Acórdão Nº 0001476-69.2015.8.24.0013 do Primeira Câmara Criminal, 19-11-2020

Número do processo0001476-69.2015.8.24.0013
Data19 Novembro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão
Recurso em Sentido Estrito Nº 0001476-69.2015.8.24.0013/SC

RELATOR: Desembargador PAULO ROBERTO SARTORATO

RECORRENTE: ROQUE DE QUEROZ (ACUSADO) ADVOGADO: ANGELITA BACH (OAB SC041560) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

O representante do Ministério Público, com base no incluso Inquérito Policial, ofereceu denúncia contra Roque de Queroz, devidamente qualificado nos autos, dando-o como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, incisos II e IV, c/c art. 14, inciso II, todos do Código Penal, pelos fatos assim narrados na exordial acusatória, in verbis (Evento 7 dos autos da ação penal):

1. No dia 13 de março de 2015, por volta das 6h00min da manhã, na Linha Santa Rita, no interior do município de Saltinho/SC, o denunciado Roque de Queroz, por motivo fútil e mediante dissimulação, deu início ao ato de matar a vítima Juvenil dos Santos, o que não ocorreu por circunstâncias alheias a sua vontade.

2. Na oportunidade, em razão de uma dívida anterior (motivo fútil), e após dissimular pedindo para que a vítima lhe ajudasse a procurar seus documentos que havia perdido (mediante dissimulação), o denunciado Roque de Queroz, com a visível intenção de matar, desferiu golpes de faca em Juvenil dos Santos, que lhe causaram as lesões corporais descritas no laudo pericial à fl.39.

3. O crime não se consumou porque a vítima conseguiu se desviar de um dos golpes que lhe acertaria o pescoço, também porque foi empurrado por sua mãe, Roseli Leite, momento em que perdeu a faca de suas mãos, sendo a vítima socorrida e levada ao pronto atendimento, aonde recebeu os cuidados necessários.

Encerrada a primeira fase da instrução processual, o MM. Juiz a quo, convencido da existência de prova da materialidade e de indícios suficientes da autoria de crime contra a vida, julgou admissível a denúncia, pronunciando o acusado Roque de Queroz, a fim de que seja ele submetido a julgamento perante o Tribunal do Júri, como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, incisos II e IV, c/c art. 14, inciso II, ambos do Código Penal, concedendo-lhe o direito de aguardar em liberdade o julgamento do feito (Evento 171 dos autos da ação penal).

Irresignado com a decisão de pronúncia, o acusado interpôs recurso em sentido estrito por termo nos autos e, também, por intermédio de sua defensora (Eventos 179 e 182 dos autos da ação penal). Em suas razões recursais, sustentou, preliminarmente, a presença de excludente de ilicitude, uma vez que o acusado teria agido em legítima defesa, pelo que requereu a absolvição sumária. De forma alternativa, pleiteou a desclassificação do delito para o crime de lesão corporal de natureza leve, ante a ausência de animus necandi, e o afastamento das qualificadoras. Por fim, pugnou pela fixação dos honorários devidos à defensora dativa, por sua atuação na esfera recursal (Evento 182 dos autos da ação penal).

Em contrarrazões, o Ministério Público manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do recurso defensivo (Evento 191 dos autos da ação penal).

Mantida a decisão recorrida (Evento 194 dos autos da ação penal), os autos ascenderam a esta Superior Instância, tendo a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Dr. Raul Schaefer Filho, opinado pelo conhecimento e desprovimento do recurso (Evento 11 dos autos do recurso em sentido estrito).

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto por Roque Queroz, irresignado com o teor da decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Campo Erê, que o pronunciou pela prática, em tese, do delito tipificado no art. 121, § 2º, incisos II e IV, c/c o art. 14, inciso II, ambos do Código Penal.

O recurso deve ser conhecido, porquanto presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade.

I - Dos pedidos de absolvição sumária e de desclassificação

A defesa do acusado pugna pela reforma da decisão que o pronunciou, sob o argumento de o acusado ter agido em legítima defesa, pelo que pretende a absolvição sumária ou, alternativamente, a desclassificação do delito para o crime de lesão corporal de natureza leve, diante da inexistência de animus necandi, ou, ainda, em caso de manutenção da decisão de pronúncia, o afastamento das qualificadoras relativas ao motivo fútil e dissimulação

Pois bem. É cediço que, nos termos do art. 413 do Código de Processo Penal, tratando-se de procedimento criminal de competência do Tribunal do Júri, necessário, para proceder-se à pronúncia do acusado, apenas a prova da materialidade do delito e indícios de autoria. Isso porque na fase da pronúncia vigora um juízo sumário de conhecimento, no qual cabe ao juiz singular admitir a denúncia, sem realizar exame aprofundado sobre o mérito, cuja incumbência é dos jurados, julgadores de fato.

A respeito do tema, cita-se entendimento doutrinário:

[...] Para que o juiz pronuncie o acusado, basta que se convença da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes da autoria, ou da participação. Um dos requisitos legais para que o juiz pronuncie o imputado é a constatação da materialidade do crime. Isso implica afirmar que a prova dos autos deve demonstrar o corpus delicti, que se eleva à categoria de prova ou de convicção quanto à existência do crime. [...] Outro permissivo processual que permite ao magistrado determinar que o imputado seja submetido a julgamento pelo colegiado popular diz respeito aos indícios da autoria. Como se observa, não há necessidade para efeito da pronúncia, que se tenha certeza da autoria, basta que haja pegadas, vestígios, que haja, enfim, a possibilidade ou probabilidade de a pessoa apontada ser a autora do crime doloso contra a vida, o que se constata do cotejo analítico das provas arrostadas aos autos por ocasião da instrução própria. Conforme magistério provindo de Bento de Faria, por "indício se entenda toda e qualquer circunstância que tenha conexão com o fato mais ou menos incerto, de que se procura a prova; se ele pode resultar de um processo lógico de raciocínio, e que resultar evidenciado por esse processo, ainda que remoto, sendo suscetível de constituir motivo de suspeita, autoriza a pronúncia" (MOSSIN, Heráclito Antônio. Júri: crimes e processo. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 271).

In casu, vê-se que a materialidade do crime narrado na peça exordial acusatória e os indícios suficientes de autoria encontram-se presentes no caderno processual sob análise, do qual igualmente podem ser extraídos subsídios a indicar a presença de animus necandi na ação do acusado - tendo sido referidos elementos, a propósito, detidamente examinados pelo Magistrado a quo na decisão recorrida (Evento 171 dos autos da ação penal), motivo pelo qual se invoca parte da referida argumentação como fundamentação do presente acórdão, realizadas as adequações necessárias, a fim de se evitar a indesejada tautologia.

Frisa-se que tal procedimento possui legitimidade jurídico-constitucional há muito reconhecida pelas Cortes Superiores, quando a transcrição ocorre em complementação às próprias razões de decidir.

Anotou o MM. Juízo a quo que "[...] A materialidade do delito tentado contra a vida...

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