Acórdão Nº 0001468-13.2008.8.24.0054 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 02-12-2021

Número do processo0001468-13.2008.8.24.0054
Data02 Dezembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0001468-13.2008.8.24.0054/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: KIRTON BANK S.A. - BANCO MULTIPLO (AUTOR) ADVOGADO: CRISTIANA VASCONCELOS BORGES MARTINS (OAB MS012002) APELADO: CARLOS JOAO CARDOSO (RÉU) ADVOGADO: TARCISIO CIMARDI (OAB SC013234) APELADO: CLEITON JOVAERTE KOLV (RÉU) ADVOGADO: RICARDO MARTINHO MULLER (OAB SC037622)

RELATÓRIO

Kirton Bank S.A. - Banco Multiplo interpôs recurso de apelação cível da sentença do Evento 220 dos autos de primeiro grau, integrada pela decisão do Evento 227 dos mesmos autos, proferida pelo juízo da Vara Regional de Direito Bancário da Comarca de Rio do Sul, que, ao julgar procedentes os pedidos formulados em ação de Reintegração de Posse ajuizada pelo banco recorrente contra Carlos João Cardoso, excluiu da demanda o réu Cleiton Jovaerte Kolv, reconhecendo, quanto a este, a incidência da prescrição, o que se deu nos seguintes termos (Evento 220 dos autos de origem):

I - RELATÓRIO

Kirton Bank S.A. - Banco Múltiplo (adquirido pelo Banco Bradesco), qualificado nos autos, propôs a presente AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE em face de Carlos João Cardoso e Sandra Regina Kolv, igualmente qualificados, alegando, em apertada síntese, que as partes firmaram contrato de compra e venda de imóvel através do Sistema Financeiro Habitacional, com garantia do imóvel por alienação fiduciária, cujo financiamento foi realizado no valor de R$ 88.900,00.

Sustentou que a parte ré deixou de efetuar o pagamento da 3ª parcela e da 7ª parcela em diante do financiamento do imóvel, resultando um saldo devedor de R$ 99.511,25, tendo em vista as parcelas vencidas e o vencimento antecipado do contrato.

Afirmou que a parte ré foi regularmente constituída em mora e, após ultrapassado o prazo sem que houvesse purgação da mora, foi averbado na matrícula do imóvel a consolidação da propriedade em nome do autor. A parte requerente promoveu primeiro e segundo leilões do imóvel, os quais restaram negativos por ausência de arrematante.

Informou que o imóvel permanece na posse dos réus e requereu a consolidação da posse em favor do autor, com a emissão do mandado de reintegração de posse e a condenação dos réus em custas e honorários (petição 13-16). Juntou procuração e documentos (17-63).

O juízo determinou, liminarmente, a reintegração da posse do imóvel (decisão 65). Contudo, após a interposição de agravo de instrumento (71-89), o juízo revogou a decisão, por não haver pedido liminar formulado na inicial (despacho 93).

Devidamente citado, o réu Carlos apresentou constestação (102-121), aduzindo, que o contrato foi firmado em 28/08/2006 e, em 26/10/2006 sua companheira Sandra Regina Kolv faleceu. Na ocasião, o réu acionou a seguradora do financiamento habitacional para perceber a indenização contratada, a qual foi negada pela seguradora ao argumento de que a doença que causou a morte de Sandra era preexistente. Alegou que sua companheira era quem recebia a maior renda do casal e era a reponsável pela maior parte do financiamento.

Informou que tentou administrativamente saldar o financiamento, mas não logrou êxito pois a casa bancária aplica juros remuneratórios, moratórios, correção monetária e multa de mora, inclusive no período de inadimplência. Alegou que não houve sua constituição em mora, eis que não foi regularmente notificado e que o herdeiro necessário da mutuária não foi notificado.

Informou que nas praças realizadas para alienação do bem, o autor considerou como se o imóvel houvesse sido inteiramente financiado, quando na verdade só foi financiado em 63,5%.

Refutou a liminar concedida e pugnou pela aplicação do CDC com a revisão das cláusulas contratuais abusivas e onerosas como a comissão de permanência cumulada com correção monetária e outros encargos e acima dos juros remuneratórios previstos no contrato. Aventou a inexistência de mora, pois cobrado por valores ilegais. Pugnou, ainda, pela improcedência da inicial e condenação do autor em honorários e pleiteou a gratuidade de justiça. Juntou documentos (122-146).

Houve réplica (154-160).

Foi juntado aos autos o prontuário médico de Sandra Regina Kolv (anexos 172-344) e determinado o apensamente da conexa ação de cobrança n. 054.08.004897-1 aos presentes autos (despacho 345), na qual o pedido de pagamento do seguro habitacional pela morte de Sandra foi indeferido (anexo 385-392).

Proferida sentença sem resolução de mérito para extinguir o feito pelo fato de o autor não ter integrado à lide o herdeiro da mutuária, tampouco ter demonstrado que o constituiu em mora, o que deveria ter feito tão logo tomou conhecimento do falecimento da contratante originária (sentença 351-354).

O autor interpôs apelação (358-365), tendo o réu Carlos interposto recurso adesivo junto com as contrarrazões (376-382). O acórdão do Tribunal de Justiça cassou a sentença proferida pelo juízo a quo, por não haver sido oportunizado ao autor a emenda à inicial para a constituição em mora do herdeiro ou espólio da mutuária, bem como retificação do pólo passivo da demanda (acórdão 411-418).

O autor emendou a inicial para substituir a ré Sandra por seu herdeiro Cleiton Jovart Kolv, pugnando pela sua citação (petição 452-454) e juntando comprovante da notificação extrajudicial no novo réu, o qual foi constituído em mora (evento 179).

Citado, o réu Cleiton constestou o feito (evento 210), pugnando, preliminarmente, pela sua exclusão da lide, por não possuir interesse, eis que acordou com Carlos que este quitaria o financiamento e ficaria como único dono do imóvel. Alegou a necessidade de regularização do polo ativo, eis que o autor foi adquirido pelo Banco Bradesco, bem como a nulidade de sua notificação extrajudicial e a ocorrência da prescrição. Pugnou pela improcedência da demanda e pelos benefícios da justiça gratuita.

Houve réplica quanto à contestação do réu Cleiton (evento 215).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório do necessário.

II - FUNDAMENTAÇÃO

Julgo antecipadamente a lide pois não há necessidade de produzir outras provas (Código de Processo Civil/2015, art. 355, I).

1. Das preliminares

1.1 Ilegitimidade passiva de Cleiton

O réu Cleiton requereu a sua exclusão da lide, na medida em que não possui interesse na discussão do imóvel. Informou que na época dos fatos acertou com o réu Carlos que este se comprometeria a quitar o financiamento do imóvel e, em contrapartida, Cleiton cederia a parte referente à sua falecida mãe para Carlos. Afirmou que jamais impediu a posse do autor e, ante a ausência do seu interesse no bem, requereu a sua exclusão da lide.

Em que pese a alegação defensiva, oberva-se que Cleiton, filho de Sandra, é herdeiro necessário da mutuária, devendo permanecer no pólo passivo da lide. Ademais, não há que se falar em ilegitimidade passiva, eis que o herdeiro possui legitimidade e, consequentemente, responde pelos encargos do falecido até as forças da herança, consoante disposição dos artigos 1.792 e 1.997, ambos do Código Civil e artigo 796 do Código de Processo Civil.

Assim, refuto a preliminar arguida pelo réu.

1.2 Regularidade da notificação extrajudicial

.O réu Cleiton alega irregularidade na notificação extrajudicial que constituiu o devedor em mora, ao argumento de que não foi efetuada por oficial do Registro de Imóveis.

Contudo, o artigo 26, §3º, da Lei n. 9514/97 estabelece que a notificação extrajudicial pode ser efetuada, também, pelo correio com aviso de recebimento.

Dessa forma, válida a notificação extrajudicial com aviso de recebimento efetuada pelo autor, motivo pelo qual afasto a preliminar aventada.

1.3 Prescrição

Alegou o réu Cleiton que ocorreu a prescrição, tendo em vista que referido réu somente foi constituído em mora quando de sua notificação extrajudicial, ocorrida em 2018, enquanto as parcelas passaram a ser devidas em 2006 e 2007, tendo decorrido prazo superior a 10 anos.

Destarte, verifica-se que razão assite ao requerido neste ponto, eis que somente foi notificado extrajudicialmente pelo autor em 29/08/2018, conforme evento 179, quando já havia decorrido mais de 10 (dez) anos desde o inadimplemento das parcelas do financiamento.

Da mesma forma, a citação judicial do requerido Cleiton ocorreu em julho/2019 (evento 207), período ainda mais distante do descumprimento do pactuado.

Ademais, observa-se que a parte requerente já tinha conhecimento do falecimento da mutuária Sandra quando do ajuizamento desta ação, tanto que, em 27/06/2007, encaminhou ao réu Carlos cópia da negativa de cobertura da seguradora pela morte da mutuária Sandra, conforme anexo 141 do evento 162.

Dessa forma, tendo ultrapassado mais de 10 (dez) anos desde o inadimplemento das parcelas do financiamento até o momento em que o réu Cleiton foi notificado e constituído em mora, constata-se a ocorrência da prescrição em relação ao referido réu, motivo pelo qual, acolhendo a preliminar arguida pela defesa, julgo extinto o feito em relação ao réu Cleiton Jovart Kolv, conforme artigo 205 do Código Civil.

2. Do mérito

Passo à análise do mérito somente quanto ao réu Carlos João Cardoso.

Em relação ao alegado contra a liminar de reintegração de posse, verifica-se que a decisão foi revogada pelo juízo (93), motivo pelo qual deixo de analisar as questões atinentes à referida liminar.

Constata-se que a presente ação de reintegração de posse decorre de contrato de financiamento habitacional garantido com bem imóvel alienado fiduciariamente, no qual não houve pagamento das parcelas devidas por parte do réu.

Ademais, sabe-se que nos contratos garantidos por alienação fiduciária de bem imóvel, a mora se dá com a notificação extrajudicial do réu para satisfazer a dívida, nos termos do artigo 26 da Lei n. 9.514/97.

Na hipótese, a instituição financeira...

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