Acórdão Nº 0001065-25.2019.8.24.0065 do Segunda Câmara Criminal, 20-10-2020

Número do processo0001065-25.2019.8.24.0065
Data20 Outubro 2020
Tribunal de OrigemMaravilha
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão


Agravo de Execução Penal n. 0001065-25.2019.8.24.0065, de Maravilha

Relator designado: Des. Sérgio Rizelo

RECURSO DE AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL. DECISÃO QUE HOMOLOGA PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR NO QUAL FOI RECONHECIDA FALTA GRAVE, QUE DECRETA REGRESSÃO DE REGIME, QUE REVOGA DIAS REMIDOS. RECURSO DO APENADO E QUE ALTERA DATA-BASE. RECURSO DO APENADO.

FALTA GRAVE. ROL TAXATIVO (LEP, ARTS. 50 E 52). POSSE DE FUMO. FALTA MÉDIA (LCE 512/11, ART. 96, XI). DESCLASSIFICAÇÃO.

A conduta de possuir fumo no retorno do trabalho externo não se enquadra na falta grave consistente em inobservar o dever de execução do trabalho, das tarefas e das ordens recebidas, ou em alguma outra prevista no rol taxativo da Lei de Execução Penal, configurando falta média, conforme legislação estadual.

RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Execução Penal n. 0001065-25.2019.8.24.0065, da Comarca de Maravilha (2ª Vara), em que é Agravante Robson Moraes Soares e Agravado o Ministério Público do Estado de Santa Catarina:

A Segunda Câmara Criminal decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e, por maioria, dar-lhe provimento, vencida a Excelentíssima Desembargadora Hildemar Meneguzzi de Carvalho, que lhe negava provimento. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado no dia 20 de outubro de 2020 e presidido pelo Excelentíssimo Desembargador Norival Acácio Engel, as Excelentíssimas Desembargadores Salete Silva Sommariva e Hildemar Meneguzzi de Carvalho.

Florianópolis, 21 de outubro de 2020.

Sérgio Rizelo

Relator DESIGNADO


RELATÓRIO

Trata-se de recurso de agravo de execução penal interposto por Robson Moraes Soares, não conformado com o teor da decisão das fls. 644-648 do PEP 0002165-21.2013.8.24.0034, por meio da qual o Juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Chapecó homologou Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD) em que foi reconhecida falta grave por ele praticada, decretou a regressão de regime de cumprimento da pena do semiaberto para o fechado, revogou 1/3 dos dias remidos e alterou a data-base.

O Agravante informa foi instaurado PAD em seu desfavor, "para apurar suposta falta grave prevista no art. 50, VI, c/c o art. 39, II e V, ambos da LEP", porque, "após retornar da atividade laboral externa, foi detectado em revista (scanner corporal), objeto estranho no estômago, sendo que posteriormente foi encontrado fumo na cela em que ficou alocado separadamente".

Alega que "a conduta praticada deve ser reconhecida, no máximo, como falta média, uma vez que não há previsão legal contrária à posse de fumo por apenados em qualquer dispositivo legal", e que "a própria unidade prisional reconhece como falta média a posse de substâncias proibidas, como portar fumo para confecção de cigarros".

Sob tais argumentos, requer a desclassificação da conduta para falta de natureza média (fls. 1-4).

O Ministério Público ofereceu contrarrazões pelo conhecimento e desprovimento do reclamo (fls. 9-16).

A decisão resistida foi mantida pelo Juízo de Primeiro Grau (fl. 17).

A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Odil José Cota, posicionou-se conhecimento e desprovimento do agravo (fls. 25-29).

Este é o relatório.


VOTO

O recurso preenche os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.

Contra o Agravante Robson Moraes Soares foi instaurado o PAD 208/2019/PACH, porque, no dia 18.8.19, após o retorno do trabalho externo e mediante a submissão a scanner corporal, foi colocado em cela isolada e expeliu 21 buchas de fumo.

Durante o trâmite do PAD, o Agravante foi ouvido na presença de Defensor Público Estadual, que apresentou defesa oral, após o que a Autoridade Administrativa reconheceu a falta grave prevista no art. 50, VI, c/c o 39, V, ambos da Lei de Execução Penal, determinando o envio de cópia ao Juízo da Execução Penal (fls. 611-622 do PEP), o qual, após manifestação das Partes (fls. 626 e 642-643 do PEP), homologou o procedimento e aplicou as sanções de sua competência (fls. 644-648 do PEP).

O Superior Tribunal de Justiça assentou que a apuração e o reconhecimento de falta grave é de competência da Autoridade Prisional, que deve fazê-lo mediante a instauração de PAD em que se observe ampla defesa e contraditório. O tema é alvo da Súmula 533 daquela Corte:

Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito da execução penal, é imprescindível a instauração de procedimento administrativo pelo diretor do estabelecimento prisional, assegurado o direito de defesa, a ser realizado por advogado constituído ou defensor público nomeado.

Na etapa judicial, cabe ao Magistrado o controle judicial de legalidade do PAD e a imposição das sanções que contam com cláusula de jurisdição, segundo positivado no parágrafo único do art. 48 da Lei de Execução Penal ("Nas faltas graves, a autoridade representará ao Juiz da execução para os fins dos artigos 118, inciso I, 125, 127, 181, §§ 1º, letra d, e 2º desta Lei").

Ao especificar os limites do controle de legalidade a que o Poder Judiciário deve submeter a decisão administrativa, o Tribunal da Cidadania deliberou que é permitido ao Juízo da Execução Penal discordar da conclusão do PAD, seja para reconhecer a prática da infração de natureza grave, para absolver o reeducando ou para reclassificar a conduta.

Segundo a Corte Superior, "o condicionamento da atuação do Juízo da Execução à decisão da Comissão Disciplinar implica inaceitável subordinação do Judiciário à Autoridade Administrativa", sendo "certo que a Lei de Execução Penal atribui ao diretor do estabelecimento prisional o poder de apurar e aplicar sanções disciplinares", mas "há faltas que, quando praticadas no curso da execução da pena, geram consequências que extravasam a esfera administrativa da disciplina prisional", como no caso "da determinação da regressão do regime (art. 118, I, da LEP), da perda dos dias remidos (art. 127, da LEP), e da suspensão do benefício de livramento condicional (art. 145, da LEP)", as quais "são medidas concernentes ao controle jurisdicional do cumprimento da pena e que não podem ficar jungidas à discricionária atuação da autoridade administrativa", de modo que "não se pode aceitar a submissão do Judiciário à esfera administrativa, sendo, em todo caso, inafastável o direito constitucional de acesso à jurisdição" (HC 562.478, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 20.2.20).

Na mesma linha:

O acórdão impugnado está em consonância com a Jurisprudência desta Corte que, considerando a independência das esferas administrativa e judicial e, sobretudo, o controle judicial que deve ser exercido sobre as decisões administrativas, permite o reconhecimento da prática de falta grave, independentemente de anterior absolvição no âmbito administrativo (HC 560.146, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, j. 30.3.20).

Também:

I - Segundo restou decidido no REsp n. 1.378.557/RS, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, o poder disciplinar na execução das penas será exercido pela autoridade administrativa a que estiver sujeito o condenado, cabendo ao Diretor da Unidade Prisional apurar a conduta faltosa do detento e realizar a subsunção do fato à norma legal, nos termos dos arts. 47 e 48 da Lei de Execução Penal. II - Em que pese seja da autoridade administrativa (Diretor da Unidade Prisional ou Conselho Disciplinar) a atribuição de apurar e classificar a infração disciplinar, as decisões por ela proferidas são atos administrativos, passíveis, portanto, de controle de legalidade pelo Poder Judiciário, conforme reconhecido no julgamento do REsp. n. 1.378.557/RS. III - Desta forma, uma vez provocado, pode o d. Juízo da Execução verificar a legalidade da decisão e a própria natureza da falta disciplinar, seja para afastar a falta grave, nos casos em que a conduta não se enquadra nas hipóteses taxativamente previstas nos arts. 50 e 52 da Lei de Execução Penal, seja para reconhecê-la, quando constatado que a conduta praticada pelo detento está tipificada em referidos dispositivos, não estando vinculado à decisão do Diretor da Unidade Prisional ou do Conselho Disciplinar. IV - "É possível o controle judicial - pelo Juízo da execução penal - sobre decisão de Conselho Disciplinar que, no uso de suas atribuições, concluiu pelo cometimento de falta disciplinar de natureza média imputada a reeducando do sistema prisional" (HC n. 381.237/MG, Sexta Turma, Relª. Minª. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 23/3/2017). Agravo regimental não provido (AgRg no HC 379.521, Rel. Min. Félix Fischer, j. 19.9.17).

Veja-se, ainda: AREsp 1.635.775, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 26.3.20; REsp 1.789.422, Relª. Minª. Laurita Vaz, j. 26.11.19; AgRg no REsp 1.813.064, Rel. Min. Félix Fischer, j. 25.6.19; HC 418.569, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 26.6.18; e HC 365.431, Relª. Minª. Maria Thereza Assis de Moura, j. 18.10.16.

A liberdade conferida ao Juízo da Execução Penal para avaliar a ocorrência ou não da falta grave encontra amparo na tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal quando da apreciação do tema 941 da repercussão geral:

A oitiva do condenado pelo Juízo da Execução Penal, em audiência de justificação realizada na presença do defensor e do Ministério Público, afasta a necessidade de prévio Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD), assim como supre eventual ausência ou insuficiência de defesa técnica no PAD instaurado para apurar a prática de falta grave durante o cumprimento da pena (RE 972.598, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 4.5.20).

Ainda que a premissa fundamental da tese seja a inexistência de nulidade quando, ausente o PAD, ocorre audiência de justificação em Juízo, ela indiretamente revela a não obrigatoriedade do procedimento, a inexistência de competência exclusiva da Autoridade Administrativa para reconhecimento da infração disciplinar e que não há...

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