Acórdão Nº 0001147-98.2014.8.24.0043 do Primeira Câmara Criminal, 15-06-2023

Número do processo0001147-98.2014.8.24.0043
Data15 Junho 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0001147-98.2014.8.24.0043/SC



RELATOR: Desembargador PAULO ROBERTO SARTORATO


APELANTE: CRISTIANO CECON APELANTE: ALEX JUNIOR FAGUNDES DA ROSA APELANTE: WILLIAN MARKWARDT ARONES APELANTE: ZENAIR TONEZER APELANTE: VILSON CLAUDENIR JESUINO FREIRE APELANTE: IRINEU OTTO BORNHOLDT APELANTE: DANIEL BORIN APELANTE: DANIEL STRIEDER APELANTE: ESTEFAN RODRIGUES MARTINS APELANTE: MARCELO BEHLING APELANTE: GENUIR COSTACURTA APELANTE: ALEXANDRE POHLMANN APELANTE: SIDNEI GAIARDO APELANTE: ODIRLEI POLIS APELANTE: ANDRE AIRES CHIESA APELANTE: RICARDO MAURICIO PEREIRA APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA RÉU: OS MESMOS


RELATÓRIO


Os representantes do Ministério Público da Comarca de Mondaí, com base no incluso Procedimento Investigatório Criminal, ofereceram denúncia em face de: a) Irineu Otto Bornholdt, Vilson Claudenir Jesuino Freire e Alexandre Pohlmann, imputando-lhes os crimes do art. 2º, caput e § 3º, da Lei n. 12.850/13, art. 272, caput e § 1º-A, do Código Penal, por onze vezes, art. 299 do Código Penal, por treze vezes, e art. 7º, inciso IX, da Lei n. 8.137/90, c/c art. 18, § 6º, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor; b) Zenair Tonezer, Willian Markwardt Arones, Daniel Strieder e Estefan Rodrigues Martins, imputando-lhes o crime descrito no art. 2º da Lei n. 12.850/13; c) Genoir Costacurta, imputando-lhe os crimes previstos no art. 2º da Lei n. 12.850/13, art. 272, caput e § 1º-A, do Código Penal, por onze vezes, e art. 299 do Código Penal, por treze vezes; d) André Aires Chiesa, imputando-lhe os crimes previstos no art. 2º da Lei n. 12.850/13, art. 272, caput e § 1º-A, do Código Penal, por uma vez, e art. 299 do Código Penal, por uma vez; e) Cristiano Cecon e Ricardo Maurício Pereira, imputando-lhe os crimes previstos no art. 2º da Lei n. 12.850/13, no art. 272, caput e § 1º-A, do Código Penal, por três vezes, e no art. 299 do Código Penal, por três vezes; f) Odirlei Polis, imputando-lhe os crimes previstos no art. 2º da Lei n. 12.850/13, e no art. 272, caput e § 1º-A, do Código Penal, por três vezes; g) Sidnei Gaiardo, imputando-lhe os crimes previstos no art. 2º da Lei n. 12.850/13, art. 272, caput e § 1º-A, do Código Penal, por duas vezes, e art. 299 do Código Penal, por duas vezes; h) Marcelo Behling, imputando-lhe os crimes previstos no art. 2º da Lei n. 12.850/13, art. 272, caput e § 1º-A, do Código Penal, por uma vez, e art. 299 do Código Penal, por duas vezes; i) Daniel Borin, imputando-lhes os crimes do art. 2º da Lei n. 12.850/13, art. 272, caput e § 1º-A, do Código Penal, por uma vez, e art. 7º, inciso IX, da Lei n. 8.137/90, c/c art. 18, § 6º, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor; j) Aléx Júnior Fagundes da Rosa, imputando-lhe os crimes previstos no art. 2º da Lei n. 12.850/13, e no art. 272, caput e § 1º-A, do Código Penal, por uma vez, estando os réus devidamente qualificados nos autos, aplicado o concurso material em relação a todos os crimes, por conta dos seguintes fatos assim narrados (Evento 5, DENUNCIA393/441, dos autos da ação penal):
I. DOS FATOS RELATIVOS À OPERAÇÃO "LEITE ADULTERADO II"
Inicialmente, conveniente traçar um breve histórico da investigação realizada no incluso Procedimento Investigatório Criminal, a fim de facilitar a correta compreensão dos fatos ora analisados.
A presente investigação foi instaurada em decorrência do compartilhamento de dados do Ministério da Agricultura, Pecuniária e Abastecimento (MAPA), os quais indicavam a prática habitual de adulteração de leite bovino por parte da empresa Laticínios Mondaí Ltda.
Assim, após aproximadamente 6 (seis) meses de diligências e medidas cautelares, tais como interceptação de comunicações telefônicas e quebra de sigilo de dados (0000514-87.2014.8.24.0043), quebra de sigilo fiscal (autos n. 0000515-72.2014.8.24.0043), buscas e apreensões (autos n. 0001073-44.2014.8.24.0043) e prisões preventivas (autos n. 0001074-29.2014.8.24.0043), foi possível ter a noção exata da estrutura hierárquica da organização criminosa, bem como de delitos praticados pelos denunciados.
Nesse contexto, restou devidamente apurado que os denunciados integram e/ou integraram organização criminosa estruturada há pelo menos 6 (seis) anos no interior da empresa Laticínios Mondaí Ltda. destinada à prática de adulteração de leite bovino mediante adição de produtos químicos e também à prática de falsificação ideológica, atividades nas quais, enquanto os integrantes hierarquicamente superiores coordenavam e determinavam as ilicitudes realizadas, gerentes e intermediários eram responsáveis por dirigir as práticas ilícitas, que eram executadas por funcionários das plataformas de carregamento do leite e do laboratório, conforme será explicitado.
Dito isso, passa-se à análise dos fatos imputados aos réus.
II - DA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA
Segundo consta dos autos, os denunciados IRINEU OTTO BORNHOLDT (sócio-administrador da Laticínios Mondaí Ltda.), VILSON CLAUDENIR JESUINO FREIRE (sócio-administrador da Laticínios Mondaí Ltda.), ALEXANDRE POHLMANN (gerente comercial da Laticínios Mondaí Ltda.), RICARDO MAURICIO PEREIRA (gerente industrial da Laticínios Mondaí Ltda.), ZENAIR TONEZER (gerente de produção da empresa), GENOIR COSTACURTA ("chefe" da plataforma - laboratoristas - da Laticínios Mondaí Ltda.), ANDRÉ AIRES CHIESA ("chefe" dos motoristas da Laticínios Mondaí Ltda.), WILLIAM MARKWARDT ARONES (técnico de campo da empresa), CRISTIANO CECCON (plataforma/laboratorista da Laticínios Mondaí Ltda.), ODIRLEI POLIS (plataforma/laboratorista da Laticínios Mondaí Ltda.), SIDNEI GAIARDO (plataforma/laboratorista da Laticínios Mondaí Ltda.), MARCELO BEHLING (plataforma/laboratorista da Laticínios Monda Ltda.), DANIEL BORIN (responsável técnico da Laticínios Mondai Ltda.), DANIEL STRIEDER (plataforma/laboratorista da Laticínios Mondai Ltda.), ESTEFAN RODRIGUES MARTINS (plataforma/laboratorista da Laticínios Mondai Ltda.) e ALÉX JÚNIOR FAGUNDES DA ROSA(plataforma/laboratorista da Laticínios Mondai Ltda.) integravam organização criminosa hierarquizada e especializada na adulteração de leite bovino destinado ao consumo humano, instalada no interior da empresa Laticínios Mondai Ltda., localizada no Município de Mondaí/SC, bem como na distribuição do leite adulterado, na fabricação de derivados dele e na inserção de dados falsos em planilhas de análise da qualidade do leite.
Assim, enquanto a empresa realizava suas atividades, muitas delas licitas, havia uma célula em seu interior (integrada apenas por alguns dos diretores e funcionários) destinada especificamente a coordenar e executar a realização de crimes, notadamente a adulteração de produtos alimentícios e a falsidade ideológica, havendo inclusive determinação para que assuntos relacionados a tal célula fossem tratados apenas entre seus membros.
Durante os cerca de seis meses de investigação, foi apurada a prática rotineira de adição de produtos químicos ilícitos ao leite cru refrigerado, com a finalidade principal de mascarar a má qualidade do leite (notadamente a acidez elevada, fora dos padrões exigidos pelas normas técnicas pertinentes) e. assim, minimizar perdas e obter maior lucro com a atividade comercial, uma vez que tal leite era distribuído para outras empresas.
Com efeito, considerando a distância a ser percorrida pelos caminhões (geralmente bitrem ou "vanderleias") - cerca de 25 (vinte e cinco) horas - até chegar ao local da entrega do produto distribuído e por ser o produto transportado considerado de alta perecibilidade, os denunciados Inseriam no leite bovino cru substâncias químicas não permitidas, com o fim de mascarar a qualidade do leite distribuído, notadamente reduzindo ou eliminando perdas por força do descarte de leite impróprio, porém causando a consequente diminuição de seu valor nutricional e tornando-o nocivo à saúde humana.
Sem prejuízo, também havia a adição de produtos químicos para reduzir a acidez do leite que era destinado à fabricação de derivados do leite, o que era realizado na fábrica existente na empresa.
Com o regular decurso das investigações realizadas, verificou-se claramente o procedimento realizado pela organização criminosa, o qual consistia em adicionar, indevidamente, ao leite in natura, produtos químicos para dois propósitos principais: primeiramente, a fraude por adição de "neutralizantes de acidez", hipótese em que eram adicionados produtos para inibir a multiplicação bacteriana que leva à acidez do leite ou, ainda, para aumentar o pH de um leite já ácido, visando a conferir maior durabilidade ao produto impróprio para o consumo, caso em que eram utilizados peróxido de hidrogênio (água oxigenada) e hidróxido de sódio (soda cáustica) no leite; em segundo lugar, para aumentar o volume do leite, era adicionada água ou soro de leite, seguido da utilização de produtos classificados como "reconstituintes de densidade", principalmente o etanol (álcool).
Assim, a organização criminosa trabalhava sigilosamente de maneira a evitar quaisquer perdas do produto (leite cru), utilizando substâncias não permitidas e adulterando as características naturais do alimento, a fim de que este tivesse uma maior "durabilidade" por meio de adição de estabilizantes impróprios para o consumo humano, prevenindo a ocorrência do chamado leite ácido, o qual possui sua venda proibida.
Impende ressaltar, ainda, que a organização criminosa trabalhava de modo a impossibilitar eventual flagrante das inserções dos produtos irregulares no leite, especialmente no que tange às substâncias peróxido de hidrogênio e hidróxido de sódio, as quais têm uma rápida volatilização, praticamente impossibilitando a detecção pelas equipes de fiscalizações.
O esquema montado pelos criminosos era liderado pelos sócios proprietários da empresa, os denunciados IRINEU OTTO BORNHOLDT e VILSON CLAUDENIR JESUINO FREIRE, os quais tinham controle final e o...

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