Acórdão Nº 0001117-33.2017.8.24.0019 do Terceira Câmara Criminal, 27-04-2021

Número do processo0001117-33.2017.8.24.0019
Data27 Abril 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0001117-33.2017.8.24.0019/SC

RELATOR: Desembargador GETÚLIO CORRÊA

APELANTE: EURIDIO HARDT (ACUSADO) ADVOGADO: LEANDRO BERNARDI (OAB SC010269) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

O Ministério Público ofereceu denúncia contra Euridio Hardt (58 anos à época dos fatos) pela prática, em tese, do delito de abuso de autoridade (Lei n. 4.898/65, art. 3º, "i"), em razão dos fatos assim narrados:

"No dia 14 de outubro de 2016, por volta das 22 horas e 30 minutos, a Polícia Militar foi acionada via COPOM para atender uma ocorrência de violência doméstica na rua Mendes Castanha, 38, bairro Nova Brasília, Concórdia-SC, tendo como suposta vítima Silvania dos Santos da Silva e como suposto autor das agressões Yuri Marcelo Port Fonseca.

A guarnição da Polícia Militar, composta pelos Policiais Militares Sidinei Schuck e Ivan Bourckhardt, após deslocamento ao endereço acima citado e atendimento da ocorrência, conduziu a vítima e o suposto ofensor à Delegacia de Polícia Civil para as providências legais.

Ato contínuo, já nas dependências da Delegacia de Polícia Civil de Concórdia-SC, situada na rua Dr. Maruri, 1381, centro, Concórdia-SC, por volta das 23 horas e 30 minutos, o denunciado Eurídio Hardt, agente da Polícia Civil em plantão na data dos fatos, ciente da ilicitude e reprovabilidade da sua conduta e mediante abuso de poder, ao encaminhar Yuri Marcelo Port Fonseca para a cela da Delegacia, passou a agredi-lo com chutes e socos, atentando contra sua incolumidade física.

Consigne-se que toda a ação do denunciado Eurídio Hardt foi registrada por meio de uma câmera de videomonitoramento instalada nas dependências da Delegacia (minutos 23:29:41 e 23:30:02 da gravação certificada à fl. 30)." (Evento 9).

A pedido do Ministério Público, deferiu-se medida cautelar diversa da prisão, consistente na proibição de Eurídio manter contato com a vítima Yuri (Evento 16).

A denúncia foi recebida em 05.12.2017 (termo de audiência do Evento 45), ocasião em que houve resposta preliminar por intermédio de defensora constituída. Na mesma audiência, foi proposta - e aceita - a suspensão condicional do processo, mediante as seguintes condições:

"a) não se ausentar da comarca sem autorização judicial por prazo superior a 8 (oito) dias;

b) apresentar-se em Juízo, bimestralmente, para informar suas atividades;

c) pagamento de prestação pecuniária no valor de R$ 4.685,00 (quatro mil, seiscentos e oitenta e cinco reais), parcelado em 15 (quinze) vezes, sendo de R$ 312,33 (trezentos e doze reais e trinta e três centavos) cada parcela [...]. O pagamento da primeira parcela deverá ser efetuado até o dia 05.01.2018 e as demais até o dia 05 (cinco) dos meses subsequentes."

Certificou-se a inexistência de qualquer depósito por parte do demandado (Evento 59) e foi revogado o benefício, determinando-se o prosseguimento do feito (Evento 69).

Apesar de intimado, o acusado deixou de comparecer à audiência de instrução, sendo-lhe decretada a revelia (Evento 93).

Encerrada a instrução, as partes apresentaram alegações finais (Eventos 117 e 122).

Diante da revogação da Lei n. 4.898/65 pela Lei n. 13.869/19, houve conversão do julgamento em diligência, para manifestação das partes sobre a nova adequação típica do fato narrado na denúncia (Evento 126).

Diante disso, o Ministério Público requereu a condenação do réu pela prática do delito tipificado no art. 322 do CP ou, alternativamente, pela contravenção penal estabelecida no art. 21 da LCP (Evento 135); a defesa postulou a absolvição do réu ou a desclassificação para a conduta do art. 21 da Lei de Contravenções Penais (Evento 140).

Sobreveio sentença prolatada pelo Juiz de Direito Cláudio Rego Pantoja, donde se extrai da parte dispositiva:

"Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na denúncia para CONDENAR o acusado EURÍDIO HARDT ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 6 (seis) meses de detenção, em regime aberto, pela infração ao art. 322, do Código Penal.

CONCEDO ao acusado EURÍDIO HARDT o benefício do sursis penal, nos termos e condições da fundamentação.

CONDENO o réu ao pagamento das despesas processuais (CPP, art. 804).

CONCEDO ao réu o direito de recorrer em liberdade, pois desta maneira aguardou a instrução criminal e não se apresentam os requisitos insertos nos arts. 312 e 313 do CPP.

A teor do disposto no art. 201, § 2º, do Código de Processo Penal, comunique-se a vítima sobre a presente sentença." (Evento 167).

Irresignado, Euridio Hardt interpôs recurso de apelação, sustentando: a) preliminarmente, nulidade por afronta ao princípio da imparcialidade (teria o Magistrado utilizado, tão somente, as provas apresentadas pelo Ministério Público); b) atipicidade da conduta diante da "abolitio criminis"; c) absolvição por insuficiência de provas ou desclassificação para a conduta prevista no art. 129, do CP (Evento 185).

Contrarrazões no Evento 191, pela manutenção da sentença.

Em 1º.03.2021, os autos foram encaminhados à douta Procuradoria-Geral de Justiça, que, por parecer do Procurador de Justiça Paulo de Tarso Brandão, manifestou-se pelo desprovimento do recurso (Evento 9 do apelo). Retornaram conclusos em 16.03.2021 (Evento 10 do apelo).

Documento eletrônico assinado por GETULIO CORREA, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 832330v10 e do código CRC 80c3124e.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): GETULIO CORREAData e Hora: 9/4/2021, às 20:20:3





Apelação Criminal Nº 0001117-33.2017.8.24.0019/SC

RELATOR: Desembargador GETÚLIO CORRÊA

APELANTE: EURIDIO HARDT (ACUSADO) ADVOGADO: LEANDRO BERNARDI (OAB SC010269) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

1. Presentes os pressupostos legais, o recurso é conhecido e desprovido.

2. O réu foi condenado pela prática, em tese, do crime de violência arbitrária, assim tipificado no CP:

"Art. 322 - Praticar violência, no exercício de função ou a pretexto de exercê-la:

Pena - detenção, de seis meses a três anos, além da pena correspondente à violência."

3. Em preliminar, a defesa arguiu nulidade absoluta da sentença, pois o Magistrado teria se baseado "unicamente nos argumentos do douto representante do Ministério Público", tendo havido, no seu entender, violação ao sistema acusatório e quebra da imparcialidade (Evento 185).

Improcede o reclamo. Como será visto na análise das provas produzidas (tópico referente à tese absolutória), o juízo de convicção que levou à condenação respeitou o contraditório e a ampla defesa, havendo plena fundamentação no acolhimento da pretensão deduzida na denúncia.

Como dito nas contrarrazões, a propósito:

"[...] ao contrário do que tenta demonstrar a defesa, o resultado "condenação" foi obtido a partir do cotejo entre todo o conjunto conjunto probatório amealhado ao feito, análise natural para a tomada de decisão em qualquer caso." (Evento 191 da ação penal).

Por tais razões, rejeita-se a preliminar.

4. Pontuou a defesa que "seja o apelante absolvido pela revogação do art. 3º, I, da Lei n. 4898/65 e inexistência do princípio da continuidade normativa típica, por estampar a 'abolitio criminis''' (Evento 185).

Novamente não há como se acolher a pretensão.

Como ponderado pelo Procurador de Justiça Paulo de Tarso Brandão em seu parecer:

"A Lei n. 4.898/65 foi revogada pela Lei n. 13.869/19, que não prevê mais como crime de abuso de autoridade a conduta de atentar contra a incolumidade física do indivíduo.

Apesar disso, a conduta continua sendo crime, não mais previsto em lei especial, mas em lei geral, ou seja, no Código Penal.

Isso porque houve a revogação formal do tipo penal do art. 3º, "i", da Lei n. 4.898/65, mas não a material do crime em questão, que, a depender do...

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