de 12 (doze) dias-multa, fixados no valor unitário de 2 (dois)...

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