Acórdão Nº 0001259-29.2020.8.24.0020 do Quarta Câmara Criminal, 15-10-2020

Número do processo0001259-29.2020.8.24.0020
Data15 Outubro 2020
Tribunal de OrigemCriciúma
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão




Agravo de Execução Penal n. 0001259-29.2020.8.24.0020, de Criciúma

Relator: Desembargador Sidney Eloy Dalabrida

AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. DECISÃO QUE INDEFERIU O PLEITO DE PRISÃO DOMICILIAR. RECURSO DA DEFESA.

APENADA SUBMETIDA AO REGIME SEMIABERTO. REQUERIDA A CONCESSÃO DA PRISÃO DOMICILIAR COM BASE NA RECOMENDAÇÃO N. 62/2020 DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, BEM COMO NA SÚMULA VINCULANTE N. 56. IMPOSSIBILIDADE. REEDUCANDA QUE NÃO INTEGRA O GRUPO DE RISCO DE CONTAMINAÇÃO PELO NOVO CORONAVÍRUS (COVID-19). IMPRESCINDIBILIDADE DE PROVA DE RISCO EFETIVO À VIDA E À SAÚDE DA PESSOA PRIVADA DE LIBERDADE. CIRCUNSTÂNCIA NÃO COMPROVADA NO CASO. ADEMAIS, AGRAVANTE QUE CUMPRE PENA POR CRIME EQUIPARADO A HEDIONDO (TRÁFICO DE DROGAS). EXEGESE DA RECOMENDAÇÃO N. 78/2020 DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. OUTROSSIM, PENITENCIÁRIA FEMININA DE CRICIÚMA QUE POSSUI ESTRUTURA PARA ABRIGAR DETENTAS EM REGIME INTERMEDIÁRIO. AVENTADA VIOLAÇÃO ÀS NORMAS DA EXECUÇÃO PENAL NÃO DEMONSTRADA. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE N. 56. PRECEDENTES.

1 Embora não se desconheça o teor da Recomendação n. 62 do Conselho Nacional de Justiça, certo é que a concessão da prisão domiciliar, com fundamento na situação de pandemia relacionada ao COVID-19, não deve ser entendida como medida obrigatória e automática, mas dependente das peculiaridades de cada caso concreto, bem como das condições pessoais do apenado, que, para fazer jus à benesse, deve comprovar situação de excepcionalidade.

2 "A partir da edição da Recomendação n. 78, de 15 de setembro de 2020, do CNJ, as medidas previstas nos artigos 4º e 5º da Recomendação n. 62 do CNJ não se aplicam às pessoas condenadas por crimes previstos na Lei nº 12.850/2013 (organização criminosa), na Lei nº 9.613/1998 (lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores), contra a administração pública (corrupção, concussão, prevaricação etc.), por crimes hediondos ou por crimes de violência doméstica contra a mulher (art. 5º-A)" (TJSC, Agravo de Execução Penal n. 0000698-67.2020.8.24.0064, rel. Des. Luiz Antônio Zanini Fornerolli, Quarta Câmara Criminal, j. em 17/9/2020).

3 Não há que se falar em afronta à súmula vinculante n. 56 quando o estabelecimento prisional, embora não se enquadre no conceito de colônia agrícola ou industrial, possua estrutura para abrigar reeducandos que usufruem do regime semiaberto. Ainda, a mera alegação de cumprimento da pena em regime mais gravoso, sem a demonstração de qualquer irregularidade concreta, não é capaz de autorizar a concessão da benesse.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Execução Penal n. 0001259-29.2020.8.24.0020, da comarca de Criciúma (Vara de Execuções Penais) em que é Agravante Tárcila Driele Junkes e Agravado o Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Quarta Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Desembargador Alexandre d'Ivanenko, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Desembargador Zanini Fornerolli. Funcionou como representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. Jorge Orofino da Luz Fontes.

Florianópolis, 15 de outubro de 2020.

Desembargador Sidney Eloy Dalabrida

Relator


RELATÓRIO

Trata-se de agravo em execução penal interposto por Tarcila Driele Junckes contra decisão proferida pelo Juízo da Vara de Execuções Penais da comarca de Criciúma, que, nos autos n. 0001820-28.2019.8.24.0072, indeferiu o pedido de prisão domiciliar.

Nas razões recursais, a defesa alega que a apenada, embora atualmente usufrua do regime semiaberto, vem cumprindo pena em modalidade mais gravosa, pois, em razão da pandemia do COVID-19, a transferência para colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar está suspensa.

Assim, com base na súmula vinculante n. 56, postula a concessão de prisão domiciliar, com ou sem monitoramento eletrônico, conforme prevê a Recomendação n. 62 do Conselho Nacional de Justiça, "durante o período da pandemia COVID-19, ou subsidiariamente, até a possibilidade de sua transferência à colônia penal agrícola, industrial ou similar [...]" (fl. 15).

Apresentadas as contrarrazões (fls. 20-23), e mantida a decisão agravada (fl. 24), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do Exmo. Dr. José Eduardo Orofino da Luz Fontes, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do reclamo (fls. 31-34).

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conhece-se do recurso.

Inicialmente, importa salientar que a agravante se encontra recolhida na Penitenciária Feminina de Criciúma, cumprindo, atualmente em regime semiaberto, as penas de 5 (cinco) anos de reclusão, por infração ao art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06, e de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de detenção, pelo cometimento dos delitos descritos nos arts. 12 e 16, ambos da Lei n. 10.826/03 (fls. 41-43, SAJ/PG).

No curso da execução, a apenada formulou requerimento de prisão domiciliar, com fundamento na súmula vinculante n. 56 e na Recomendação n. 62 de 7 de março de 2020 do CNJ, argumentando que, embora em regime semiaberto, vem adimplindo a reprimenda como se estivesse na modalidade fechada (fls. 319-318, SAJ/PG).

Após a oitiva do representante do Ministério Público, a togada singular indeferiu o pedido, nos seguintes termos (fls. 326-332, SAJ/PG):

No caso, a reeducanda não se enquadra em nenhuma das hipóteses elencadas nos dispositivos legais autorizadoras da prisão domiciliar, razão pela qual deve ser o pleito indeferido. Explico: a apenada se encontra atualmente em regime semiaberto, após ter progredido durante o cumprimento da sua reprimenda de 8 anos e 6 meses de reclusão, a qual foi condenada em razão do cometimento dos crimes de tráfico de drogas, posse irregular de arma de fogo de uso permitido e porte ilegal de arma de fogo de uso restrito. Não é pessoa doente nem idosa (tem apenas 27 anos), não possuindo qualquer circunstância especial que legitime o deferimento da benesse.

Embora a reclusa se encontre, de fato, em regime semiaberto, recolhida na Penitenciária Feminina desta Comarca, entendo que nenhuma ilegalidade existe e nada há a reparar. É que, embora a Súmula Vinculante 56 do STF disponha que "a falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso [...]", as condições regulares para cumprimento da pena neste regime intermediário lhe estão sendo garantidas, dentro do possível no atual cenário em que o País se encontra (pandemia decorrente do novo Coronavírus), ao passo que não importam as nomenclaturas "prisão em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar" e "presídio regional", se os privilégios, recompensas, prejuízos, gravames e obrigações são idênticos na prática, além do fato de que a presa desfrutará de todos os benefícios legais proporcionados pelo regime semiaberto, tão logo a situação normalize em nossa região (o que se aplica para todos os estabelecimentos prisionais).

Ora, a corroborar o fato de que lhe estão sendo garantidos direitos inerentes ao regime semiaberto, a apenada se encontra desfrutando, atualmente, da saída temporária "estendida", pelo lapso de 21 dias, com previsão para retornar apenas em 27/8/2020 (semana que vem).

Nessa senda, bem pontuou o eg. TJSC, em decisão que analisa pedido idêntico ao ora examinado, quando consigna que "a ausência de vagas para o cumprimento da pena no regime semiaberto não implica, automaticamente, o deferimento da transferência para o regime aberto ou para a prisão domiciliar. Sendo respeitados os direitos do reeducando inerentes ao regime semiaberto, é possível o resgate da reprimenda em "estabelecimento adequado", ainda que diverso daquele previsto em lei" (Agravo de Execução Penal n. 0017184-79.2018.8.24.0038, de Joinville, rel. Getúlio Corrêa, Terceira Câmara Criminal, j. 19-2-2019).

É importante lembrar, ainda, que "os juízes da execução penal poderão avaliar os estabelecimentos destinados aos regimes semiaberto e aberto para qualificação como adequados a tais regimes e que são aceitáveis estabelecimentos que não se qualifiquem como "colonia agrícola, industrial" (regime semiaberto) ou 'casa de albergado ou estabelecimento adequado" (regime aberto) (texto aprovado no Plenário do Supremo Tribunal Federal, originário da Súmula Vinculante 56).

[...]

Como visto, as alternativas de "(i) a saída antecipada de sentenciado no regime com falta de vagas; (ii) a liberdade eletronicamente monitorada ao sentenciado que sai antecipadamente ou é posto em prisão domiciliar por falta de vagas; (iii) o cumprimento de penas restritivas de direito e/ou estudo ao sentenciado que progride ao regime aberto" e deferimento de prisão domiciliar ao apenado até a estruturação destas medidas só deve ocorrer se não existir estabelecimento compatível, o que não é o Caso.

Isso porque, como visto alhures, embora esteja reclusa em uma Penitenciária, todos os seus direitos inerentes ao regime semiaberto estão sendo preservados, sendo o ergástulo relativamente novo, inaugurado há menos de 2 anos, não existindo superlotação e com ótima estrutura, contando inclusive com horta, biblioteca, ala de gestantes e berçário com objetos lúdicos e livre de grades. Aliás, é a única Penitenciária Feminina do Estado.

No mais, saliento que a unidade onde se encontra a apenada, assim como as demais da Comarca, está com a situação sanitária controlada. Todos os estabelecimentos prisionais, assim como os respectivos servidores que neles laboram diariamente, estão seguindo o protocolo de assepsia recomendado pelo governo (incluindo aferição de temperatura corporal de cada agente prisional, assim como dos advogados que porventura ingressarem na unidade), visando encontrar um equilíbrio entre a tutela da saúde dos detentos e a segurança da sociedade.

As...

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