Acórdão Nº 0001229-85.2015.8.24.0014 do Primeira Câmara Criminal, 12-03-2020

Número do processo0001229-85.2015.8.24.0014
Data12 Março 2020
Tribunal de OrigemCampos Novos
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Criminal n. 0001229-85.2015.8.24.0014, de Campos Novos

Relator: Desembargador Paulo Roberto Sartorato

APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO SIMPLES (ART. 155, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL). RECURSO DA DEFESA. ALEGADA OCORRÊNCIA DE CRIME IMPOSSÍVEL. SISTEMA DE VIGILÂNCIA INCAPAZ DE OBSTAR A CONSUMAÇÃO DO FURTO. PLEITO DESCABIDO. ALMEJADA DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO PARA SUA FORMA TENTADA (ART. 14, INCISO II, DO CÓDIGO PENAL). INVIABILIDADE. CONSUMAÇÃO DO DELITO DE FURTO EVIDENCIADA. ADOÇÃO DA TEORIA DA APPREHENSIO OU AMOTIO. CRIME QUE SE CONSUMA NO MOMENTO EM QUE O AGENTE OBTÉM A POSSE DO BEM SUBTRAÍDO. CONDENAÇÃO MANTIDA. DOSIMETRIA. SEGUNDA FASE. ALMEJADA A COMPENSAÇÃO ENTRE A AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA E A ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. NÃO CABIMENTO. PREPONDERÂNCIA DAQUELA SOBRE ESTA, POR SE TRATAR DE RÉU MULTIRREINCIDENTE ESPECÍFICO. AINDA, PLEITO DE ABRANDAMENTO DO REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA. REGIME FECHADO QUE NÃO MERECE ALTERAÇÃO. RÉU COM PLURAIS CONDENAÇÕES PRETÉRITAS EM RAZÃO DE CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. PECULIARIDADES DO CASO QUE ENSEJAM A ADOÇÃO DE REGIME MAIS GRAVE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. Inviável se reconhecer a ocorrência de crime impossível se a existência de sistema de vigilância eletrônica no estabelecimento espoliado não foi capaz de constituir obstáculo intransponível à consumação do crime, mas tão somente mecanismo hábil a facilitar a apuração do delito e a identificação do larápio.

2. Consoante a teoria da apprehensio ou amotio, atualmente adotada pelos Tribunais Superiores pátrios, o crime de furto, a exemplo do delito de roubo, se consuma no momento em que o bem subtraído passa para a esfera de domínio do agente, ainda que por curto espaço de tempo, não sendo necessário, para a caracterização do crime, que seja exercida a posse mansa e pacífica do objeto subtraído ou que este seja deslocado de um lugar para outro.

3. A existência de multirreincidência, inclusive de natureza específica, impõe a preponderância do aumento decorrente da agravante da reincidência (art. 61, inciso I, do Código Penal) em relação à mitigação ensejada pela atenuante da confissão espontânea (art. 65, inciso III, alínea "d", do Código Penal).

4. A verificação de plurais condenações pretéritas em desfavor do réu, pelo mesmo crime que ora se apura, evidencia a necessidade de se impor uma maior repressão penal em razão do novo crime cometido e, via de consequência, impede a concessão de regime mais brando, ensejando a prevalência do fechado, imposto no édito condenatório.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0001229-85.2015.8.24.0014, da comarca de Campos Novos (Vara Criminal), em que é Apelante Carlos Alberto Ribeiro e Apelado o Ministério Público do Estado de Santa Catarina:

A Primeira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Des. Carlos Alberto Civinski, com voto, e dele participou o Exmo. Des. Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva.

Funcionou na sessão pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Dr. Marcílio de Novaes Costa.

Florianópolis, 12 de março de 2020.

Assinado digitalmente

Desembargador Paulo Roberto Sartorato

Relator

RELATÓRIO

O representante do Ministério Público, com base no incluso Auto de Prisão em Flagrante, ofereceu denúncia contra Carlos Alberto Ribeiro, devidamente qualificado nos autos, dando-o como incurso nas sanções do artigo 155, caput, c/c o artigo 61, inciso I, por duas vezes, na forma do artigo 71, todos do Código Penal, pelos fatos assim narrados na preambular acusatória, in verbis (fls. 01/02):

No dia 5 de junho de 2015, por volta das 14h45min., o denunciado Carlos Alberto Ribeiro dirigiu-se ao estabelecimento comercial "Farmácia Santa Rita", localizado na Rua Coronel Farrapo, Centro, neste Município de Campos Novos/SC, oportunidade em que, depois de adentrar no local e agindo com manifesto animus furandi, subtraiu para si 1 [um] perfume, marca Paco Rabanne, objetos estes de propriedade do estabelecimento comercial em comento, conforme auto de exibição e apreensão de fl. 24 e boletim de ocorrência de fl. 17.

Ato contínuo, na mesma ocasião, o denunciado Carlos Alberto Ribeiro deslocou-se até o estabelecimento "Lojas Alana", localizado na Rua Coronel Farrapos, Centro, neste Município de Campos Novos/SC, momento em que agindo com manifesto animus furandi, subtraiu para si 9 [nove] calças jeans, marcas diversas, objetos estes de propriedade do referido estabelecimento comercial, conforme auto de exibição e apreensão de fl. 24 e boletim de ocorrÊncia de fl. 17.

Ressalta-se, ademais, que o denunciado Carlos Alberto Ribeiro é reincidente na prática de crimes dolosos, conforme certidões de antecedentes criminais de fls. 70/80.

Encerrada a instrução processual, o MM. Juiz a quo julgou procedente a denúncia, condenando o acusado à pena privativa de liberdade de 01 (um) ano, 03 (três) meses e 05 (cinco) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 22 (vinte e dois) dias multa, cada qual na razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na época dos fatos, por infração ao artigo 155, caput, do Código Penal, por duas vezes, concedendo-lhe o direito de recorrer em liberdade (fls. 172/183).

Irresignado, o acusado interpôs recurso de apelação, por termo nos autos (fls. 192/193) e, também, por intermédio da Defensoria Pública do Estado (fl. 198). Em suas razões recursais, pleiteou o reconhecimento da figura do crime impossível, com a consequente absolvição ou, de forma subsidiária, a configuração da tentativa, com a redução da pena, na terceira fase dosimétrica, no patamar máximo correspondente. Ainda, requereu a compensação da agravante da reincidência com a atenuante da confissão espontânea e alteração do regime para o semiaberto (fls. 203/216).

Em contrarrazões, o Ministério Público pugnou pelo conhecimento e não provimento do recurso defensivo (fls. 220/227).

Após, os autos ascenderam a esta Superior Instância, tendo a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Dr. Marcílio de Novaes Costa, opinado pelo conhecimento e parcial provimento do recurso, tão somente para a fixação do regime semiaberto para o início do resgate da reprimenda (fls. 234/238).

É o relatório.

VOTO

O presente recurso de apelação criminal se volta contra sentença de primeiro grau que, ao julgar procedente a denúncia, condenou o acusado Carlos Alberto Ribeiro à pena de 01 (um) ano, 03 (três) meses e 05 (cinco) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 22 (vinte e dois) dias-multa, cada qual no seu valor mínimo legal, por infração ao art. 155, caput, do Código Penal, por duas vezes, em continuidade delitiva.

O apelo é de ser conhecido, porquanto presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade.

Primeiramente, impõe-se anotar que, em conformidade com o posicionamento doutrinário dominante, o efeito devolutivo da apelação criminal encontra seus limites no objeto especificamente impugnado nas razões recursais, de modo que cabe ao órgão ad quem apreciar tão somente as questões suscitadas pelo recorrente, em prestígio ao princípio tantum devolutum quantum appellatum, não podendo o julgador agir de ofício para exercer atividade sem ter sido provocado, sob pena de proferir decisório ultra ou extra petita.

Consequente ao explanado, o reexame da matéria restringir-se-á àquilo que foi impugnado no apelo, de modo que a análise do presente recurso será limitada à irresignação exposta pelo recorrente.

In casu, o acusado não contesta a materialidade e a autoria delitivas, reconhecendo ter sido o autor dos crimes que lhe foram imputados. Deduz, apenas, a existência de circunstância caracterizadora da figura do crime impossível, e afirma que sua conduta não alcançou a consumação, perfazendo somente a modalidade tentada do delito. Por fim, apresenta insurgência voltada à dosimetria da pena.

I - Da tese de crime impossível

O réu/apelante alega que, durante a prática dos delitos de furto pelos quais fora condenado, estivera ele sendo continuamente observado por câmeras de monitoramento. Diante disso, teria empregado meio absolutamente ineficaz à consumação do crime patrimonial, o que faria subsistir, na hipótese, crime impossível e tentativa impunível (art. 17 do Código Penal).

Todavia, a tese não prospera.

Sabe-se que "[...] O crime impossível (ex vi do art. 17 do Código Penal) somente se caracteriza quando o agente jamais poderia consumar o crime, ou em face da ineficácia absoluta do meio empregado ou pela absoluta impropriedade do objeto material [...]". (TJMG - Apelação Criminal n. 1.0188.12.007615-6/001, de Nova Lima, 4ª Câmara Criminal, Rel. Des. Eduardo Brum, j. em 18/09/2013).

A despeito da argumentação defensiva, evidente que a existência de sistema de vigilância eletrônica em um dos estabelecimentos furtados não seria capaz de constituir obstáculo intransponível à consumação do crime, mas tão somente mecanismo hábil a facilitar a apuração da conduta e a identificação dos larápios.

Não por acaso, o crime em questão perfectibilizou-se, sendo o agente abordado na posse da res furtiva somente em momento posterior, do lado de fora dos comércios.

Nesse sentido, merece destaque o depoimento da testemunha Renato José Stolfo, o qual, inquirido em juízo, relatou que é policial militar e que, na data dos fatos, foi acionado pelos funcionários da Farmácia Santa Rita, que informaram a ocorrência de furto, alegando que era a segunda vez que tal fato ocorria. Esclareceu que as câmeras de monitoramento registraram imagens do réu, sendo que, ao abordar o réu verificou que trajava as mesmas vestes dos vídeos. Asseverou que com o réu foram apreendidos objetos furtados da farmácia e também da loja Alana (mídia de fl. 171 - transcrição do depoimento à...

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