Acórdão Nº 0001166-26.2016.8.24.0014 do Primeira Câmara Criminal, 23-01-2020

Número do processo0001166-26.2016.8.24.0014
Data23 Janeiro 2020
Tribunal de OrigemCampos Novos
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Criminal n. 0001166-26.2016.8.24.0014, de Campos Novos

Relator: Desembargador Paulo Roberto Sartorato

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA A PESSOA. AMEAÇA (ART. 147, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL) E INJÚRIA QUALIFICADA POR PRECONCEITO DE RAÇA E COR (ART. 140, § 3°, DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. MANIFESTAÇÃO DA PROCURADORIA DE JUSTIÇA. ALEGAÇÃO DE AFRONTA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. ACOLHIMENTO. DEFESA QUE, NA PEÇA RECURSAL, ALÉM DE TRAZER NOVOS ARGUMENTOS, FAZ REMISSÃO AO CONTEÚDO DAS ALEGAÇÕES FINAIS, SEM SEQUER PROCEDER À REPETIÇÃO DESTE. CIRCUNSTÂNCIA QUE DIFERE DAQUELA EM QUE HÁ A REPRODUÇÃO DAS TESES. NÃO CONHECIMENTO DA APELAÇÃO NESSE PONTO. ENFRENTAMENTO, TODAVIA, DO PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA, ARGUIDO NAS ALEGAÇÕES FINAIS, POR TRATAR-SE DE MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. PRESCRIÇÃO, DE QUALQUER MODO, NÃO VERIFICADA. PRAZOS DE 03 (TRÊS) E 04 (QUATRO) ANOS NÃO DECORRIDOS ENTRE AS CAUSAS INTERRUPTIVAS. MÉRITO RECURSAL. PRETENDIDA A ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. OCORRÊNCIA DOS DELITOS E SUA AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS. PALAVRAS DA VÍTIMA E DE INFORMANTE HARMÔNICAS E COERENTES. RÉU QUE, PROFERINDO PRENÚNCIOS RACISTAS E INTIMIDADORES, OFENDE A HONRA DA VÍTIMA E A ATEMORIZA. DELITOS DE NATUREZA FORMAL. DOLO DEMONSTRADO. CONDENAÇÃO MANTIDA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. Ofende a dialeticidade recursal a mera remissão, nas razões de insurgência, aos argumentos invocados nas alegações finais, sem que haja sequer a repetida exposição destes.

2. Não se verifica a prescrição da pretensão punitiva estatal quando, entre os marcos interruptivos, não decorre lapso temporal suficiente para tal, nos termos dos artigos 109 e 110 do Código Penal.

3. Não havendo dúvidas de que o acusado, na clara intenção de humilhar, bem como intimidar a vítima, ofendendo-a em sua honra subjetiva, proferiu palavras injuriosas, valendo-se de elementos referentes a raça e cor, anunciando, ainda, que iria lhe causar um mal injusto e grave, configurados estão os crimes delineados no art. 140, § 3º, e art. 147, ambos do Código Penal.





Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0001166-26.2016.8.24.0014, da comarca de Campos Novos (Vara Criminal), em que é Apelante Claocir Seibel e Apelado o Ministério Público do Estado de Santa Catarina:





A Primeira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer em parte do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, o Exmo. Des. Carlos Alberto Civinski e a Exma. Desa. Hildemar Meneguzzi de Carvalho.

Funcionou na sessão pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Dr. Paulo de Tarso Brandão.

Florianópolis, 23 de janeiro de 2020.



Assinado digitalmente

Desembargador Paulo Roberto Sartorato

Presidente e Relator





RELATÓRIO

O representante do Ministério Público, com base no incluso Termo Circunstanciado, ofereceu denúncia contra Claocir Seibel, devidamente qualificado nos autos, dando-o como incurso nas sanções do art. 140, § 3º, c/c art. 147, caput, ambos do Código Penal, pelos fatos assim narrados na preambular acusatória, in verbis (fl. 01):


No dia 17 de março de 2016, por volta das 09h30min., o ora denunciado Claocir Seibel dirigiu-se até à Linha Santa Rita, Loteamento Santa Rita, no Município de Vargem/SC, ocasião em que injuriou a vítima Mário Nazário, a qual se encontrava trabalhando no local, ao chamá-lo de "vagabundo, nego sem vergonha e filho da puta", utilizando assim, elementos referentes à raça e cor em desfavor do ofendido. Ato contínuo, na mesma oportunidade, o denunciado ameaçou a vítima de lhe causar mal injusto e grave, na medida em após injuriar o aludido proferiu "que se a vítima ou alguém de sua família passasse pela estrada iria dar morte".


Encerrada a instrução processual, o MM. Juiz a quo julgou procedente a denúncia, condenar o acusado: a) à pena privativa de liberdade de 01 (um) ano de reclusão, em regime aberto, bem como ao pagamento de 10 (dez) dias multa, no valor unitário mínimo legal, por infração ao art. 140, § 3°, do Código Penal, e b) à pena de 01 (um) mês de detenção, em regime aberto, pela prática do delito tipificado no art. 147 do Código Penal, substituindo as reprimendas corporais por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e em limitação de final de semana (fls. 92/104).

Inconformada, a defesa do acusado interpôs recurso de apelação (fl. 114). Em suas razões recursais, requereu o provimento absolutório, sob o argumento de insuficiência probatória, nos termos do art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal (fls. 125/129).

Em contrarrazões, o Ministério Público pugnou pelo conhecimento e não provimento do recurso defensivo (fls. 133/136).

Após, os autos ascenderam a esta Superior Instância, tendo a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Dr. Marcílio de Novaes Costa, opinado pelo parcial conhecimento (deixando-se de conhecer das insurgências repisadas das alegações finais, por afronta ao princípio da dialeticidade recursal) e, no mérito, pelo desprovimento do recurso (fls. 145/148).

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação criminal contra a sentença que julgou procedente a denúncia para condenar o acusado Claocir Seibel pela prática dos crimes de injúria racial e ameaça, tipificados nos arts. 140, § 3º, e 147, ambos do Código Penal.

Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, o recurso merece ser conhecido, ao menos parcialmente, conforme adiante se verá.

Isso porque o acusado, em suas razões recursais, preliminarmente, faz remissão às teses deduzidas nas alegações finais, requerendo que estas também venham a integrar o conteúdo da insurgência.

Acerca desse pedido, manifestou-se a douta Procuradoria de Justiça pelo não conhecimento do recurso nesse ponto, por ofensa ao princípio da dialeticidade recursal, já que não enfrentados, ao menos indiretamente, os fundamentos da sentença.

Com razão o Órgão Ministerial.

É que, "[...] Em não se tratando sequer de reiteração dos argumentos expendidos noutra peça processual, mas de mera remissão às alegações finais, o recurso carece da mínima fundamentação de fato e/ou de direito. Com as razões da sentença não impugnadas, a manifestação da vontade de recorrer se esvazia, há infringência do princípio da dialeticidade, consequente violação ao postulado contraditório e, assim, exsurge obstáculo intransponível para a apreciação da causa por esta Corte de Justiça" (TJSC - Apelação Criminal n. 0014707-16.2013.8.24.0020, de Criciúma, Terceira Câmara Criminal, Rel. Des. Ernani Guetten de Almeida, j. em 06/03/2018).

Para corroborar:


APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL (ART. 217-A, "CAPUT", NA FORMA DO ART. 71, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PRELIMINAR. REMISSÃO ÀS TESES CONSTANTES DAS ALEGAÇÕES FINAIS. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. NÃO CONHECIMENTO, NO PONTO. [...]. (TJSC - Apelação Criminal n. 0000278-90.2016.8.24.0003, de Anita Garibaldi, Primeira Câmara Criminal, Rel. Des. Norival Acácio Engel, j. em 12/04/2018).


Assim, não deve ser conhecido o apelo nesse ponto.

Todavia, analisando-se as alegações finais defensivas, vê-se que o acusado nelas deduziu pedido relativo ao reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva pela pena em concreto, o qual, por tratar-se de matéria de ordem pública, deve ser enfrentado no presente acórdão, ainda que de ofício.

Desse modo, passa-se ao exame da referida tese.

I - Da alegada prescrição da pretensão punitiva

Sobre o tema, inicialmente, cumpre anotar que a prescrição da pretensão punitiva, sendo causa extintiva de punibilidade, deve, no caso de concurso de crimes, ser analisada em relação à pena de cada um, isoladamente (artigo 119 do Código Penal).

In casu, o acusado fora condenado: pela prática do crime descrito no art. 140, § 3º, do Código Penal à pena de 01 (um) ano de reclusão, e pelo cometimento do delito tipificado no art. 147 do mesmo Estatuto Repressivo, à reprimenda de 01 (um) mês de detenção.

Elencada pelo art. 107 do Código Penal como uma das causas de extinção da punibilidade, a prescrição acarreta ao Estado a perda do direito de punir ou de impor a execução da pena.

Nesse contexto, prevê o art. 110, § 1º, do Código Penal prevê que, quando transitada em julgado a sentença condenatória para a acusação, passará a contar como parâmetro, para fins de prescrição da pretensão punitiva, a pena aplicada em concreto, que, por sua vez, deverá ser confrontada com a relação de correspondência traçada pelo art. 109 do mesmo diploma legal, a fim de se verificar o prazo prescricional em cada caso.

O Supremo Tribunal Federal, a propósito, sanando quaisquer eventuais dúvidas, sedimentou, por meio da Súmula 146, que "A prescrição da ação penal regula-se pela pena concretizada na sentença, quando não há recurso da acusação".

Trata-se da prescrição da pretensão punitiva relacionada à pena aplicada in concreto, quando há trânsito em julgado para a acusação ou desde que desprovido seu recurso, que, excetuadas as hipóteses de júri, pode ocorrer, segundo a atual redação do art. 110, entre o recebimento da denúncia e a publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis (prescrição retroativa) ou, ainda, entre estes e seu trânsito em julgado (prescrição intercorrente, subsequente, ou, ainda, retroativa intercorrente).

Assim, já que o réu, na hipótese, foi condenado a penas individuais de 01 (um)...

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