Acórdão Nº 0001378-15.2019.8.24.0023 do Primeira Câmara Criminal, 23-01-2020

Número do processo0001378-15.2019.8.24.0023
Data23 Janeiro 2020
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Apelação Criminal n. 0001378-15.2019.8.24.0023, da Capital


ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Criminal n. 0001378-15.2019.8.24.0023, da Capital

Relator: Des. Carlos Alberto Civinski

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. ROUBOS MAJORADOS PELO EMPREGO DE ARMA DE FOGO E CONCURSO DE AGENTES, NA FORMA DO ART. 70 DO CP. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA.

PRELIMINARES. INÉPCIA DA DENÚNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. EXORDIAL ACUSATÓRIA QUE PREENCHE OS REQUISITOS DO ARTIGO 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL E POSSIBILITA O REGULAR EXERCÍCIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA.

CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DE DILIGÊNCIAS. RELEVÂNCIA NÃO EVIDENCIADA. DISCRICIONARIEDADE DO DESTINATÁRIO DA PROVA. NULIDADE AFASTADA.

MÉRITO. PLEITO ABSOLUTÓRIO. ALEGADA DÚVIDA ACERCA DA AUTORIA DELITIVA. NÃO OCORRÊNCIA. CONJUNTO FORMADO PELA PALAVRA DOS OFENDIDOS, PELO RECONHECIMENTO POR ELES EFETUADO, PELO DEPOIMENTO DOS POLICIAIS MILITARES E PELA APREENSÃO DE PARTE DA RES FURTIVA. RECORRENTE QUE ADERIU AOS DESÍGNIOS DOS COMPARSAS E CONCORREU PARA A CONDUTA CRIMINOSA.

DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE FURTO. INVIABILIDADE. EMPREGO DE VIOLÊNCIA E GRAVE AMEAÇA COMPROVADOS. POSSIBILIDADE, TODAVIA, DE AFASTAR A MAJORANTE DO EMPREGO DE ARMA DE FOGO. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO QUE NÃO PERMITEM CONCLUIR QUE O ACUSADO ADERIU À VONTADE DOS COMPARSAS NO QUE TANGE AO USO DE ARTEFATO BÉLICO. HIPÓTESE DE PARTICIPAÇÃO DOLOSAMENTE DISTINTA CONFIGURADA.

POSTULADO O RECONHECIMENTO DE CRIME ÚNICO. DELITO DE ROUBO PRATICADO CONTRA DUAS VÍTIMAS. OFENSA A PATRIMÔNIOS DISTINTOS NO MESMO CONTEXTO FÁTICO. EFETIVA PRÁTICA DE DOIS CRIMES EM CONCURSO FORMAL PRÓPRIO. EXEGESE DO ART. 70, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL.

APLICAÇÃO DO INSTITUTO DA DETRAÇÃO. CABIMENTO CONDICIONADO À PROGRESSÃO DO REGIME INICIAL DE RESGATE DA REPRIMENDA. TEMPO DE PRISÃO CAUTELAR INSUFICIENTE PARA TANTO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.

- Não há cerceamento de defesa quando o magistrado decide de forma fundamentada sobre a desnecessidade de diligência requerida pela defesa, porquanto, na condição de destinatário da prova, ostenta a prerrogativa de indeferir a sua produção sem que essa providência resulte em prejuízo à defesa, especialmente quando consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias.

- Não é inepta a denúncia que preenche os requisitos do artigo 41 do CPP, descreve a conduta criminosa e suas circunstâncias, além de tipificar o crime no qual incorreram os agentes, tudo isso a possibilitar o regular exercício da ampla defesa e do contraditório.

- A existência de prova harmônica, composta pela palavra das vítimas e pelos reconhecimentos por ela efetuados, pelos depoimentos de policias e pela apreensão de parte da res furtiva na posse do acusado confere segurança na sua identificação como autor do crime de roubo circunstanciado.

- Sendo constatado que o agente ingressou na empreitada criminosa no meio do iter criminis, para auxiliar seus comparsas a agredirem as vítimas e, assim, assegurar a posse da res furtiva, mas desconhecendo que foi empregada arma de fogo para a abordagem inicial dos ofendidos, é viável o reconhecimento da participação dolosamente distinta do recorrente, para, por conseguinte, afastar a incidência da majorante do inciso I do § 2º-A do art. 157 do CP.

- A prática do delito de roubo em um mesmo contexto fático contra patrimônios distintos configura concurso formal de crimes, nos termos do artigo 70, caput, do Código Penal.

- O artigo 387, § 2º, do Código de Processo Penal tem por finalidade aferir se o tempo que o condenado ficou preso preventivamente durante a persecução penal é suficiente para, de plano, alterar o regime de cumprimento de pena imposto na sentença.

- Recurso conhecido e parcialmente provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0001378-15.2019.8.24.0023, da comarca da Capital (3ª Vara Criminal), em que é apelante Suézio Aparício Inácio Júnior, e apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina:

A Primeira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso, rejeitar as preliminares e dar-lhe provimento parcial, para reduzir a pena privativa de liberdade para 6 anos, 2 meses e 20 dias de reclusão e fixar o regime semiaberto. Comunicar a vítima, conforme determinação do art. 201, § 2º, do Código de Processo Penal. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Desembargador Paulo Roberto Sartorato, com voto, e dele participou a Desembargadora Hildemar Meneguzzi de Carvalho.

Florianópolis, 23 de janeiro de 2020.

Assinado digitalmente

Carlos Alberto Civinski

relator

RELATÓRIO

Denúncia: o Ministério Público ofereceu denúncia em face de Suézio Aparício Inácio Júnior, dando-o como incurso nas sanções do art. 157, caput, § 2º, II, e §2º-A, I, por duas vezes, na forma do art. 70, ambos do Código Penal, em razão dos seguintes fatos:

"No dia 30 de janeiro de 2019, por volta das 22h, na Avenida Pequeno Príncipe, bairro Campeche, nesta Capital, o denunciado e dois agentes ainda não identificados abordaram as vítimas Luciano Maykot Mateus e Tobias Mateus Vallespir com o objetivo de subtrair bens de valor.

Na ocasião, ameaçaram-nas gravemente com o emprego de duas armas de fogo, uma delas portada pelo denunciado, e, em seguida, subtraíram um celular, um relógio, uma aliança de ouro, documentos e a quantia de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais) da vítima Luciano, e um relógio, uma CNH, dois cartões bancários, uma toalha e $120.000,00 (cento e vinte mil pesos chilenos) da vítima Tobias.

Ato contínuo, o denunciado, com apoio dos demais, agrediu fisicamente as vítimas com socos e chutes, apesar de ambas não terem praticado qualquer ato de resistência."

Sentença: a Juíza Substituta Lucilene dos Santos julgou procedente a denúncia, para condenar Suézio Aparício Inácio Júnior ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 10 anos, 4 meses e 13 dias de reclusão e ao pagamento de 24 dias multa, no valor mínimo legal, pela prática do crime previsto no art. 157, caput, § 2º, II, e §2º-A, I, por duas vezes, na forma do art. 70, ambos do Código Penal (fls. 260-284).

Trânsito em julgado: muito embora não certificado pelo Juízo a quo, verifica-se que a sentença transitou em julgado para a defesa.

Recurso de Suézio Aparício Inácio Júnior: a defesa interpôs recurso de apelação, no qual sustentou, em síntese:

a) a inépcia da denúncia, porquanto descreveu de forma genérica a conduta imputada ao apelante;

b) a defesa do recorrente foi cerceada ao serem indeferidas diligências;

c) o conjunto probatório, em especial a prova oral colhida durante a instrução, é insuficiente para a condenação do acusado;

d) o reconhecimento efetuado pelas vítimas é inválido porquanto não observou as disposições do art. 226 do CPP e tampouco ratificado em juízo;

e) a conduta deve ser desclassificada para o crime de furto qualificado, devendo ser afastado o concurso formal;

f) havendo concurso de majorantes, o Juízo a quo deveria ter optado pela que causa maior aumento e excluído a remanescente;

g) além disso, a conduta não revelou maior gravidade e não foi localizada qualquer arma de fogo, de modo que a fundamentação assentada pelo Juízo a quo é inerente ao tipo penal e o aumento desproporcional;

h) deve ser concedido o direito de recorrer em liberdade.

Requereu o conhecimento e provimento do recurso, nos moldes acima (fls. 331-349).

Contrarrazões do Ministério Público: a acusação impugnou parcialmente as razões recursais, ao argumento de que:

a) a denúncia observou todos os requisitos do art. 41 do CPP;

b) os elementos dos autos permitem conclusão segura acerca da autoria delitiva.

c) a palavra das vítimas, o reconhecimentos efetuados na fase policial e a apreensão de parte da res furtiva na posse do apelante não suficientes para denotar sua autoria delitiva;

d) o art. 68 do CP apenas autoriza que seja aplicada apenas uma majorante, mas não determina que o juiz assim proceda;

e) não é necessária a apreensão da arma de fogo para caracterização da respectiva majorante;

f) foi demonstrada a necessidade da prisão para a garantia da ordem pública, além de ser viável a execução provisória da pena.

Postulou o conhecimento do recurso e a manutenção da sentença condenatória (fls. 374-381).

Parecer da PGJ: o Procurador de Justiça Ernani Dutra opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 386-389).

Este é o relatório.

VOTO

1 - Juízo de admissibilidade

O recurso preenche os requisitos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.

2 - Preliminares

O apelante sustentou a inépcia da denúncia, haja vista a ausência de individualização de sua conduta, questão que também foi apontada nas alegações finais. O Juízo refutou a tese na sentença condenatória, conclusão que deve ser mantida neste momento.

A rejeição da denúncia em decorrência de sua inépcia ocorre nos casos em que não estiverem preenchidos os requisitos previstos no artigo 41 do Código de Processo Penal, que assim estabelece:

Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.

Na hipótese em tela, porém, a exordial acusatória atende a todos os requisitos legais, descrevendo a conduta típica em tese praticada pelo agente, com todas as suas circunstâncias, além de classificar o crime e individualizar o denunciado.

A peça apresentou narrativa clara dos fatos, destacando que o acusado e outros dois indivíduos não identificados abordaram a vítima e, mediante grave ameaça exercida com armas de fogo e emprego de violência, subtraíram uma série de bens.

Não se desconhece que a peça especificou que o...

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