Acórdão Nº 0001232-73.2014.8.24.0079 do Terceira Câmara de Direito Público, 04-04-2023

Número do processo0001232-73.2014.8.24.0079
Data04 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0001232-73.2014.8.24.0079/SC



RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS


APELANTE: JOSE FERREIRA (Sucessão) (AUTOR) APELANTE: ANA FERREIRA (Sucessor) (AUTOR) APELANTE: JANETE FERREIRA (Sucessor) (AUTOR) APELANTE: SUELI FERREIRA MORAIS (Sucessor) (AUTOR) APELADO: MUNICÍPIO DE VIDEIRA/SC (RÉU)


RELATÓRIO


Na Comarca de Videira, José Ferreira ajuizou "ação trabalhista" em face do Município de Videira alegando que foi admitido pelo ente municipal no ano de 1994 para exercer a função de soldador, primeiramente na condição de celetista e mais tarde como concursado; que trabalhava no "setor oficina" desenvolvendo atividades pesadas e repetitivas que exigiam esforço físico e rotação da coluna, o que acarretou o surgimento de doenças ocupacionais; que em 2009 afastou-se de suas atividades em razão das fortes dores nos membros superiores, passando a receber o benefício de auxílio-doença do IPREVI; que, devido à gravidade da enfermidade adquirida no exercício de suas atividades laborais junto ao município, teve que se submeter a inúmeras cirurgias e, em 28/02/2012, não tendo mais capacidade laborativa foi aposentado por invalidez. Após apresentar os fundamentos jurídicos, postulou a procedência do pedido com a condenação do ente municipal ao pagamento de indenização por danos morais e estéticos, despesas futuras e pensão mensal vitalícia (evento 112, inf. 2/22).
Devidamente citado, o Município de Videira ofertou contestação alegando que a responsabilidade referente aos fatos alegados é subjetiva, não havendo culpa do ente municipal pelos males do requerente, tampouco nexo de causalidade entre estes e as atividades profissionais desenvolvidas no município. Impugnou as verbas indenizatórias postuladas e requereu a improcedência dos pedidos formulados (evento 112, inf. 78/88).
O autor apresentou réplica (evento 112, inf. 222/223).
Foi determinada a realização de prova pericial e testemunhal.
Em audiência de instrução foi ouvida uma testemunha arrolada pela parte autora (evento 112, inf. 265/266).
Diante da informação do falecimento do autor, foi deferida a habilitação dos seus herdeiros e determinada a produção de perícia indireta (evento 129). O laudo foi juntado e as partes sobre ele se manifestaram.
Na sequência, o MM. Juiz de Direito, ao sentenciar o feito, inscreveu na parte dispositiva da decisão:
Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados nesta ação trabalhista proposta por ESPÓLIO DE JOSE FERREIRA contra o MUNICÍPIO DE VIDEIRA/SC.
Pelo princípio da causalidade, considerando que JOSE FERREIRA não preencheu o pressupostos para fruição de licença por acidente de trabalho ou aposentadoria por invalidez, condeno os autores ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, a teor do art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC.
Considerando que ainda não foi analisado o pedido de justiça gratuita formulado pelos herdeiros habilitados, defiro o prazo de 15 (quinze) dias para que as partes postulantes demonstrem a sua insuficiência financeira, consoante art. 5º, LXXIV, da CRFB, art. 99, § 2º, e art. 321, ambos do CPC e art. 25 da LCE n. 156/1997.
Como parâmetro geral de hipossuficiência financeira, fixo a renda bruta inferior ao montante de isenção do Imposto de Renda (atualmente R$ 28.123.91 anuais ou R$ 2.343,66 mensais) para pessoas físicas e, ainda, o triplo disto para sociedades empresárias e associações, ressalvada eventual excepcionalidade adicional, que demonstre a efetiva impossibilidade de estar em juízo, considerando as peculiaridades da causa. O montante é superior à renda média do brasileiro divulgada pelo IBGE e, outrossim, segundo uma análise econômica, a fixação de regra geral em patamar superior cria indevido incentivo para o uso inconsequente da jurisdição por excessivo número de pessoas, as quais poderiam optar por externalizar os custos de seu risco para a integralidade da Sociedade.
Juntados os documentos, voltem conclusos para deliberação.
Por outro lado, decorrido o prazo sem manifestação, desde já indefiro o pedido de justiça gratuita, devendo os autos serem encaminhados à contadoria para cobrança das custas finais.
Certificado o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com as devidas baixas.
Publique-se. Registre-se. Intime-se.
O pedido de justiça gratuita formulado pela parte autora foi deferido (evento 174).
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação repisando, em síntese, os termos da inicial, acrescentando que restou devidamente comprovado nos autos o nexo causal entre o surgimento das doenças e o trabalho desenvolvido, bem como a culpa do ente público que não tomou medidas hábeis e eficientes para a prevenção de doenças ocupacionais. Requereu, por isso, o provimento do seu recurso para que a pretensão inicial seja julgada procedente.
Com as contrarrazões, os autos ascenderam a esta Superior Instância, perante a qual a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra da Exma. Sra. Dra. Eliana Volcato Nunes, considerou ausente o interesse público na causa e deixou de intervir

VOTO


Trata-se de recurso de apelação interposto por espólio de José Ferreira, Ana Ferreira, Sueli Ferreira Morais e Janete Ferreira contra a sentença que, nos autos da "ação trabalhista" movida em face do Município de Videira, julgou improcedente o pedido com que visava à condenação do ente público ao pagamento de indenização por danos morais e estéticos, despesas futuras e pensão mensal vitalícia.
Pois bem.
A Constituição Federal de 1988, no art. 37, § 6º, prevê a responsabilidade civil objetiva da Administração Pública, por ato de seus agentes, "in verbis": "As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa".
O Código Civil de 1916, no art. 15, previa a responsabilidade civil subjetiva do Estado, por não prescindir da demonstração da culpa do agente público.
Todavia, o Código Civil de 2002, no art. 43, consagrou a responsabilidade civil objetiva do Estado, seguindo a Constituição.
Tem-se entendido, no entanto, que a responsabilidade civil objetiva do Estado se vincula à ocorrência de ato comissivo de seus agentes, já que na hipótese de omissão a responsabilidade civil deve ser considerada subjetiva, portanto, vinculada à existência de ato ilícito de parte dos agentes estatais, nos termos do art. 159, do Código Civil de 1916, e consoante a regra atualizada dos arts. 186 e 927 e seu parágrafo único, do Código Civil de 2002.
Também é subjetiva a responsabilidade do ente público, quando acionado como empregador, nos termos do art. 7º, inciso XXVIII, segundo o qual o seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, não exclui "a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa".
Na espécie, a eventual obrigação do Município de indenizar os alegados danos que supostamente teriam sido causados ao demandante deve ser examinada com base na responsabilidade civil subjetiva, nos termos do art. 7º, inciso XXVIII, da Constituição Federal de 1988, e dos arts. 186 e 927, do Código Civil de 2002, sobretudo porque não se discute sobre a ocorrência de uma lesão provocada pelos prepostos da Administração Pública em terceiros (particulares), mas uma suposta doença ocupacional adquirida durante o exercício de sua atividade laboral.
Inaplicável, pois, a responsabilidade civil objetiva de que trata o art. 37, § 6º, da Constituição Federal de 1988.
Como bem anotou o eminente Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, no voto que proferiu na Apelação Cível n. 2008.017192-5, julgada em 23/07/2008:
"[...] para que se possa estabelecer quais os elementos necessários para caracterização de possível obrigação reparatória do recorrente, faz-se necessário definir qual o sistema de responsabilidade civil que regula a presente situação, ou seja, cabe constatar se cuida de sistema ressarcitório baseado na noção de culpa 'lato sensu' (responsabilidade civil subjetiva) ou na ideia de risco administrativo (responsabilidade civil objetiva).
"Consoante decisão deste Tribunal:
"'[...] em razão do Poder Público ocupar o polo passivo da 'actio', poder-se-ia invocar, de imediato, o art. 37, § 6º, da Constituição da República Federativa do Brasil, que consagra a teoria do risco administrativo e, portanto, gera a responsabilidade civil objetiva. Esta modalidade ressarcitória independe do elemento volitivo culpa...

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