Acórdão Nº 0001056-29.2018.8.24.0023 do Quinta Câmara Criminal, 08-04-2021

Número do processo0001056-29.2018.8.24.0023
Data08 Abril 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0001056-29.2018.8.24.0023/SC



RELATORA: Desembargadora CINTHIA BEATRIZ DA SILVA BITTENCOURT SCHAEFER


APELANTE: ADRIANA CARNEIRO RAMOS (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


O representante do Ministério Público do Estado de Santa Catarina com atuação perante o Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Florianópolis ofereceu denúncia em face de Adriana Carneiro Ramos, dando-a como incursa nas penas do artigo 155, caput, do Código Penal, pela prática do fato delituoso assim narrado (doc. 02/06, evento n. 195):
"No dia 19 de janeiro de 2018, por volta das 16h, a denunciada ADRIANA CARNEIRO RAMOS adentrou o estabelecimento comercial Lojas Millium (rua Conselheiro Mafra n. 338, Centro) e subtraiu para si 01 serrote dobrável, 01 apito, 01 jogo uno, 01 hashi de sushi e 01 faca/utensílio de cozinha (fl. 06), avaliados em aproximadamente R$135,50 (cento e trinta e cinco reais e cinquenta centavos - fl. 10), que estavam expostos à venda, ocultando-os na bolsa que trazia consigo e saindo da loja sem efetuar o devido pagamento pelos produtos. Fato ocorrido em Florianópolis.
Adriana foi capturada por seguranças do estabelecimento comercial, no momento em que abandonava o local com a res subtraída, sendo esta recuperada integralmente".
A denúncia foi recebida em 20 de fevereiro de 2018 (evento n. 17), a ré foi citada (evento n. 22) e apresentou resposta à acusação (evento n. 39), por intermédio da Defensoria Pública.
A defesa foi recebida, e não sendo o caso de absolvição sumária foi designada audiência de instrução e julgamento (evento n. 42).
Durante a instrução foram ouvidas três testemunhas comuns às partes; após, ausente a ré em razão de não ter mantido seu endereço atualizado nos autos, tendo sido devidamente intimada por edital para comparecimento no ato, foi decretada a sua revelia, nos termos do artigo 367, do Código de Processo Penal. (termo de audiência e mídias registradas nos eventos n. 59 e 75).
Encerrada a instrução processual, foram apresentadas as alegações finais (evento n. 82 e 85), e sobreveio a sentença (docs. 454/474, evento n. 195), com o seguinte dispositivo:
"Ante o exposto e do mais dos autos consta, JULGO PROCEDENTE o pedido da denúncia para CONDENAR a ré ADRIANA CARNEIRO RAMOS, filha de Sebastiana Carneiro Ramos e Durval Ramos Sobrinho, nascida em 27/06/1974, devidamente qualificada, dando-a como incursa nas penas do art. 155, caput, c/c § 2º do Código Penal (CP), à pena de 04 (quatro) meses de reclusão em regime aberto, SUBSTITUÍDA por uma restritiva de direito (art. 44), sendo eleito o pagamento de prestação pecuniária (art. 45, § 1º) no valor correspondente a 01 (um) salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, admitido o parcelamento, ser revertido para entidade pública ou privada com destinação social a ser definida na fase de execução da pena." (grifos originais).
Não resignada, a ré interpôs recurso de apelação (eventos n. 134), no qual pleiteia, em síntese, por sua absolvição com base no reconhecimento da atipicidade da conduta praticada à luz do princípio da insignificância. Alternativamente, pugna pelo reconhecimento da tentativa, em sua fração máxima, nos moldes do artigo 14, inciso II, do Código Penal. Ao final, requer a substituição da pena privativa de liberdade por pena exclusiva de multa.
Foram apresentadas as contrarrazões (evento n. 145), e os autos ascenderam a este egrégio Tribunal de Justiça.
Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Henrique Limongi, opinando pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento n. 10, destes autos)

VOTO


Presentes os pressupostos de admissibilidade, o recurso merece ser conhecido.
Cuida-se de apelação criminal interposta por Adriana Carneiro Ramos contra sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito 2ª Vara Criminal da Comarca de Florianópolis, que julgou procedente a denúncia condenando-a à pena privativa de liberdade de 04 (quatro) meses de reclusão em regime aberto, substituída por uma restritiva de direito: o pagamento de prestação pecuniária (art. 45, § 1º) no valor correspondente a 01 (um) salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, admitido o parcelamento, ser revertido para entidade pública ou privada com destinação social a ser definida na fase de execução da pena, por infração ao artigo 155, caput, c/c § 2º do Código Penal.
Consoante sumariado, a douta Defesa pretende a absolvição da recorrente sob o fundamento de atipicidade material da conduta, por entender necessária a incidência do princípio da insignificância ao caso concreto.
Para tanto, argumenta, em suma, que a insignificância do fato independe das condições pessoais da ré, sobretudo quando a conduta praticada não lesionou de forma relevante quaisquer bens jurídicos da vítima que, aliás, foram integralmente restituídos.
Porém, data venia, razão não assiste à Defesa.
A aplicação do princípio da insignificância decorre da boa política criminal, levando-se o direito penal à sua condição de ultima ratio, evitando-se a imposição de penas a quem ofendeu minimamente a ordem social. Todavia, há que se analisar caso a caso, para se ter como possível a incidência.
Nesse sentido, preceitua Fernando Capez:
[...] Segundo tal princípio, o Direito Penal não deve preocupar-se com bagatelas, do mesmo modo que não podem ser admitidos tipos incriminadores que descrevam condutas incapazes de lesar o interesse protegido. Se a finalidade do tipo penal é tutelar um bem jurídico, sempre que a lesão for insignificante a ponto de se tornar incapaz de lesar o interesse protegido, não haverá adequação típica. É que no tipo não estão descritas condutas incapazes de ofender o bem tutelado, razão pela qual os danos de nenhuma monta devem ser considerados fatos atípicos. (Curso de Direito Penal, 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2007. p.11).
Este é o escólio de Cezar Roberto Bittencourt:
"A tipicidade penal exige uma ofensa de alguma gravidade aos bens jurídicos protegidos, pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou interesses é suficiente para configurar o injusto típico. Segundo esse princípio, que Klaus Tiedmann chamou de princípio de bagatela, é imperativa uma efetiva proporcionalidade entre a gravidade da conduta que se pretende punir e a drasticidade da intervenção estatal. Amiúde, condutas que se amoldam ao tipo penal, sob o ponto de vista formal, não apresentam nenhuma relevância material. Nessas circunstâncias, pode-se afastar liminarmente a tipicidade penal porque em verdade o bem jurídico não chegou a ser lesado". (Tratado de direito penal: parte geral. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. v.1. p. 26).
O Supremo Tribunal Federal se manifestou sobre os requisitos necessários para o reconhecimento do benefício:
"O princípio da insignificância incide quando presentes, cumulativamente, as seguintes condições objetivas: (a) mínima ofensividade da conduta do agente, (b) nenhuma periculosidade social da ação, (c) grau reduzido de reprovabilidade do comportamento, e (d) inexpressividade da lesão jurídica provocada. Precedentes: HC 104403/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, 1ª Turma, DJ de 1/2/2011; HC 104117/MT, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, DJ de 26/10/2010; HC 96757/RS, rel. Min. Dias Toffoli, 1ª Turma, DJ de 4/12/2009; RHC 96813/RJ, rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJ de 24/4/2009)." (HC 100367 / RS - rel. Min. Luiz Fux, j. 9.8.2011).
Nessa perspectiva, andou bem o magistrado a quo ao não considerar insignificante a conduta praticada, pois, tendo em vista o valor da res furtivae (a saber: um serrote dobrável, um apito, um jogo de uno, um hashi de sushi, um facão de cozinha), avaliado em R$ 135,50 (doc. 10, evento n. 01), portanto, superior a 10% do salário mínimo vigente à época dos fatos (R$ 954,00 - Decreto n....

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