Acórdão Nº 0001464-07.2014.8.24.0008 do Terceira Câmara de Direito Público, 19-10-2021

Número do processo0001464-07.2014.8.24.0008
Data19 Outubro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0001464-07.2014.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

APELANTE: REGINALDO RODRIGUES DA SILVA (AUTOR) APELADO: SAMAE - SERVIÇO MUNICIPAL DE AGUA E ESGOTO DE BLUMENAU (RÉU)

RELATÓRIO

Na Comarca de Blumenau, Reginaldo Rodrigues da Silva ajuizou "ação de cobrança" em face do Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto de Blumenau - SAMAE alegando que é servidor público municipal, ocupante do cargo de agente de logística; que desde 5/10/2009 exerce suas atividades na balança de pesagem do aterro municipal e que no exercício de suas funções está em contato direto com agentes biológicos e químicos nocivos à saúde; que jamais recebeu o respectivo adicional. Requereu a procedência do pedido com a condenação do demandado ao pagamento do adicional de insalubridade.

Devidamente citado, o SAMAE apresentou contestação sustentando que a atividade desenvolvida pelo autor concentra-se na realização de pesagem de veículos na entrada e saída do setor utilizando sistema informatizado sem que haja contado direto, nem tampouco habitual ou permanente com agentes químicos e biológicos. Aduziu que conforme Laudo de Avaliação de Prevenção de Riscos Ambientais, o trabalho desempenhado pelo demandante é salubre e não perigoso. Ao final, pugnou pela improcedência do pedido.

O autor apresentou réplica.

Saneado o feito, foi determinada a realização de prova pericial.

Juntado o laudo pericial judicial, as partes se manifestaram.

O representante do Ministério Público manifestou-se pela improcedência do pedido.

Na sequência, o MM. Juiz de Direito, ao sentenciar o feito, inscreveu na parte dispositiva da decisão:

"Isto posto e pelo mais que dos autos conta, JULGO IMPROCEDENTE, com arrimo no artigo 487, caput e inciso I do Código de Processo Civil (CPC/15), o pedido deduzido por REGINALDO RODRIGUES DA SILVA em face de SERVIÇO AUTÔNOMO MUNICIPAL DE ÁGUA E ESGOTO DE BLUMENAU - SAMAE.

"Por corolário dos princípios da causalidade e da sucumbência, condeno o demandado no pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios que fixo equitativamente no valor de R$ 1.500,00, observada a gratuidade da justiça, conforme a dicção conjunta dos artigos 82, 85, §§1º, 2º, 3º e 8º e 98, §3º do CPC/15.

"Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

"Certificado o trânsito em julgado e observadas as formalidades legais, arquivem-se os autos definitivamente, com as devidas anotações."

Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação sustentando em suas razões recursais que as atividades desenvolvidas por ele são de fato insalubres, porque desempenhadas no aterro sanitário da cidade, em ambiente permeado por agentes patológicos e infecciosos e que o laudo pericial não se ateve às reais condições de fato do labor executado. Argumentou, ainda, que a perícia judicial não levou em consideração o fato de os demais funcionários que laboram no mesmo local, ocupando a mesma função, receberem o adicional pretendido. Acrescentou que a Norma Regulamentadora NR-15 comtempla a atividade por ele desenvolvida. Ao final, requereu que sejam acolhidas as razões do presente recurso, reformando-se a sentença combatida para julgar procedente o pedido inicial.

Com as contrarrazões, os autos ascenderam a esta Superior Instância, perante a qual a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Plínio Cesar Moreira, considerou ausente o interesse público na causa e deixou de intervir.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Reginaldo Rodrigues da Silva inconformado com a sentença que, nos autos da "ação de cobrança", ajuizada em face do Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto de Blumenau - SAMAE, julgou improcedente o pedido formulado pelo autor que pretendia a condenação da empresa pública municipal ao pagamento do adicional de insalubridade em razão do exercício do cargo de agente de logística em aterro sanitário municipal.

Pois bem.

Inicialmente, convém consignar que Administração Pública está atrelada ao princípio da legalidade insculpido no caput, do art. 37 da Constituição Federal e qualquer pretensão só será passível de concessão quando houver expressa previsão legal.

Nestes termos, prudente lembrar a sempre citada lição de Hely Lopes Meirelles:

"A legalidade, como princípio administrativo (CF, art. 37, "caput"), significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso.

"(...)

"Na Administração Pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei significa "deve fazer assim".

"As leis administrativas são, normalmente, de ordem pública e seus preceitos não podem ser descumpridos, nem mesmo por acordo ou vontade conjunta de seus aplicadores e destinatários, uma vez que contêm verdadeiros poderes-deveres, irrelegáveis pelos agentes públicos. Por outras palavras, a natureza da função pública e a finalidade do Estado impedem que seus agentes deixem de exercitar os poderes e de cumprir os deveres que a lei lhes impõe. Tais poderes, conferidos à Administração Pública para serem utilizados em benefício da coletividade, não podem ser renunciados ou descumpridos pelo administrador sem ofensa ao bem comum, que é o supremo e único objetivo de toda ação administrativa." (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 37ª edição atualizada até a EC nº 67, de 22.12.2010. São Paulo: Malheiros Editores, 2011, p. 89).

Portanto, nenhuma vantagem pecuniária pode ser percebida pelos servidores públicos sem a correspondente lei que lhe dê amparo, em atenção ao princípio da legalidade. O campo de aplicação e os limites impostos aos benefícios concedidos devem ser depreendidos da lei, no caso, municipal, tendo o Administrador dever de observá-la.

A Constituição Federal de 1988 (CF/88) prevê que são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais a "redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança" (art. 7º, inciso XXII), bem como o "adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei" (art. 7º, inciso XXIII).

De outro lado, a Emenda Constitucional n. 19/1998, ao acrescentar o § 3º, ao art. 39, da CF/88, determinou que se aplica "aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir".

Observe-se, então, que o inciso XXIII do art. 7º, da CF/88, que trata especificamente do adicional de insalubridade, não mais figura entre os direitos aplicáveis aos servidores públicos.

A Emenda Constitucional n. 19, de 4/6/1998, suprimiu do § 3º do art. 39, da CF/88, essa extensão obrigatória do adicional de insalubridade ao servidor público, mas não proibiu que as leis federais, estaduais ou municipais prevejam gratificações para o servidor público que exercer atividade insalubre, penosa ou perigosa.

Por oportuno:

"A perda do status de direito constitucional do adicional de insalubridade em relação aos servidores públicos, em razão da superveniência da Emenda Constitucional n. 19/1998, não obsta que o Município, no exercício de sua competência para disciplinar a remuneração dos servidores públicos que lhe são afetos, estabeleça a sua concessão, em lei regularmente editada, e devidamente regulamentada." (Apelação Cível n. 2008.075377-2, de Dionísio Cerqueira, Rel. Des. Vanderlei Romer, j. 13/5/2009).

As verbas referentes a atividades insalubres são consideradas como gratificações, sendo devidas em razão das condições excepcionais da prestação do serviço, eis que possuem nítido caráter "propter laborem". Em virtude disso, para o recebimento da remuneração de insalubridade, o servidor precisa ter efetivamente prestado trabalho contínuo em condições nocivas à sua saúde.

O mestre HELY LOPES MEIREILES, acerca do assunto, leciona:

"Adicionais são vantagens pecuniárias que a Administração concede aos servidores em razão do tempo de exercício (adicional de tempo de...

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