Acórdão Nº 0001125-80.2016.8.24.0007 do Quarta Câmara Criminal, 05-03-2020

Número do processo0001125-80.2016.8.24.0007
Data05 Março 2020
Tribunal de OrigemBiguaçu
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Criminal n. 0001125-80.2016.8.24.0007

Relator: Desembargador Sidney Eloy Dalabrida

APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, CAPUT, DA LEI N. 11.343/06). CONDENAÇÃO. RECURSO DA DEFESA.

ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. DEPOIMENTOS FIRMES E COERENTES DOS AGENTES PÚBLICOS. APREENSÃO DE ENTORPECENTE E DINHEIRO, ALÉM DE APARELHO CELULAR COM MENSAGENS RELACIONADAS AO COMÉRCIO ESPÚRIO. CONDENAÇÃO MANTIDA.

DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE PORTE DE DROGAS PARA CONSUMO PESSOAL (ART. 28 DA LEI N. 11.343/06) INCOGITÁVEL. PROVAS COLIGIDAS QUE EVIDENCIAM A NARCOTRAFICÂNCIA. CONDIÇÃO DE USUÁRIO QUE NÃO DESCARACTERIZA O CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS.

RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0001125-80.2016.8.24.0007, da comarca de Biguaçu Vara Criminal em que é Apelante Felipe de Souza Ventura e Apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Quarta Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Desembargador Alexandre d'Ivanenko, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Desembargador Zanini Fornerolli. Funcionou como representante do Ministério Público a Exma. Sra. Dra. Jayne Abdala Bandeira.

Florianópolis, 5 de março de 2020.

Desembargador Sidney Eloy Dalabrida

Relator


RELATÓRIO

Na comarca de Biguaçu, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Felipe de Souza Ventura, imputando-lhe a prática do delito capitulado no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06, pois, segundo consta na inicial:

No dia 10 de maio de 2016, por volta das 23h, na via pública da Rua Solimões, Saveiro, nesta cidade e Comarca, uma guarnição da Polícia Militar abordou o denunciado FELIPE DE SOUZA VENTURA e o usuário Murilo dos Santos Laurindo, enquanto ambos desembarcavam do veículo VW/Gol, placas MBD-6181.

Em tal ocasião, os policiais lograram êxito em encontrar no interior do automóvel 1 (um) cigarro de "maconha", 1 (um) pequeno torrão de "maconha" e a quantia de R$ 247,00 (duzentos e quarenta e sete reais) em dinheiro vivo, todos dentro de uma carteira de cigarros. Próximo do veículo, ainda, encontraram mais um pacote contendo 6 (seis) buchas de "maconha", apresentando massa bruta total de 22,4g (vinte e dois gramas e quatro decigramas), tudo de propriedade do denunciado FELIPE DE SOUZA VENTURA.

Com o denunciado FELIPE DE SOUZA VENTURA foi apreendido, ainda, 1 (um) aparelho celular, da marca Samsung, contendo mensagens sobre a traficância (laudo pericial de fls. 126-133 e 137), e com o usuário fora encontrado 1 (um) cigarro de maconha.

Ou seja, o denunciado FELIPE DE SOUZA VENTURA expôs à venda e transportou as substâncias entorpecentes descritas no laudo de constatação de fl. 17 - as quais não eram para consumo - sem autorização legal ou regulamentar (fls. 138-140).

Finalizada a instrução, o Magistrado a quo julgou procedente o pedido formulado na denúncia, para condenar o réu ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, além do pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa, fixados no mínimo legal, por infração ao art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06 (fls. 268-275).

Inconformado com a prestação jurisdicional, o réu interpôs apelação criminal, mediante a qual postulou a absolvição, sustentando a insuficiência de provas para embasar a condenação e, subsidiariamente, a desclassificação para o crime previsto no art. 28 da Lei de Drogas (fls. 291-303).

Apresentadas as contrarrazões (fls. 310-319), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do Exmo. Dr. Jorge Orofino da Luz Fontes, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do reclamo (fls. 327-333).

VOTO

Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, o apelo deve ser conhecido.

1 Absolvição

O apelante pretende a absolvição ao argumento de que apenas o cigarro de maconha apreendido no veículo lhe pertencia, porém era destinado ao consumo.

Sem razão.

O crime de tráfico de drogas encontra-se previsto no art. 33, caput, da Lei de Drogas, in verbis:

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.

Impende destacar, inicialmente, que, para a configuração do delito em apreço, é prescindível que o réu tenha posse direta da droga no momento da prisão, "sendo suficiente outras provas que possam conduzir à certeza da sua responsabilidade pelo material tóxico apreendido" (Apelação Criminal n. 33.039, de São José, rel. Des. Álvaro Wandelli, j. em 12/5/1995).

Assim, ainda que parte das drogas não tenha sido apreendida na posse direta do réu, a imputação do crime de tráfico irá depender da existência de nexo etiológico entre eles (drogas e acusado).

Sobre a matéria, já foi decidido:

APELAÇÃO CRIMINAL - CRIMES DE TRÁFICO, ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS (LEI N. 11.343/06, ART. 33, CAPUT, ART. 35, CAPUT) E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO E MUNIÇÕES (LEI N. 10.826/03, ART. 16, CAPUT) - SENTENÇA CONDENATÓRIA QUANTO AOS CRIMES DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO E MUNIÇÕES - INSURGÊNCIA DA DEFESA. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO DE AMBOS OS DELITOS - ALEGADA INEXISTÊNCIA DE PROVAS DA LIGAÇÃO DO ACUSADO COM AS SUBSTÂNCIAS ILÍCITAS, O ARTEFATO BÉLICO E AS MUNIÇÕES - DEPOIMENTO DOS AGENTES PÚBLICOS, RELATOS DE INFORMANTES QUE EVIDENCIAM A PRÁTICA DO CRIME - ADEMAIS, DESNECESSIDADE DA POSSE DIRETA DO RÉU COM OS OBJETOS DO CRIME - NEXO ETIOLÓGICO ENTRE O RÉU, A DROGA, A ARMA E AS MUNIÇÕES DEMONSTRADO - CONDENAÇÃO MANTIDA. O fato de os objetos dos crimes não terem sido apreendidos na posse direta do apelante, não restringe a este a demonstração da materialidade delitiva, de modo a ensejar a sua absolvição. DOSIMETRIA QUE NÃO MERECE REPAROS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO (TJSC, Apelação n. 0016559-55.2014.8.24.0080, de Xanxerê, rel. Des. Salete Silva Sommariva, Segunda Câmara Criminal, j. em 1º/12/2015 - grifou-se).

Ainda:

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA A SAÚDE, A INCOLUMIDADE E A FÉ PÚBLICAS E CONTRA O PATRIMÔNIO. TRÁFICO DE DROGAS, ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO, USO DE DOCUMENTO FALSO E RECEPTAÇÃO (ARTS. 33, CAPUT, E 35, CAPUT, AMBOS DA LEI N. 11.343/2006, ARTS. 297, CAPUT, C/C O 304 E ART. 180, CAPUT, TODOS DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. CONDENAÇÃO DE TODOS OS ACUSADOS PELO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS (COM A INCIDÊNCIA DO AUMENTO DE PENA DO ART. 40, VI, DA LEI ANTITÓXICOS [...]. PLEITO ABSOLUTÓRIO. NÃO ACOLHIMENTO. MATERIALIDADE, AUTORIA E CULPABILIDADE DEVIDAMENTE COMPROVADAS NO TOCANTE A AMBOS OS RECORRENTES QUANTO AOS DELITOS PERPETRADOS. REVELADO COMÉRCIO ILEGAL, PRINCIPALMENTE DE MACONHA E COCAÍNA. APREENSÃO DE GRANDE QUANTIDADE DE AMBOS OS ENTORPECENTES NA RESIDÊNCIA DE GUSTAVO, DE MONCRIS, NA AUTOLAVAÇÃO DE PROPRIEDADE DO PRIMEIRO E GERENCIADA PELO SEGUNDO E TAMBÉM NA CASA DOS AVÓS DE GUSTAVO. NEXO ETIOLÓGICO COM OS NARCÓTICOS DEMONSTRADO. DROGAS QUE TOTALIZAM MAIS DE ONZE QUILOS DE MACONHA E DE UM QUILO DE COCAÍNA. OUTROSSIM, APREENSÃO DE BALANÇA DE PRECISÃO E BLOCOS COM ANOTAÇÕES RELATIVAS À CONTABILIDADE DO MERCADEJO. GUSTAVO QUE CONFIRMOU, EM PARTE, A PRÁTICA DO COMÉRCIO ESPÚRIO. DELAÇÃO DE CORRÉU E DO PRÓPRIO MONCRIS NA FASE POLICIAL, COM CALÇO NA PROVA JUDICIALIZADA. [...] RECURSOS CONHECIDOS, O DE TAMIRES APENAS EM PARTE, E DESPROVIDOS (TJSC, Apelação Criminal n. 0000988-59.2016.8.24.0020, de Criciúma, rel. Des. Leopoldo Augusto Brüggemann, Terceira Câmara Criminal, j. em 28/11/2017 - grifou-se).

A materialidade do crime ficou devidamente comprovada por meio do boletim de ocorrência (fls. 2-3), termo de exibição e apreensão (fl. 15) e laudo de constatação da substância entorpecente firmado por perito criminal (fl. 17), bem como pelo laudo pericial do aparelho celular do apelante (fls. 126-132).

No tocante ao exame pericial definitivo da substância ilícita, como bem pontuado pelo magistrado a quo, embora possa se considerar como imprescindível para a condenação pelo crime de tráfico de drogas, entende-se que, em situações excepcionais, a materialidade pode ser aferida por meio do laudo de constatação, quando presente grau de certeza compatível com a perícia definitiva.

Nesse sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL PENAL E PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO. NÃO CABIMENTO. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. AUSÊNCIA DE LAUDO TOXICOLÓGICO DEFINITIVO. ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. [...] 3. Somente em situação excepcional poderá a materialidade do crime de drogas ser suportada por laudo de constatação, quando permita grau de certeza idêntico ao do laudo definitivo, pois elaborado por perito oficial, em procedimento e com conclusões equivalentes. [...] (HC n. 350.996/RJ, rel. Min. Nefi Cordeiro, j. em 24/8/2016, DJe de 29/8/2016).

Esta é a situação dos autos.

Extrai-se do caderno processual que o Laudo de Constatação foi assinado pela Perita Criminal Vânia Rita...

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