Acórdão Nº 0001195-37.2011.8.24.0019 do Terceira Câmara de Direito Público, 01-02-2022

Número do processo0001195-37.2011.8.24.0019
Data01 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0001195-37.2011.8.24.0019/SC

RELATOR: Desembargador JÚLIO CÉSAR KNOLL

APELANTE: MUNICÍPIO DE CONCÓRDIA/SC (RÉU) APELADO: COMPUFOUR SOFTWARE LTDA (AUTOR) ADVOGADO: MICHEL POY OLMI (OAB SC018347) MP: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA INTERESSADO: MAXIMILIANO ZAMBONATTO PEZZIN (INTERESSADO) ADVOGADO: NORAH VON BIVENICZKO PEZZIN

RELATÓRIO

Perante a 2ª Vara Cível da comarca de Concórdia, Compufour Software Ltda, devidamente qualificado, por intermédio de procurador habilitado, com fulcro nos permissivos legais, promoveu Ação Anulatória de Débito em desfavor daquele município.

Relatou que o fisco municipal está lhe exigindo, a título de Imposto Sobre a Prestação de Serviços de Qualquer Natureza, o valor de R$ 663.757,40 (seiscentos e sessenta e três mil setecentos e cinquenta e sete reais e quarenta centavos), no entanto, defende que as suas operações correspondem ao fato gerador do ICMS.

Requereu a anulação do lançamento inserto nas notificações n. 256 e 257 de 2010.

Devidamente citada, a parte adversa apresentou contestação, rechaçando os argumentos expostos na exordial.

Réplica.

Instruído o feito, as partes se manifestaram.

Sentenciando, o MM. Juiz, Dr. Marcus Vinicius Von Bittencourt, decidiu:

"Assim, ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos, com resolução do mérito, fulcrado no artigo 487, I, do Código de Processo Civil, para:

"- Reconhecer a incidência do ICMS sobre o fato gerador decorrente das operações mercantis realizadas;

"- Declarar inexigível o Crédito Tributário Municipal relativo ao ISS, determinando o cancelamento das notificações fiscais e do lançamento do ISS relativo aos anos de 2008 e 2009.

"Condeno o Réu ao pagamento dos honorários advocatícios, estes fixados na base de 8% (oito por cento) sobre o proveito econômico obtido (R$ 663.757,40 - seiscentos e sessenta e três mil setecentos e cinquenta e sete reais e quarenta centavos), nos moldes do artigo 85, §§ 2º e 3º, inciso II, do Código de Processo Civil.

"O Réu é isento das despesas processuais.

"Publique-se.

"Registre-se.

"Intimem-se.

"Transitada em julgado, arquive-se.

"Cumpra-se."

Malcontente com a prestação jurisdicional entregue, o Município de Concórdia opôs Embargos de Declaração, os quais foram rejeitados.

O ente público opôs novos aclaratórios, que também foram rechaçados.

Inconformada, a tempo e modo, a municipalidade interpôs Recurso de Apelação.

Em suas razões, sustentou, em apertada síntese, que está exigindo a tributação sobre o fato gerador de "licenciamento ou cessão de uso de software e não a produção ou venda de software não-customizável", motivo pelo qual a sentença merece reforma.

Com a contraminuta, os autos ascenderam a este Tribunal e foram encaminhados à douta Procuradoria-Geral de Justiça, ocasião em que lavrou parecer o Exmo. Dr. Carlos Alberto de Carvalho da Rosa, manifestando-se pela ausência de interesse público.

Vieram-me conclusos em 25/11/2021.

É o relatório.

VOTO

Porque preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do inconformismo.

Trata-se de recurso de apelação cível interposto pelo Município de Concórdia com o desiderato de reformar a sentença que julgou procedentes os pedidos formulados por Compufour Software Ltda, para tornar inexigível o ISS sobre suas operações.

Narrou que o fisco lhe atribuiu a prática de operações de "licenciamento de programas de computador não customizáveis" e está lhe exigindo o Imposto Sobre a Prestação de Serviços de Qualquer Natureza, referente aos exercícios financeiros de 2008 e 2009, correspondente a R$ 663.757,40 (seiscentos e sessenta e três mil setecentos e cinquenta e sete reais e quarenta centavos).

Disse que desde 1995 desenvolve o software "aplicativos comerciais", inicialmente voltado apenas para pessoas jurídicas, e, posteriormente, em 2007 tendo sido disponibilizada a versão também para pessoas físicas.

Aduziu que a partir dessa alteração, é que a tecnologia deixou de ser "específica e customizável", transformando-se em um programa "genérico e igual para todos os usuários".

Afirmou que essa modificação acarretou em mudança na operação de "Serviço - cessão de direito de uso" para "produto mercadoria - Licença Uso Aplicativos Comerciais".

Explicou que esta comercialização envolve uma atividade intelectual, caracterizada pela prestação de serviço, e também porque se materializa no programa, que corresponde a uma mercadoria.

Argumentou, desse modo, que cabe a incidência do Imposto Sobre a Circulação de Mercadorias - ICMS, sendo, portanto, inexigível a exação de competência municipal (ISSQN).

A sentença, proferida em 13/06/2019, entendeu que era o caso de ICMS, arrimada na jurisprudência até então firmada.

O Município, por sua vez, recorre alegando a superação dos julgados, em razão da recente decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal.

A par dessas considerações, é que passo a analisar o feito.

É cediço que a jurisprudência definiu que, em se tratando de "sofware personalizado" incide o ISS. Doutra parte, também pacificou-se o entendimento de que se o caso for de "software de prateleira" ou "standard" é a hipótese de incidência de ICMS, consoante já decidiu recentemente esta 3ª Câmara, em acórdão de minha relatoria:

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CAUTELAR DE CAUÇÃO AJUIZADA SOB A ÉGIDE DO CPC/73. PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO E EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITOS. IRRESIGNAÇÃO DA MUNICIPALIDADE. ISS INCIDENTE SOBRE CONTRATOS DE LICENÇA OU CESSÃO DE USO DE SOFTWARE. PRODUTO STANDART (DE PRATELEIRA). FABRICAÇÃO EM LARGA ESCALA. AUSÊNCIA DE PERSONALIZAÇÃO. MERA COMPRA E VENDA. ANÁLISE SUPERFICIAL DE MÉRITO QUE SUGERE A INCIDÊNCIA DE ICMS. PRECEDENTES. PROBABILIDADE DO DIREITO E PERIGO NA DEMORA EVIDENCIADOS. PREENCHIDOS REQUISITOS PARA CONCESSÃO DA TUTELA. FIXAÇÃO DOS HONORÁRIOS RECURSAIS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. "1. Os programas de computador desenvolvidos para clientes, de forma personalizada, geram incidência de tributo do ISS. 2. Diferentemente, se o programa é criado e vendido de forma impessoal para clientes que o compram como uma mercadoria qualquer, esta venda é gravada com o ICMS. 3. Hipótese em que a empresa fabrica programas em larga escala para clientes." (REsp 1.070.404/SP, rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, j. 26-8-2008)" (TJSC, Apelação Cível n. 2013.079685-7, de Chapecó, rel. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, Primeira Câmara de Direito Público, j. 25-08-2015)." (TJSC. Apelação Cível n. 0000152-65.2011.8.24.0019, Des. Relator o subscritor, 3ª Câmara de Direito Público, j. 02/02/2021).

Ocorre, entretanto, que em 24/02/2021, o Supremo Tribunal Federal, em controle concentrado de constitucionalidade, por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5.659 de Minas Gerais, fixou novo entendimento sobre o assunto.

O Pretório Excelso, ao fim e ao cabo, concluiu que independente da customização ou não daquela tecnologia, há um contrato de licenciamento de uso. Isto é, há uma prestação de serviços, e por isso, cabe a incidência do ISS.

O acórdão restou assim ementado:

"Ação direta de inconstitucionalidade. Direito Tributário. Lei nº 6.763/75-MG e Lei Complementar Federal nº 87/96. Operações com programa de computador (software). Critério objetivo. Subitem 1.05 da lista anexa à LC nº 116/03. Incidência do ISS. Aquisição por meio físico ou por meio eletrônico (download, streaming etc). Distinção entre software sob encomenda ou padronizado. Irrelevância. Contrato de licenciamento de uso de programas de computador. Relevância do trabalho humano desenvolvido. Contrato complexo ou híbrido. Dicotomia entre obrigação de dar e obrigação de fazer. Insuficiência. Modulação dos efeitos da decisão.

"1. A tradicional distinção entre software de prateleira (padronizado) e por encomenda (personalizado) não é mais suficiente para a definição da competência para a tributação dos negócios jurídicos que envolvam programas de computador em suas diversas modalidades. Diversos precedentes da Corte têm superado a velha dicotomia entre obrigação de fazer e obrigação de dar, notadamente nos contratos tidos por complexos (v.g. leasing financeiro, contratos de franquia).

"2. A Corte tem tradicionalmente resolvido as indefinições entre ISS e do ICMS com base em critério objetivo: incide apenas o primeiro se o serviço está definido por lei complementar como tributável por tal imposto, ainda que sua prestação envolva a utilização ou o fornecimento de bens, ressalvadas as exceções previstas na lei; ou incide apenas o segundo se a operação de circulação de mercadorias envolver serviço não definido por aquela lei complementar.

"3. O legislador complementar...

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