Acórdão Nº 0001456-55.2016.8.24.0074 do Primeira Câmara Criminal, 06-02-2020

Número do processo0001456-55.2016.8.24.0074
Data06 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemTrombudo Central
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Apelação Criminal n. 0001456-55.2016.8.24.0074, de Trombudo Central


ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Criminal n. 0001456-55.2016.8.24.0074, de Trombudo Central

Relator: Des. Carlos Alberto Civinski

PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. APROPRIAÇÃO INDÉBITA QUALIFICADA. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. RECURSO DA ACUSAÇÃO. PLEITO CONDENATÓRIO. INVIABILIDADE. AUSÊNCIA DE PROVAS SUFICIENTES DO ELEMENTO SUBJETIVO DA CONDUTA. CONDENAÇÃO INVIÁVEL. ABSOLVIÇÃO MANTIDA.

- A ausência de substrato probatório seguro sobre a prática do crime de apropriação indébita importa na aplicação do princípio do in dubio pro reo e, consequentemente, na manutenção da absolvição do agente.

- Recurso conhecido e desprovido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0001456-55.2016.8.24.0074, da comarca de Trombudo Central (2ª Vara), em que é apelante Ministério Público do Estado de Santa Catarina, e apelados Cristiano Conink:

A Primeira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Comunicar a vítima, conforme determinação do art. 201, § 2º, do Código de Processo Penal. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Desembargador Paulo Roberto Sartorato, e dele participou a Desembargadora Hildemar Meneguzzi de Carvalho.

Florianópolis, 6 de fevereiro de 2020.

Assinado digitalmente

Carlos Alberto Civinski

relator

RELATÓRIO

Denúncia: o Ministério Público ofereceu denúncia em face de Cristiano Conink, dando-o como incurso nas sanções do art. 168, § 1º, inciso III, em razão dos seguintes fatos:

Inicialmente cumpre dizer que, na época em que o fato a seguir narrado se efetivou, o denunciado CRISTIANO CONINK era vendedor externo da sociedade empresária Retsul - Retífica e Recuperação de Cabeçotes Ltda., estabelecida na Avenida Arthur Muller, n. 800, Bairro Centro, no Município de Trombudo Central/SC, de propriedade da vítima Arno Gorges, sendo que, no exercício das funções de seu emprego, era encarregado de fazer a entrega e a coleta de blocos e cabeçotes de motor para serem retificados, bem como receber os valores correspondentes aos serviços prestados pela mencionada sociedade empresária.

Nesta condição, no mês de novembro de 2014, em data a ser melhor delimitada durante a instrução processual, sabendo-se, contudo, que após o dia 17 de novembro, o denunciado CRISTIANO CONINK realizou a entrega dos serviços constantes do pedido n. 124942 (fl. 13) à Empresa Retisales Retífica de Motores Ltda., situada na Rua Henrique, no Município de São Gonçalo/RJ, com o valor final de R$ 9.710,00 (nove mil, setecentos e dez reais).

Assim é que, em razão do seu emprego e das funções que desempenhava para a sociedade empresária vítima, o denunciado CRISTIANO CONINK, no intuito de se apropriar de coisa alheia móvel, de forma livre consciente e voluntária, repassou ao cliente da vítima o número da agência e o número de sua conta bancária particulares (Banco 237, Agência n. 02550, Conta Corrente n. 0000000089516, de titularidade de Cristiano Conink), em cuja conta recebeu 2 (dois) depósitos, 1 (um) no valor de R$ 2.710,00 (dois mil, setecentos e dez reais), e outro no valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais), totalizando a quantia de R$ 9.710,00 (nove mil, setecentos e dez reais), referentes ao pagamento pelos serviços prestados.

Não obstante, o mencionado valor não foi repassado à sua legítima proprietária, a sociedade empresária Retsul - Retífica e Recuperação de Cabeçotes Ltda., ora vítima, tendo o denunciado CRISTIANO CONINK, de forma livre, consciente e voluntária, apropriado-se deste valor (coisa alheia móvel), de que tinha a detenção em razão de emprego.

O denunciado CRISTIANO CONINK, portanto, apropriou-se de coisa alheia móvel, de que tinha a detenção em razão de emprego e das funções que exercia para a vítima.

Sentença: a juíza de direito Juliana Andrade da Silva Silvy Rodrigues julgou improcedente a denúncia, absolvendo o acusado nos termos do inciso VII do art. 386 do CPP (fls. 469-482).

Trânsito em julgado: muito embora não certificado pelo Juízo a quo, verifica-se que a sentença transitou em julgado para o Ministério Público.

Recurso de apelação do Ministério Público: a acusação interpôs recurso de apelação, no qual sustentou que o conjunto probatório, em especial as provas documental e testemunhal, demonstrou que o acusado teve depositada, em sua conta bancária, quantia que pertencia a sua empregadora, deixando de repassá-lo ao legítimo destinatário do pagamento.

Requereu o conhecimento e provimento do recurso, para condenar o acusado pela conduta narrada na denúncia (fls. 487-494).

Contrarrazões de Cristiano Conink: a defesa impugnou as razões recursais, sob o fundamento de que o valor foi depositado mediante autorização do setor responsável, como forma de abater despesas das viagens do acusado e comissões não pagas.

Pugnou, ao fim, pela manutenção integral da sentença absolutória ou, em caso de condenação, pela desclassificação para o tipo do art. 345 do CP (fls. 500-514).

Parecer da PGJ: o procuradora de justiça Jayne Abdala Bandeira opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 523-529).

Este é o relatório.

VOTO

O recurso preenche os requisitos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.

A acusação pugnou pela reforma da sentença, sob o fundamento de que o conjunto probatório é suficiente para a condenação, pois teria demonstrado que ele, na condição de representante comercial da empresa Retsul Retifica e Recuperação de Cabeçotes, apropriou-se de valores repassados pela empresa Retisales Retífica de Motores Ltda, como forma de pagamento pelos serviços por aquela prestados.

Não é a conclusão que se extrai dos autos, sendo acertada a sentença absolutória de fls. 469-482 proferida pela juíza de direito Juliana Andrade da Silva Silvy Rodrigues, de modo que sua judiciosa análise, por ter esgotado o conjunto probatório, será adotada como razão de decidir, providência autorizada pelo entendimento pacificado do Superior Tribunal de Justiça (HC 247.708/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. em 19-4-2018, v.u. e RHC 95.278/PA, Sexta Turma, Rel. Min. Antônio Saldanha Palheiro, j. em 19-4-2018, v.u.) - grifos no original:

Segundo consta dos autos, o acusado Cristiano exercia a função de Representante Comercial da Retifica Retsul, de propriedade da suposta vítima Arno Gorges, e em dezembro de 2014, realizou uma entrega de equipamentos à empresa cliente Retsales, de São Gonçalo/RJ, onde declinou sua própria conta bancária para receber os valores pagos pelo serviço.

A versão acusatória é de que Cristiano não recebeu qualquer autorização da empresa para ter os valores depositados em sua conta particular, apontando que este se apropriou indevidamente do dinheiro pertencente ao seu empregador.

A tese defensiva, no entanto, aponta que o denunciado recebeu outorga do setor financeiro da Retsul, por meio da pessoa de Silvana Gorges, filha do proprietário, para receber o pagamento diretamente em sua conta bancária, uma vez que a empregadora lhe devia meses de salários e comissões atrasados, além das despesas com diárias e combustível do caminhão. Alega, outrossim, que a acusação da vítima seria tendenciosa e esquematizada, com o intuito de demitir o réu por justa causa e assim não arcar com os débitos trabalhistas que lhe incumbia.

A controvérsia então, dessume-se na efetiva comprovação de que o acusado tenha agido com animus rem sibi habendi, ou seja, com dolo de se apropriar da coisa alheia móvel.

Ao ser interrogado pela Autoridade Policial, o réu Cristiano Conink asseverou que a apropriação não foi indébita, uma vez que o recebimento dos valores pagos pelo cliente da empresa vítima diretamente em sua conta bancária particular teriam sido autorizados pela funcionária responsável pelo setor competente, Silvana Gorges.

Extrai-se do termo de interrogatório de fls. 22/23:

Que é representante comercial da empresa Retsul há aproximadamente dois anos e meio, fazendo a entrega e coleta de blocos e cabeçotes de motos para serem retificados; que as peças que não eram faturadas, o depoente recebia do próprio cliente os valores, muitas vezes em cheques de terceiros ou em dinheiro e raramente em depósitos bancários; que ao retornar à empresa prestava contas através de relatórios manuais para o setor financeiro da empresa, diretamente com Silvana Gorges, responsável pelo setor; que o depoente era responsável pela prestação de contas de valores financeiros e também das mercadorias que eram carregadas no caminhão e que porventura retornavam; que devido a problemas financeiros que a Retsul estava passando, inúmeras vezes o depoente mesmo bancava as despesas de viagens com o caminhão, onde posteriormente a empresa o reembolsava; que quanto aos dois depósitos bancários feitos na conta particular do depoente, um no valor de R$ 2.710,00 (dois mil e setecentos e dez reais) e o outro no valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais), esclarece que foram feitos com conhecimento e autorização de Silvana Gorges; que ela autorizou tais depósitos como forma de abater o que eles deviam ao depoente, decorrente das despesas de viagens que arcava para poder trabalhar, além das comissões não pagas; [...] (grifei).

Sob o...

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