Acórdão nº 0001363-04.2018.8.14.0009 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Penal, 12-06-2023

Data de Julgamento12 Junho 2023
Órgão2ª Turma de Direito Penal
Número do processo0001363-04.2018.8.14.0009
Classe processualAPELAÇÃO CRIMINAL
AssuntoTráfico de Drogas e Condutas Afins

APELAÇÃO CRIMINAL (417) - 0001363-04.2018.8.14.0009

APELANTE: LUCIVANE DO SOCORRO DOS SANTOS REIS

APELADO: JUSTIÇA PÚBLICA

RELATOR(A): Desembargador LEONAM GONDIM DA CRUZ JÚNIOR

EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. ARTIGO 33, CAPUT, DA LEI 11.343/2006. ABSOLVIÇÃO OU DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO. IMPOSSIBILIDADE. TRÁFICO PRIVILEGIADO. RECONHECIMENTO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITO.PROCEDÊNCIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO. DECISÃO UNÂNIME.

01 – As provas presentes nos autos, com especial relevância para a confissão em juízo da apelante, são suficientes para o convencimento tanto da materialidade como da autoria delitiva no que tange ao delito capitulado no artigo 33, caput, da Lei 11.343/2006 (tráfico de drogas), não havendo que se falar em absolvição ou mesmo desclassificação do delito.

02 – A Quinta Turma do STJ, alinhando-se ao entendimento sufragado no Supremo Tribunal Federal, além de buscar nova pacificação no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, consignou que a causa de diminuição pelo tráfico privilegiado, nos termos do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006, não pode ter sua aplicação afastada com fundamento em investigações preliminares ou processos criminais em andamento, mesmo que estejam em fase recursal, sob pena de violação do art. 5º, LIV, da Constituição Federal (RE 1.283.996 AgR, Rel. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 11/11/2020). (HC n. 644.284/ES, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, DJe 27/9/2021). Precedentes.

03 – Dada a nova dosimetria da pena, o lapso prescricional previsto no art. 109, V, do Código Penal se consumou após a publicação da sentença, devendo ser declarada, de ofício, a extinção da punibilidade da recorrente, pela prescrição intercorrente da pretensão punitiva estatal.

04 – Recurso conhecido e parcialmente provido. Reconhecimento, de ofício, da prescrição intercorrente da pretensão punitiva. Decisão unânime.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da 2ª Turma de Direito Penal do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade, conhecer do recurso de apelação e lhe dar parcial provimento, reconhecendo-se, de ofício, a prescrição, na modalidade intercorrente da pretensão punitiva do Estado, tudo conforme fundamentação do voto do Excelentíssimo Desembargador Relator.

Sala das Sessões do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, aos doze dias do mês de junho do ano de dois mil e vinte e três.

Julgamento presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Rômulo José Ferreira Nunes.

RELATÓRIO

RELATÓRIO

O EXMO. SR. DES. LEONAM GONDIM DA CRUZ JÚNIOR (RELATOR):

Trata-se de apelação penal interposta por Lucivane do Socorro dos Santos Reis, irresignada com os termos da sentença condenatória proferida pelo MM. Juízo da Vara Criminal da Comarca de Bragança/Pa, nos autos da ação penal ajuizada pelo Ministério Público, cuja peça acusatória imputa a ela a prática do crime disposto no artigo 33, caput, da Lei 11.343/2006.

Segundo consta da sentença (id. 5066846 - Págs. 2/12), ipsis litteris:

(...) De acordo com a inicial acusatória, na data de 06/02/2018, neste município, a Polícia local fazia rondas ostensivas, quando avistou a denunciada em atitude suspeita e ao proceder a revista na ré, encontraram em suas vestes 58 papelotes de ‘OXI, 1 papelote contendo maconha, mais um celular e R$ 27,00. A denunciada foi presa em flagrante e a droga foi levada à Delegacia de Polícia para os procedimentos legais. A acusada confessou a prática do tráfico de drogas perante a autoridade policial. Ao final, afirma o Parquet, que os indícios de autoria e a materialidade do delito estão presentes nos autos, e por fim, requer a condenação da ré como incursa nas penas do art. 33, caput, da Lei 11.343/06. (...)

Após regular instrução, foi julgada procedente a acusação (id.5066846 – Págs.2/12), condenando o recorrente pela prática do artigo 33, caput, da Lei 11.343/2006, às sanções de 05 (cinco) anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicial semiaberto, mais 500 (quinhentos) dias-multa, no menor valor unitário previsto em lei (sentença datada de 21/05/2019).

Inconformada, sua defesa interpôs o presente apelo (id. 5066847 - Págs. 6/10), onde pede:

1 – A absolvição da recorrente, sob alegações de insuficiência de provas, ressaltando a ausência do laudo toxicológico definitivo acerca das 58 pedras de oxi

2 – Alternativamente, a desclassificação do delito para uso (art. 28 da Lei de Drogas);

3 – Supletivamente, a reforma da dosimetria, para reconhecimento do tráfico privilegiado, reduzindo-se a reprimenda imposta que, ainda, pede que seja substituída por penas restritivas de direitos.

As contrarrazões firmaram-se pela manutenção da sentença (id. 5066847 - Págs. 17/27 e id. 5066848 – págs. 1/3).

Em segunda instância, os autos foram a mim distribuídos (id. 5066849 - Pág. 3).

Instada a se manifestar, a Procuradoria de Justiça emitiu parecer pelo conhecimento e improvimento do apelo (id. 5997193 – Págs. 2/7).

É o relatório do necessário.

À Douta Revisão, com sugestão de inclusão do feito no Plenário Virtual.

VOTO


O EXMO. SR. DES. LEONAM GONDIM DA CRUZ JÚNIOR (RELATOR):

01 – JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

O recurso encontra-se adequado, tempestivo, com interesse da parte e legitimidade desta para recorrer. Preenchidos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço-o, por conseguinte.

02 – DA ABSOLVIÇÃO E DA DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO

Sem a necessidade de maiores delongas, tenho que as provas presentes nos autos são suficientes para o convencimento tanto da materialidade como da autoria delitiva no que tange ao delito capitulado no artigo 33, caput, da Lei 11.343/2006 (tráfico de drogas).

Conforme relatei, a recorrente foi presa com 58 papelotes de ‘OXI’ e 1 papelote contendo maconha.

De fato, inicialmente, só foi acostado o laudo definitivo referente à maconha (id. 5066839, págs. 11/12), constando o laudo provisório referente ao ‘oxi’ (id. 5066836, págs. 17).

No entanto, as demais provas dos autos evidenciaram a apreensão da droga e sua natureza, inclusive a confissão em juízo da própria recorrente.

Em última análise, foi juntado, posteriormente, o laudo definitivo da droga, ex vi no id. 5066848, págs. 4/7, de onde se vê que foram apreendidas, em poder da apelante, 58 (cinquenta e oito) petecas, que testaram positivo para ‘cocaína’, e 0,441g de erva, que testou positivo para maconha.

Assim, não há dúvidas da quantidade e da natureza do entorpecente.

No que se refere à autoria, além dos depoimentos das testemunhas em juízo, a recorrente, na ocasião de seu interrogatório, confessou que a droga foi apreendida em sua posse e que era destinada a difusão ilícita (conforme mídias nos ids. 5076734, 5076736, 5076738, 5076740).

Como bem registrou o juízo, na sentença guerreada, resta inconteste, portanto, que a conduta da ré se amolda ao tipo penal do art. 33 da Lei Antidrogas, eis que, trazia consigo a droga. No caso em apreço, verifico que os depoimentos das testemunhas são harmônicos e mostram a realidade do delito, e a plena configuração da materialidade do crime de tráfico de drogas, bem como a autoria na pessoa da acusada, sendo tal assertiva confirmada pela própria ré em seu interrogatório.

É cediço que as condutas de transportar e trazer consigo configuram o tipo, bastando qualquer delas para sua materialização.

Ademais, entendo que a quantidade e condições de armazenamento da droga, bem como o fato de não haver nos autos provas de que a recorrente seja usuária de entorpecentes, deixa-me convicto do objetivo de traficância, não havendo margem para dúvidas de que a substância era destinada à difusão ilícita.

Some-se a isto o fato de que a condição de usuário de drogas, alegada pela defesa da recorrente, não tem o condão de afastar a traficância e gerar a desclassificação para o tipo reclamado, pois, não raro, as condutas se agregam.

Assim, não há nada nos autos que corrobore as assertivas da defesa, revelando-se, portanto, impossível tanto a absolvição como a desclassificação pleiteada, vez que presentes provas robustas de autoria e materialidade delitivas, aptas a embasar a sentença condenatória.

Tudo está de acordo com o disposto no artigo 155 do Código de Processo Penal.

Em comentário a esse dispositivo legal, doutrina Guilherme de Souza Nucci (in Código de Processo Penal Comentado – 20. ed. rev. atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2021):

Produção da prova sob o contraditório judicial: a disciplina do controle de apreciação da prova integra o sistema da persuasão racional, pois permite ao magistrado que forme a sua convicção livremente, analisando o conjunto probatório, desde que o faça motivadamente e calcado nos parâmetros constitucionais acerca dos limites ideais para a produção da prova. Esses limites são traçados pelo princípio do contraditório e da ampla defesa, num primeiro momento, vale dizer, as partes têm o direito de participar da colheita da prova, influindo na sua formação, dentro de critérios regrados, e o réu tem o direito de se defender da maneira mais ampla possível, tomando ciência, por seu advogado, das provas coletadas e podendo influir para a produção de outras em seu benefício. Além disso, veda-se a produção de provas ilícitas, hoje preceito expressamente contemplado pela nova redação dada ao art. 157 do CPP pela Lei 11.690/2008. Por isso, estabelece-se, como regra, dever o julgador basear a formação da sua convicção apreciando livremente a prova produzida em juízo, sob o crivo do contraditório.

Não há, pois, como acolher as teses defensivas.

03 – DA INCIDÊNCIA DO TRÁFICO PRIVILEGIADO

A defesa pede o reconhecimento do privilégio previsto no art. 33, §4º, da Lei de Drogas, com a sua aplicação em patamar máximo.

O §4º do artigo 33 da Lei 11.343/2006 assim versa:

§ 4º Nos delitos definidos no caput...

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