Acórdão Nº 0001304-56.2014.8.24.0048 do Sétima Câmara de Direito Civil, 10-11-2022

Número do processo0001304-56.2014.8.24.0048
Data10 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSétima Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0001304-56.2014.8.24.0048/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ROBERTO DA SILVA

APELANTE: MARLENE BOQUETT APELADO: ROSA WOLENSKI DUBIELA (Espólio) E OUTRO

RELATÓRIO

Marlene Boquett interpôs recurso de apelação contra sentença (evento 153 dos autos de origem) que, nos autos da ação anulatória de atos jurídicos cumulada com declaratória de propriedade ajuizada em face do espólio de Rosa Wolenski Dubiela, representado por Lincon Rozan Dubiela, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais e reconheceu a prescrição aquisitiva do imóvel debatido nos presentes autos em favor da parte demandada.

Para melhor elucidação da matéria debatida nos autos, adota-se o relatório da sentença recorrida:

Marlene Boqueti ingressou com ação anulatória c/c declaratória contra Ofício de Registro de Imóveis da Comarca de Balneário Piçarras e Espólio de Rosa Dubiela, aduzindo, em síntese, ser legítima possuidora e proprietária do imóvel matriculado sob o nº 3.669 no 2º Ofício de Registro de Imóveis da Comarca de Itajaí, representado pelo lote nº 9, da quadra F, do loteamento Jardim Tânia, com área de 402 m².

Relatou que o bem foi adquirido, inicialmente, pelo seu ex marido, sr. Altamiro Biberg, da empresa Comércio e Imobiliária Iracema Ltda., com averbação de compra e venda por escritura pública lavrada no Tabelionato de Notas Ludgero Figueredo, na cidade de Penha, sob o nº R-1-3.669.

Historiou que, por ocasião de separação conjugal, o bem foi partilhado e passou a integrar seu patrimônio e, desde então, paga o IPTU, lançado em nome de seu ex-marido no cadastro municipal.

Suscitou que, em março de 2014, pretendendo vender o bem, tomou conhecimento da existência de outra matrícula na qual o mesmo imóvel está registrado, porém em nome de Rosa Dubiela, averbação esta efetuada em28/01/88 na matrícula de nº 23.071.

Pontuou que, quando a empresa Comércio e Imobiliária Iracema Ltda. alineou o imóvel à requerida, ela não era mais a proprietária do bem, situação que comprova a nulidade da escritura pública de compra e venda averbada na matrícula de nº 23.071 e o cometimento de erro, fraude e simulação pelo oficial do registro público demandado, pleiteando a anulação da referida escritura e a declaração de propriedade do bem em seu favor.

Asseverou, ainda, que a escritura pública que deu azo à abertura da matrícula imobiliária nº 23.071 caracteriza-se por ser um documento falso, razão segunda porque o negócio jurídico deve ser declarado nulo.

Pugnou a procedência do pedido e, em sede de tutela de urgência, requereu seja restrita a venda dos imóveis sobre os quais recai a lide a fim de que não haja prejuízos a terceiros de boa fé.

Valorou a causa e juntou documentos.

Indeferida a justiça gratuita, a autora recolheu as custas processuais e, em seguida, foi negado o pedido de tutela de urgência.

O Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Balneário Piçarras, por meio de sua oficiala, apresentou contestação, na qual arguiu, em preliminar de mérito, sua ilegitimidade para figurar no polo passivo da demanda.

Requereu a citação da empresa Comércio e Imobiliária Iracema Ltda. na qualidade de litisdenunciada e, em seguida, peticionou no feito propugnando a desconsideração do pedido afeto à denunciação da lide.

Requereu a improcedência do pedido e juntou documentos.

Espólio de Rosa Dubiela, citado, ofertou defesa na forma de contestação na qual arguiu a ocorrência da prescrição da pretensão deduzida pela parte ativa. No mérito, defendeu que adquiriu o bem de boa-fé e que sempre exerceu a posse e a propriedade dele, suscitando, por derradeiro, a prescrição aquisitiva e a possibilidade de a matrícula apresentada pela autora na petição inicial ser falsa.

Requereu a improcedência do pedido e juntou documentos.

A autora ofereceu réplicas, rebatendo os argumentos suscitados pelas rés.

Decisão saneadora às págs. 146-156, por meio da qual o feito foi extinto sem exame de mérito relativamente ao Cartório de Registro de Imóveis, foi afastada a prescrição/decadência da pretensão voltada ao reconhecimento de nulidade absoluta de negócio jurídico e foi declarado precluso o direito de a ré produzir prova pericial para atestar falsidade material de documento.

Apresentado rol de testemunhas, designou-se audiência de instrução e julgamento.

Foi declarada a preclusão do direito da autora de produzir prova pericial.

A autora juntou novos documentos aos autos.

Em audiência, foram ouvidas duas testemunhas da parte autora e três da parte requerida. No mesmo ato, homologou-se a desistência da oitiva da testemunha João pela parte autora, declarando-se encerrada a instrução, ficando as partes intimadas para apresentação de alegações finais.

As alegações finais foram apresentadas por memoriais.

Os autos vieram conclusos.

É o relato.

Da parte dispositiva do decisum, extrai-se a síntese do julgamento de primeiro grau:

Ante o exposto, DECLARO a nulidade da escritura pública de compra e venda do lote nº 9, quadra F, do loteamento Jardim Tânia, com área de 402 m², de Comércio e Imobiliária Iracema Ltda. a Rosa Dubiela, lavrada no tabelionato Ludgero Francisco Figueiredo, Penha - SC, às págs. 74-75.

Via de consequência, DETERMINO o cancelamento da averbação da referida escritura pública de compra e venda na matrícula mãe nº 28.005, junto ao 1º Ofício de Registro de Imóveis de Itajaí, cópia à pág. 21, averbação esta indicada na alínea 'a' do campo denominado 'OBSERVAÇÃO'.

Via de consequência, DETERMINO, ainda, o cancelamento da matrícula imobiliária nº 23.071, do Cartório de Registro de Imóveis de Balneário Piçarras (págs. 23-24).

MANTENHO o registro do lote nº 9, quadra F, do loteamento Jardim Tânia, com área de 402 m², no 2º Cartório de Registro de Imóveis de Itajaí, matriculado sob o nº 3.669 em 06/06/1978, cópia da matrícula às pág. 25-26.

RECONHEÇO, por fim, a prescrição da pretensão aquisitiva do lote nº 9, quadra F, do loteamento Jardim Tânia, com área de 402 m², individualizado na matrícula imobiliária nº 3.669 do 2º Cartório de Registro de Imóveis de Itajaí, e DECLARO a sua aquisição imobiliária em favor de Espólio de Rosa Dubiela.

Considerando que, em que pese a autora não tenha sucumbido quanto ao pedido de declaração de nulidade de ato jurídico, perdeu a propriedade do bem sobre o qual recai a lide em razão da declaração da prescrição aquisitiva em favor da ré, reconheço caber à primeira o pagamento integral dos ônus sucumbenciais.

Neste contexto, CONDENO a autora ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios em favor do procurador da ré, que arbitro em 10% sobre o valor da causa (CPC, art. 85, § 2º).

DOU POR RESOLVIDO O MÉRITO DO PROCESSO forte no art. 487, I, c/c art. 490, ambos do Código de Processo Civil.

Em suas razões recursais (evento 158 dos autos de origem), a parte autora asseverou que "consoante a prova carreada para o bojo dos autos, durante a fase instrutória, ficou cristalinamente provado ter a autora, adquirido de boa-fé, por escritura pública lavrada e registrada em Cartórios idôneos o imóvel objeto da demanda, sendo que, em decorrência da compra com quitação integral não tendo sido edificação residência no local, por ser um imóvel com mata fechada, ainda sem infraestrutura, o que torna alegação de posse exercida pela ré, totalmente descabida, pois como pode ter zelado, cuidado e preservado o imóvel, se nem acesso ao mesmo possuía".

Aduziu que "se realmente tivesse a apelada tomado em algum momento a posse do imóvel, teria juntado aos autos os comprovantes de pagamentos dos impostos, o que não o fez, pois sabe que quem pagou os tributos municipais foi a apelante em nome de seu ex-marido".

Alegou que "a Apelada, não juntou fotos que demonstrassem a posse, o cuidado e o zelo alegado, não juntou comprovante de pagamento de água, luz, telefone, taxas ou mesmo impostos, pois isso não existe, já que não existe infraestrutura no local, portanto, não há como ter sido exercido a posse pela mesma".

Sustentou que "se o negócio jurídico encontra-se na integra contaminado pela nulidade, a escritura não se mostra como justo título hábil. E, por decorrência lógica, ausente também o requisito da boa-fé, porquanto a apelante agiu de má-fé ao simular o negócio jurídico, com o intuito de arredar os direitos sobre a propriedade, agindo como proprietária, sem nunca ter exercido a posse, pois era a apelante quem sempre pagava os impostos".

Referiu que "a prova é robusta no sentido de se responsabilizar o Cartório ou seus oficiais pela malfadada transação, o que possibilita sem dúvida em uma possível ação regressiva, a indenização dos prejuízos sofridos pela parte apelante, no tocante ao processado".

Defendeu que "da leitura da responsável decisão em sua parte final, emerge claro e sem sombra de qualquer dúvida que, tendo sito dado provimento parcial à ação proposta, parece lógico que os ônus da sucumbência, que a nosso ver é recíproca, devam ser proporcionalmente suportados por ambas as partes".

Com as contrarrazões (evento 163 dos autos de origem), ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença que julgou parcialmente...

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