Acórdão Nº 0001277-41.2011.8.24.0125 do Primeira Câmara Criminal, 26-11-2020

Número do processo0001277-41.2011.8.24.0125
Data26 Novembro 2020
Tribunal de OrigemItapema
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Criminal n. 0001277-41.2011.8.24.0125, de Itapema

Relator: Desembargador Paulo Roberto Sartorato

APELAÇÕES CRIMINAIS. CRIMES CONTRA A PAZ PÚBLICA, A FÉ PÚBLICA E A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. QUADRILHA, FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO, FALSIDADE IDEOLÓGICA, CORRUPÇÃO PASSIVA EXAURIDA E CORRUPÇÃO ATIVA EXAURIDA (ARTS. 288, CAPUT, NA ANTIGA REDAÇÃO, 297, 299, 317, § 1º E 333, PARÁGRAFO ÚNICO, TODOS DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSOS DEFENSIVO E MINISTERIAL.

PRELIMINARES. ARGUIDA A OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA EM SUA FORMA RETROATIVA. EXISTÊNCIA, PORÉM, DE RECURSO MINISTERIAL VISANDO À MAJORAÇÃO DA REPRIMENDA. IMPOSSIBILIDADE DE EXAME DA PRESCRIÇÃO, COM BASE NA PENA APLICADA EM CONCRETO, ANTES QUE ANALISADO O APELO DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

ALEGAÇÃO DE INÉPCIA DA DENÚNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. EXORDIAL QUE PREENCHE OS REQUISITOS DO ARTIGO 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.

MÉRITO. PLEITO ABSOLUTÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. RÉUS (ENTRE ELES, O ORA APELANTE) AGENTES PÚBLICOS E POLÍTICO QUE SE ASSOCIARAM PARA A PRÁTICA DE CRIMES. ANIMUS ASSOCIATIVO ESTÁVEL E DURADOURO PRESENTE. PARTE DOS ACUSADOS QUE OCUPARAM, EM PERÍODOS SUCESSIVOS, A DIREÇÃO DE SECRETARIA MUNICIPAL E QUE, EM COMUNHÃO COM O CHEFE DO EXECUTIVO MUNICIPAL, TAMBÉM RÉU, PRATICARAM INÚMERAS FRAUDES NA APROVAÇÃO DE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS. PARTE DOS ILÍCITOS LEVADOS A EFEITO MEDIANTE A INSERÇÃO DE INFORMAÇÕES INEXATAS EM DOCUMENTO PÚBLICO. DELITO DE FALSIDADE IDEOLÓGICA CONFIGURADO. EVIDENCIADO, AINDA, O RECEBIMENTO DE VANTAGEM PECUNIÁRIA INDEVIDA, PARA A PRÁTICA DE ATO DE OFÍCIO EM INFRINGÊNCIA A DEVER FUNCIONAL. CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA EXAURIDA CARACTERIZADO. PARTICULARES QUE EFETUARAM A OFERTA DA VANTAGEM CONDENADOS PELO DELITO DE CORRUPÇÃO ATIVA EXAURIDA. SENTENÇA MANTIDA NESSE TOCANTE. PROVA SEGURA DA MATERIALIDADE E DA AUTORIA DAS CONDUTAS. ABSOLVIÇÃO INVIÁVEL.

DOSIMETRIA. PRIMEIRA FASE. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DO ARTIGO 59 DO CÓDIGO PENAL DEVIDAMENTE FUNDAMENTADAS E JUSTIFICADAS EM ELEMENTOS IDÔNEOS. PEDIDO DEFENSIVO DE EXCLUSÃO NÃO ACOLHIDOS. PEDIDO MINISTERIAL DE ALTERAÇÃO DO PATAMAR DE AUMENTO, PARA QUE SEJA ADOTADA A FRAÇÃO DE 1/8 (UM OITAVO) PARA CADA CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DESFAVORÁVEL, SENDO REFERIDO MONTANTE APLICADO SOBRE O INTERVALO ENTRE AS PENAS MÍNIMA E MÁXIMA ABSTRATAMENTE COMINADAS AOS DELITOS IMPUTADOS AOS ACUSADOS. INVIABILIDADE. ATIVIDADE DE FIXAÇÃO DA REPRIMENDA QUE SÓ DEVE SER REPARADA, NESTA INSTÂNCIA RECURSAL, QUANDO O CRITÉRIO UTILIZADO PELO JUIZ SENTENCIANTE MOSTRAR-SE FLAGRANTEMENTE DESPROPORCIONAL. FRAÇÃO UTILIZADA PELA MAGISTRADA SENTENCIANTE QUE SE MOSTROU EM CONSONÂNCIA COM O PATAMAR ROTINEIRAMENTE UTILIZADO POR ESTA CORTE, SENDO SUFICIENTE À REPRESSÃO E PREVENÇÃO DAS CONDUTAS.

TERCEIRA FASE. REQUERIMENTO DEFENSIVO DE AFASTAMENTO DA CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO DO ARTIGO 317, § 1º, DO CÓDIGO PENAL, SOB O ARGUMENTO DE CARACTERIZAÇÃO DE BIS IN IDEM COM OS VETORES RECONHECIDOS NA PRIMEIRA FASE DOSIMÉTRICA. TESE RECHAÇADA. CIRCUNSTÂNCIAS QUE SE EMBASARAM EM FUNDAMENTOS DISTINTOS. PEDIDO MINISTERIAL DE INCIDÊNCIA DA MAJORANTE PREVISTA NO ARTIGO 327, § 2º, DO CÓDIGO PENAL. ACOLHIMENTO. RÉUS QUE PRATICARAM O DELITO DE CORRUPÇÃO PASSIVA NA CONDIÇÃO DE PREFEITO E DE SECRETÁRIOS MUNICIPAIS. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA CITADA CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO DE PENA A DETENTORES DE MANDATO ELETIVO E ÀQUELES POR ELE NOMEADOS. PRECEDENTES DESTA CORTE E DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA, EM SUA FORMA RETROATIVA, A SER RECONHECIDA APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO PARA O ÓRGÃO MINISTERIAL, NO TOCANTE À PARTE DAS CONDUTAS PELAS QUAIS O ACUSADO FORA CONDENADO. CONSEQUENTE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE QUANTO A ESSAS. RECURSOS CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS.

1. Havendo pendente recurso ministerial com vista ao recrudescimento da reprimenda, mostra-se inviável a análise da prescrição da pretensão punitiva com base na pena aplicada em concreto, até que analisada a pretensão do Parquet.

2. Não ocorre inépcia da denúncia quando a exordial acusatória qualifica satisfatoriamente os acusados e os fatos criminosos, classifica os crimes, bem como indica o rol de testemunhas cujas inquirições almeja o órgão ministerial, possibilitando, sobremaneira, a efetivação do contraditório e da ampla defesa aos acusados.

3. Impossível a absolvição quando os elementos contidos nos autos, corroborados pelos depoimentos firmes das testemunhas ouvidos e por farta documentação probatória, formam um conjunto sólido, dando segurança ao juízo para a condenação dos acusados pela prática dos delitos descritos na denúncia.

4. Inexiste reparo a ser feito na primeira fase dosimétrica quando a Magistrada sentenciante, na valoração negativa da culpabilidade, das circunstâncias e das consequências do crime, vale-se de argumentação idônea e apoiada em elementos constantes dos autos.

5. Por força do princípio constitucional da individualização da pena (art. 5°, inciso XLVI, da Carta Magna), e por ser a atividade dosimétrica um processo judicial de discricionariedade juridicamente vinculada, não se deve impor, de forma apriorística, invariáveis frações de aumento a todo e qualquer caso, merecendo readequação somente o critério que se mostrar flagrantemente desproporcional.

6. Não se observa bis in idem no reconhecimento concomitante da majorante prevista no art. 317, § 1º, do Código Penal com a valoração negativa de parte das circunstâncias judiciais do art. 59 do mesmo diploma legal se, para tal proceder, valeu-se a Magistrada sentenciante de fundamentos diversos.

7. Deve incidir a majorante do art. 327, § 2º, do Código Penal aos fatos em tela, uma vez que levados a efeito pelos acusados quando ocupavam os cargos de Prefeito e de Secretários Municipais, detendo, na estrutura administrativa, posição de notável hierarquia.

8. Tão logo ocorra o trânsito em julgado da condenação para o Ministério Público, deve ser reconhecida a prescrição da pretensão punitiva estatal, em sua modalidade retroativa, em relação à parte das condutas pelas quais fora o apelante condenado.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0001277-41.2011.8.24.0125, da Comarca de Itapema (Vara Criminal), em que são Apelantes e Apelados o Ministério Público do Estado de Santa Catarina e Antônio Cruz Neto:

A Primeira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer dos recursos e: a) dar provimento parcial ao recurso ministerial, para reconhecer a majorante prevista no art. 327, § 2º, do Código Penal em desfavor do réu Antônio, em relação ao delito de corrupção passiva (art. 317 do Código Penal), e b) acolher, em parte, a preliminar de prescrição da pretensão punitiva retroativa, invocada pelo réu Antônio Cruz Neto, tão somente para declarar a extinção da sua punibilidade no tocante aos crimes de quadrilha e falsidade ideológica (arts. 288, caput, e 299, parágrafo único, ambos do Código Penal); rejeitar a prefacial de inépcia da denúncia e, no mérito, negar provimento ao apelo, assentando-se sua condenação final em 05 (cinco) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 25 (vinte e cinco) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, pela prática do crime tipificado no art. 317, § 1º, do Código Penal. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Des. Carlos Alberto Civinski, dele participou o Exmo. Des. Norival Acácio Engel e Exmo. Des. Ernani Guetten de Almeida.

Funcionou na sessão pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Dr. Gercino Gerson Gomes Neto.

Florianópolis, 26 de novembro de 2020.

Assinado digitalmente

Desembargador Paulo Roberto Sartorato

Relator


RELATÓRIO

O representante do Ministério Público Federal, com base no incluso Inquérito Policial, ofereceu denúncia contra Clóvis José da Rocha, Manoel Pereira dos Passos Neto, Jocemar Fasolo, Luiz Antônio Pasqualotto, Luiz Carlos Feitosa, Carla Fernanda Feitosa, Denize Xavier da Silva, Carlos Humberto Cruz e Antônio Cruz Neto, devidamente qualificados nos autos, dando-os como incursos nas sanções: o acusado Clóvis, do art. 317, § 1º, e do art. 288, na forma do art. 69, todos do Código Penal; Carlos, do art. 317, § 1º, c/c o art. 29, e art. 299 (por 14 vezes), 297 (por 03 vezes) e art. 288, na forma do art. 69, todos do Código Penal; Manoel, do art. 317, § 1º, c/c o art. 29, art. 299 (por 04 vezes), 333, parágrafo único, e 288, na forma do art. 69, todos do Código Penal; Denize, do art. 317, § 1º, c/c o art. 29, art. 299 (por 04 vezes) e art. 288, na forma do art. 69, todos do Código Penal; Antônio, do art. 317, § 1º, c/c o art. 29, art. 299 e art. 288, na forma do art. 69, todos do Código Penal, e Luiz Carlos, Carla, Jocemar e Luiz Antônio, do art. 333, parágrafo único, do Código Penal, por serem os denunciados, em tese, responsáveis por diversas irregularidades relacionadas à aprovação e ao licenciamento de obras no Município de Itapema/SC.

O inquérito policial teve início em informações oriundas de representação formulada pela Procuradoria do referido Município e, durante as investigações, identificou-se, segundo a denúncia, um esquema criminoso montado no âmbito da Prefeitura Municipal, visando ao favorecimento de empresários e autônomos ligados à construção civil, e ao benefício individual de políticos e funcionários públicos.

Narrou ainda a denúncia que "o esquema envolvia oferecimento de vantagens indevidas pelos particulares aos agentes públicos e político (Prefeito Municipal), bem como a solicitação e o recebimento dessas vantagens pelos agentes, que garantiam a aprovação de projetos de construção sem o preenchimento dos requisitos necessários. Assim, os funcionários públicos asseguravam o protocolo de pedidos de autorização de construção e a expedição dessa autorização com datas passadas, de modo a preservar direitos construtivos decorrentes de legislação não mais em...

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