Acórdão Nº 0001218-41.2019.8.24.0006 do Terceira Câmara Criminal, 08-11-2022

Número do processo0001218-41.2019.8.24.0006
Data08 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0001218-41.2019.8.24.0006/SC

RELATOR: Desembargador LEOPOLDO AUGUSTO BRÜGGEMANN

APELANTE: IAGO RIBEIRO (ACUSADO) APELANTE: KAYQUE AVILA AGUIAR DERENCIO (ACUSADO) APELANTE: ESMAEL CENTENO DA LUZ (ACUSADO) APELANTE: IGOR JANUARIO MATOS (ACUSADO) APELANTE: ISMAEL FERNANDO MARTINS DE ANDRADE (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca de Barra Velha, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Esmael Centeno da Luz, Ismael Fernando Martins de Andrade, Igor Januário Matos, Iago Ribeiro e Kayque Avila Aguiar Derêncio, dando-os como incursos nas sanções do art. 121, § 2º, incisos I, IV e V, do Código Penal e no art. 2º, §2º, da Lei n. 12.850/13, pela prática das condutas assim descritas na inicial acusatória:

FATO 1:

Segundo ficou apurados no presente caderno policial, a vítima Patrícia de Souza foi "decretada" pelas lideranças da facção criminosa Primeiro Grupo Catarinense - PGC, uma vez que, na qualidade de testemunha, teria colaborado com a Justiça Criminal (autos do Inquérito Policial nº 00033.17.00436 e Ação Penal nº 0001970-47.2018.8.24.0006) que apuram crime de homicídio ocorrido neste município envolvendo disputas entre as facções criminosas rivais, quais sejam, PGC e o Primeiro Comando da Capital - PCC.

Assim, no dia 18 de maio de 2019, por volta das 2 horas, na Rua Miranda Coutinho, nesta cidade de Barra Velha, o denunciado ESMAEL CENTENO DA LUZ, ciente da ilicitude de sua conduta e imbuído de manifesto animus necandi, ceifou a vida da vítima Patrícia de Souza, mediante o uso de arma de fogo, causando-lhe os ferimentos localizados na região da cabeça, tórax e abdômen, que foram causa efetiva de sua morte - "traumatismo crânio-encefálico por projetil de arma de fogo".

Sengundo ficou apurado, todos os denunciados participaram, de forma direta ou indireta, na prática do crime ora apurado.

Vejamos: O denunciado IGOR JANUÁRIO MATOS, ciente da ilicitude de sua conduta e imbuído de manifesto animus necandi, auxiliou materialmente o denunciado ESMAEL CENTENO DA LUZ, entregando-lhe, momentos antes do crime, a arma de fogo utilizada para o cometimento do delito e auxiliando na fuga do local dos fatos, o que foi feito a bordo de uma motocicleta.

KAYQUE AVILA AGUIAR DERÊNCIO, ciente da ilicitude de sua conduta e imbuído de manifesto animus necandi, após saber da delação feita por Patrícia de Souza, sua ex-companheira, requereu ao alto escalão da facção a tomada de providências quanto à situação, postulando pelo "decreto" da morte da vítima, respeitando a hierarquia estabelecida na organização criminosa quanto à tomada de decisões.

Já, o denunciado ISMAEL FERNANDO MARTINS DE ANDRADE, ciente da ilicitude de sua conduta e imbuído de manifesto animus necandi, emitiu a ordem de morte de Patrícia e designou ESMAEL CENTENO DA LUZ para cumpri-la. Além disso, ISMAEL FERNANDO MARTINS DE ANDRADE mandou IGOR JANUÁRIO MATOS ao encontro de Esmael para fornecer a arma de fogo utilizada na prática do delito e para lhe auxiliar na fuga.

IAGO RIBEIRO, por sua vez, ciente da ilicitude de sua conduta e imbuído de manifesto animus necandi, além de influir para a decisão da alta cúpula em "decretar" a morte da vítima, organizou, fiscalizou e interferiu diretamente na execução do crime, sempre mantendo contato com ISMAEL FERNANDO MARTINS DE ANDRADE para que as ordens do "decreto" fossem cumpridas com rapidez e eficiência.

Cumpre frisar que o crime foi cometido por motivo torpe, já que a vítima teria colaborado com a Justiça Criminal e delatado integrantes da organização criminal - PGC.

Além disso, de acordo com as investigações, ESMAEL CENTENO DA LUZ, valendo-se da condição de namorado da vítima, ardilosamente, prometeu-lhe que ambos iriam fugir para evitar a execução do "decreto" emitido pela facção criminosa. No entanto, em momento de distração da vítima, recebeu a arma do crime de forma velada do denunciado Igor e disparou contra Patrícia de Souza. Logo, a atitude covarde ora relatada, demonstra que o crime também foi cometido à traição.

Por fim, o delito foi praticado para assegurar a impunidade de outro crime, qual seja, o homicídio cometido por KAYQUE AVILA AGUIAR DERÊNCIO e outros integrantes do PGC contra Allan Benedito Camargo Morais, cujo processo penal ainda se encontrava ainda em fase de instrução. De fato, o cometimento do delito impediu a oitiva da vítima nos autos nº 0001970-47.2018.8.24.0006, evitando que Patrícia prestasse depoimento novamente e confirmasse suas declarações em Juízo, buscando, assim, a impunidade dos faccionados envolvidos naquele crime.

FATO 2:

Ainda, durante as investigações, constatou-se que os denunciados ESMAEL CENTENO DA LUZ, ISMAEL FERNANDO MARTINS DE ANDRADE, IGOR JANUÁRIO MATOS, IAGO RIBEIRO e KAYQUE AVILA AGUIAR DERÊNCIO integram, pessoalmente, organização criminosa, denominada Primeiro Grupo Catarinense - PGC, composta, por mais de 4 (quatro) pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, com o objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas são superiores a 4 (quatro) anos, notadamente o tráfico de drogas, crimes contra o patrimônio, homicídios etc.

A referida Organização Criminosa é popularmente conhecida no Estado de Santa Catarina, sobretudo pelo terror que impõe à população catarinense mediante atos de vandalismo, terrorismo, assaltos e homicídios, geralmente ordenados e planejados por seus líderes, os quais, em sua maioria, cumprem penas nos ergástulos deste Estado.

ESMAEL CENTENO DA LUZ não ocupa cargo específico, porém foi diretamente encarregado de ceifar a vida de Patrícia de Souza (Fato 1) em função da dívida que possuía com o PGC, o que demonstra que integra pessoalmente a organização.

ISMAEL FERNANDO MARTINS DE ANDRADE é disciplina geral do quadro de Barra Velha, Penha e Piçarras, sendo a autoridade maior na região.

IGOR JANUÁRIO MATOS ocupa a posição de disciplina rigor do quadro Barra Velha, Penha e Piçarras e é responsável pela cobrança de dízimos e pelo cumprimento de sanções.

IAGO RIBEIRO é representante do 1º Ministério responsável pelo quadro de Barra Velha, Penha e Piçarras.

Por fim, KAYQUE AVILA AGUIAR DERÊNCIO, na época do "decreto" da morte de Patrícia de Souza (Fato 1), ocupava o cargo de representante do 2º Ministério responsável pelo quadro de Barra Velha, Penha e Piçarras.

Além disso, a organização criminosa PGC emprega, no cometimento dos seus ilícitos, arma de fogo, instrumento utilizado, inclusive, na prática do crime descrito no Fato 1 (ev. 153).

Concluída a instrução do feito, na forma do art. 413 do Código de Processo Penal, a denúncia foi acolhida para pronunciar os acusados nas sanções do art. 121, § 2º, incisos I, IV e V, do Código Penal e no art. 2º, §2º, da Lei n. 12.850/13 e remeter a matéria ao Tribunal do Júri. Foi-lhes negado o direito de apelar em liberdade (ev. 451).

Irresignada, apenas a defesa de Ismael Fernando Martins de Andrade interpôs recurso em sentido estrito, ao qual, por votação unânime, foi negado provimento, por esta Câmara Criminal, fixados de ofício honorários recursais ao defensor nomeado (ev. 19), tendo havido o desmembramento do feito em relação aos demais acusados (autos n. 5003327-06.2020.8.24.0006).

A defesa do acusado Igor Januário Matos também interpôs recurso em sentido estrito, cuja autuação se deu em apartado, a saber, autos n. 5003182-47.2020.8.24.0006.

Em relação aos demais denunciados (Esmael, Iago e Kayque), a decisão de pronúncia transitou em julgado (ev. 11 dos autos n. 5003327-06.2020.8.24.0006).

Preclusa a decisão de pronúncia (ev. 608), cumpridas as formalidades do art. 422 do CPP (ev. 609, 617 e 633), designada sessão (ev. 672) e submetidos os quesitos formulados à apreciação dos jurados (ev. 910), a denúncia foi julgada parcialmente procedente, para condenar os acusados Esmael Centeno da Luz à pena de 19 (dezenove) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa, a ser cumprida em regime inicial fechado, pela prática dos crimes previstos no art. 121, § 2º, incisos I, IV e V, do Código Penal e no art. 2º, §2º, da Lei n. 12.850/13; Ismael Fernando Martins de Andrade à pena de 23 (vinte e três) anos, 5 (cinco) meses e 5 (cinco) dias de reclusão e 14 (catorze) dias-multa, a ser cumprida em regime inicial fechado, pela prática dos crimes previstos no art. 121, § 2º, incisos I e V, c/c art. 29, ambos do Código Penal e no art. 2º, §2º, da Lei n. 12.850/13; Igor Januario Matos à pena de 19 (dezenove) anos, 6 (seis) meses e 11 (onze) dias de reclusão e 11 (onze) dias-multa, a ser cumprida em regime inicial fechado, pela prática dos crimes previstos no art. 121, § 2º, incisos I, IV e V, c/c art. 29, ambos do Código Penal e no art. 2º, §2º, da Lei n. 12.850/13; Iago Ribeiro à pena de 22 (vinte e dois) anos e 1 (um) mês de reclusão e 12 (doze) dias-multa, a ser cumprida em regime inicial fechado, pela prática dos crimes previstos no art. 121, § 2º, incisos I, IV e V, c/c art. 29, ambos do Código Penal e no art. 2º, §2º, da Lei n. 12.850/13; Kayque Avila Aguiar Derencio à pena de 1 (um) ano, 2 (dois) meses e 14 (catorze) dias de reclusão e 11 (onze) dias-multa, a ser cumprida em regime inicial aberto, pela prática do crime previsto no art. 2º, §2º, da Lei n. 12.850/13; e por fim absolver o acusado Kayque Avila Aguiar Derencio do crime previsto no art. 121, § 2º, incisos I, IV e V, c/c art. 29, ambos do Código Penal. Foi negado aos acusados Esmael, Ismael, Igor e Iago o direito de apelar em liberdade (ev. 912).

Irresignada, a defesa do acusado Esmael Centeno da Luz interpôs recurso de apelação, no qual requereu a anulação do veredicto por ser manifestamente contrário à prova dos autos. Pugnou pela sua absolvição e impronúncia, alegando que as provas indiciárias não foram confirmadas sob o crivo do contraditório. Por fim, pleiteou a redução das penas aplicadas quanto aos delitos de...

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