Acórdão Nº 0001074-52.2019.8.24.0011 do Quarta Câmara Criminal, 23-06-2022

Número do processo0001074-52.2019.8.24.0011
Data23 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão
Recurso em Sentido Estrito Nº 0001074-52.2019.8.24.0011/SC

RELATOR: Desembargador ALEXANDRE D'IVANENKO

RECORRENTE: JORGE FONTANA (ACUSADO) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo acusado Jorge Fontana, inconformado com a decisão interlocutória mista não terminativa (Evento 120) proferida pelo Juízo da Vara Criminal da comarca de Brusque, que, nos autos da ação penal n. 0001074-52.2019.8.24.0011, julgou admissível a pretensão acusatória materializada pela denúncia e, assim, o pronunciou a julgamento pelo Tribunal do Júri, dando-o como incurso nas sanções do art. 121, §2º, inc. II, c/c art. 14, inc. II, ambos do Código Penal, e do art. 14, "caput", da Lei n. 10.826/2003.

Em síntese, o recorrente, por meio de seu defensor constituído, requereu "a absolvição sumária do acusado, conforme já predito acima, pela imputação que lhe recai, por ser de direito e da mais exata JUSTIÇA, julgando-se improcedente a Denúncia oferecida pelo Ministério Público em desfavor do acusado Jorge Fontana; a reforma da sentença, para impronunciar o acusado pelo crime de tentativa de homicídio qualificado que lhe é imputado, sobretudo levando em consideração a tese de legítima defesa da honra e em homenagem ao princípio do in dubio pro reo, conforme demonstrado exaustivamente no corpo desta peça; Caso o acusado seja levado ao julgamento pelo Tribunal do Júri, ainda que equivocada e injustamente, em entendendo este Tribunal por manter a decisão do Juízo a quo, sejam excluídas todas as qualificadoras previstas no artigo 121, §2º, inciso II, c/c artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal, e artigo 14, caput, da Lei nº 10.826/2003". Para tanto, argumentou que "restando robustamente demonstrada pela instrução processual, plenamente aplicável à espécie a excludente de ilicitude prevista nos artigos 23, 24 e 25 ambos do Código Penal , uma vez que o denunciado agiu em clara legítima defesa de sua honra mediante injusta provocação das supostas vítimas, e imbuído por emoção, por isso, impõe-se a sua absolvição sumária do delito descrito na peça delatória, com amparo na regra capitulada no artigo 415, IV, do Código de Processo Penal, uma vez que a legítima defesa da honra é sabidamente uma excludente, pertencendo sim a honra conforme dispõe a Constituição Federal como sendo parte imaterial do patrimônio do ser humano, para tanto ventilado pela defesa a tese de legítima defesa da honra" (Evento 136).

Com as contrarrazões (Evento 147), e mantida a decisão impugnada por seus fundamentos em atenção ao preconizado no art. 589 do Código de Processo Penal (Evento 161), os autos ascenderam a esta Corte.

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça a Exma. Sra. Dra. Vera Lúcia Coró Bedinoto, que se manifestou pelo conhecimento e não provimento do recurso (Evento 21 - promoção 1).

VOTO

O recurso em sentido estrito concentra as condições objetivas (cabimento, adequação, tempestividade e inexistência de fatos impeditivos ou extintivos do direito recursal) e as subjetivas (interesse jurídico e legitimidade) de admissibilidade, motivo por que deve ser conhecido.

Como visto dos autos da ação penal, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina, por meio da 4ª Promotoria de Justiça da comarca de Brusque, ofereceu denúncia contra JORGE FONTANA, dando-o como incurso nas sanções do art. 121, § 2º , incs. II e IV, na forma do art. 14, inc. II, ambos do Código Penal (por três vezes), e do art. 14, "caput", da Lei 10.826/2003, em razão dos seguintes fatos narrados na peça acusatória (Evento 16):

FATO 1

Segundo consta do incluso procedimento policial, no dia 9 de março de 2019 (sábado), por volta das 20 horas, as vítimas Renato Eduardo Butsch, seu irmão Fabiano Ricardo Butsch e seu filho Eduardo Kauan Butsch (menor) caminhavam pela Rua Alsácia, bairro Alsácia, na cidade de Guabiruba, quando nas proximidades da residência de seu vizinho JORGE FONTANA encontraram um tio e começaram a conversar em voz alta na rua.

Na ocasião, JORGE ouviu que havia uma conversa alta nas imediações e, acreditando que a vítima e seus familiares estavam falando mal de sua pessoa, foi até a frente do imóvel para questioná-los e tirar satisfações sobre as ofensas que pensou ter escutado.

Nesse momento, as vítimas passaram a indagar o denunciado acerca de uma discussão e ameaça que ele havia proferido contra sua mãe naquela manhã, tendo até mesmo usado de uma faca para tal, instante em que JORGE negou as ameaças e adentrou na residência, dizendo: "vou buscar o remédio de vocês". Ato contínuo, o denunciado saiu do interior do imóvel na posse de uma espingarda, calibre 32, e, com evidente animus necandi, ou seja, com o firme propósito de ceifar a vida das vítimas, imbuído por motivo fútil, devido ao fato de acreditar que eles estavam em frente à sua residência falando mal de sua pessoa, JORGE passou a efetuar disparos em direção à família.

Diante dos fatos, a família passou a correr para tentar se esquivar dos tiros, segundo em que perceberam que um dos disparos atingiu o pé da criança Eduardo Kauan Butsch, de 5 anos (Laudo Pericial a ser juntado posteriormente), e os outros disparos atingiram a vítima Renato em ambos os braços, tórax posterior, coxa e região glútea esquerda, causando as lesões descritas no Laudo Pericial n. 9403.19.202 (fl. 36).

Ressalta-se que as lesões causadas na vítima somente não foram a causa eficiente de sua morte, pois conseguiram continuar correndo para se evadir local e, posteriormente, receberam socorro eficiente, sendo que Renato conduzido ao nosocômio, onde recebeu pronto atendimento, livrando-o de mal maior.

Enfatiza-se que o fato de nenhum disparo ter atingido a vítima Fabiano, não livra o denunciado de sua responsabilidade, pois efetuou os disparos em direção à toda família com o firme propósito de atingí-los, os quais saíram correndo desesperadamente do local, somente não concluindo seu intento criminoso por fatores alheios à sua vontade.

Fixa-se que a atitude do denunciado pegou as vítimas de surpresa, porque naquela ocisão eles apenas estava retornando da casa de seus familiares, caminhando e conversando pela rua, não imaginando que sofreriam um ataque desta proporção contra suas vidas, tampouco podendo eles suspeitar que algo pudesse justificar esta ação, o que tornou impossível a sua defesa.

Importantíssimo mencionar que as vítimas estavam completamente desarmadas, não possuindo meios para se defender dos ataques, o que as deixou vulnerável à ira do denunciado.

Dessa forma, o denunciado JORGE tentou matar as vítimas Renato, Fabiano e Eduardo, por motivo fútil e mediante recurso que dificultou ou impossibilitou a sua defesa.

FATO 2

Consta do presente procedimento policial que antes dos acontecimentos narrados no fato 1, o denunciado JORGE FONTANA adquiriu uma arma de fogo, tipo espingarda, marca Rossi, calibre 32, contendo três munições calibre 32, marca CBC (Auto de Exibição e...

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