Acórdão Nº 0001114-66.2022 do null, 17-03-2022

Número do processo0001114-66.2022
Data17 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
Classe processualConsulta
Tipo de documentoAcórdão


ACÓRDÃO



PROCESSO SEI N. 0001114-66.2022.8.24.0710



CONSULTA. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. SITUAÇÕES HIPOTÉTICAS. CAUSAS DE IMPEDIMENTO E SUSPEIÇÃO. NEPOTISMO. ADVOGADO CONSULENTE.



1) CHEFE DE CARTÓRIO CASADA COM ADVOGADO QUE ATUA EM LIDES QUE TRAMITAM NA MESMA UNIDADE JURISDICIONAL EM QUE TRABALHA. INEXISTÊNCIA DE IMPEDIMENTO E/OU DE SUSPEIÇÃO DO MAGISTRADO. POR OUTRO LADO, CHEFE DE SECRETARIA IMPEDIDA DE OPERAR NAS CAUSAS PATROCINADAS PELO CÔNJUGE. EXEGESE DOS ARTS. 144, 148, 149 E 152 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.



2) SERVIDORA CONCURSADA DESTE PODER JUDICIÁRIO FILHA DE CHEFE DE CARTÓRIO. POSSIBILIDADE DE A DESCENDENTE ATUAR EM FUNÇÃO COMISSIONADA NA MESMA COMARCA. SÚMULA VINCULANTE N. 13. VEDAÇÃO AO NEPOTISMO. ADOÇÃO DE CRITÉRIOS OBJETIVOS PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PARA A CARACTERIZAÇÃO DA CONDUTA PROIBIDA. OCUPAÇÃO DE CARGO COMISSIONADO ADMISSÍVEL, DESDE QUE NÃO SUBORDINADO À HIERARQUIA PROFISSIONAL DA ASCENDENTE.



CONSULTA ADMITIDA E RESPONDIDA.



Vistos, relatados e discutidos estes autos de Consulta n. 0001114-66.2022.8.24.0710 em que é consulente Rodrigo Faresin.



O Conselho da Magistratura decidiu, por votação unânime, responder à consulta no sentido de: i) estar hipoteticamente caracterizado o impedimento da Chefe de Cartório para atuar nos processos em que seu cônjuge atue diretamente como causídico da parte, observadas as ressalvas dos parágrafos primeiro e terceiro do art. 144 do CPC; ii) que, em tese, a descendente poderia ocupar cargo em comissão na comarca narrada na situação hipotética, desde que não esteja diretamente subordinada à chefia de sua ascendente.



O julgamento, realizado no dia 14 de março de 2022, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador João Henrique Blasi, e dele participaram a Excelentíssima Senhora Desembargadora Denise Volpato e os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Getúlio Corrêa, Altamiro de Oliveira, Rodolfo Cezar Ribeiro da Silva Tridapalli, Gilberto Gomes de Oliveira, Rubens Schulz, André Carvalho, Gerson Cherem II, Luiz Antônio Zanini Fornerolli e Selso de Oliveira.



Florianópolis, 14 de março de 2022.



Desembargador Rubens Schulz



Relator



RELATÓRIO



Trata-se de Consulta formulada pelo advogado Rodrigo Faresin, com inscrição na OAB/SC de n. 47.397.



A parte consulente relata situações de hipotéticas nomeações de servidores concursados para cargos em comissão nos quadros de servidores deste Poder Judiciário de Santa Catarina.



Para tanto, aponta as seguintes situações fáticas supostas:



1. Magistrado nomeia para a função de Chefe de Cartório servidora que é casada com advogado que atua na mesma comarca em que Magistrado e servidora desempenham suas funções;



2. Na hipótese acima, narra hipoteticamente e questiona se, havendo feitos patrocinados pelo referido advogado conclusos ao Magistrado antes citado, poderia o Juiz atuar nestas lides, sugerindo haver causa de impedimento ou suspeição;



3. Ainda nesta hipótese, questiona se a Chefe de Cartório incide em alguma causa de impedimento;



4. Por fim, aponta situação em que a Chefe de Cartório tem uma filha que tenha sido aprovada em concurso deste Poder Judiciário de Santa Catarina e pergunta se, neste caso, a descendente poderia ocupar cargo comissionado.



Recebidos os fatos e os questionamentos, foram autuados e, então, vieram conclusos.



VOTO



A Consulta foi autuada e encaminhada para apreciação deste r. Órgão consultor segundo determina o art. 6º, parágrafo único, inciso I, alínea 'h', do Regimento Interno do Conselho da Magistratura.



Conhece-se, pois, do pedido de consulta.



O pedido cuida de consulta formulada por advogado que narra situações hipotéticas e sugeridas em que há um Magistrado, uma servidora ocupante do cargo de Chefe de Cartório, um advogado que é cônjuge desta e uma descendente da referida servidora.



Para tanto, questiona se, atuando todos na mesma comarca, haveria impedimento do Magistrado e do servidor; ainda, pergunta se a filha poderia ocupar cargo em comissão neste Poder Judiciário.



Pois bem.



Destaca-se os pedidos em consulta em dois tópicos, separadamente, apenas para fins didáticos.



1 IMPEDIMENTO E SUSPEIÇÃO



No que toca às causas de suspeição e impedimento, as normas de direito processual civil (invocadas inclusive pelo advogado consulente), com a interpretação sistemática que lhe é cabível, conferem a resposta buscada pelo demandante.



A normatização processual civil acerca das hipóteses de impedimento e suspeição pretende que haja a preservação da imparcialidade que é própria dos referidos atores processuais na condução dos processos que estão sob suas respectivas responsabilidades.



Conforme já se decidiu neste Conselho da Magistratura, "a imparcialidade do magistrado constitui-se em princípio de elevada importância à preservação do devido processo legal, e apresenta-se, com efeito, como uma das facetas do princípio do juiz natural, plasmado em nossa Carta Magna. Pressuposto de validade do processo e norteador do magistrado nas causas afetas ao direito processual - quer seja em matéria penal, quer seja em matéria civil - tal princípio consubstancia-se na conduta isenta do julgador. Noutras palavras, pressupõe-se que a conduta do juiz não seja contaminada por fatores alheios à mais correta aplicação do direito, sobretudo de modo a resguardar um julgamento que não se desenrede tendencioso em relação a qualquer das partes" (Consulta n. 2017.900039-4, rel. Des. Ricardo Fontes, j. 13-6-2017).



Dito isto, cumpre destacar que o Código de Processo Civil determina, em seu artigo 144, as hipóteses que constituirão motivo para o reconhecimento de impedimento do Juiz:



Art. 144. Há impedimento do juiz, sendo-lhe vedado exercer suas funções no processo:



I - em que interveio como mandatário da parte, oficiou como perito, funcionou como membro do Ministério Público ou prestou depoimento como testemunha;



II - de que conheceu em outro grau de jurisdição, tendo proferido decisão;



III - quando nele estiver postulando, como defensor público, advogado ou membro do Ministério Público, seu cônjuge ou companheiro, ou qualquer parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive;



IV - quando for parte no processo ele próprio, seu cônjuge ou companheiro, ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive;



V - quando for sócio ou membro de direção ou de administração de pessoa jurídica parte no processo;



VI - quando for herdeiro presuntivo, donatário ou empregador de qualquer das partes;



VII - em que figure como parte instituição de ensino com a qual tenha relação de emprego ou decorrente de contrato de prestação de serviços;



VIII - em que figure como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, mesmo que patrocinado por advogado de outro escritório;



IX - quando promover ação contra a parte ou seu advogado.



§ 1º Na hipótese do inciso III, o impedimento só se verifica quando o defensor público, o advogado ou o membro do Ministério Público já integrava o processo antes do início da atividade judicante do juiz.



§ 2º É vedada a criação de fato superveniente a fim de caracterizar impedimento do juiz.



§ 3º O impedimento previsto no inciso III também se verifica no caso de mandato conferido a membro de escritório de advocacia que tenha em seus quadros advogado que individualmente ostente a condição nele prevista, mesmo que não intervenha diretamente no processo.



Para Maria Helena Diniz, resta configurado o impedimento quando certa demanda "priva o magistrado do exercício de suas funções num certo caso, em razão de sua relação com o objeto da causa" (Dicionário jurídico. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 894).



Já para Guilherme de Souza Nucci, "considera-se impedido de atuar o juiz que é parcial, situação presumida pela lei, em casos específicos. Logo, as hipóteses previstas neste artigo, de caráter objetivo, indicam a impossibilidade de exercício jurisdicional em determinado processo. A sua infração implica inexistência dos atos praticados" (Código de Processo Penal Comentado. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 252).



Já quanto às causas para o reconhecimento da suspeição do Magistrado, determina o art. 145, do Código de Processo Civil:



Art. 145. Há suspeição do juiz:



I - amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes ou de seus advogados;



II - que receber presentes de pessoas...

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